Cerca de 200.000 estudantes secundaristas, universitários
e professores fizeram uma série de manifestações
conjuntas em 70 cidades ao redor da Alemanha para protestar contra
a ruína do sistema educacional do país. As manifestações
de massa na quarta-feira foram o ponto alto de uma semana de ações
que incluíram greves isoladas e protestos em universidades
individuais. Na capital alemã, estudantes ocuparam temporariamente
prédios das universidades Humboldt e Free.
Universidades estiveram sujeitas a cortes drásticos
nos anos recentes, com muitos postos de docência vazios
permanecendo não preenchidos. Os orçamentos para
universidades foram reduzidos enquanto dinheiro foi liberado para
o estabelecimento de universidades mais elitistas, como a Einstein
Foundation, em Berlim. Muitos dos cortes e deteriorações
em cursos universitários ocorreram sob o Processo de Bolonha,
que foi inicialmente assinado em 1999 e tinha como objetivo transformar
a educação em uma mercadoria.
A isso acrescenta-se a decisão da corte constitucional
alemã em 2005 de permitir que governos dos estados implementem
novas taxas. Muitos estados alemães introduziram ou estão
introduzindo tais taxas, que podem totalizar até 500 euros
por semestre. As novas taxas ameaçam muitos estudantes
com a pobreza e inevitavelmente forçarão um número
considerável a encerrar os estudos prematuramente.
Relatos recentes da mídia fornecem o exemplo de jovens
estudantes que foram forçados a trabalhar meio-período
em hotéis para suplementar a renda e pagar as taxas. Como
funcionários temporários do hotel, eles devem limpar
os quartos e fazer as camas por menos de 3 euros/hora.
Uma das principais exigências dos estudantes universitários
na quarta-feira foi libertar a educação para
todos, com a vasta maioria dos estudantes se opondo vigorosamente
ao desenvolvimento de um sistema educacional baseado em renda.
Cortes financeiros e de efetivo ao redor do país resultaram
em salas de aula superlotadas e uma drástica deterioração
da proporção professor-estudante.
Ao mesmo tempo, novos regulamentos quanto aos cursos de bacharelado
das universidades levaram à restrições nas
escolhas de matérias disponíveis aos estudantes,
com cursos cada vez mais orientados às eventuais carreiras.
Sob condições onde as perspectivas de emprego para
os graduados estão diminuindo rapidamente, em razão
da atual crise econômica e financeira, a restritiva estrutura
do curso, somada às possibilidades sombrias para o futuro
profissional, cria uma mistura explosiva.
Embora um punhado de faixas de sindicatos eram visíveis
na manifestação em Berlim, o principal papel dos
sindicatos do funcionalismo público que possuem representação
entre os professores e outros efetivos da educação
foi desmontar e isolar uma onda de ações de protesto
e greves que está se levantando através do país.
Na segunda-feira, líderes do sindicato do funcionalismo
público Verdi usaram uma manifestação de
30.000 trabalhadores de assistência infantil para criar
uma plataforma para políticos da situação.
Apesar dos trabalhadores da assistência infantil compartilharem
de muitos dos problemas em termos de cortes financeiros
e condições de trabalho deterioradas que
perseguem os estudantes e professores, os sindicatos estão
se utilizando de uma tática divisionista sistemática.
Eles se recusaram a organizar uma manifestação conjunta
de estudantes, professores e trabalhadores da assistência
infantil.
A ruína da educação foi conduzida por
governos sucessivos em particular o da coalizão
Partido Social Democrata-Partido Verde (1998-2004) e a atual grande
coalizão (Partido Social Democrata-União Democrata
Cristã-União Social Cristã). Em Berlim, os
cortes foram implementados pelo senado da cidade, que consiste
numa coalizão entre o Partido Social Democrata e o Partido
de Esquerda.
Muitos dos participantes das manifestações ao
redor da Alemanha eram críticos quanto ao papel dos partidos
da situação e dos sindicatos, e era notável
que nenhum dos oradores da marcha em Berlim representava um sindicato
ou oficialmente reconhecia comprometimento com algum partido político
estabelecido.
Repórteres do WSWS estiveram em diversas das manifestações
e entrevistaram estudantes:
Berlim
Moritz, 22, estuda ciências sociais na Universidade Humboldt,
e Jona, 21, é estudante de engenharia econômica na
Universidade Técnica.
Moritz e Jona dissearm que uma das principais razões
de sua participação na marcha de cerca de 15.000
pessaos era protestar contra a ruína das universidades
em Berlim e a crescente tendência em direção
a um sistema educacional de duas classes.
Moritz disse: Estamos exigindo que o Senado invista 150
milhões de euros adicionais nas universidades de Berlim
ao longo dos próximos quatro anos. Esse dinheiro é
necessário meramente para manter o status quo nas
universidades. Também nos opomos à neo-liberalização
dos cursos universitários. Em particular, os novos cursos
de bacharelado introduzidos há alguns anos são muito
restritivos. A escolha de matérias foi limitada e quaisquer
cursos interessantes ou socialmente críticos foram podados.
Moritz continuou: As decisões em tais assuntos
financeiros são sempre políticas. Estão nos
dizendo que agora não existe dinheiro para a educação
em razão da crise financeira, mas o dinheiro está
sendo liberado para os bancos e, aqui em Berlim, a Fundação
Einstein está sendo financiada pelo senado com 40 milhões
de euros. Também há planos para reconstruir a Stadtschloss
por 100 milhões. O Estado deveria estar investindo em educação
básica e no futuro de seus cidadãos, em vez de em
projetos controversos.
Quando questionado sobre o senado de Berlim, Moritz declarou
que não possuía qualquer confiança no Partido
Social Democrata ou no Partido de Esquerda. O problema com
o Partido de Esquerda é que não é de esquerda.
É social-democrata e simplesmente tenta repetir as políticas
que o Partido Social Democrata levou adiante na década
de 1970.
A discussão sobre 1968 está no ar após
o aniversário de 40 anos desses eventos no ano passado.
Mas me parece que uma das principais diferenças entre aqueles
anos e o presente é que muitos dos estudantes de 68 faziam
seus protestos, mas tinham confiança de que seriam capazes
de encontrar empregos num estágio mais tardio de suas carreiras.
Hoje na esteira da crise financeira as coisas são muito
diferentes. Estamos sendo limitados a uma carreira específica
mas sob condições onde é muito questionável
se seremos capazes de encontrar um trabalho razoavelmente bem
pago ao final de nossos estudos.
Relatando a situação de sua própria universidade,
Jona explicou que o nível e qualidade do ensino caiu dramaticamente
20 vagas de docência não foram preenchidas
na universidade desde 2003.
Bielefeld
Em Bielefeld cerca de 4.500 jovens tomaram parte em uma marcha
de protesto através do centro da cidade, que terminou com
um comício em frente à prefeitura da cidade. A manifestação
foi integrada principalmente por estudantes secundaristas e a
ausência de estudantes da universidade local e vários
colégios de ensino superior era marcante.
Antes da manifestação a Corte Administrativa
em Minden impediu os manifestantes de protestar na junção
de tráfico central da cidade. Os jovens manifestantes ocuparam
a junção mesmo assim, paralisando o tráfico
suburbano por horas. Aquela foi uma decisão política
pela corte, explicou o estudante Jannis para nosso repórter.
Na época do campeonato mundial de futebol eles disponibilizaram
a junção ao público, mas quando se trata
de livre expressão da opinião a junção
é banida!
Nosso reporter falou com organizadores e participantes do protesto.
Hendrik, um membro da equipe de organização e do
conselho estudantil do distrito, fez um balanço positivo
da ação e da participação substancial
de secundaristas: Também fomos apoiados por professores
que estão descontentes que as atuais condições
em suas escolas. Ele foi positivo sobre o papel assumido
pelos sindicatos na disputa, e anunciou novos protestos para o
próximo ano escolar, para colocar pressão
sobre os políticos. Quando questionado sobre o motivo
de trabalhadores da assistência infantil não tomarem
parte dos protestos ele reconheceu que as táticas sindicais
eram inapropriadas.
Leipzig
Cerca de 3.000 estudantes e professors participaram da manifestação
em Leipzig. O protesto começou no colégio de educação
superior (HTWK Leipzig) no sul da cidade e cresceu conforme progredia.
Professores em greve se juntaram à manifestação,
e enquanto ela percorria o caminho através do centro da
cidade estudantes da Universidade de Leipzig também a incorporaram.
Com uma gama de faixas e estandartes, os participantes deixaram
claro sua posição crítica quanto ao atual
estado do sistema educacional e expressaram sua raiva quanto ao
fato do governo liberar centenas de bilhões para os bancos
e se recusar a investir em educação e nos jovens.
Robert, que estuda ciência cultural, disse que a universidade
está sujeita a sub-financiamento crônico com uma
contínua redução dos postos de docência,
embora o número de estudantes está aumentando. Na
sua opinião é necessário repensar completamente
todo o Processo de Bolonha, co-responsável pelas miseráveis
condições. Quando questionado se achava que ações
de protesto como a de quarta-feira poderiam ser vitoriosas, foi
cético: Olhando para trás, a grande demonstração
realizada no ano passado em Dresden não foi vitoriosa.
Desde lá nada mudou. Naturalmente protestar é importante,
mas não vai longe o bastante. Precisa haver mais.
Igualmente critico foi Mohamed, estudante de ciência
política e estudos árabes. Ele tomava parte da manifestação
por melhores condições de estudo, melhores equipamentos
nas universidades e um melhor sistema educacional como um todo.
Expressou ódio quanto ao modo como as universidades se
voltaram à economia privada para o financiamento. Nos
cursos de ciência política e comunicação
há um professor que é financiado pelo grupo do setor
de energia Vatternfall. Eu me pergunto até que ponto um
homem como esse pode nos ensinar ou em que medida suas aulas são
determinadas ideologicamente pela companhia para a qual trabalha.
A pior parte é que freqüentemente os estudantes não
conhecem o histórico do professor.
Integrando a marcha dos secundaristas e universitários
em Leipzig estava um professor, Birgit, que explicou: Eu
estou protestando porque as condições de trabalho
em meu emprego pioraram inteiramente do mesmo modo que as condições
para secundaristas e universitários. Ela reclamou
do nível de barulho do local onde trabalha, que aglomera
crianças demais em cada grupo. Há menos e
menos professores empregados, embora as exigências que nos
são feitas cresçam continuamente. Ela não
tinha certeza se o protesto iria ser capaz de mudar a política
oficial, mas declarou que era importante não desistir
nunca.