As instituições europeias claramente mudaram
de rumo em relação à Grécia. Em vez
do "resgate" ao país, elas agora discutem sua
falência e como reduzir o risco de contágio. O fundo
de resgate do Euro, que supostamente deveria garantir a solvência
grega, está sendo usado para assegurar os bancos credores
contra as consequências da falência do Estado.
A mudança de curso tem acontecido gradualmente, sob
a pressão de intensas flutuações nas bolsas
de valores e mercados financeiros, a ameaça de falências
bancárias e crescente oposição às
medidas de austeridade do Governo grego. Mas isso segue a inconfundível
lógica de classe.
O medo de uma incontrolável reação em
cadeia já havia impedido a UE de arriscar uma falência
da Grécia. Temia-se a falência dos maiores bancos
credores, que, por sua vez, levaria mais bancos ao abismo - como
o Lehman Brothers nos EUA após sua falência em setembro
de 2008. Outros países seriamente endividados, como Portugal,
Irlanda, Espanha e Itália também estão ameaçados
de não ter mais acesso a crédito caso a Grécia,
país-membro da Zona do Euro, vá a falência.
Sob essas circunstâncias, os pacotes de resgate de bilhões
de dólares da Grécia servem para ganhar tempo. Eles
não beneficiaram o Estado grego, nem, certamente, a população
grega, mas foram diretamente para os cofres dos bancos credores,
que receberam o pagamento total de seus empréstimos com
todos os juros devidos. O Banco Central Europeu também
comprou grandes quantidades de títulos do Estado grego
no mercado aberto, aliviando assim o risco que os bancos sofriam
sobre seus títulos adicionais.
Os pacotes de resgate à Grécia são condicionados
por drásticas medidas de corte de gastos, as quais, desde
o princípio, descartavam a possibilidade de recuperação
econômica da Grécia. Mesmo para um leigo, era óbvio
que a recessão causada pelas medidas de austeridade anularia
qualquer economia orçamentária.
O propósito das medidas de austeridade não era tanto
reestruturar o orçamento, mas arruinar a classe trabalhadora.
Sob os ditames da chamada troika - o Banco Central Europeu,
a Comissão Europeia e o Fundo Monetário Internacional
- o governo grego cortou aposentadorias e salários, destruiu
dezenas de milhares de empregos do setor público e levou
os trabalhadores autônomos à falência com o
aumento dos impostos, enquanto a elite rica acumula suas fortunas
em bancos estrangeiros.
Ao mesmo tempo, revoltas contra essas medidas estão cada
vez mais ameaçando o governo grego. Somente este mês
houve vários atos e greves gerais. Os sindicatos, que trabalham
lado a lado ao governo, encontram cada vez mais dificuldades para
manter a resistência da classe trabalhadora sob controle.
Os representantes da troika tiraram a conclusão a partir
desses fatos de que chegou a hora de abandonar a Grécia.
A falência do Estado significaria que o governo não
teria mais fundos para pagar salários e aposentadorias,
assim como para quaisquer outros gastos públicos.
Assim como as indústrias automotivas americanas se aproveitaram
da legislação de falência para se livrar de
suas obrigações financeiras com a classe trabalhadora
em um só golpe, o governo grego poderia anular efetivamente
seus contratos e obrigações legais atuais. A questão
então não seria de quantos empregos seriam eliminados
e até que ponto os salários seriam cortados, e sim
quem vai conseguir sequer ter um emprego.
A falência do Estado grego também seria usada para
intimidar os trabalhadores de outros países europeus. Ela
representaria uma ameaça inequívoca, mostrando o
que os espera se eles não aceitarem as medidas de austeridade
imposta por seus governos.
Na Grécia, a falência do Estado provocaria uma efervescência
violenta da população. Mas a UE espera conseguir
isolar essa agitação com a ajuda dos sindicatos,
que até agora se recusam a organizar a solidariedade internacional
aos trabalhadores gregos. O exército grego também
se pronunciou, ameaçando derrubar o governo do PASOK. Sob
o governo de "coronéis", o exército suprimiu
a classe trabalhadora de 1967 a 1974 em uma ditadura sanguinária.
A principal preocupação da UE no momento é
como prevenir que a falência do Estado grego derrube bancos
internacionais e outros países europeus. Todas as decisões
e debates das últimas semanas e dias giravam em torno dessa
questão.
Os governos da Zona do Euro já concordaram em junho em
aumentar o fundo de resgate ao Euro (EFSF) e em ampliar seus poderes.
Mais do que apenas providenciar garantias de crédito para
ajudar os países da Zona do Euro, o EFSF agora poderá
também comprar títulos de Estados vulneráveis
no mercado aberto e, assim, remover os riscos que os bancos correm.
Também está colocado em discussão o aumento
de capital dos bancos com fundos da EFSF ou outras fontes de dinheiro
público. Esse foi o tema central do encontro de ministros
da UE na terça-feira da semana passada. Os ministros pediram
que a Autoridade Bancária Europeia (EBA) verificasse a
resiliência dos bancos europeus caso a Grécia provocasse
um calote dos seus pagamentos.
Na quarta-feira, a chanceler alemã, Angela Merkel, também
concordou com essa linha. Se os bancos precisavam de dinheiro
urgentemente, os Estados europeus não deveriam atrasar
uma ajuda financeira porque isso seria um "dinheiro investido
racionalmente", disse ela após encontrar o presidente
da UE, José Manuel Barroso e os líderes das principais
instituições financeiras internacionais.
Na quinta-feira o Banco Central Europeu decidiu, por sua vez,
ajudar os bancos ameaçados com grandes somas de dinheiro.
Em outras palavras, em vez de resgatar os países da Zona
do Euro que estão à beira da falência, os
fundos do pacote de resgate do Euro e o Banco Central Europeu
estão agora sendo usados para resgatar os bancos enquanto
países endividados vão à falência.
Especialistas acreditam que os bancos europeus precisam de ao
menos 200 a 300 bilhões de euros em capitais adicionais
para sobreviver à falência do Estado grego. Como
no resgate aos bancos na crise financeira de 2008, esses fundos
seriam pagos de volta, mais uma vez, por meio de medidas de austeridade
à custa da classe trabalhadora.
Muitos políticos e representantes da mídia agora
veem a falência do Estado grego como uma certeza.
O Spiegel Online comentou sobre os eventos da semana passada:
"Agora as instituições financeiras deverão
ser apoiadas com o dinheiro dos contribuintes. Isso pode ser mais
barato do que resgatar países em crise".
E o maior jornal econômico europeu, o Financial Times,
publicou um comentário na quinta-feira sob a manchete "Salvem
o Euro - permitam o calote grego".
"Dada sua dívida, seu orçamento, seus atuais
déficits e sua completa falta de competitividade,
a Grécia não pode escapar à armadilha da
dívida", declaravam. "Austeridade sobre austeridade
irá apenas matar o paciente".
Para gerenciar a falência do Estado, o Financial Times
clama por uma "recapitalização coordenada dos
bancos e a quadruplicação, a cerca de 2000 bilhões
de euros, do EFSF". A conta dessas medidas deverá
ser paga pela classe trabalhadora de toda a Europa, na forma de
mais cortes e medidas de austeridade.
As preparações para a falência do Estado grego
marcam um novo estágio na ofensiva da elite financeira
contra a classe trabalhadora. Essa ofensiva só pode ser
respondida com uma luta comum dos trabalhadores da Europa sobre
as bases de um programa socialista que se foque na expropriação
dos bancos e grandes corporações e no estabelecimento
dos Estados Unidos da Europa.