O Bundestag alemão (parlamento) ratificou nesta quinta-feira
[30 de setembro] a ampliação do fundo de resgate
europeu destinado a assegurar bancos e instituições
financeiras ameaçadas pela falência estatal.
Em uma votação de 523 a 85, o parlamento decidiu
aumentar as garantias do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira
de 400 bilhões para 780 bilhões, tendo
a própria Alemanha prometido 253 bilhões.
O EFSF [na sigla em inglês] é uma sociedade anônima
formada pelos membros da zona do euro. Ele contrai empréstimos
em condições favoráveis e os transfere para
os países da zona euro incapazes de levantar dinheiro no
mercado livre, devido à sua baixa classificação
de crédito.
Desde que foi criado em junho de 2010, o EFSF foi responsável
por garantir que os bancos que emprestam para os países
mais endividados da zona do euro não só recebessem
o valor total de seus empréstimos no tempo certo, mas também
toda a taxa de juros. Com as novas medidas, o EFSF pode agora
diretamente patrocinar as instituições financeiras.
No futuro, o fundo pode comprar títulos do governo diretamente
de investidores, emprestar dinheiro para o resgate dos bancos
e conceder eventuais linhas de crédito para estados que
não enfrentam diretamente a falência.
O objetivo destas medidas é transferir o risco da falência
dos bancos nacionais para os orçamentos dos países
da zona euro. As iniciativas anteriores já significam que
a falência completa da Grécia imediatamente custará
ao Estado cerca de 28 bilhões de euros, mas somente custará
aos bancos alemães cerca de 12 bilhões de euros.
No entanto, o fundo de resgate não irá fornecer
alívio algum para os trabalhadores em países altamente
endividados, como a Grécia, Espanha ou Portugal. Pelo contrário,
o apoio do EFSF está ligado às duras condições
de austeridade.
A "troika" da Comissão Europeia, Banco Central
Europeu (BCE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI)
ordenou à Grécia a implementação de
grandes cortes sociais, que estão conduzindo a grande massa
da população à miséria e mergulhando
o país em uma recessão profunda . Isso não
vai resolver o problema da dívida, mas torná-lo
pior. Não vão ser os bancos que irão assumir
o risco, mas, sim, os países europeus.
Representantes da troika viajaram para a Grécia na quinta-feira
para investigar as medidas implementadas até agora e estabeleceram
os critérios para mais austeridade. O governo social-democrata
grego PASOK, em face de manifestações em massa e
greves, se comprometeu a seguir os ditames da aristocracia financeira.
As operações do EFSF significam que tais medidas
de austeridade serão distribuídas por toda a Europa.
Não só países altamente endividados, como
Espanha, Itália ou Portugal serão afetados, mas
todas as partes da zona euro. Isto representa uma redistribuição
fundamental da riqueza da base da sociedade para aqueles no topo.
As dívidas do Estado que agora estão sendo repassadas
para a população em toda a Europa são elas
mesmas o resultado de uma orgia de enriquecimento por aqueles
no topo da sociedade. Na Alemanha, a dívida pública
aumentou nos últimos 12 anos de 1,2 para 2,0 trilhões
de euros. Durante o mesmo período, a riqueza privada passou
de 3,4 trilhões para cerca de 5 trilhões,
com os top 3 da sociedade tendo 90 % dessa riqueza.
A votação no Bundestag deixa claro o apoio esmagador
dentro do cenário político para essas políticas.
O Partido Democrata Cristão / União Social Cristã
(CDU / CSU), Partido Democrático Livre (FDP), Partido Social
Democrata (SPD), Verdes, associações patronais e
os sindicatos, todos apoiam essas medidas. A oposição
atacou o governo dizendo que eles não vão longe
o suficiente.
O ex-ministro das Finanças no grande coalizão
CDU / CSU e SPD do governo anterior, Peer Steinbrück (SPD),
disse que, embora certas medidas de austerida terem sido realizadas
na Grécia, "elas não são suficientes."
Ele sugeriu que uma falência ordenada deveria ser considerada.
O líder dos Verdes, Jürgen Trittin, criticou o governo
por sua relutância em agir: "Esta crise é muito
grande para pequenos passos", disse ele.
Nas últimas semanas, representantes do SPD, Verdes e
Partido de Esquerda repetidamente solicitaram que medidas do resgate
fossem extendidas e pediram a introdução das obrigações
em euros, ou seja, títulos comuns do governo europeu para
os quais todos os Estados da zona euro dariam garantias para os
bancos.
Em julho, a liderança do SPD prometeu total apoio a
Angela Merkel para o mecanismo de resgate e todas as medidas impopulares
que resultam dela. O líder do Partido da Esquerda, Gregor
Gysi, chamou o estabelecimento de obrigações em
euros de "inevitável". O líder do partido,
Klaus Ernst, afirmou esta tinha sido uma proposta do Partido de
Esquerda, que agora "todo mundo estava discutindo".
Enquanto o Partido de Esquerda votaram "não"
na votação de quinta-feira, isto não foi
nada mais do que uma manobra transparente. Sempre que seus votos
eram realmente cruciais, como sancionar as medidas mais rápidas
para resgatar os bancos, o Partido de Esquerda nunca hesitou em
apoiar o governo. Neste debate, também, eles essencialmente
defenderam a linha do governo. Sua única exigência
era que o BCE deve emprestar aos países endividados com
juros baratos. O mecanismo para isso seria o mesmo que o do EFSF:
os bancos disponibilizariam novos fundos, enquanto as finanças
públicas arcariam com os custos.
Há uma semana, as quatro lideranças de associações
de empregadores na Alemanha falaram claramente em favor das medidas
de resgate. Sem o EFSF, houve uma ameaça de "conseqüências
incalculáveis para a União Europeia e para a moeda
comum", eles escreveram em uma carta aberta ao Parlamento.
O fundo foi uma "chave para manter a zona do euro em conjunto."
A pressão das grandes empresas alemãs significou
que quando a proposta chegou à votação apenas
um punhado de membros da coalizão governista rejeitou o
pacote de resgate. Nas últimas semanas, vários membros
da CDU e do FDP tinham se pronunciado contra a lei, com base em
uma perspectiva nacionalista de direita.
Os críticos da medida, tais como Wolfgang Bosbach (CDU)
ou Schäffler Frank (FDP), já haviam sublinhado antes
da votação que iriam falar contra qualquer responsabilidade
alemã para as dívidas de outros países.
O Ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble (CDU),
tem previsto um cenário em que a Grécia não
mais recebe qualquer apoio, vai à falência, e só
as instituições financeiras alemãs seriam
resgatadas com dinheiro alemão. Por outro lado, os fundos
EFSF beneficiam todos os bancos que atuam nos países endividados.
Essas visões expressam o nacionalismo crescente com
a qual todos os países europeus estão reagindo à
crise. Enquanto a maioria da elite dominante atualmente vê
os interesses da Alemanha prevalecendo em um resgate do euro sob
o domínio alemão, as vozes estão crescendo
para uma estrada nacional.
Tal caminho teria conseqüências catastróficas
para os trabalhadores na Alemanha e da Europa. Mesmo o Spiegel
Online não exclui o conflito armado neste caso. O fracasso
do euro não significa apenas o "colapso do sistema
financeiro global", escreveu. Ao longo da história,
o fim de uma moeda comum foi precedido pelo "colapso de alianças
políticas ou mesmo de guerra". O "fim da união
monetária seria um cenário de pesadelo".
Antes da votação, as tensões entre os
EUA e a Alemanha tinham se agravado significativamente. O Presidente
Barack Obama não só exigiu um aumento no tamanho
do EFSF para 2 trilhões, mas também se queixou
de que a inércia europeia deixou "o mundo com medo."
Schäuble já tinha sido contido na resposta a essa
demanda de forma a não pôr em perigo a votação
no Bundestag. Agora a pressão dos EUA vai aumentar, e a
discórdia dentro do governo alemão vai crescer.