Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 28 de junho de 2007.
Trabalhadores dos correios britânicos estão se
preparando para realizar a sua primeira greve nacional em onze
anos no dia 29 de junho. A greve foi chamada pelo Sindicato dos
Trabalhadores da Comunicação (CWU - Communication
Workers Union) depois que as negociações salariais
entre o sindicato e a direção do Royal Mail
chegaram a um impasse.
Mais de 75% dos trabalhadores do Royal Mail votaram
a favor da greve.
O sindicato estava negociando com o Royal Mail, que
propõe um reajuste salarial de 2,5% para os carteiros e
ameaça cortar 40.000 empregos. Cerca de 5.000 associados
do CWU concordaram em protestar contra os fechamentos, o rebaixamento
dos salários e a mudança das agências para
dentro de lojas comerciais na rua W. H. Smith. Trabalhadores da
área financeira, que enviam dinheiro às agências,
também votaram pela greve.
O Royal Mail emprega cerca de 193.000 trabalhadores
e envia 84 milhões de itens a 27 milhões de residências
e empresas todos os dias, o que representou, no ano passado, uma
soma de £9,1 bilhões (US$ 18,1 bilhões).
Os trabalhadores dos correios estão enfrentando uma
grande luta contra um oponente que está determinado a vencer
a qualquer custo. O problema é que eles são dirigidos
por um sindicato que faz reivindicações rebaixadas,
e tenta impô-las aos seus associados, o que acaba ajudando
o Royal Mail a atingir seus objetivos.
A direção do Royal Mail se preparou para
a greve. O plano é mantido em segredo. Um porta-voz declarou
apenas que a companhia utilizará todos os recursos
que puder para manter a normalidade dos serviços.
No passado, isso significava usar administradores e trabalhadores
temporários como fura-greves.
A linguagem utilizada pelos representantes do Royal Mail
na preparação do confronto é absurda. Um
executivo chegou a dizer: isso será sangrento. Nós
tivemos os mineiros, nós tivemos Longbridge (greve em fábrica
de automóveis em 1970) e agora nós temos isso.
Um outro executivo descreveu estas greves como o ponto de
tensão da história do Royal Mail.
O que está em jogo na disputa entre os trabalhadores
e a companhia é um programa de reestruturação
que deve atacar ainda mais os empregos e as condições
de trabalho. Um ex-chefe executivo do Royal Mail, Bill
Cockburn, agora vice-presidente de uma empresa de correios concorrente,
a Business Post, disse que as coisas devem se dar de forma
semelhante à British Telecom. Segundo ele, o
Royal Mail deve se ajustar à realidade da concorrência
e desenvolver inovações para o atacado, ao invés
de se manter na defensiva, baseando-se num setor que não
se sustenta.
A British Telecom foi privatizada em 1984, e em três
meses, mais de 80.000 empregos foram liquidados. A privatização
das agências de correio se tornou algo difícil por
causa da militância dos trabalhadores e a clara oposição
pública. Todavia, com a ajuda da burocracia do CWU, o governo
tem sido capaz de fazer tudo para preparar a privatização.
Numa recente pesquisa, apenas 29% dos trabalhadores disseram
que se sentiam valorizados pela administração dos
correios e 21% disse ter testemunhado intimidações
e provocações por parte da administração.
Em 1986, a agência de correios foi desmembrada em quatro
setores distintos um dos quais, o Royal Mail, foi
reestruturado em 1992, reduzindo 64 distritos postais para 9 divisões,
com significativa perda de empregos.
Em 1999, a secretaria do comércio do governo trabalhista,
de Peter Mandelson, organizou uma nova estrutura comercial, que
exigiu o mais radical conjunto de reformas, desde que a
moderna agência de correios foi criada em 1969.
O governo trabalhista abriu o serviço de correios britânico
ao mercado no dia 1 de janeiro de 2006 três anos
depois do prazo final estabelecido pela Diretriz do Sindicato
Europeu dos Serviços Postais, de 1997, que exigia acabar
com o monopólio das transportadoras nacionais e abrir o
serviço de correspondências ao mercado.
Acelerando a desregulamentação do Royal Mail,
o governo tentou posicionar a companhia de forma a conquistar
vantagens no mercado de serviço postal europeu, que equivale
a 80 bilhões de euros por ano e envolve a circulação
e entrega de 135 bilhões de itens.
A direção do Royal Mail reclama que, desde
que o serviço postal foi aberto ao mercado em janeiro de
2006, a empresa perdeu 40% das correspondências empresariais,
que representam 90% das correspondências britânicas.
Ela reclama também que os concorrentes são 40% mais
eficientes, em conseqüência da introdução
de novas tecnologias. Além disso, eles pagam salários
25% menores aos seus trabalhadores.
Crozier afirma que estamos perdendo negócios porque
falhamos em mudar e modernizar como resultado disso, nossos
custos e preços são mais altos do que os dos nossos
concorrentes num mercado que é altamente competitivo.
O presidente do Royal Mail, Allan Leighton, disse ainda
que nós estamos ouvindo a população,
mas isso não é um concurso de popularidade. Mudar
é difícil para todos e entendemos isso
mas nós não temos opção a não
ser nos modernizarmos e termos um negócio competitivo,
se quisermos ter sucesso num mercado como o de hoje.
Tudo indica que o Royal Mail esteja preparado para uma
longa batalha (a expectativa é que a greve possa durar
até três meses). O mesmo não pode ser dito
em relação ao CWU. No primeiro dia, o sindicato
tentou bloquear a greve, com uma atitude hesitante diante de uma
massa de trabalhadores revoltada e frustrada.
O CWU deixou clara a sua posição: o CWU
esclarece mais uma vez que nós sempre nos propusemos a
conversar. Nós explicamos que não somos contra a
modernização, nem exigimos um aumento salarial de
27%. Nós dissemos ao Royal Mail que eles precisavam
considerar seus empregados como aliados, mudar o que for necessário
e buscar o apoio dos trabalhadores por meio do aumento do salário.
O sindicato reclamou que não foi autorizado pelo Royal
Mail a celebrar um acordo salarial semelhante àquele
aceito pelos trabalhadores da seção de empacotamentos
do Royal Mail, a Parcelforce. O sindicato exerceu
uma estreita colaboração com o Royal Mail
no passado, o que causou a degradação das condições
de trabalho e o aumento da produtividade. O presidente do CWU,
Billy Hayes, disse recentemente que os trabalhadores dos correios
são insubstituíveis hoje. Em 2005, os trabalhadores
do Royal Mail entregaram 99,7% das correspondências
previamente separadas. Em 2006, os trabalhadores do Royal Mail
entregaram 99,8% da correspondência previamente separada.
Há anos, o sindicato vem colaborando com a administração
do Royal Mail e com o governo trabalhista para forçar
os trabalhadores dos correios a aceitar os acordos de modernização
e eficiência, dizendo que eles seriam beneficiados pelas
economias obtidas com a radical reestruturação da
companhia muitas das idéias tendo origem na própria
proposta do CWU, que defendia uma Corporação de
Propriedade Pública Independente. Todos os anos, os dirigentes
do sindicato ameaçavam organizar greves, abortando-as no
último momento. Isso fez com que os lucros subissem e que
os postos de trabalho e os salários fossem sendo destruídos.
Os salários dos carteiros estão entre os mais baixos
do Reino Unido.
O Royal Mail converteu o antigo déficit, que
era de £1,1 bilhões, para um lucro recorde de £355
milhões em 2005. Mesmo assim, os trabalhadores têm
um salário semanal básico de £323 e reivindicam
um reajuste de £14,53 o dobro da oferta atual
numa tentativa de recompensar as perdas com a inflação.
Os últimos números do governo já mostram
que os trabalhadores do correio recebem menos do que o salário
médio do país, e que essa queda tende a continuar.
Uma pesquisa do Comitê da Indústria e do Comércio
publicada recentemente (O Royal Mail depois da liberalização)
mostrou que tudo o que o Royal Mail conseguiu economizar
foi conquistado por meio da destruição dos empregos
e da degradação das condições de vida
dos trabalhadores.
A pesquisa observa que desde que o acordo foi assinado em 2006,
33.000 trabalhadores contratados e 25.000 trabalhadores temporários
perderam seus empregos e outros 30.000 podem perdê-los nos
próximos anos. A pesquisa observa ainda que o Royal
Mail pôde introduzir práticas de trabalho
diferentes em 1.400 agências, enquanto reduzia o número
de dias perdidos por greves, de 100.000 em 2006, para menos de
4.000 em 2005.
O CWU abriu o caminho para a privatização, promovendo
as ações por meio da promessa de dividendos equivalentes
à £800, caso fossem alcançadas as metas das
unidades individuais e do grupo como um todo.
Uma coisa é certa: os trabalhadores que comprarem ações
não terão o controle da companhia, pois as ações
têm uma cláusula que não permite o voto. E
as experiências do passado mostram que, em poucos anos,
tais ações normalmente acabam nas mãos da
administração, depois de serem vendidas pelos trabalhadores
empobrecidos.
A globalização do comércio e da indústria
desestruturou os monopólios dos correios organizados nacionalmente
e forçou-os a competir dentro das fronteiras e internacionalmente.
O enorme crescimento do correio eletrônico forçou
o serviço de cartas a cortar custos em todo o mundo e aumentar
a eficiência, criando novos mercados para entregas de itens
comprados via internet. A British Gas anunciou recentemente
que iniciará uma campanha, que deverá coincidir
com a greve nos correios, visando persuadir 1 milhão de
clientes a converterem suas contas para cobranças virtuais
por meio da internet.
Isso tem sido desastroso para os trabalhadores dos correios,
levando-os a uma luta fratricida, da qual só se beneficiam
a administração e os acionistas. Os consumidores
também foram afetados. De acordo com Jon Pedersen, do UNI-Europa
(que representa os sindicatos em toda a Europa), dez anos
de liberalização dos correios na Europa significaram
até agora uma diminuição do número
de agências dos correios, das caixas de correio e, conseqüentemente,
um aumento das distâncias entre as agências. Para
os trabalhadores do setor postal isso significou menos empregos,
piores condições de trabalho e salários cada
vez mais baixos. Tudo isso é o contrário das promessas
da EU (União Européia).
Na Suécia, o resultado da privatização
foi o fechamento de 25% das agências de correio e a diminuição
de 70.000 para 38.000 empregos no setor. Na Itália, o número
de trabalhadores caiu de 220.000 para 150.000, enquanto na Alemanha,
onde a rede dos correios (Deutsche Post)foi privatizada
parcialmente, os empregos caíram mais da metade
de 306.000 para 150.000. Na Holanda, a TNT Post, o ex-monopólio
alemão de operação dos correios, disse que
deve cortar 7.000 empregos e congelar os salários. Na Nova
Zelândia, o mesmo processo conduziu à destruição
de 43% dos empregos.
O CWU se recusou explicitamente a unir a luta dos trabalhadores
dos correios britânicos àquela de seus irmãos
e irmãs europeus.
Um grande número de estados europeus como França,
Alemanha e Itália chamaram a atenção para
a taxa de liberalização. Estes governos disseram
que a desregulamentação muito rápida está
ameaçando a Obrigação Universal de Serviços
ou seja, as entregas a domicílio nos respectivos
países. Além disso, os governos temem que a liberalização
esteja aumentando a revolta dos trabalhadores dos correios da
Europa. Apesar das greves nos países que estão passando
pela liberalização ainda serem, no momento atual,
poucas e pequenas, isso pode mudar rapidamente.
Houve recentes greves em 300 cidades de toda a Europa. Os trabalhadores
protestavam contra a desregulamentação do serviço
postal, os cortes de emprego e os ataques às condições
de trabalho, o que é uma clara indicação
de que existe a possibilidade de uma luta conjunta dos trabalhadores
dos correios da Europa. Mas isso não será realizado,
a não ser sob a forma de protestos simbólicos, se
estiver sob a liderança de um sindicato comprometido com
o sucesso de seus patrões e da economia nacional.
O requisito fundamental de qualquer luta para defender os empregos
dos trabalhadores dos correios é organizar-se de forma
independente da burocracia do CWU e rejeitar toda e qualquer proposta
que leve ao comprometimento com a administração,
baseadas em supostos interesses comuns entre trabalhadores e patrões
pelo sucesso da companhia.
Os interesses dos trabalhadores dos correios na Inglaterra
são os mesmos dos trabalhadores da Europa e de todo o mundo
a defesa de seus empregos, salários e condições
de trabalho contra o constante busca de valorização
e ampliação do mercado de ações, que
é feito à custa dos trabalhadores. Os trabalhadores
devem construir uma nova direção que tenha uma nova
perspectiva socialista, a fim de organizar uma luta política
independente contra o CWU e o governo trabalhista e seus parceiros
no continente.