Os EUA presenciaram duas cenas ontem, 2, com imagens de dois mundos totalmente separados: uma com uma pequena e rica elite; a outra com pessoas da classe trabalhadora, que compõe aproximadamente 90% da população. Logo após o sinal de abertura em Wall Street, o índice Dow Jones Industrial, o principal indicador da Bolsa de Nova Iorque, superou a marca dos 22 mil pontos pela primeira vez na história, um marco que foi saudado com manchetes exuberantes na imprensa tradicional e tornou-se a principal história do noticiário à noite da rede NBC.
No dia anterior, o presidente Trump tuitou: “As corporações NUNCA ganharam tanto dinheiro quanto estão ganhando hoje”, uma alegação que o site de checagem de fatos Politifact disse que era parcialmente verdadeira, com a ressalva de que os lucros foram ainda maiores sob Barack Obama. Do ponto de vista dos 10% mais ricos dos EUA, que controlam mais de 75% da riqueza nacional, a alegação de Obama em 2016 de que “os Estados Unidos estão indo muito bem neste momento” é a afirmação de um fato.
No mesmo momento em que o Dow Jones ultrapassava a marca dos 22 mil pontos, dezenas de milhares de trabalhadores estavam em uma fila esperando para candidatarem-se a empregos na feira nacional da Amazon, o maior desses eventos na história americana.
Fila de candidatos na feira de empregos da Amazon em Nova Jersey
Se as fotos de longas filas de trabalhadores em busca de emprego dando a volta em quarteirões e atravessando estacionamentos relembram cenas da Grande Depressão, isso acontece porque as condições de vida das massas de trabalhadores relembram cada vez mais os “os famintos anos de 1930”.
O World Socialist Web Site conversou com trabalhadores representando uma amostra diversa da sociedade americana – negros e brancos, imigrantes e nativos, jovens e pessoas mais velhas – que enfrentaram a mesma fila na esperança de conseguir um emprego no depósito da Amazon sem aposentaria, cobertura de saúde muito limitada e nenhuma garantia de jornadas de trabalho de 8 horas por dia ou 40 horas por semana.
Trabalhadores disseram ao WSWS que a Amazon os forçou a fazer um teste de drogas na própria feira e passar por uma verificação de antecedentes apenas para candidatarem-se ao emprego. Muitos estavam desapontados e chateados porque a Amazon recusou os candidatos que anteriormente não tinham preenchido o pedido de emprego online.
Fila de trabalhadores em Ohio
O fato de que milhares de trabalhadores veem o salário médio da Amazon, de cerca de 12,50 dólares por hora, como uma melhora em relação ao salário da indústria de serviços, que paga o salário mínimo federal de 7,25 dólares por hora para muitos deles, é uma evidência de suas condições desesperadoras de trabalho. Porém, o salário médio de um trabalhador americano da Amazon é menor do que o salário por hora de um minerador de carvão de 1935 em termos reais, de acordo com o Livro de Estatísticas do Trabalho do Departamento do Trabalho dos EUA. A maior parte dos trabalhadores, especialmente aqueles contratados como temporários, ganham ainda menos.
As feiras de emprego da Amazon foram realizadas aproximadamente em uma dúzia de regiões particularmente abaladas econômica e socialmente por todo os EUA. Baltimore, em Maryland, e Buffalo, em Nova Iorque, foram esvaziadas por décadas de perdas de emprego e declínio populacional. Áreas suburbanas como Etna, em Ohio, Whistestown, em Indiana, Romeoville, em Illinois, e Hebron, em Kentucky, estão entre as mais impactadas por uma crise de opióides que matou aproximadamente 60.000 pessoas no ano passado.
Antigos cinturões industriais como Fall River, em Massachusetts, Robbinsville, em Nova Jersey, e Kenosha, em Wisconsin, foram um dia regiões de empregos manufaturados bem pagos, mas agora estão sendo transformados em parques industriais para empregos de baixo salário e com poucos benefícios em depósitos, incluindo a planta de 10.000 trabalhadores da Foxconn anunciada na semana passada.
Trabalhadores candidatando-se para um emprego em Wisconsin
Apesar de todas as suas origens e experiências diversas, os desafios que os trabalhadores enfrentam em suas vidas diárias e as preocupações que compartilham procurando o bem-estar de suas famílias e pessoas amadas são, fundamentalmente, os mesmos. Eles se preocupam com seus filhos encarando uma vida inteira de dívidas e empregos sem futuro, ou membros de sua família sendo vítimas do álcool ou da dependência química para anestesiarem sua dor física e mental. Eles sentem-se sobrecarregados por saberem que uma emergência médica ou problema no carro pode deixá-los financeiramente quebrados.
Eles se perguntam como vão conseguir o dinheiro para cuidar dos seus pais idosos ou enviar seus filhos para a faculdade. Eles conhecem militares veteranos que foram combater pelo seu país e voltaram traumatizados pelos horrores da guerra imperialista, para depois terem o acesso negado à assistência social do governo que os enviou. Eles sabem que seus amigos e colegas de trabalho enfrentam os mesmos problemas fundamentais da vida.
Fila de trabalhadores fora do depósito da Amazon em Robbinsville, Nova Jersey
No mundo dos ricos, aparentemente tão distante e, ainda assim, parte da mesma realidade social, um conjunto inteiramente diferente de preocupações predomina, motivados pelo ímpeto em aumentar sua riqueza, seus privilégios e sua posição social.
Todo o establishment político – incluindo os partidos Democrata e Republicano, a mídia corporativa, as universidades, os “think tanks” e as instituições de estado oficiais – está exclusivamente focado em satisfazer as necessidades dos ricos. Uma parcela da classe média alta, insatisfeita com a distribuição dos recursos entre os 10% mais ricos, mergulha em uma política de auto-obsessão, baseada em categorias de identidade racial e de gênero que são empregadas para ganhar posições de privilégio.
Enquanto existem diferenças entre as diferentes camadas dos 10% mais ricos, a política burguesa é o que Obama chamou uma “rixa interna” entre grupos que estão, em última instância, “do mesmo lado”. Esse fato é demonstrado pelo o que Democratas e Republicanos concordam: guerra permanente e gastos massivos nas forças armadas, vigilância doméstica, cortes nos programas sociais, cortes de impostos dos ricos, e a militarização da polícia para suprimir a resistência da classe trabalhadora.
Existe uma oposição crescente na classe trabalhadora ao caráter cada vez mais oligárquico da sociedade americana. “Eu vi muitas pessoas perderem muitas coisas”, disse Eric Childs, que buscava emprego na Amazon, a uma equipe do WSWS em Illinois. Lucinda, uma mãe de quatro filhos que também toma conta de quatro netos, ficou na fila para se candidatar a um emprego em Ohio. Ela disse: “se gastássemos mais em empregos e menos em ir à guerra contra pessoas com as quais não temos nenhuma disputa, o país estaria bem melhor”. Andrea, outra pessoa em busca de emprego em Ohio, expressou a frustração que muitos trabalhadores sentiram com ambos os candidatos na eleição de 2016: “Hillary era tudo o que havia de errado com o governo”, ela disse, “e Trump era tudo o que havia de errado com a sociedade”.
Lucinda, avó de quatro netos que mora em Ohio e que se candidatou a um emprego na Amazon, falou contra as atuais guerras dos EUA
As mesmas condições econômicas que causam a desigualdade social também contém sua solução. O crescimento massivo de corporações como a Amazon, cujas cadeias de produção estão espalhadas por todo o mundo, uniu bilhões de trabalhadores internacionalmente no processo de produção. Novas tecnologias – incluindo celulares, a internet e sistemas de transporte avançados – estão revolucionando as relações sociais e transformando a maneira como as pessoas de todas as raças e nacionalidades interagem umas com as outras.
Apesar do potencial criado pelo desenvolvimento das forças produtivas do ser humano para acabar com a fome, a pobreza e as doenças, sob o capitalismo esses avanços se tornam armas nas mãos da classe capitalista. Eles são usados para destruir os empregos e os padrões de vida dos trabalhadores ao redor do mundo, enquanto devastam o meio ambiente. Ao mesmo tempo que a propriedade privada das corporações e bancos subordina a economia à gula por lucro dos oligarcas capitalistas, o conflito entre o caráter cada vez mais integrado da economia mundial e o sistema de estado-nação irrompe na forma do militarismo e da guerra, ameaçando o planeta com a aniquilação nuclear.
A tarefa da classe trabalhadora é de libertar as forças produtivas do mundo das garras desvirtuadas das corporações e utilizar os enormes avanços em ciência e tecnologia para satisfazer as necessidades de toda a humanidade.
As corporações precisam ser transformadas em utilidades públicas e administradas democraticamente pelos próprios trabalhadores. A riqueza dessas corporações e aquela dos seus CEOs, grandes acionistas e investidores precisam ser confiscadas e utilizadas para garantir empregos bem pagos, saúde universal, educação, moradia, programas de reabilitação para o vício em drogas, aposentadorias e outros serviços sociais necessários. Isso requer uma luta política para unir os trabalhadores internacionalmente, em oposição aos partidos políticos da classe capitalista, pela transformação socialista da economia mundial.