WSWS : Portuguese
Primeiro-ministro português renuncia em meio a crescentes
protestos sociais
Por Paul Mitchell e Alex Lantier
29 de março de 2011
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Publicado originalmente em inglês em 24 de março
de 2011
O primeiro-ministro, José Sócrates, renunciou
ontem, depois que os cinco partidos da oposição
rejeitaram o orçamento apresentado por seu governo minoritário
do Partido Socialista (PS). O orçamento inclui grandes
cortes de gastos, aumento de impostos e congelamento de pensões
e é destinado a impedir que Portugal procure ajuda, como
aquelas concedidas à Irlanda e à Grécia no
ano passado.
Sócrates disse que permaneceria no cargo em caráter
provisório: O país não ficará
sem governo. O governo vai continuar a cumprir todos os seus deveres
como um governo provisório.
O presidente Aníbal Cavaco Silva pode agora convocar
eleições dentro de dois meses. No entanto, a Constituição
portuguesa determina um período de espera de pelo menos
55 dias entre a convocação das eleições
e a realização das eleições de fato.
Silva emitiu uma declaração afirmando que ele não
iria convocar as eleições, pelo menos até
amanhã.
Até agora, o governo minoritário do PS funcionou
com o apoio tácito dos partidos de oposição
como o PSD, que se absteve de exercer a sua opção
de bloquear as políticas do PS na legislatura. O Partido
Social Democrata (PSD) de extrema-direita se absteve nas votações
anteriores sobre as medidas de austeridade permitindo que o governo
minoritário do PS os aprovasse.
Desta vez o PSD decidiu votar contra declarando que uma
ampla coalizão no governo é necessária
para instituir completamente as medidas de austeridade necessárias.
Eu conversei com o presidente sobre a posição
firme e irreversível do PSD sobre este assunto, declarou
Pedro Passos Coelho, líder do PSD. Esperamos que
o governo saiba como mudar o caminho de modo a não penalizar
os mais desprotegidos, especialmente os aposentados, acrescentou.
Os comentários do PSD sobre proteger os desprotegidos
não são mais que lágrimas de crocodilo. O
PSD foi fundado como uma organização de extrema-direita
em 1974, duas semanas depois da Revolução dos Cravos,
que derrubou a ditadura de Salazar, num período em que
nenhum partido ousou chamar-se conservador. Ele tem agido de forma
agressiva na defesa da elite governante de Portugal desde então.
A retirada do apoio do PSD em relação ao PS é
sinal de uma mudança no seio da burguesia portuguesa a
respeito da melhor forma de impor medidas de austeridade em meio
a crescente oposição social da classe trabalhadora.
Em novembro passado, uma greve geral levou Portugal a um impasse.
Milhões de trabalhadores do setor público e privado
afastaram-se do trabalho para protestar contra o orçamento
e as medidas de austeridade do governo do PS. Enquanto as medidas
de austeridade foram sendo debatidas no Parlamento, uma série
de greves ocorriam inclusive nos trens, metrôs e balsas,
o que deixou muitas áreas paradas.
Em 12 de março, centenas de milhares de jovens trabalhadores
e famílias saíram às ruas em 11 cidades,
organizadas através do Facebook, sem a participação
dos partidos políticos e sindicatos para protestar contra
as últimas medidas. Estima-se que 200 mil pessoas marcharam
em Lisboa e 80 mil no Porto. Os manifestantes exigiram a destituição
do governo e a dissolução do Parlamento, denunciando-os
como "ladrões".
Houve protestos em massa contra as medidas de austeridade nos
dois últimos fins de semana, e na quarta-feira em Lisboa
os maquinistas de trem entraram em greve, criando grandes engarrafamentos
na capital.
O governo do PS quis implementar seu orçamento de austeridade
vital para o Pacto de Estabilidade e Crescimento feito
com a UE aprovado antes da Cúpula Europeia sobre
a crise da dívida da zona do euro. O fracasso em fazê-lo,
juntamente com a probabilidade da Irlanda precisar de mais apoio
e de que a Espanha oscila à beira de uma crise financeira
criou especulações sobre o futuro do euro.
Já havia sinais de que Portugal estava caindo em outra
recessão, a segunda em três anos, o que tornaria
ainda mais difícil para o país pagar suas dívidas.
O Banco de Portugal reviu sua previsão de crescimento para
o próximo ano, feita no final do ano passado, de zero para
uma queda de 1,3%. O banco disse que cortes de salários,
aumentos de impostos e aumento do desemprego podem causar a queda
da demanda doméstica em 3,6% neste ano e a queda de investimentos
em 6,8%.
A taxa de juro da dívida soberana portuguesa quase duplicou
no último ano, tornando ainda mais difícil para
Portugal pagar suas dívidas. Ontem, a taxa dos títulos
de 10 anos subiu para 7,8%, enquanto os títulos de 5 anos
bateram um recorde de 8,2%. A Alemanha paga apenas 3% em contraste.
O governo do PS alegou que sua proposta de orçamento
teria ajudado a reduzir o déficit orçamental para
4,6% do produto interno bruto este ano, em relação
à estimativa do ano passado de 7,3%, e de 3% em 2012. No
entanto, o país ainda precisar emprestar cerca de 20 bilhões
de euros este ano para financiar seu déficit. Ele tem apenas
6 bilhões de euros em reservas de dinheiro para pagar 13
bilhões de euros dos empréstimos devidos em abril
e junho.
Uma ajuda indireta já está ocorrendo, na medida
em que o Banco Central Europeu é o único comprador
da dívida soberana de Portugal, vendida através
de títulos do governo em leilões nos mercados financeiros.
Ou seja, o BCE está imprimindo dinheiro para emprestar
ao governo Português, visto que outros bancos estão
se recusando a emprestar dinheiro a Lisboa.
O ministro das Finanças, Fernando Teixeira dos Santos
disse que a rejeição do orçamento de austeridade
do PS cortaria o acesso a esses empréstimos e aumentaria
a pressão sobre Portugal para aceitar uma ajuda da União
Europeia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI).
A rejeição deste plano vai agravar as condições
de financiamento do país e criar mais dificuldades que
eu duvido que possamos superar por conta própria,
disse Teixeira dos Santos enquanto abria o debate no parlamento.
Em tais momentos, uma crise política equivale a um
grande impulso para cair nos braços da ajuda externa.
Os analistas financeiros concordam. O temor é
de que se Portugal não conseguir chegar a um acordo sobre
as medidas de austeridade isto poderá, potencialmente,
forçar o país a entrar na EFSF [Linha de Estailidade
Financeira Europeia] ", disse Maria Nicola, uma economista
do BNP Paribas.
A EFSF é um fundo de resgate de 750 bilhões de
euros criado pela União Europeia, pelo FMI e por vários
governos europeus em 09 de maio de 2010, em meio à crise
da dívida grega. Ele é projetado para emprestar
dinheiro para os governos europeus ameaçados de falência,
quando bancos e investidores nos mercados financeiros se recusam
a emprestar-lhes dinheiro. Antes de obter o empréstimo,
o país deve, então, participar de um programa
nacional, impondo cortes sociais negociados com o FMI e
com o Eurogrupo dos ministros das finanças europeus.
A renúncia de Sócrates prepara o terreno para
a eleição de um governo de direita, preparado para
impor cortes ainda mais drásticos para os trabalhadores
em aliança com bancos internacionais.
Ao votar contra as medidas de austeridade do PS, o PSD praticamente
garantiu que as autoridades financeiras forçarão
Portugal a aceitar uma ajuda europeia enquanto antecipa uma eleição
na qual Sócrates e o PS estão no fundo do poço
nas pesquisas de opinião devido à sua política
anti-trabalhista. Atualmente, Coelho do PSD lidera nas pesquisas
e acredita-se que será eleito como o próximo primeiro-ministro.
Um pacote de resgate irá significar que as instituições
financeiras internacionais efetivamente assumirão o controle
direto da economia portuguesa e a implementação
de cortes de gastos ainda mais severos do que aqueles que estão
sendo realizados pelo Governo do PS. Portugal teve a experiência
de intervenção do FMI em 1977 e em 1983 que resultaram
em ataques enormes sobre os padrões de vida dos trabalhadores
e em recessões profundas.
Portugal já tem uma das maiores diferenças entre
ricos e pobres na UE, e um quinto da população sobrevive
com menos de 360 euros por mês. O desemprego é de
11,2% é um recorde. Um em cada três trabalhadores
quase um milhão ganha menos do que o salário
mínimo de 475 euros por mês. Quase 40% dos trabalhadores
trabalham de forma precária em meio-período
ou em trabalhos temporários.
Alguns comentaristas burgueses expressaram preocupação
de que, caso ocorra uma crise financeira antes da realização
de novas eleições, ela pode criar uma situação
explosiva, onde um governo provisório ou seja, sem
um mandato formal tente impor cortes sociais impopulares
sobre a população.
O jornal UE Observer escreveu: E qualquer programa de
austeridade contido em tal acordo (da EFSF), sem dúvida,
será ainda mais duro do que as medidas que Sócrates
está tentando adotar. Se o primeiro-ministro interino tentar
tal movimento, a legitimidade do governo provavelmente cairia
sob suspeita, uma situação perigosa em meio à
crescente indignação pública.
No entanto, o analista político Antonio Costa Pinto
apesar de tais preocupações, sugeriu que o governo
iria adiante de qualquer maneira. Apesar de um governo interino
não poder tomar grandes iniciativas autônomas, ele
pode tomar a decisão de recorrer à ajuda se for
apoiado pelo parlamento", disse ele à Reuters.
[Traduzido por movimentonn.org]
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