Publicado originalmente em inglês em 4 de março
de 2014
Em coincidência com o golpe de direita na Ucrânia,
organizado pelos Estados Unidos e pela União Europeia,
a mídia americana tem assacado uma torrente inflamatória
e belicosa direcionada contra a Rússia.
Nos jornais, nos veículos radiofônicos e televisivos,
a demonização da Rússia é incessante.
A cobertura dos fatos segue uma linha única e simplista.
As ações da Rússia são retratadas
como o epítome do mal. Seu presidente, Vladimir Putin,
é encarnação demoníaca.
A base histórica deste comportamento, os interesses
econômicos, o contexto político e as avaliações
geopolíticas que fundamentam as ações russas
são ignorados. Não se permite que nenhum fato surja
nas mensagens programadas. Nenhuma mentira é demasiado
absurda ou ridícula. O propósito da campanha propagandística
não é convencer a opinião pública,
mas intimidá-la.
O editorial principal da segunda-feira (A agressão
da Rússia) do New York Times não contém
ao menos um traço de análise. Ele consiste inteiramente
de denunciações, ameaças belicosas e hipocrisia
ilimitada.
O Times começa denunciando a cínica
e ultrajante exploração da crise ucraniana por Putin
para assumir o controle da Criméia. A realidade é
destorcida. Os Estados Unidos apoiaram grupos de direita e fascista
na Ucrânia para conseguirem a mudança de regime em
um país limítrofe da Rússia. Estas operações
foram expostas ao mundo em uma conversa telefônica que vazou
o mês passado, em que o embaixador dos Estados Unidos na
Ucrânia e o secretário de estado discutiram a composição
de um novo governo apoiado por Washington. Evidentemente, o Times
não aludiu ao episódio.
Com surpreendente cinismo, o Times exige que Obama diga
a Putin que a Rússia excedeu os limites de um comportamento
civilizado, e que isto acarretará preço elevado
diante da situação internacional e nas relações
econômicas.
Quem excede os limites do convívio civilizado?
Os Estados Unidos têm intervindo em país após
país - do Panamá à Granada, do Vietnam ao
Afeganistão, Iraque, Líbia e Síria. De suas
operações militares no decorrer do último
quartel do século passado resultarem mortes de pelo menos
um milhão de pessoas.
O Times também publicou na coluna de Roger Cohen
(O crime de Putin na Criméia) em que ele assume
a postura de intelectual e especialista em política internacional.
Tem ele defendido, ano após ano, todo o posicionamento
agressivo dos Estados Unidos, dos Bálcãs à
Síria. Era amigo íntimo de Christopher Stevens,
o último embaixador dos Estados Unidos na Líbia,
assassinado na representação diplomática
americana em Benghazi após organizar a operação
que derrubou Muammar Gaddafi.
A coluna de Cohen no Times consiste em uma enfiada de
insultos e epítetos. O dirigente ucraniano deposto, Yanukovych,
é descrito como um presidente sibarita, grosseiro,
de mau gosto, rápido no gatilho, e Putin, como obsessivo
quanto ao impérium' russo.
As ações de Putin são retratadas como
incompreensíveis. Porque deveria ele sentir-se ameaçado
pela expansão da NATO (OTAN) em direção
aos países bálticos, a aliança
semelhante da União Europeia com a Polônia e a Romênia,
a submissão da Sérvia pela NATO, ou
a patente manipulação mandatária das Nações
Unidas abrindo caminho para a Líbia?. Obviamente,
Putin é louco!
Numa breve e repugnante incursão pela história,
Cohen refere-se, ligeiramente, aos crimes nazistas na Ucrânia
durante a II Guerra Mundial, mas sugerindo que estes eram apenas
uma continuação dos crimes de Stalin. Os nazistas
(após Stalin) fizeram pior, escreve jubilosamente,
ao afirmar que mais milhões morreram. Aqui,
Cohen acrescenta uma lista de autores direitistas que relacionam
os crimes nazistas como parte de um esforço para justificar
a remilitarização alemã de nossos dias.
Cohen então alude, sem explicações, ao
barranco repleto de cadáveres de Babi Yar.
Leitores não familiarizados com a história da II
Guerra Mundial suporão que Cohen se refere a atrocidades
de Stalin. Ele não informa a seus leitores que o barranco
de Babi Yar, próximo a Kiev, capital ucraniana, foi o local
onde aconteceu o massacre de 33.000 judeus perpetrado pelos nazistas
em 29 e 30 de setembro de 1941.
O evento ocorreu exatamente após o início da
guerra de extermínio nazista (Vernichtungskrieg)
contra a União Soviética. As operações
do imperialismo alemão incluíram a matança
de seis milhões de judeus europeus. Aproximadamente 27
milhões de soldados e civis soviéticos morreram
na luta para derrotar a violenta investida do regime fascista
da Alemanha.
Significativamente, Cohen menciona Babi Yar sem mencionar a
origem dos grupos na Ucrânia com que os Estados Unidos e
Alemanha tratam hoje. A oposição é dominada
por odientos anti-semitas.
O partido Svoboda é a força política majoritária
nos protestos que derrubaram Yanukovych. Foi organizado em 2004
como parte da iniciativa para renomear sua organização
precedente, o Partido Social-Nacional da Ucrânia (PSNU).
Esse partido, cujos membros portam insígnias que eram usadas
pelas Waffen SS, foi compelido a mudar sua denominação
porque seu estreito vínculo com o fascismo complicava o
esforço dos Estados Unidos para integrá-lo à
Revolução Laranja, afinal concluída
em 2005.
Oleg Tyahnybok é desde longa data dirigente do Svoboda
e participou das reuniões com os Estados Unidos e funcionários
da União Europeia que preparavam a mudança de regime
do mês passado. Em 2004, Tyahnybok discursou no monte Yavoryna,
quando enalteceu o Insurgente Exército Ucraniano da II
Guerra Mundial que lutou contra os russos, lutou contra
os alemães, lutou contra os judeus e outras imundícies
desejosas de tomar de nós o Estado da Ucrânia,
afirmou. Tyahnybok elogiou seus ouvintes, classificando-os como
a força mais temida pela máfia russo-semita
que controla a Ucrânia. Em 2005, Tyahnybok assinou
uma petição exigindo o banimento de organizações
judias da Ucrânia.
Roger Cohen sabidamente evita referências às forças
fascistas e anti-semitas com as quais os Estados Unidos estão
aliados na Ucrânia. Neste aspecto, Cohen não está
só. O assunto é quase tabu na imprensa dos Estados
Unidos.
A tendência do New York Times é idêntica
à do Wall Street Journal a publicar editoriais afirmando
que a afrontosa agressão da Rússia traz a
ameaça de guerra para o coração da Europa
pela primeira vez desde o fim da Guerra Fria), o Washington
Post (insiste que a administração Obama avalia
as consequências para a Rússia pela invasão
da Ucrânia) e a revista Nation (cujo principal
correspondente de política internacional é o ex-larouchite
Robert Dreyfuss escreve que Vladimir Putin deve ceder).
A característica coordenada da mídia norte-americana
torna claro que não se trata de posicionamentos individuais
e é, porém, exatamente o desdobramento de um plano
bem elaborado que visa à doutrinação do público
para aceitar ações antes impensáveis.
Especialistas políticos influentes clamam por ação
militar. Andrew Kuchins, do Centro de Estudos Políticos
Internacionais, escreve que a intervenção militar
russa além da Criméia é a linha vermelha
que, se for cruzada, significará a guerra com os ucranianos
e as forças da NATO. E acrescenta, forças
dos Estados Unidos e da NATO devem ser destacadas para o mar Negro
bem próximo da costa ucraniana.
Tal guerra teria consequências catastróficas.
A repulsa contra a guerra requer incessante luta com o objetivo
de expor as mentiras da mídia. Urge que nossos leitores
divulguem a World Socialist Web Site entre os trabalhadores
e a juventude. Partilhem e distribuam nossos artigos. Os povos
de todo o mundo devem ser alertados relativamente ao grave perigo
atual.