World Socialist Web Site
 

WSWS : Portuguese

Os protestos de massa no Brasil e a crise de liderança revolucionária

Por Bill Van Auken
29 de junho de 2013

Utilice esta versión para imprimir | Enviar por email | Comunicar-se com

Publicado originalmente em inglês em 22/06/2013

No decorrer de toda semana passada, o Brasil assistiu a seus maiores protestos desde o fim da ditadura militar em 1985. Essa explosão de luta popular tem exposto, acima de tudo, a crise de liderança revolucionária no seio da classe trabalhadora.

O disparo inicial para a escalada de protestos foi o aumento das passagens de ônibus, que subsequentemente resultou numa tentativa de afastar qualquer tentativa de inquietação social. Contudo, quinta-feira entre algo em torno de um e dois milhões de pessoas foram às ruas no Rio de Janeiro, em São Paulo e em dezenas de outras cidades país afora, reivindicando maiores investimentos em educação, saúde e ao mesmo tempo manifestando a ira popular contra os bilhões profusamente dissipados na construção de estádios para a Copa Mundial em prejuízo do povo.

Em muitos casos, os manifestantes enfrentaram brutais repressões, inclusive gás lacrimogênio, balas de borracha e investidas de cavalarias policiais.

Mobilizações populares de tão vultosas dimensões não se explicam apenas por eventos imediatos, desencadeados, por exemplo, pelo simples aumento de 20 centavos nos bilhetes de ônibus; no caso particular da Turquia, as manifestações originaram-se no emprego de tratores para demolição do parque Gezi de Istambul, mas na verdade representam contradições sedimentadas nessas sociedades, e imensamente agravadas pela histórica crise do capitalismo globalizado.

O Brasil da mesma forma que a Turquia, foi aclamado nos últimos anos como exemplo de sucesso econômico. No entanto, o "milagre brasileiro" aparentemente esgotou-se.

Enquanto gerou cerca de 50 bilionários e mais de 150 mil milionários, revelou-se incapaz de resolver a herança da opressão imperialista e o atraso econômico de sua estrutura social básica. Programas restritos de assistência social apontados como redutores dos índices de extrema pobreza e que teriam criado uma nova "classe média" pouco fizeram para mudar o status de um dos países mais desiguais do planeta.

Há crescentes sinais de crise econômica, com taxa de crescimento decrescente de 0,9% em 2012 e 0,6% no primeiro trimestre deste ano. A produção industrial caiu 0,3%, o que importa em demissões e menos contratações de mão de obra. O consumo cai, na medida em que a maioria da população se endivida. A inflação alcança o índice oficial de 6,5%, com o custo de vida básico a subir rapidamente.

Enquanto o número de graduado nas universidades dobrou na última década, a maioria dos que deixaram a universidades não pôde conseguir empregos compatíveis com seus diplomas ou salários decentes.

Os jovens universitários e recém-formados, compõem porção substancial dos manifestantes que encheram as ruas por odo o Brasil esta semana, com o maior número deles participando de ações de massa pela primeira vez na vida.

A inevitável confusão política de tal movimento popular foi explorada, particularmente na quinta-feira, por forças de extrema-direita. Bandos de malfeitores lançaram-se contra grupos de manifestantes esquerdistas e um pequeno numero de sindicalistas, rasgando e queimando faixas, atacando-os com esguichos de pimenta, granadas de efeito moral e canos de metal, e por último expulsando-os das passeatas. Isto aconteceu em São Paulo, no Rio de Janeiro e em várias outras cidades, a indicar uma campanha bem organizada, sem dúvida nenhuma sob a coordenação de policiais e possivelmente militares.

A direita procurou afastar a direção política dos protestos e tentou descaracterizá-la como luta pela igualdade social, gritando o slogan "fora partido" e denunciando a corrupção política, os altos impostos e a criminalidade.

Enquanto a maioria daqueles que se manifestava permanecia desatenta para essas ações sinistras, o fato tem na verdade significação política, e é necessário acentuar que os desordeiros fascistas podiam agir impunemente.

A maior parte daqueles que protestava passou a vida sob o efeito da pregação política do Partido dos Trabalhadores, de governantes ligados ao ex-líder operário Luiz Inácio Lula da Silva e à presidenta Dilma Rousseff sucessora por ele escolhida para a presidência do Brasil. O Partido dos Trabalhadores ocupa o poder há uma década..

.

Formado em 1983 por ocasião de tumultuosas e maciças greves que abalaram a ditadura militar, o Partido dos Trabalhadores e sua confederação sindical, a CUT, desde o começo tem servido de instrumento diversionista, empurrando o movimento dos trabalhadores brasileiros de volta à influência do estado burguês.

Ademais, uma série de organizações falsamente de esquerda dedicou-se a semear a ilusão de que o PT podia tornar-se veículo para implantação do socialismo no Brasil.

Na medida em que nomeou servidores para cargos nos municípios e nos estados, sua política voltou-se cada vez mais para a direita, até Lula ser eleito presidente em 2002, baseado na garantia de continuar a política econômica ditada pelo FMI. O capitalismo brasileiro e o internacional consideraram o PT o melhor instrumento para a proteção de seus interesses contra uma revolução de baixo para cima.

Alguns dos supostos penduricalhos esquerdistas desgarram-se do PT, enquanto outros com ele permaneceram, com membros ocupando posições de influência. No caso do Secretariado Pabloita Unido (*), as duas coisas confirmaram-se.

Parte da seção brasileira foi expulsa, e formou novo partido na mesma linha originária do PT, o PSOL - Partido Socialismo e Liberdade, enquanto outros permanecem com um membro, Miguel Rossetto, nomeado ministro da reforma agrária e que atuou simpaticamente aos grandes proprietários rurais.

Outros que previamente se autoproclamaram trotskistas, inclusive Antonio Palocci, 53, que foi ministro da Fazenda e Luiz Gushiken, 63, do Libelu, ex-secretário de Comunicação de Lula. Os dois foram acusados de manterem ligações com a onda de corrupção e com o escândalo de compra de votos que envolveu o governo petista.

O papel criminoso desempenhado por estes elementos pseudoesquerdistas, todos de tendências nacionalistas, tiveram o simples objetivo de prover o PT de uma coloração partidária "socialista" numa facção de tendência capitalista que trabalhava sistematicamente para subordinar toda forma de luta social aos interesses dos grandes negócios e do estado brasileiro. Eles assim atuaram, em parte promovendo os sindicatos, que desde então deixaram de ser vistos pela população como veículo de transformação social; e brilham pela ausência nas atuais manifestações.

Esta situação abriu espaço total para a direita, que se engajou à forma reacionária e populista notada nos recentes protestos, a explorar a ira popular contra o aparato político corrupto e pró-capitalista petista. Os efetivos perigos apresentados pela presente situação, em um país que por duas décadas foi dominado por uma ditadura militar, e onde nenhum dos responsáveis por assassinatos, torturas, prisões ilegais e outros crimes jamais foi punido.

Como na Turquia e noutros países, as limitações do vagalhão espontâneo de protestos, não importa de que tamanho seja, cedo se evidenciarão no Brasil. A tarefa política decisiva colocada por estes acontecimentos e pela crise global do capitalismo representará uma virada para a classe trabalhadora e a construção dentro dela de nova liderança revolucionária firmada num programa socialista e internacionalista.

Isto significará uma implacável política de críticas ao PT e aos grupos falsamente esquerdistas que giram ao seu redor. É necessário rearmar os trabalhadores brasileiros de perspectivas revolucionárias e forjar sua independência política em relação a todos os setores da burguesia.