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A renúncia de Oskar Lafontaine e a crise do Partido de Esquerda alemão

Por Ulrich Rippert
3 de fevereiro de 2010

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Publicado originalmente em inglês no dia 24 de janeiro de 2010.

A decisão tomada por Oskar Lafontaine de renunciar à presidência do Partido da Esquerda e abandonar sua cadeira no parlamento lançou o partido em uma crise profunda.

Lafontaine declarou que sua decisão baseava-se "exclusivamente em motivos médicos". Em dezembro sofrera uma cirurgia para lidar com um câncer. A operação foi bem-sucedida, mas seu estado de saúde fez com que fosse aconselhado a limitar suas atividades políticas. Assim, Lafontaine declarou no fim de semana passado que pretendia restringir seu trabalho ao parlamento estadual do Sarre, onde também exerce o cargo de deputado. Ele não entrou em detalhes sobre seu estado de saúde, mas relatos da imprensa colocam que sua condição na próstata fora identificada e tratada a tempo.

A saúde de Lafontaine é, no entanto, insuficiente para explicar o profundo estado de crise do partido em cuja fundação ele desempenhou um papel fundamental. Na realidade, sua renúncia é a confirmação de que suas concepções políticas foram derrotadas.

Lafontaine já possui uma renúncia em seu histórico. Onze anos atrás ele renunciou aos cargos de presidente do Partido Social-democrata (SPD), ministro federal das finanças e vice-líder da coligação SPD-Verdes após sérias pressões por parte de círculos financeiros. Quando o chanceler Gerhard Schröder (SPD) destacou que não implementaria nenhuma política que fosse de encontro aos interesses dos grandes negócios e bancos, Lafontaine renunciou sem levar adiante qualquer tipo de luta, deixando Schröder e o resto da direção do SPD continuarem seus ataques absurdos à classe trabalhadora através do programa de reformas Agenda 2010.

Lafontaine só retornou à carreira política depois que fileiras enormes de filiados e eleitores do SPD voltaram as costas ao partido. A decadência da social-democracia foi recebida com alarde por amplas camadas da burguesia — afinal, o SPD cumprira um papel crucial na manutenção da ordem burguesa na Alemanha por quase um século. Em 1918, foi o SPD que garantiu a sobrevivência do capitalismo depois que o imperador foi varrido de seu trono. Após a Segunda Guerra, o SPD defendeu a propriedade privada e uma política voltara para o oeste. Após as revoltas estudantis e greves espontâneas de 1968/1969, foi o líder do SPD Willy Brandt que pôs um fim os protestos.

O objetivo de Lafontaine era prevenir o declínio do SPD. Com este fim, ele organizou a junção da Eleição Alternativa por Trabalho e Justiça Social (WASG) na Alemanha ocidental — um depósito de social-democratas desiludidos e burocratas sindicais — com o Partido do Socialismo Democrático, que surgiu a partir do partido stalinista alemão, possuía um enorme aparelho partidário e inúmeras cadeiras nas administrações estaduais e municipais na Alemanha oriental.

Desde o começo, o novo partido caracterizava-se por profundas divisões. Nos estados da Alemanha ocidental, o recém-formado Partido da esquerda usou sua influência política e cargos para empurrar os fortes ataques sociais na Agenda 2010, enquanto Lafontaine viajava pelo país empregando clichês esquerdistas para denunciar os cortes sociais e reduções de postos de trabalho. O Partido da esquerda nunca teve um programa original. A pose oposicionista de Lafontaine tinha natureza puramente retórica, baseada em manter as ilusões social-democratas pelo maior tempo possível. Onde quer que o Partido da esquerda assumisse um cargo, sua política não se distinguia da do SPD e dos partidos conservadores.

O principal projeto de Lafontaine era uma futura coligação entre o SPD e o Partido da esquerda em nível federal voltada para prevenir qualquer mobilização ampla da população contra a elite política. Não por coincidência Lafontaine de repente se viu como o herdeiro político de Willy Brandt, o qual fizera escola política no centrista Partido Socialista dos Trabalhadores antes de se tornar prefeito de Berlim após a guerra. Em seguida assumiu a vice-liderança de uma grande coligação de partidos conservadores e do SPD antes de finalmente assumir o posto de chanceler alemão. Como chanceler ele pôde dissipar o movimento protestante de 1968, que havia ganhado o apoio de amplas camadas de trabalhadores, prometendo mais democracia e reformas sociais.

Lafontaine também tem experiência em dissolver crises sociais. Sendo primeiro-ministro do Sarre por longo tempo, ele foi bem-sucedido ao fechar levas de indústrias estatais de mineração e siderurgia sem causar uma rebelião social.

Agora os planos de Lafontaine acabaram frustrados pelo colapso do sistema financeiro internacional e a conseqüente crise econômica. Sua demagogia social-reformista se tornou completamente insustentável. Ele não tinha mais nada a oferecer na forma de uma solução às injustiças sociais às quais se referia em seus discursos além de apelos à constituição alemã, que se refere à responsabilidade social ligada à riqueza. Qualquer chance de ser possível retornar ao tipo de política reformista levada adiante por Willy Brandt 40 anos atrás foi considerada um absurdo a cada dia que se passava com as conseqüências devastadoras da crise econômica.

As tentativas de Lafontaine para formar uma coligação estadual com o SPD no Sarre e na Turíngia como preparação para uma participação no governo federal também fracassaram após o SPD da Turíngia e os Verdes do Sarre decidirem formar coligações com a União Democrata-Cristã. O único estado a produzir uma coligação do SPD com o Partido da esquerda foi Brandenburgo, sob um programa baseado no corte de um a cada cinco postos públicos.

A tensão estava se aprofundando no Partido da esquerda muito antes do câncer de Lafontaine tornar-se público. No leste, onde o partido está profundamente integrado ao aparelho estatal, a retórica populista de Lafontaine era cada vez mais vista como provocadora, enquanto que no oeste o partido temia que poderia perder credibilidade muito rápido se fosse imediatamente identificado com as políticas austeras do governo alemão.

As tensões emergiram em um conflito aberto entre Lafontaine e o secretário do Partido da esquerda, Dietmar Bartsch. Bartsch, cuja base é localizada no leste do país, foi acusado por círculos do oeste de ter espalhado rumores sobre um caso extra-conjugal de Lafontaine. No fim, Bartsch foi forçado a renunciar seguindo as pressões de Lafontaine. Agora, Lafontaine também abandonou o barco. Sua saída só intensificará as tensões no partido A Esquerda, como já demonstraram os conflitos que surgiram sobre quem deveria tomar seu posto.

Com um congresso prestes a ocorrer em maio, a direção acreditava que poderia dispensar sua solução acordada de uma direção dupla eleita igualmente do leste e do oeste do país. Mas os atritos estão tão avançados que a última proposta de uma nova direção implica não somente dois novos presidentes (mais uma vez, representando o leste e o oeste), mas também dois secretários de partido.

A decisão sobre os dois futuros presidentes deixa clara a orientação futura do partido. O ex-secretário stalinista, Gesine Lötzsch, de Berlim, tem habitualmente apoiado as políticas direitistas do Senado da capital (também uma coligação do Partido da esquerda e SPD), enquanto o candidato pelo oeste, Klaus Ernst, é funcionário período integral do sindicato IG Metall e é típico daquela camada de burocratas que há tempos cumprem o papel de co-diretores das empresas.

O futuro do Partido da esquerda permanece em aberto. O que fica claro é que, baseado em seu passado, o partido irá inevitavelmente reagir a essa última crise lutando ainda mais para demonstrar sua credencial de uma força que atua para estabilizar a ordem capitalista.

[traduzido por movimentonn.org]

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