Publicado originalmente em inglês em 16 de março
de 2012
Julian Assange fala sobre os ataques dos EUA à WikiLeaks,
a liberdade de imprensa, e a decisão iminente do Supremo
Tribunal Britânico sobre o seu recurso contra a extradição
para a Suécia. Por Richard Phillips, World Socialist Web
Site
O fundador e redator-chefe da WikiLeaks não foi acusado
de crime algum na Suécia, na Grã-Bretanha nem em
nenhum outro país. Contudo, Julian Assange foi mantido
sob detenção em casa durante mais de 450 dias, forçado
a usar uma pulseira de tornozelo eletrónica, a observar
um recolher obrigatório às 22h e a apresentar-se
à polícia diariamente.
Richard Phillips: pode comentar os últimos detalhes
da acusação do grande júri dos Estados Unidos
e o que acontece se for extraditado para a Suécia?
Julian Assange: Novas provas que emergiram dos ficheiros
Stratfor - mensagens de correio eletrónico de uma agência
privada de informações secretas baseada no Texas
- mostram que o governo dos Estados Unidos obteve uma acusação
secreta do grande júri contra mim. O embaixador dos Estados
Unidos no Reino Unido, Louis Susman, afirmou em fevereiro de 2011
que o governo dos Estados Unidos esperaria para ver o que acontecia
com o caso de extradição sueco atual no que respeita
a fazer o seu próprio pedido de extradição.
O embaixador dos Estados Unidos na Austrália [Jeffrey
L. Bleich], uma semana antes da visita recente de Obama, também
disse aos meios de comunicação australianos que
o governo australiano poderia ter de considerar as suas obrigações
de extradição em relação a mim, presumivelmente
no caso de eu voltar à Austrália. E enquanto a WikiLeaks
tem muitos dos seus membros sob ataque judicial, a própria
organização é também vítima
de bloqueio financeiro extra-judical. Há umas 40 pessoas
que foram varridas em operações pelo FBI, Scotland
Yard ou outras forças policiais.
Quanto às decisões iminentes do Supremo Tribunal
da Grã-Bretanha sobre o caso de extradição
sueco: se formos mal sucedidos, espero ser extraditado para a
Suécia em 10 dias e logo possivelmente re-extraditado para
os Estados Unidos. Mesmo se formos bem sucedidos no Supremo Tribunal,
a situação será semelhante, porque os Estados
Unidos irão provavelmente apresentar as suas acusações
de espionagem através do grande júri e requerer
diretamente a minha extradição da Grande Grã-Bretanha.
Naturalmente, nenhuma dessas coisas acontecerá se não
for possível politicamente fazê-lo. Quando um caso
legal atinge um destaque público suficientemente grande
para o governo, torna-se uma questão de política.
Tem alguma informação detalhada sobre conluio
direto entre a Grã-Bretanha, os EUA e a Suécia a
propósito da sua extradição?
O que podemos dizer publicamente é que no dia 8 de dezembro
de 2010, o jornal The Independent publicou um relatório
sobre contactos informais que já ocorriam naquela fase
entre os EUA e a Suécia em relação à
minha extradição. A embaixada australiana em Washington
também enviou uma mensagem a Canberra por volta dessa altura,
afirmando que a investigação de espionagem e criminal
dos Estados Unidos à WikiLeaks era de uma escala
e natureza sem precedentes. Também disse que a acusação
criminal em relação a mim foi ativa e vigorosa.
Esse material foi o resultado de um pedido da Freedom of Information
e saiu no Sydney Morning Herald há uns meses.
O serviço de acusação da coroa britânica
também recusou um pedido sob a lei Freedom of Information
em relação a comunicações sobre planos
de extradição potenciais, afirmando que afetaria
as relações diplomáticas britânicas
com outros países. A meio do ano passado, o painel de reforma
de extradição de Inglaterra, agendado pelo secretário
do Interior, encontrou-se com Eric Holder, o procurador geral
dos Estados Unidos, e um certo número de membros do departamento
de Defesa dos Estados Unidos. Além do mais, houve outras
reuniões recentes entre Carl Bildt, o ministro sueco dos
Negócios Estrangeiros [e amigo íntimo de Karl Rove],
e William Haig, o ministro de Negócios Estrangeiros britânico.
Pode comentar sobre o papel que está a ter o governo
australiano de Gillard?
A reação do governo Gillard a atividades da WikiLeaks,
especialmente a nossa revelação das mensagens diplomáticas
dos Estados Unidos, foi publicamente a pior de todas as nações.
Gillard afirmou falsamente que a nossa organização
estava envolvida em atividades ilegais. Isto foi dado como falso
por uma investigação de Polícia Federal australiana.
Em conjunto com o procurador geral, ela lançou toda
uma equipa especial do governo contra a WikiLeaks, recrutando
a Polícia Federal Australiana, a agência de informações
externa ASIS, a agência de informações interna
ASIO, o departamento de Defesa e o departamento do procurador
geral. Publicamente, Gillard não emitiu uma única
declaração de apoio e não temos conhecimento
de qualquer apoio em privado.
Os grandes grupos de comunicação social afirmam
que o bloqueio financeiro à WikiLeaks pela PayPal, Mastercard,
Visa e outros desmantelou a organização. Qual é
a sua resposta?
Temos dois processos ativos em tribunal contra o bloqueio e
uma terceira reclamação à Comissão
Europeia, que já excedeu o prazo para produzir uma conclusão
preliminar. Embora o bloqueio tenha retido 95% do rendimento da
WikiLeaks, a organização é ainda extremamente
popular em todo o mundo e conseguimos continuar apesar disso.
Irá a WikiLeaks publicar informação
sobre os preparativos para a guerra contra o Irão e a Síria?
Sim. Temos estado a publicar informação nesta
semana passada e esse processo será contínuo. Publicámos
um relatório muito interessante sobre operações
de forças especiais na Síria em dezembro passado.
Leu o World Socialist Web Site, o que pensa dele? O que
devem os leitores do WSWS explicar aos outros sobre o significado
político dos ataques contra si e a WikiLeaks?
Leio o World Socialist Web Site há muitos anos. Admiro
o desenho gráfico simples e os artigos que são normalmente
exatos, desde que não entremos em questões de sectarismo
socialista. Eu convidaria os leitores do World Socialist Web Site
a tomar as seguintes medidas: primeiramente, juntarem-se aos Amigos/as
do WikiLeaks em wlfriends.org; em segundo lugar a ler os factos
em Justice4assange.com em vez de acompanharem os fazedores de
opinião governamentais; a seguir as notícias do
twitter da WikiLeaks; a corrigir as calúnias sempre que
as virem; e a ajudar a espalhar os valores e ideais da WikiLeaks
ao seu local de trabalho e à família e amigos.
A WikiLeaks é uma organização que luta
para realizar apenas reformas e espalhar certos valores. Se formos
bem sucedidos em promover a justiça e em ter outros a assumir
os nossos valores, seremos bem sucedidos apesar dos ataques à
organização.
Como vê o ataque a si e à WikiLeaks do ponto
de vista dum jornalismo verídico e o seu futuro?
Os ataques contra nós são extraordinariamente
reveladores. Sim, publicámos muita informação
importante sobre as atividades do governo dos Estados Unidos e
doutros países durante estes anos mas a contra-reação
? o ataque contra nós ?revela muito sobre como os governos
e a política contemporânea funcionam.
O governo dos Estados Unidos está a tentar erigir uma
nova interpretação do que pensa ser um jornalista.
Quer que qualquer comunicação com uma fonte seja
encarada legalmente como uma conspiração. Por outras
palavras, quer que os jornalistas sejam recetáculos completamente
passivos para outros. Mas isto não é pura e simplesmente
o modo como o jornalismo tem sido tradicionalmente feito. Se eles
tiverem sucesso, será o fim do jornalismo no Ocidente tal
como o conhecemos.
Esses ataques contra nós também foram colhidos
por outros países e usados para legitimar as suas próprias
repressões. Por exemplo, dois jornalistas suecos estão
a ser agora presos na Etiópia. Eles investigavam uma companhia
de petróleo sueca sob o nome Lundin - o ministro dos negócios
estrangeiros sueco Carl Bildt tinha sido anteriormente diretor
da companhia - mas foram condenados a 11 anos de cadeia na Etiópia
sob acusação de terrorismo. O primeiro-ministro
etíope diz que é perfeitamente aceitável
tratar jornalistas deste modo caminho e apontou para as minhas
circunstâncias como justificação.
As questões que a WikiLeaks enfrenta são totalmente
políticas e por isso é uma questão de relevo
público. A minha mensagem para as pessoas em qualquer lugar
é: não esperem que a WikiLeaks seja levada à
falência ou os seus membros extraditados para os Estados
Unidos para atuarem. Então será demasiado tarde.
Se as pessoas atuarem com força agora, a organização
terá sucesso. A WikiLeaks tem muito apoio e agora estamos
enrijecidos pela batalha. Não vamos abaixo sem dar luta
e, se toda a gente fizer força ao mesmo tempo, ganharemos.