Publicado originalmente em inglês no dia 23 de janeiro
de 2009
Na quinta-feira, o presidente dos EUA, Barack Obama, emitiu
ordens para o fechamento da prisão de Guantánamo
(em Cuba) por pelo menos um ano, pedindo à Central Intelligence
Agency (CIA) e aos militares que seguissem as proibições
do Manual do Exército a respeito das torturas e fechando
prisões secretas da CIA por todo o mundo.
Enquanto toda a mídia retrata tais medidas como um repúdio
às detenções e interrogações
policiais feitas pela administração Bush, tais ordens,
na verdade, mudam em praticamente nada a situação.
Essencialmente, representam apenas um esforço das relações
públicas para renovar a imagem dos EUA no exterior, depois
de anos de tortura, e uma tentaiva de impedir que um grande número
de oficiais do exército sofram processos criminais.
De forma covarde, Obama encenou, ao assinar tais ordens, que
assim buscava aplacar os direitos políticos dos defensores
da tortura em Guantánamo - ao mesmo tempo em que sublinhava
sua intenção de levar adiante a "guerra ao
terror" da administração Bush. Estava acompannhado
por 16 generais aposentados e almirantes que reivindicaram o fechamento
da prisão em Cuba com o argumento de que tal prisão
impedia o desenvolvimento da "guerra" no resto do mundo.
Em seguida, reiterou sua intenção de seguir o quadro
político básico da política externa da administração
Bush.
A continuidade dos mesmos pretextos ideológicos para
a manutenção e ampliação das guerras
e para o ataque aos direitos democráticos evidencia que
a estrutura policial do Estado erigida na administração
Bush permanecerá intacta. Na verdade, é ainda mais
reforçada pelas garantias feitas por Obama de que seu governo
não investigará ou julgará os oficiais -
incluindo Bush, Cheney, Rumsfeld, Alberto Gonzales e outros -
responsáveis pelas políticas de tortura e detenção
ilegal.
As medidas de Obama não desfazem os ataques aos direitos
constitucionais e às leis internacionais feitos pelo governo
Bush. Não foi contestado o suposto direito do presidente
de aprisionar arbitrariamente qualquer indivíduo, sem julgamento
e sem custódia, declarando-o como um "inimigo de combate".
Além disso, não teve fim o procedimento conhecido
como "execuções extraordinárias",
com o qual supostos terristas foram raptados pelo governo dos
EUA, durante os anos Bush, e transportados a países estrangeiros
ou prisões secretas da CIA fora os EUA, onde foram submetidos
à tortura.
As ordens de Obama também não atingem as centenas
de prisioneiros - 600 só na prisão de Bagram, Afeganistão
- encarcerados em lugares diferentes de Guantánamo. Se
e quando Guantánamo for fechada, o governo dos EUA simplesmente
enviará supostos terroristas pegos por sua armadilha internacional
a outras prisões no resto do mundo.
Quanto a questão das chamadas "técnicas
brutais de interrogatório", ou seja, tortura, as ordens
de Obama também deixam intacta a sua continuidade. O cônsul
da Casa Branca, Gregory Craig, disse aos jornalistas que a administração
estava disposta a acatar as exigências da CIA sobre a continuidade
de tais métodos. Obama anunciou a criação
de uma força tarefa que estudará novos métodos
de interrogatório além dos sancionados pelo Manual
do Exército - que agora aceita 19 formas diferentes de
interrogatório, bem como práticas extraordinárias
de rendição.
O almirante aposentado Dennis Blair, nomeado diretor da inteligência
nacional por Obama, disse em uma audiência ao Senado que
o Manual do Exército será modificado, potencialmente
permitindo formas brutais de interrogatório; mas tais mudanças
seriam mantidas em segredo.
Obama também anunciou que a segunda força tarefa
considera o destino dos 245 detidos restantes em Guantánamo.
No início desta semana, suspendeu os procedimentos da comissão
militar da prisão, mas não aboliu as próprias
comissões militares.
A administração Obama retirou o único
remédio constitucional dos que estiveram submetidos a condições
bárbaras por anos - sem libertá-los ou dar-lhes
um julgamento num tribunal civil, com todo acompanhamento legal,
proteções e garantias. Tem sido alvo de muita especulação
a possibilidade do governo Obama estabelecer uma Corte de Segurança
Nacional especial dentro de um sistema de tribunal civil para
julgar os prisioneiros de Guantánamo e outros supostos
terroristas. Isso representaria mais um ataque às liberdades
civis, configurando um sistema de tribunal "a toque de caixa"
para encaminhar os envolvidos com o "terrorismo" - o
que também poderia, no fururo, ser usado para reprimir
qualquer oposição política.
Segundo o NBC Nightly News desta quinta-feira (22.01), o novo
governo considera manter cerca de 20 detentos de Guatánamo,
incluindo 5 supostos organizadores do 11 de Setembro que enfrentam
atualmente os julgamentos da comissão militar, encarcerados
indefinidamente e sem custódia em um calabouço militar
dentro os EUA.
Comentadores têm observado que a administração
Obama quer evitar a detenção de não-cidadãos
tidos como terroristas, pelo fato de poderem exigir o direito
do habeas corpus.
Duas medidas adotadas separadamente por Obama nesta terça-feira
e quinta-feira (20 e 22/01) evidenciam claramente a questão
que está por trás do fechamento de Guantánamo.
Na quinta-feira, Obama pediu uma pausa no pedido de um habeas
corpus solicitado ao Supremo Tribunal, alegando unicamente que
a pessoa era um "combatentes inimigos" do governo, preso
em solo americano (trata-se de Ali al-Marri, do Qatar, a quem
Obama chamou de "perigoso") Os advogados de al-Marri
desafiam o direito do presidente em prender indivíduos
declarando-os "combatentes inimigos".
A isto se seguiu o pedido de pausa a recursos semelhantes,
feito pela Corte do Distrito Federal, e que poderá mais
de 200 prisioneiros de Guantánamo.
Assim, esses dois fatos evidenciam a política de Obama
sobre a questão: seu objetivo imediato é travar
os processos civis que poderiam revelar-se extremamente prejudiciais
ao governo, pois trariam a luz as torturas sistemáticas
dos detidos e poderia prejudicar altos oficiais do governo.