O congresso da semana passada da Alternativa para a Alemanha (AfD), o partido de extrema-direita xenofóbico e anti-imigrante, marcou uma nova etapa na legitimação da política fascista na Alemanha. Sete décadas após a queda da ditadura de Hitler, a mídia alemã tratou o congresso de fascistas como um importante e legítimo evento político, enquanto o presidente alemão Frank-Walter Steinmeier se destacou convidando dois líderes da AfD para ir à sua residência oficial para conversar sobre a formação de uma coalização política.
Apesar da ala nacionalista populista de extrema-direita do partido, liderada por Björn Höcke, ter dominado o congresso, a mídia e os políticos do establishment criticaram a AfD não pelo seu militarismo extremo e xenofobia, mas pela sua falta de união.
O jornal alemão Süddeutsche Zeitung queixou-se na segunda-feira, dizendo que a AfD exibiu “um embaraçoso caos”. E isso depois de seu grupo parlamentar ter se apresentado como “unido e politicamente capaz”. O jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung expressou uma visão parecida, queixando-se de que “não apenas os moderados, mas também os radicais eram meramente observadores de um partido sem líder”. O canal de notícias Phoenix até mesmo mostrou o congresso ao vivo na televisão e comentou sobre as disputas entre as varias facções do partido como se fossem uma partida esportiva.
O congresso da AfD precisa ser encarado com a maior seriedade política. A AfD é um veículo para forças de extrema-direita que defendem a sujeira que se considerava superada na Alemanha: o racismo, o nacionalismo populista e o militarismo. Alexander Gauland foi eleito um dos dirigentes do partido, um homem que elogiou “as realizações dos soldados alemães em duas guerras mundiais” durante a campanha eleitoral federal e exigiu que o ouvidor federal para integração, Aydan Özoguz, um alemão de origem turca, fosse “descartado” na Turquia. O professor de Economia Jörg Meuthen foi confirmado como líder do partido.
A AfD será então liderada por duas figuras com conexões próximas à ala de extrema-direita do partido. Ambos participaram neste ano de um encontro organizado por Höcke em Kyffhäuser, um monumento da era do Kaiser, que nos anos 1920 se tornou um local de encontro para nacionalistas populistas e depois para nazistas. Em 2016, Höcke discursou no local – na presença de Gauland e Meuthen – sobre o “furor Teutonicus” (fúria teutônica) e a emergência de uma “nova mitologia” para o povo alemão.
A eleição de Gauland está ligada diretamente com uma intervenção pela facção de Höcke. Para bloquear a eleição do candidato “moderado”, o líder da AfD em Berlim, Georg Pazderski, a facção de Höcke inseriu Doris Sayn-Wittsgenstein na corrida. A porta-voz para a AfD em Schleswig-Holstein deu um discurso provocativo, agitando contra anti-fascistas e defendendo o neo-nazista Movimento Identidade. Ela não apenas abriu o caminho para Gauland, como agiu de acordo com as tradições da sua classe – a alta nobreza alemã. Heinrich Prinz zu Sayn-Wittgenstein, um dos seus antepassados, foi um oficial altamente condecorado na Wehrmacht, a força armada nazista. Entre outras coisas, ele participou na guerra de aniquilação contra a União Soviética.
Os grupos e as tradições de extrema-direita e militarista que levaram duas vezes o mundo à catástrofe durante o século XX são capazes de erguer suas cabeças de novo tão agressivamente apenas porque têm apoio do aparelho do Estado. O congresso da AfD foi protegido por uma polícia fortemente armada, que usou canhões de água para dispersar os manifestantes enquanto os delegados da AfD os incentivavam. “Fiquem firmes. Neste espírito, deixem a água fluir! Ela sempre atinge o alvo”, tuitou com empolgação o juiz de Dresden filiado à AfD, Jens Maier.
Ao longo da semana passada, o chefe de estado, na pessoa do presidente Frank-Walter Steinmeier, deu sua benção ao espetáculo de direita em Hanover. Depois de um encontro com Steinmeier no Palácio de Bellevue, a líder parlamentar da AfD, Alice Weidel tuitou: “Ontem, Alexander Gauland e eu fomos os convidados do presidente alemão Frank-Walter Steinmeier. Assim como as conversas exploratórios sobre a formação de um governo, o assunto foi a eleição da nossa direção executiva federal em Hanover”.
Não é mera coincidência que Steinmeier, em sua tentativa de instalar um governo de direita, elogie a AfD. Quando ele era ministro das relações exteriores, Steinmeier proclamou o “fim da restrição militar” em 2014 e esteve fortemente envolvido no golpe de direita na Ucrânia. Sob sua direção, o Ministério das Relações Exteriores iniciou o chamado processo de revisão para superar a oposição popular profundamente enraizada ao militarismo e à guerra. Steinmeier escreveu artigos estratégicos defendendo a militarização da Europa sob a liderança alemã, e se vangloriou em uma série de discursos e artigos sobre o “novo papel global da Alemanha”.
As posições militaristas da AfD se sobrepõem com aquelas de figuras de liderança no estado e nas forças armadas, e são compartilhadas por todos os partidos no parlamento. Em seu programa, a AfD exige “o retorno das forças armadas para a prontidão de combate”, dadas “as ameaças atuais encarando a Europa e a nova orientação geopolítica dos EUA”. Elas tem que ser “reformadas de um tal modo que sua prontidão de combate esteja garantida em destacamentos da mais alta intensidade. Para isso, mudanças completas estruturais, de pessoal e materiais são essenciais”.
Alguns dias antes do congresso partidário da AfD, o inspetor geral dos serviços militares das forças armadas alemãs falou em termos praticamente idênticos em um debate.
O Sozialistische Glleichheitspartei (SGP – Partido Socialista pela Igualdade) – a seção alemã do Comitê Internacional da Quarta Internacional – analisou as forças objetivas que impulsionam o retorno do militarismo alemão desde Setembro de 2014 em uma resolução que advertimos: “A propaganda da era pós-guerra – de que a Alemanha havia aprendido com os crimes terríveis dos nazistas, havia ‘chegado ao Ocidente’, havia adotado uma política externa pacífica e havia se desenvolvido em uma democracia estável – é uma mentira. O imperialismo alemão está novamente mostrando seu verdadeiro rosto do mesmo modo que surgiu historicamente, com toda a sua agressividade dentro e fora do país”.
Esse prognóstico está agora sendo confirmado, mostrando a urgência da construção do SGP. Todos os outros partidos – com o Partido A Esquerda à frente – se opõem à novas eleições porque temem um desenvolvimento socialista na classe trabalhadora muito mais do que a ascensão da extrema-direita. O SGP é o único partido se opondo à essa loucura. Nós chamamos novas eleições para construir uma alternativa socialista ao capitalismo, ao fascismo e à guerra.