Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 25 de novembro de 2006
A greve dos trabalhadores da Volkswagen em Bruxelas torna clara
a urgência de se organizar uma luta conjunta dos trabalhadores
de todas as fábricas da Volks.
A decisão da administração da empresa
de interromper a produção do modelo Golf na sua
fábrica de Bruxelas, transferindo-a para suas fábricas
em Wolfsburg, na Alemanha, e Mosel, na Saxônia, é
parte do "histórico programa de contenção
de custos" anunciado no início deste ano. O programa
envolve drásticas medidas de racionalização
sob a forma de demissões em massa e cortes nos salários,
associadas à degeneração das condições
de trabalho em todas as fábricas da Europa.
Os trabalhadores estão sendo colocados uns contra os
outros e sendo chantageados para que aceitem estas medidas. Vários
trabalhadores estão cientes desse fato e vêem a necessidade
de uma luta comum, internacionalmente coordenada por todos os
trabalhadores, como a única forma de conseguir defender
efetivamente seus empregos. A estratégia internacional
praticada pela administração da empresa deve ser
acompanhada por uma estratégia internacional de resistência.
O problema é que os sindicatos e os conselhos de trabalhadores
têm o ponto de vista oposto. Eles estão colaborando
intimamente com a empresa e são o principal instrumento
para que se implemente as políticas gerenciais à
custa dos trabalhadores. Este papel desempenhado pela burocracia
de tais organizações fica especialmente evidente
nesse episódio da Volkswagen.
A condição para a transferência da produção
do modelo Golf para Wolfsburg e Mosel foi o novo contrato para
as fábricas alemãs da Volks, com o qual concordaram
os sindicatos e que inclui cortes salariais e a flexibilidade
das condições de trabalho. A jornada semanal de
quatro dias, introduzida em 1993, que totalizava 28,8 horas, foi
abolida. Segundo o novo contrato, que entrou em vigor no início
de novembro, a semana de trabalho regular aumentou para 33 horas
para os trabalhadores da produção e 34 horas para
o pessoal administrativo. O acordo envolveu uma semana de trabalho
flexível de 25 a 33 horas para os trabalhadores da produção
e de 26 a 34 horas para os demais trabalhadores. Os salários
foram mantidos iguais aos da jornada de 28,8 horas semanais.
A declaração de alguns membros do conselho de
trabalhadores em Wolfsburg de que o contrato está completamente
desvinculado de qualquer transferência da produção
do modelo Golf é uma mentira. Em diversas ocasiões,
os mesmos membros do conselho sublinharam a necessidade de ampliar
a capacidade de produção das plantas alemãs-visando
a produção do Golfe concordaram com os cortes
salariais propostos pela administração. Agora, os
mesmos membros do conselho e do principal sindicato de engenheiros
e operários da Alemanha, o IG METALL, têm a coragem
de enviar repugnantes saudações solidárias
aos trabalhadores grevistas da Volks de Bruxelas. O cinismo de
tais pessoas só não é maior que suas ações
corruptas.
Para libertarem-se das amarras do conselho de trabalhadores
e estabelecerem uma defesa principista de todos os empregos nas
fábricas da VW, os trabalhadores devem construir comitês
independentes que criem uma unidade entre os trabalhadores de
diferentes fábricas nos diversos países onde estas
existam. Os atuais conselhos de trabalhadores que atuam nos níveis
europeu e internacional se opõem fortemente a essa iniciativa.
Eles se autointitulam co-administradores e são parte da
conspiração contra os trabalhadores.
O World Socialist Web Site oferece seu apoio ativo para coordenar
os trabalhadores na luta por uma defesa principista de todos os
empregos em todas as localidades. Está preparado para colaborar
no estabelecimento dos contatos com os trabalhadores em outros
locais ameaçados por demissões e cortes de direitos.
O mal-estar diante da corrupção de tantos funcionários
de conselhos de trabalhadores e sindicatos é compreensível,
mas insuficiente. Sua ação e sua influência
devem ser barradas.
Para este fim, é necessário realizar uma profunda
e detalhada avaliação dos últimos acontecimentos
em Wolfsburg. Os fatos esclarecem que o conselho de trabalhadores
está quase literalmente no bolso dos empresários.
Eles não têm o menor direito de falar em nome dos
trabalhadores ou ter o direito de assinar os contratos.
Lições de Wolfsburg
Nas últimas semanas, três notícias sobre
a Volks foram manchetes nos jornais de Wolfsburg:
No dia 7 de novembro, o chefe executivo da Volks, Bernd Pischetsrieder,
anunciou sua demissão prematura no final desse ano. Ele
será substituído pelo atual "chefe" da
Audi Motors, Martin Winterkorn.
No dia 16 de novembro, o escritório de processos públicos
em Braunschweig levantou acusações contra o antigo
chefe do comitê de gerenciamento de pessoal, por violação
de confiança em 44 casos. Hartz demitiu-se de seu posto
no final do ano passado, e já havia se retirado quando
foi descoberto que, no período de apenas dois anos, 780.000
euros foram dados como prêmio, sob a forma de despesas não
registradas, para membros do conselho de trabalhadores. O dinheiro
foi gasto, entre outras coisas, em viagens a luxuosos bordéis
durante os feriados.
No dia 21 de novembro, o mesmo escritório de processos
públicos prendeu o antigo chefe do conselho de trabalhadores,
Klaus Volkert, sob a acusação de "perigo de
obstrução da justiça". De acordo com
a notícia, Volkert tentou obstruir investigações
movidas contra ele e manipular testemunhas.
Estas três notícias estão estreitamente
relacionadas. A substituição de Winterkorn por Pischetsrieder
representou um golpe de Ferdinand Piech na administração
executiva da Volks. O multimilionário austríaco
é neto de Ferdinand Porsche, que desenvolveu o lendário
Volkswagen Beetle, o fusca, para o então chefe de estado,
Adolf Hitler. Como sócio da Porsche, Piech possui uma considerável
parcela das ações da Volks.
Quando Piech assumiu a administração da Volks,
em 1993, ele estabeleceu estreitos laços com o primeiro
ministro do estado da Baixa Saxôniae posteriormente
chanceler alemãoGerhard Schröder, do Partido
Social-Democrata. Piech teve ainda o apoio do sindicato IG Metall.
Duas características foram marcantes durante o mandato
de Piech na presidência da Volks. Em primeiro lugar, ele
procurou ampliar a base da empresa, que tradicionalmente produzia
modelos de baixo e médio custo, para a produção
de veículos de luxo. Ele comprou marcas como Bentley, Bugatti
e Lamborghini, desenvolvendo o luxuoso Phaeton Sedan, e mandou
construir uma fábrica envidraçada no centro de Dresden
para a produção desses modelos.
Em segundo lugar, Piech, tendo o apoio do pessoal do departamento
liderado por Peter Hartz e do conselho dos trabalhadores, pôde
impor severos cortes salariais aos trabalhadores. Em 1993, ele
anunciou o corte de 30.000 empregos ocasionado por uma drástica
queda na demanda. Sua resposta foi a introdução
da semana de quatro dias, estabelecendo uma jornada média
de 28,8 horas. A medida envolveu substanciais cortes de salários
aos trabalhadores, mas foi elogiada pelos sindicatos como a única
forma de evitar demissões.
O deslocamento da produção ao setor de carros
de luxo foi catastrófico, custando bilhões à
Volkswagen. Piech, sob pressão, tornou-se presidente provisório.
Seu vice foi o atual presidente do IG Metall, Jürgen Peters,
que atua no quadro de supervisores da Volks, juntamente com o
novo presidente do conselho de trabalhadores, Bernd Osterloh,
e outros oito membros do mesmo conselho.
Para Bernd Pischetsrieder, o tão falado "Sistema
VW", que inclui a colaboração entre o comitê
executivo, o conselho de trabalhadores e os sindicatos, foi uma
mera carga de custos adicionais. A estratégia de Piech
para a companhia, por outro lado, é considerada como uma
conquista obtida por meio da estreita colaboração
de seus "parceiros sociais", através de pesados
ataques aos empregos, salários e condição
de trabalho dos trabalhadores da Volks.
Neste cenário, os detalhes das práticas corruptas
do conselho de trabalhadores se tornaram públicas em toda
a sua extensão. Num único ano (2002), Klaus Volkert
recebeu o total de 693.000 eurossob a forma de salário
regular, pagamento extra e bônus especiais. Tal soma corresponde
a uma renda mensal de 57.750 euros. Além disso, ele recebeu
o ressarcimento dos gastos de suas viagens. A cada três
meses a Volks transferiu uma soma de 23.000 euros para a conta
da amante brasileira de Volkert..
Qualquer um que diga que isso é um mero e lamentável
caso particular, esconde o fato de que escritório de processos
está atualmente envolvido na investigação
de nada menos do que dez casos relacionados ao conselho de trabalhadores
da Volkswagen. Comentários de Jürgen Peters, que procurou
abafar o caso dizendo que as concessões feitas a Volkert
são altas, mas não incomuns, somente torna mais
claro que o caso não é um caso particular.
Tal corrupção é algo inseparável
do sistema alemão de relacionamento entre as administrações
e sindicatos pela "co-administração" e
pela parceria social. No passado, membros do conselho de trabalhadores
ocupavam cargos nos quadros de supervisão de grandes companhias
alemãs e possuíam grandes privilégios. Na
década de 1970 e no início da década de 1980,
eles ainda mantinham o direito de negociar acordos e melhorias
parciais aos trabalhadores. Mas agora a situação
foi completamente transformada pela globalização
da produção.
Sob a pressão da concorrência internacional e
da constante ameaça da transferência da produção
à países com baixa carga tributária e menores
salários, a resposta dos conselhos de trabalhadores e dos
sindicatos tem sido a de defender suas próprias "localidades"
e fábricas, por meio da busca de benefícios para
suas próprias companhias. Eles foram totalmente transformados
em braços da administração, assegurando remunerações
extravagantes em troca de seus serviços. O mesmo caso pode
ser encontrado nos sindicatos de todo o mundo.
A defesa principista dos empregos necessita de um rompimento
político com as concepções de colaboração
social e co-administração. É necessário
adotar uma perspectiva completamente diferente, baseada no caráter
internacional da produção e no interesse comum dos
trabalhadores de todo o mundo. Tal perspectiva é baseada
numa transformação socialista da sociedade, onde
os interesses sociais da população como um todo
tem prioridade sobre os interesses privados do grande capital
e dos bancos.
A construção de comitês de defesa contra
as demissões e os cortes de benefícios deve ser
feita com a perspectiva socialista e internacionalista. Isso é
a única alternativa aos argumentos covardes e falidos da
burocracia dos sindicatos, que permanece completamente atrelada
ao sistema capitalista.
Nós chamamos aqueles que apóiam a luta dos trabalhadores
da Volkswagen em Bruxelas ou desejam tomar parte na construção
dos comitês de defesa em outras empresas a entrar em contato
com o comitê editorial do World Socialist Web Site
e discutir essas questões essenciais.