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Washington pressiona por acordo com golpistas em Honduras
Por Bill Van Auken
3 de novembro de 2009
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Publicado em inglês no WSWS em 31 de outubro de 2009
As delegações que representam o presidente hondurenho
deposto de Honduras, Manuel Zelaya, e o regime que o substituiu
por meio do golpe de 28 de junho, assinaram um acordo na sexta-feira,
dia 30/10, após a intervenção de uma delegação
do alto escalão do Departamento de Estado dos EUA em Tegucigalpa.
Não há nenhuma garantia de que o acordo restaurará
Zelaya ao poder. Se isso acontecer, será por não
mais que dois meses e somente como um presidente sem poderes,
em um governo dominado por aqueles que o depuseram.
As condições do acordo servem para consolidar
os objetivos centrais do golpe, traindo as demandas políticas
e sociais das massas de trabalhadores hondurenhos que resistiram
ao golpe e sofreram violenta repressão do estado por mais
de quatro meses.
A assinatura do acordo ocorreu menos de um mês antes
da eleição para escolher o sucessor de Zelaya. O
acordo foi fechado dois dias depois que Thomas Shannon, secretário-assistente
de Estado dos EUA para o hemisfério ocidental e um resquício
da administração Bush chegou à capital hondurenha
junto com Dan Restrepo, o conselheiro do Conselho de Segurança
Nacional da administração Obama na América
Latina.
O objetivo central de Washington é legitimar a eleição
presidencial marcada para 29 de novembro para escolher o sucessor
de Zelaya. Washington vê essa eleição como
uma forma de estabilizar o Estado hondurenho e frear a radicalização
das massas hondurenhas.
Quase todos os termos do chamado Acordo de Tegucigalpa, assinado
na sexta-feira, constavam no acordo de San José, intermediado
pelo presidente da Costa Rica, Oscar Arias, há mais de
três meses, por ordem de Washington.
Os termos incluem a formação de um governo de
unidade e reconciliação nacional no
qual as forças dominantes serão os políticos
que apoiaram o golpe de junho e os militares que o executaram.
Segundo informações recebidas, os dois lados e os
principais partidos políticos selecionarão os ministros
de tal regime. Entretanto, não está claro o que
acontecerá aos muitos outros funcionários que foram
demitidos e substituídos após o golpe. A única
instituição que permanecerá intocada serão
as Forças Armadas.
O acordo também inclui a renúncia de Zelaya de
qualquer tentativa de convocar uma Assembleia Nacional Constituinte
com a finalidade de revisar a constituição de Honduras.
Tal mudança foi a principal exigência dos protestos
em massa contra o golpe. A atual constituição foi
imposta ao povo hondurenho em 1982 pela ditadura militar, em consulta
com a embaixada dos EUA, e foi criada para defender os interesses
da oligarquia que monopoliza a riqueza do país.
Foi a tentativa de Zelaya de realizar uma votação
para determinar se havia apoio popular para tal assembleia que
desencadeou o golpe de junho passado. Os apoiadores do golpe o
acusaram de que tentava emendar a constituição para
derrubar os limites de mandato e concorrer novamente à
presidência.
O acordo prevê a formação de uma Comissão
de Verificação e de uma Comissão da Verdade.
A primeira delas é composta por dois hondurenhos e dois
estrangeiros, a serem escolhidos pela Organização
dos Estados Americanos, que irá supervisionar o cumprimento
do acordo. O painel da Verdade investigará o golpe e os
acontecimentos que levaram a ele e aqueles que o seguem. Em praticamente
todos os países onde tais comissões foram formadas,
elas serviram como um substituto para proteger aqueles que realizaram
o golpe de Estado e a repressão.
Ao fornecer uma moratória sobre os processos criminais,
tanto de Zelaya quanto dos líderes do golpe, o acordo final
exclui uma anistia para crimes políticos. Inicialmente
foi divulgado que Zelaya se opôs à oferta de anistia,
mas parece que os generais hondurenhos o vetaram, uma vez que
ainda querem ver o presidente deposto julgado por traição.
Também no âmbito do acordo, a autoridade formal
sobre os militares deve ser transferida para o Supremo Tribunal
Eleitoral do país, antes da eleição presidencial
de novembro. Todos os partidos são obrigados a apoiar a
eleição, juntamente com a instalação
de um novo governo em janeiro.
A cláusula final refere-se ao mecanismo para retornar
Zelaya ao poder. No início deste mês, os dois lados
interromperam as negociações após a delegação
de Zelaya exigir que seu retorno à presidência fosse
decidido pelo Congresso Nacional, enquanto a equipe de Micheletti
insistiu que fosse determinada pela Suprema Corte.
No golpe de junho passado, foi o alto tribunal que declarou
as ações de Zelaya uma violação da
constituição, enquanto foi o Congresso que votou
em substituí-lo por Micheletti. A decisão foi implementada
pelos militares, que o arrastaram para fora do palácio
presidencial no meio da noite e o forçaram a entrar em
um avião que o levou ao exílio.
O suposto sucesso da mediação dirigida pelos
Estados Unidos nos últimos dias foi engendrar um acordo,
sob o qual a Suprema Corte emitiria uma recomendação
a respeito da situação de Zelaya, enquanto o Congresso
teria o voto de decisão.
Apenas há alguns minutos atrás, eu autorizei
a assinatura do acordo que marca o início do fim do problema
político que o país enfrentou, anunciou Micheletti
na noite de quinta-feira.
Quão cedo será o fim do fim, entretanto,
não está claro de forma alguma.
Primeiramente, a Suprema Corte do país deve apresentar
a sua recomendação ao Congresso. Então, mesmo
se o Legislativo votar em última instância por colocar
Zelaya de volta no palácio presidencial, não há
nenhuma garantia de que isto acontecerá em breve. O presidente
do Congresso Nacional de Honduras, José Alfredo Saavedra,
disse à rádio local HRN na sexta-feira que ninguém
poderia impor um prazo de discussão sobre o corpo do acordo
e a programação de uma votação. Até
então, ressaltou, Micheletti permaneceria na presidência.
De sua parte, Shannon, do departamento de Estado, disse que
a implementação do acordo seria complicada
e que o Congresso determinaria quando, como e se Zelaya
seria restabelecido como o presidente.
Enquanto isso, a agência de notícia Bloomberg
citou uma conselheira de Micheletti, Marcia Facusse de Villeda,
que afirmou em uma entrevista: Zelaya não será
restaurado. Mas só com a assinatura deste acordo nós
já temos o reconhecimento da comunidade internacional para
as eleições.
Em uma declaração à Rádio Globo,
uma estação que foi interrompida repetidamente por
forças de segurança por sua oposição
ao golpe, Zelaya descreveu o acordo como um símbolo
da paz para o nosso país e da restauração
de nossa democracia.
Ele pediu ao povo hondurenho que mantenha a calma,
acrescentando, em um aparente apelo por respeito aos líderes
do golpe, que nós não iremos ironizar ninguém,
nós não usaremos isto para ridicularizar, mas para
pedir paz. Ele também alertou a população
de que a situação não seria resolvida de
um dia para o outro.
O acordo não conseguiu mudar a situação
imediata de Zelaya. Ele continua na embaixada brasileira, onde
tem permanecido por quase seis semanas. As forças de segurança
hondurenhas continuam cercando o edifício.
Zelaya elogiou os funcionários dos EUA escalados para
negociar o acordo. A secretária de estado Hillary
Clinton, Shannon, Dan Restrepo e o embaixador (dos EUA), (Hugo)
Llorens desempenharam um papel fundamental e essencial,
disse ele.
Nos mesmos termos expressou sua gratidão ao Brasil,
que lhe deu refúgio em sua embaixada em Tegucigalpa, e
à Arias, da Costa Rica, por negociar o acordo inicial.
Notadamente ficou ausente desta lista de agradecimentos o presidente
Hugo Chávez. Uma das justificativas dadas para o golpe
era o fato de que Zelaya estava muito próximo do presidente
venezuelano, um relacionamento cimentado com os contratos do petróleo
barato.
Em Caracas, Chávez disse que dava boas-vindas ao acordo
mediado pelos EUA se ele colocasse Honduras de volta para
o caminho da democracia.
A assinatura do acordo em Tegucigalpa nos dias em que a administração
Obama enviou funcionários do alto escalão para a
capital hondurenha levanta a questão óbvia sobre
por que Washington não conduziu tal iniciativa meses atrás.
O estabelecimento político de Honduras e de seus militares
têm sido dominado pelo imperialismo dos EUA por mais de
um século. Nos anos 80, a embaixada dos EUA e a CIA tiveram
rédeas livres sobre o território hondurenho, usando-o
como seu porta-aviões para lançar a
guerra contra a Nicarágua e alimentar a campanha sangrenta
da contra-insurreição em El Salvador. Hoje, os EUA
contabilizam mais da metade do comércio estrangeiro de
Honduras e dois terços de seu investimento estrangeiro.
Claramente, a séria pressão de Washington produziria
o efeito desejado.
Se a administração Obama não interveio
durante quatro meses, foi porque apoiou silenciosamente os objetivos
do regime do golpe, enquanto publicamente proclamou seu apoio
à ordem constitucional e à democracia. Levou a cabo
as mesmas táticas bloqueadoras do regime de Micheletti,
procurando esgotar o relógio para a presidência de
Zelaya.
Os EUA viram a expulsão de Zelaya como um meio de conter
a influência de Chávez na região e proteger
os interesses das corporações dos EUA que procuram
mão-de-obra barata em Honduras. Dada a estreita relação
entre as forças armadas hondurenhas e o Pentágono,
que mantém sua maior base latino-americano em Honduras,
é difícil acreditar que o golpe em si foi realizado
sem o prévio conhecimento e aprovação de
Washington.
Com menos de dois meses restantes de mandato presidencial de
Zelaya, a administração Obama considera um acordo
que possa trazer Zelaya momentaneamente de volta como um governante
sem poderes como um preço pequeno a pagar pela legitimação
do golpe e da próxima eleição.
Desde o golpe de junho passado, a repressão das forças
armadas e da polícia resultou em pelo menos 20 mortes.
Centenas de pessoas foram feridas e milhares foram detidas sem
acusações. As transmissões de rádio
que denunciavam os pontos críticos do regime foram fechadas
pelos militares, enquanto as manifestações foram
rotineiramente quebradas. Mesmo com a conferência de paz,
que estava para ocorrer na quinta-feira, as forças de segurança
dispersaram mais de 1.000 manifestantes usando gás lacrimogêneo
e cassetetes.
As condições de vida da população
de Honduras, a mais pobre das Américas depois do Haiti,
pioraram drasticamente. O Fundo das Nações Unidas
para a Infância (UNICEF) emitiu na quarta-feira um relatório
que denuncia graves violações dos direitos
das crianças hondurenhas desde o golpe de junho, citando
casos de crianças mortas, torturadas, espancadas e detidas
ilegalmente.
A UNICEF estimou que pelo menos 1.600 bebês e crianças
menores de cinco anos de idade morreram desde o golpe de junho
13 por dia atribuindo o aumento dramático
na taxa de mortalidade ao colapso do sistema de saúde pública.
A agência acrescentou que os 1,8 milhão de crianças
de escolas públicas ficaram efetivamente sem aulas por
causa dos fechamentos das escolas.
A administração Obama não emitiu nenhum
protesto contra esses ataques à população
de Honduras e agora elogia seus autores como heróis
da democracia. Ele aceitou o uso de forças repressivas
como se fossem necessárias para reprimir o movimento dos
trabalhadores, estudantes e camponeses do país.
Dado este registro, a aceitação de Zelaya do
acordo reacionário mediado pelos EUA, assim como de Chávez,
representa a exposição mais contundente da bancarrota
do nacionalismo burguês na América Latina, não
importa quais sejam as suas pretensões de esquerda
.
Os eventos em Honduras demonstraram que os trabalhadores hondurenhos
e de toda a América Latina somente podem defender seus
direitos construindo sua independência política de
todos as facções da elite governante e construindo
a luta pelo governo dos trabalhadores e pela transformação
socialista internacionalmente.
[traduzido por movimentonn.org]
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