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Putin aponta para o crescente perigo de guerra

Por Nick Beams
19 de novembro de 2014

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O presidente russo Vladimir Putin enfaticamente advertiu que ações dos Estados Unidos, violando normas que regiam as relações internacionais desde o fim da II Guerra Mundial, podiam levar a guerra.

Sua declaração surgiu em discurso pronunciado em 24 de outubro numa reunião promovida pelo Valdai International Discussion Club, no balneário de Sochi. O tema escolhido para discussão, no encontro de que participaram, jornalistas, especialistas em política internacional e acadêmicos da Rússia e internacionais foi a Ordem Mundial ou Jogo sem Regras.

Putin iniciou sua palestra afirmando "esta fórmula descreve claramente o ponto crucial que alcançamos hoje e a opção que todos devemos adotar....Mudanças na ordem mundial - e o que vemos a cada dia são eventos nesta escala frequentemente acompanhados por guerras e conflitos, muito embora não globais, às vezes desencadeados por meio de intensa cadeia de conflitos locais".

A palestra de Putin compreendeu uma série de acusações à política externa norte-americana desde o fim da Guerra Fria. Os Estados Unidos, afirmou ele, declararam-se vitoriosos, não veem a necessidade de estabelecer "novo equilíbrio de poder, essencial para a manutenção da ordem e a estabilidade", e em seu lugar "assumem atitudes que lançam o sistema em agudo e grave desequilíbrio".

As observações de Putin constituem uma condenação não somente de Washington, mas também às consequências da dissolução pelo Kremlin da URSS em 1991 com o objetivo de restaurar o capitalismo. Na época, os burocratas stalinistas em sua esmagadora maioria unanimemente renunciaram ao conceito de imperialismo, considerando-o uma ficção criada por Lênin e o Partido Bolchevique.

Desde então, o surgimento impopular de oligarcas super-ricos na direção de várias antigas repúblicas soviéticas firmadas em critérios étnicos- nacionalistas, proporcionou às potências imperialistas congregadas na OTAN terreno fértil para as "revoluções coloridas" (color revolutions) e guerras civis étnicas, até o golpe apoiado pelos Estados Unidos e a Alemanha na Ucrânia este ano, levando a Rússia e a OTAN à beira da guerra.

Putin equiparou as ações dos Estados Unidos ao comportamento de novos ricos, "quando repentinamente esgotam grandes fortunas, neste caso na forma de liderança e dominações mundiais. Em vez de administrarem suas riquezas sabiamente em beneficio próprio, também, acredito, têm cometido muitas loucuras".

Em recente passado, afirmou Putin, leis internacionais foram desrespeitadas diante de um "niilisno legal". Normas legais foram substituídas por "interpretações e posicionamentos vesgos". Ao mesmo tempo, "o controle geral da mídia global tornou isso possível, quando se pretende retratar o branco como preto".

Referindo-se às divulgações das operações dos órgãos de inteligência dos Estados Unidos, o presidente russo disse que "o grande irmão" estava gastando bilhões de dólares, ao porem sob vigilância até mesmo seus mais próximos aliados".

Criticando as ações dos Estados Unidos no Médio oriente, no Afeganistão e na Ucrânia, Putin afirmou que a imposição de um ditame unilateral, em lugar de conduzir à paz e à prosperidade, produzia resultados opostos. "Ao invés de resolver conflitos, levava à escalação destes, ao invés de construir estados soberanos e estáveis vemos a disseminação do caos, ao invés de democracia há apoio crescente e notório incentivo a declarados neofascistas e radicais islâmicos".

Na Síria, os Estados Unidos e seus aliados armaram e financiaram rebeldes e permitiram que permeassem suas fileiras com mercenários de várias nacionalidades. "Permitam-me indagar: onde esses mercenários conseguem fundos, armas e assessoria militar? De onde vem tudo isto? Como os mal afamados bandos do ISIL Onde conseguem meios para tornarem-se tão poderosos, na verdade uma força armada?"

É inquestionavelmente um fato que Washington e seus aliados europeus levaram o mundo à beira de uma guerra apoiando os fundamentalistas sunitas ligados ao Al Qaeda seus pais-mandados no Oriente Médio, e grupos fascistas tais como as milícias direitistas da Ucrânia.

Contudo, as críticas de Putin são politicamente vazias e impotentes. Seu próprio regime firma-se em sicários, malfeitores nacionalistas e gangsters que controlam áreas da Rússia destroçadas por guerras étnicas, a exemplo da Tchetchénia e o norte do Cáucaso, e apoia as milícias xiitas no Iraque e por todo o Oriente Médio. Os comentários de Putin representam essencialmente uma tentativa de elaborar parcerias com as elites dirigentes da América e da Europa que se preocupam com o apoio dos Estados Unidos à Al Qaeda e que os fascistas ucranianos possam representar uma política muito arriscada.

Putin pressiona com o objetivo de maior reconhecimento dos interesses do Kremlin, ao notar que o período de domínio unipolar dos Estados Unidos revelaram que apenas um único centro de poder não tornou a política mundial viável, e abriu caminho para um inflado orgulho nacional, para a manipulação da opinião pública que, no final, permite que os mais violentos e mais expressivos fanfarrões suprimam os mais fracos. Em essência, um mundo unipolar significa simplesmente justificar ditaduras sobre povos e nações".

Putin advertiu que a não ser que exista um claro sistema de acordos e obrigações disciplinando as relações internacionais, juntamente com mecanismos de administração e solução de crises, "os sintomas de anarquia global inevitavelmente aumentarão".

"Muitas nações não veem outros meios de assegurar sua soberania exceto obtendo suas próprias bombas. Isto é extremamente perigoso", acrescentou.

Estas fundamentadas constatações feitas pelo chefe de estado da maior potência nuclear constituem marcante advertência às classes trabalhadoras.

Neste escalonamento militar, todavia, um maior perigo que enfrenta a classe operária mundial é o chauvinismo reacionário russo do regime de Putin. Hostil a qualquer apelo em relação a sentimentos antiguerreiros no seio da classe operária internacional, que ele teme como ameaça a suas próprias mal-adquiridas riquezas, o regime de Putin reagiu diante da crise da Ucrânia promovendo o militarismo russo e recorrendo a métodos czaristas. .

Num discurso pronunciado no memorial militar em Moscou, no Poklonnaia Hill em comemoração ao centenário da I Guerra Mundial, Putin exaltou a "legendária" ofensiva do general czarista Aleksei Brusilov, denunciou os bolcheviques e a Revolução de Outubro. "A vitória foi roubada do país", afirmou ele."Foi roubada por aqueles que conseguiram a derrota de sua própria pátria e de suas forças armadas, semearam a discórdia dentro da Rússia, e conseguiram galgar o poder traindo os interesses nacionais".

Este nacionalismo contra-revolucionário é extremamente inválido diante da nova explosão de provocações e guerras imperialistas.

As últimas observações de Putin parecem motivadas, pelo menos na parte final, pelo temor de súbita queda global das cotações do petróleo, ligada às sanções impostas por insistência dos Estados Unidos e suas implicações na economia russa.

A queda do preço do petróleo de U$200,00 para U$80,00 por barril, importaria em subtrair mais ou menos 2% do PIB da Rússia, e seriamente atingir o orçamento governamental, ao desestabilizar, assim, o regime de Putin, altamente influenciado por uma rede de poderosos oligarcas.

Quaisquer que sejam as motivações por traz do discurso, os perigos de guerra apontados são reais e crescentes. As possíveis consequências suscitadas publicamente por Putin quanto ao papel dos Estados Unidos sem dúvida estão sendo discutidas a portas fechadas em círculos políticos das maiores potências.

Como o impacto da queda dos preços do petróleo demonstra, estas tensões geopolíticas serão alimentadas pelo aprofundamento das crises econômicas e pelas tendências que pesam na deflação e estagnação da economia mundial.

Os riscos de guerra a que Putin alude foram minimizados em comentários relativos à conferência por Christopher Gaddy, especialista americano, no Instituto Brookings. Dois dias antes do discurso de Putin, Gaddy evocou The Sleepwalkers (Os Sonâmublos), recente livro sobre as origens da I Guerra Mundial, de autoria de Christopher Clark que estabeleceu paralelos com a presente situação.

"Eu temo isso deveras... há elementos de sonambulismo nas políticas dominantes dos principais políticos no mundo de hoje", afirmou Gaddy, ao sublinhar que as sanções contra a Rússia foram decididas pelos Estados Unidos e delineadas por um pequeno grupo com objetivos não claros e de resultados questionáveis.