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A lógica da agressão imperialista: resultarão as ameaças dos EUA à Coreia do Norte em uma catástrofe global?

Bill Van Auken
3 de novembro de 2017

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Publicado originalmente em 06 de Setembro de 2017

A série sem fim de ameaças inflamatórias e imprudentes feitas por Trump e seus altos conselheiros contra a Coreia do Norte provocaram temores globais de que o mundo está sendo trazido à beira de uma guerra nuclear e de uma perda catastrófica de vida humana.

A promessa do presidente dos EUA de lançar “fogo e fúria tais como o mundo nunca viu” foi seguida pela advertência por seu Conselheiro de Segurança Nacional, general H.R. McMaster de que Washington está preparada para lançar uma “guerra preventiva” - uma doutrina proibida pelos julgamentos dos crimes de guerra nazistas em Nuremberg - para impedir que a Coreia do Norte “ameace os Estados Unidos com uma arma nuclear.” O secretário de defesa de Trump, o general James “Cachorro Louco” Mattis, declarou no domingo que o Pentágono tem “muitas opções” para realizar “a total aniquilação de um país, a saber: a Coreia do Norte,” e que Trump estava sendo “informado de cada uma delas.”

Mais recentemente, a embaixadora dos EUA para as Nações Unidas, Nikki Haley, declarou na segunda-feira no Conselho de Segurança que o líder norte-coreano, Kim Jong-un “está implorando por guerra.” Isso combinou-se com a censura feita por Trump ao governo sul-coreano por tentar “conciliação” com Pyongyang, e repetidas declarações de que o período de conversas acabou.

Com cada novo impulso, com essas ameaças, ao desencadeamento de uma conflagração nuclear, a questão é colocada com cada vez mais força: Washington irá à guerra para colocar-se à altura de sua retórica de guerra? Será que as próprias ameaças, em si mesmas - e a determinação de provar que elas não são meros blefes - tornar-se-ão uma força impulsionadora da marcha para uma potencial guerra nuclear?

É um consenso no interior da administração Trump, do alto comando militar e de poderosas seções do aparato de Estado e da oligarquia dominante dos EUA que sob a administração Obama, o imperialismo americano sofreu uma “perda de credibilidade” na arena global, encapsulada na incapacidade de Obama de cumprir as declarações sobre sua “linha vermelha” para uma guerra dos EUA contra a Síria. Para reverter essa “perda,” Washington pode muito bem escolher uma opção militar claramente insana na Península Coreana.

Que isso é percebido como um perigo real e presente no interior dos círculos dominantes dos EUA foi inequivocamente expresso no tombo dos preços das ações quando Wall Street retomou as negociações na terça-feira e no aumento do preço do ouro para o seu maior nível em cerca de um ano.

A ameaça de guerra não é apenas causada pelos tuítes belicosos do demagogo bilionário fascistóide na Casa Branca. Não há oposição pública organizada ao impulso para a guerra. Qual liderança no interior do Partido Democrata pronunciou-se contra ela? Quando alguma audiência pública foi convocada para considerar as consequências de uma guerra aberta na Península Coreana?

A mídia empresarial, um instrumento dócil da propaganda de guerra, trata o conflito como se não tivesse nenhum contexto mais amplo histórico ou geopolítico e não guardasse relação com qualquer coisas que tenha acontecido antes do último lançamento de míssil ou teste de bomba pela Coreia do Norte.

Mal se poderia imaginar que há pessoas vivas hoje na Coreia do Norte que podem se lembrar da guerra dos EUA 65 anos atrás na qual cerca de 3 milhões de coreanos morreram, a grande maioria no norte, e na qual cada uma das cidades do país foi reduzida a entulho retorcido pela artilharia e bombas dos EUA. Para eles, a evocação de “fogo e fúria” não é mero exagero retórico. Desde então, os EUA mantiveram uma presença militar massiva nas fronteiras da Coreia do Norte, ao mesmo tempo ameaçando-a regularmente com bombardeiros nucleares, submarinos e navios de guerra.

Como em todas as guerras de agressão dos EUA ao longo do último quarto-de-século, a atual escalada em direção a um confronto militar com a Coreia do Norte está sendo preparada com a acusação de que o líder norte-coreano Kim Jong-un é “louco” - como Noriega, Milosevic, Saddam Hussein e Gaddafi antes dele. Nas guerras anteriores - no Iraque, Afeganistão, Líbia e demais regiões - um pretexto foi inventado, seja de uma ameaça terrível colocada aos EUA por “armas de destruição em massa” ou terrorismo, seja de um desastre iminente para os “direitos humanos” que poderia apenas ser impedido pelo poder de fogo dos EUA. A questão nuclear da Coreia do Norte não é diferente.

O por quê de a posse de armas nucleares pela Coreia do Norte constituir uma ameaça mortal para os EUA, enquanto outros países, incluindo Israel, Paquistão e Índia puderam obter tais armas, em alguns casos com a ajuda dos EUA, nunca é explicado. A ameaça de um choque nuclear entre a Índia e o Paquistão, ambos aliados declarados dos EUA, é razoavelmente maior que qualquer ameaça na Península Coreana.

A crescente crise de guerra carrega a etiqueta “Feito nos EUA.” As guerras de agressão anteriores lançadas por Washington têm uma influência direta no comportamento da liderança norte-coreana. Não há nada de “louco” em sua determinação de manter e desenvolver suas capacidades nucleares depois de ver o destino tanto do iraquiano Hussein quanto do líbio Gaddafi, os quais desistiram de seus programas de armas para satisfazer Washington e, em troca, viram seus países invadidos e destruídos antes de serem eles mesmos assassinados. Mesmo não sendo “louca”, a liderança norte-coreana avalia de forma imprecisa a insanidade do imperialismo americano, o qual está preparado para abandonar restrições anteriores à guerra nuclear para fazer avançar seus objetivos.

Esses objetivos estão direcionados não contra as políticas seguidas pelo governo da empobrecida e isolada nação da Coreia do Norte, mas contra dois países que fazem fronteira com ela, China e Rússia, ambas potências nucleares que Washington vê como os principais obstáculos para seu ímpeto de exercer sua hegemonia sobre a massa continental da Eurásia e todo o planeta. Ao mesmo tempo em que ameaça uma guerra contra a Coreia do Norte, Washington está organizando provocações de “liberdade de navegação” contra a China no Mar do Sul da China e conduzindo uma escalada militar provocativa no Mar Báltico contra a Rússia.

Uma nova guerra na Península Coreana tem todas as chances de envolver a China, como o fez a guerra de 65 anos atrás, e a Rússia, colocando o risco de uma Terceira Guerra Mundial nuclear.

Mesmo o “melhor cenário” de uma guerra convencional contra a Coreia do Norte envolveria a morte de dezenas, se não centenas de milhares de pessoas, enquanto um bombardeio nuclear mútuo aventa o massacre de dezenas, se não centenas de milhões e o possível extermínio da vida no planeta.

Longe de restaurar a “credibilidade” do imperialismo americano, uma chamada “guerra preventiva” contra a Coreia do Norte transformaria os EUA em um Estado pária ao redor do mundo, odiado por crimes sem precedente desde aqueles da Alemanha de Hitler. Os líderes políticos dos EUA implicados nesses crimes ficariam impossibilitados de deixar os EUA por medo de enfrentar mandados de prisão no exterior.

As consequências nefastas do ponto de vista político, econômico e, na verdade, moral de tal guerra desencadeariam uma crise interna de dimensões sem precedente, colocando em questão a própria existência dos Estados Unidos.

O perigo atual de guerra é, em última análise, o resultado da falência de todo o sistema político nos EUA. O estado adoecido da cultura política americana pode encontrar sua personificação na figura asquerosa de Donald Trump, mas está profundamente enraizado na crise do capitalismo americano e global e atravessa ambos os partidos políticos, a imprensa e todas as instituições do Estado capitalista e da elite dominante.

Durante o quarto-de-século que se seguiu à dissolução da União Soviética, o imperialismo dos EUA buscou conter seu declínio global por meio de infindáveis - e mal-sucedidas - guerras de agressão que mataram, mutilaram e expulsaram milhões.

A guerra no exterior andou de mãos dadas com a desigualdade social cada vez maior e ataques incessantes aos padrões de vida e direitos básicos da classe trabalhadora nos EUA. A política externa imprudente e criminosa que está levando a uma guerra catastrófica na Ásia espelha-se na incapacidade e indisposição da classe dominante americana de responder a, e muito menos preparar-se para, catástrofes como o furacão Harvey, ao tempo que uma vasta riqueza social é canalizada para o enriquecimento de uma estreita camada de oligarcas financeiros.

A mesma crise do capitalismo que cria o ímpeto para a guerra nuclear está construindo as bases objetivas para as lutas revolucionárias da classe trabalhadora. No entanto, a distância entre o estado avançado dos preparativos para a guerra mundial e a consciência de tal risco entre amplas massas de trabalhadores deve ser superada. Somente uma intervenção politicamente consciente e independente da classe trabalhadora, lutando pelo socialismo nos EUA a internacionalmente pode prevenir uma catástrofe global.