Abaixo está a segunda e última parte de palestra
ministrada na escola de verão do Socialist Equality Party
(SEP Partido da Igualdade Socialista) em Ann Arbor, Michigan,
agosto de 2007.
O governo da Frente Popular não deu qualquer passo no
sentido de resistir à deflagração do golpe
militar em julho de 1936 e recusou todas as demandas por armamento
aos trabalhadores. Mas, em Barcelona, uma das cidades mais industrializadas
da Espanha, a classe trabalhadora resistiu.
A maior organização da classe trabalhadora na
Catalunha era a federação sindical anarquista CNT
(Confederación Nacional del Trabajo). A influência
do Partido Socialista e do Partido Comunista era pequena se comparada
à do POUM. Trabalhadores comandavam armas, explosivos e
veículos motorizados. Eles convocavam os soldados a recusar
as ordens dos oficiais.
Inspirados pelos trabalhadores catalães, trabalhadores
em Madri e Valença fizeram o mesmo. Os mineradores asturianos
enviaram uma coluna de 5.000 dinamiteiros em auxílio a
Madri. Em Malaga, os trabalhadores não tinham acesso às
armas e primeiro usaram combustível para atear fogo ao
redor das bases militares. Os marinheiros tomaram o controle de
suas embarcações. O governo da Frente Popular ficou
sem um exército, sem uma força policial, sem guardas
de fronteira ou qualquer meio de imposição de autoridade.
Em âmbito nacional, regional e local, a máquina do
Estado entrara em colapso em face do levante fascista.
Todo o aparato estatal havia se desintegrado, e seu papel foi
assumido por comitês improvisados conforme trabalhadores
tomavam o controle das fábricas e começavam a organizar
as cidades, enquanto no campo os camponeses ocupavam a terra e
estabeleciam cooperativas. A campanha militar continuada contra
os fascistas estava nas mãos de milícias de trabalhadores,
que iniciavam uma ofensiva e estendiam a revolução
ao território que recapturavam.
Escrevendo sobre essa experiência, Trotsky disse: "O
proletariado espanhol apresentava atributos militares de primeira
ordem. Em seu peso específico quanto à vida econômica
do país, em seu nível político e cultural,
o proletariado espanhol estava, no primeiro dia da revolução,
não abaixo, mas acima do proletariado russo do começo
de 1917."
Na Rússia, os bolcheviques não haviam sido capazes
de resolver o problema da coletivização imediata
da terra, mas na Espanha, os próprios camponeses, que haviam
sido altamente proletarizados pelo desenvolvimento do capitalismo,
começaram a coletivização. Franco havia precipitado
a revolução que ele esperava prevenir.
Os republicanos e os socialistas sabiam perfeitamente onde
o verdadeiro poder estava. O presidente Luis Companys disse a
um grupo de anarquistas em 20 de julho: "Hoje vocês
são senhores da cidade de Catalunha... Vocês a conquistaram
e tudo está em seu poder. Se não precisam de mim
ou não me querem como presidente da Catalunha, me digam
agora e eu devo me tornar simplesmente outro soldado na luta contra
o fascismo." Companys havia sido um advogado sindical e sabia
o que estava fazendo. Ele estava preparado para aceitar os comitês
de trabalhadores como o poder de facto na Catalunha até
que pudesse desestabilizá-los e restaurar o Estado burguês.
Mas o Estado trabalhador espanhol permaneceu embrionário.
O que havia emergido na Espanha era uma situação
de dualidade de poder. Felix Morrow, o autor de Revolução
e Contra-Revolução na Espanha, se refere à
"Revolução de 19 de Julho", como uma revolução
incompleta que permaneceu equilibrada no fio da navalha. Nenhum
dos partidos, certamente não o POUM, demandou que os comitês
de trabalhadores fossem centralizados em conselhos nacionais de
soldados e trabalhadores. Em vez disso, os comitês permaneceram
locais e espalhados fragmentadamente. O governo foi capaz de usar
seu controle do banco nacional e das reservas de ouro para exercer
o controle financeiro. O POUM e a CNT nunca tentaram assumir os
bancos.
No decurso das sete semanas seguintes, as organizações
de trabalhadores se aproximaram da República porque, ao
não construir soviets, o POUM concedeu tacitamente o direito
de governar à Azaña, Companys e todo o resto. Em
7 de setembro, o próprio Nin demandou que os ministros
burgueses fossem derrubados, mas, em 18 de setembro, a posição
do POUM havia mudado. Seu jornal declarou que o movimento de esquerda
republicano era "de uma profunda natureza popular".
Agora, afirmava que o governo da Frente Popular podia garantir
o socialismo.
Nin chegou à conclusão lógica e se juntou
ao governo catalão. Foi a violação de um
século de experiência revolucionária acumulada.
Marx havia reconhecido na época da Comuna de Paris que
a classe trabalhadora não poderia simplesmente tomar o
controle das instituições estatais existentes, mas
deveria substituí-las por uma nova forma de Estado que
refletisse seus próprios interesses de classe. Os bolcheviques
não entraram no governo de Kerensky mesmo quando ele foi
ameaçado por Kornilov.
Um dos primeiros atos do novo governo na Catalunha foi dissolver
os comitês revolucionários que os trabalhadores haviam
estabelecido em 19 de julho. Esse foi o primeiro grande avanço
da contra-revolução. Foi seguido de um decreto que
desarmou os trabalhadores.
No curso dos 8 meses seguintes, os governos de Madri e Barcelona
destruíram as conquistas obtidas pelos trabalhadores em
Julho. A presença de Nin deu aos governos a autoridade
que precisavam para tomar tais medidas. O processo contra-revolucionário
se movia com a maior lentidão na Catalunha, mas seu sentido
era o mesmo que no resto da Espanha republicana.
Em dezembro, quando já não era mais necessário,
o POUM foi expulso do governo graças à insistência
do cônsul soviético, Antonov-Oyvseyenko. Mas Nin
não aprendera nada e ainda dizia que a Espanha não
precisava de soviets. Suas críticas ao governo eram na
realidade conselhos e sugestões e, embora tenha clamado
pelo controle trabalhador do exército, ele respeitosamente
pediu ao governo que conseguisse isso. Semanas antes do Estado
apontar suas armas para os trabalhadores da Catalunha, Nin ainda
argumentava que os trabalhadores tomariam o poder pacificamente.
Ele permaneceu comprometido com a perspectiva da Frente Popular.
Em março de 1937, Trotsky avisou: "Se essa política
[do POUM] continuar, o proletariado catalão será
vítima de uma terrível catástrofe comparável
àquela da Comuna de Paris de 1871". Suas palavras
se provaram demasiadamente proféticas.
Em maio de 1937, o governo e os stalinistas deflagraram um
assalto militar contra a companhia telefônica de Barcelona,
ocupada pelos trabalhadores desde julho de 1936. O prédio
não era apenas um símbolo visível da dualidade
de poder, mas também uma construção estratégica,
cujo controle permitia aos trabalhadores monitorar as conversas
telefônicas dos ministros do governo. O governo republicano
jamais teria o controle de Barcelona se não retomasse o
controle da central telefônica.
A tentativa pegou os líderes do POUM e da CNT de surpresa,
mas provocou resistência massiva da classe trabalhadora,
que espontaneamente se levantou em defesa das conquistas da revolução.
Todos os documentos disponíveis hoje confirmam que os trabalhadores
teriam conseguido tomar o poder, mas, em vez disso, os líderes
do POUM e os anarquistas insistentemente chamavam pelo cessar-fogo
durante a semana de batalhas de rua que se seguiu. Apenas um pequeno
grupo de bolcheviques-leninistas afiliados à Oposição
de Esquerda, alguns membros de base do POUM e o grupo anarquista
Amigos de Durruti chamaram a tomada do poder pelos trabalhadores
e denunciaram o cessar-fogo.
Em 3-4 de maio, a cidade de Barcelona estava nas mãos
dos trabalhadores. Naquela noite, os executivos do POUM, CNT,
FAI (Federación Anarquista Ibérica) e Juventude
Libertária se encontraram numa sessão conjunta.
Julián Gorkin depois relembrou, "Colocamos o problema
nestes termos precisos: 'Nenhum de nós chamou as massas
de Barcelona a tomar essa ação. Essa é uma
resposta espontânea a uma provocação stalinista.
É um momento decisivo para a revolução. Ou
nos colocamos na liderança do movimento para destruir o
inimigo interno ou então o movimento cairá e o inimigo
nos destruirá. Precisamos fazer nossa escolha entre revolução
e contra-revolução'".
Não se podia colocar com mais clareza e, de fato, eles
fizeram sua escolha.
"Não nos sentíamos espiritual ou fisicamente
fortes o bastante para assumir a liderança e organizar
as massas para a resistência," disse depois um membro
da executiva do POUM. A executiva do POUM admitiu: "Teria
sido possível tomar o poder, mas nosso partido, uma força
minoritária no movimento da classe trabalhadora, não
pôde assumir a responsabilidade de emitir esse slogan".
Se eles houvessem chamado a tomada do poder, fossem ou não
um partido pequeno, os trabalhadores da CNT que estavam muito
à esquerda de seus líderes certamente os teriam
ouvido. O próprio POUM possuía por volta de 40.000
membros e um destacamento de milícia de 10.000.
Mas, se os trabalhadores de Barcelona tivessem tomado o poder,
como os líderes do POUM e CNT admitem que poderia ter acontecido,
estariam isolados? De maneira alguma.
Se uma república dos trabalhadores tivesse sido declarada
em Barcelona, isso teria implicado na galvanização
da classe trabalhadora francesa. Teria sido muito difícil
para o governo de Frente Popular na França manter um embargo
de armas com sua própria classe trabalhadora em alerta.
Trabalhadores e camponeses do resto da Espanha, tanto na área
republicana quanto na nacionalista, certamente teriam respondido
se os trabalhadores de Barcelona tivessem tomado medidas socialistas
para colocar as fábricas nas mãos dos trabalhadores
e a terra nas mãos dos camponeses. O exército de
Franco teria se despedaçado, especialmente se uma república
dos trabalhadores tivesse declarado seu apoio à auto-determinação
colonial. Tal slogan teria impactado não somente nas colônias
espanholas, mas também as britânicas e francesas.
Não se luta em uma guerra civil apenas por meios militares.
É preciso ter uma estratégia política. A
história dá muitos exemplos disso. A abolição
da escravidão por Lincoln foi descrita por um político
europeu como "a mais insana e infame revolução
da história". Ainda assim ela se provou um meio de
ganhar apoio por trás das linhas inimigas entre os escravos
e também internacionalmente. Os trabalhadores do algodão
nas cidades fabris se mobilizaram aos milhares em apoio à
abolição da escravidão e à vitória
do Norte. O governo britânico não ousou intervir
em prol dos donos de escravos sulistas. Em Barcelona, o POUM não
possuía uma estratégia revolucionária tão
ousada como essa.
Quando o cesar-fogo foi finalmente acordado, provou ser o prelúdio
do expurgo sangrento de todos os elementos de oposição
em Barcelona e outros lugares da Espanha. O POUM foi acusado de
organizar um golpe em coalizão com as polícias secretas
alemã, italiana e franquista. Sua imprensa foi banida,
Nin foi preso e a organização foi posta na ilegalidade.
Os líderes do POUM foram levados a uma prisão stalinista
em Madri uma ex-igreja em Calle Atocha.
O próprio Nin foi separado dos outros e levado à
Alcalá de Henares, onde o interrogaram por três dias.
Quando se recusou a confessar ser um agente fascista, foi torturado
até a morte. Seu corpo foi enterrado nos arredores da cidade.
A GPU, então, ordenou aos voluntários da Brigada
Internacional Alemã que tomassem de assalto a prisão
onde Nin havia sido mantido. Para dar a impressão de que
a Gestapo veio resgatá-lo, deixaram para trás notas
do banco nacionalista, distintivos falangistas e documentos falsos.
Depois da morte de Nin, Trotsky o descreveu como um "velho
e incorruptível revolucionário." Os membros
do POUM, Trotsky disse, "lutaram heroicamente em todas as
frentes contra os fascistas da Espanha". Mas ao entrar na
Frente Popular, participar do governo de Frente Popular na Catalunha
e recusar a chamada pela tomada do poder em maio de 1937, Nin
cometeu uma traição que se provou fatal não
apenas para si mesmo, como também para a revolução
espanhola.
Nas semanas seguintes, a polícia secreta stalinista
juntou todos os elementos de oposição na Catalunha,
os aprisionou e torturou, execuntando muitos milhares. Um Tribunal
Especial para Espionagem e Alta Traição foi estabelecido
para julgar os militantes do POUM e os anarquistas acusados por
colaborar com a insurreição. Quase todos os enviados
a esse tribunal foram considerados culpados. Outros desapareceram,
como Nin, nas prisões secretas da GPU conhecidas
como Preventoriums. Cerca de 20.000 prisioneiros foram enviados
a campos de trabalho forçado. Sobreviventes relataram privação
de sono, negação de alimento, falsas execuções,
isolamento, confinamento em espaços minúsculos,
mutilação, negação de atenção
médica, total escuridão, luzes ofuscantes, quase-afogamento
e, é claro, espancamentos.
A repressão havia começado muito antes dos Dias
de Maio. Alexander Orlov, o cabeça da GPU na Espanha, enviou
um número de agentes a Barcelona com ordens para confraternizar
com o POUM e identificar alvos para sequestro e assassinato. Erwin
Wolf, o ex-secretário de Trotsky, foi assassinado na Espanha.
Um voluntário inglês, David Crook, contou depois
como foi recrutado da Brigada Internacional para prestar serviços
especiais. O relato que faz de sua vida nos dá um bom entendimento
de como as operações na Espanha se encaixavam em
uma campanha contra-revolucionária mais ampla que possuía
sua face mais pública nos Processos de Moscou.
Crook foi levado à escola de treinamento de oficiais
em Albacete, onde Ramon Mercader, que depois assassinaria Trotsky
no México, o ensinou a língua espanhola. De lá,
foi a Barcelona para espionar o POUM e seus apoiadores britânicos
do Partido Trabalhista Independente (ILP Independent Labour
Party). Crook caiu nas graças de Eileen Blair, esposa de
George Orwell, o que lhe deu a oportunidade de roubar documentos
dos escritórios do ILP. Quando os líderes do POUM
foram presos, ele foi posto conjuntamente na cela da prisão,
para coletar informações. Também teve um
papel importante no sequestro do trotskista austríaco Kurt
Landau.
Da Espanha, Crook foi a Xangai, onde espionou suspeitos de
trotskismo. Fica claro, a partir do relato de Crook, que os Dias
de Maio não foram um evento único e isolado, mas
parte de uma campanha muito mais ampla e previamente preparada
para ter ramificações globais. A Espanha se tornou
um campo de treinamento para os espiões, provocadores e
assassinos stalinistas. Quando Ignace Reiss o agente do
serviço secreto soviético que rompeu com Stalin
e se aproximou de Trotsky foi assassinado na Suiça,
seus assassinos esqueceram no país uma peça de roupa
feita na espanha. Eric Hobsbawn descreve sua experiência
de juventude na Frente Popular em Paris em termos esplendorosos,
mas, na realidade, a Frente Popular era inseparável da
repressão dos Processos de Moscou e da Espanha.
Alguns historiadores afirmam que nunca houve mais que 20 ou
40 operativos da GPU em toda a Espanha. Esse número parece
estar em discrepância com as evidências e, em todo
caso, ignora os stalinistas que, não sendo membros da polícia
secreta, estavam de qualquer modo engajados em exterminar os oposicionistas.
O Partido Comunista da Espanha era pequeno em 1936, mas um ano
depois havia se tornado o mais poderoso partido da Frente Popular.
Havia crescido em parte pela absorção do movimento
de juventude do Partido Socialista, mas também pelo recrutamento
de camponeses que estavam insatisfeitos com a coletivização
e mesmo trabalhadores das áreas rurais, além de
funcionários civis, magistrados e oficiais do exército
nas cidades. Nessas camadas sociais, a GPU encontrou o material
humano para seu trabalho: entre eles estavam gangsters, ladrões
e ex-fascistas e todos encontraram um lar natural no aparato
de terror stalinista.
E a atividade repressora dos stalinistas não estava
confinada à Catalunha. José Cazorla e Santiago Carillo,
ambos membros do comitê central do PCE (Partido Comunista
Espanhol), ilegalmente aprisionaram trabalhadores que haviam sido
inocentados pelos tribunais populares em Madri e os enviaram à
frente de batalha para servirem como "fortificações"
humanas. O jornal da CNT Solidaridad Obrera identificou uma rede
de prisões privadas "operando sob uma liderança
unificada e um plano pré-concebido em escopo nacional".
Enquanto as derrotas militares se acumulavam, um ar de pânico
começou a permear o comando militar stalinista após
o esmagamento da classe trabalhadora catalã. Relatórios
da inteligência soviética falam de uma "bactéria
contaminante" entre as Brigadas Internacionais. Um relatório
em tom quase histérico descreve como toda uma companhia
foi desarmada e aprisionada e seus oficiais foram mortos. Uma
"organização trotskista de espionagem e terrorismo"
de suposta larga escala foi exposta na décima-quarta brigada
e um homem morreu sob interrogatório. André Marty,
o líder do Comintern francês responsável pela
organização das Brigadas Internacionais, admitiu
ter matado 500 membros desses brigadas. É um décimo
do total de mortos entre os das Brigadas Internacionais.
Todos esses crimes foram executados sob os auspícios
dos liberais e "democráticos" políticos
Socialistas e Republicanos da Frente Popular. Seus defensores
afirmam que eles eram ignorantes sobre as ações
da GPU, o que é facilmente refutado pelos registros históricos.
Um documento interessante que grava a conversa entre um conselheiro
soviético e o Presidente Juan Negrin em dezembro de 1938
lança um pouco de luz sobre a atitude do governo da Frente
Popular em relação à democracia.
Nessa conversa, Negrin parece ter mapeado uma estratégia
política de pós-guerra que envolvia um Estado unipartidário
"Pode ser chamado de frente nacional ou frente espanhola
ou união", disse Negrin. O regime que vislumbrou estaria
sob a liderança de uma figura militar. Para Negrin e os
outros líderes da República, a democracia podia
ser desejável, mas a verdadeira questão era a ordem
a supressão da revolta vinda de baixo. Para isso, uma aliança
com o Kremlin era essencial e eles estavam dispostos a dar ao
aparato repressivo que havia sido criado na luta contra o trotskismo
o controle sobre a Espanha se essa fosse a única forma
de defender a propriedade privada. A GPU agia meramente como o
braço mais resoluto da Frente Popular.
Ao final de 1937, Trotsky escreveu em "Lições
da Espanha: Um Último Aviso": "Quando os trabalhadores
e camponeses entram no caminho da revolução
quando tomam as fábricas e fazendas, expulsam os velhos
proprietários, conquistam o poder nas províncias
então a contra-revolução burguesa
tanto faz se democrática, stalinista ou fascista
não tem outro modo de pôr em xeque esse movimento
senão a coerção sangrenta, suplementada por
mentiras e artifícios. A superioridade da clique stalinista
nessa via consistiu na sua habilidade em aplicar instantaneamente
medidas que estavam além da capacidade de Azaña,
Companys, Negrin e seus aliados de esquerda."
Na Espanha, escreveu Trotsky, dois programas irreconciliáveis
se confrontavam. Havia o programa que consistia em "salvar
do proletariado, a qualquer custo, a propriedade privada, e salvar
de Franco, na medida do possível, a democracia; e, do outro
lado, o programa de abolição da propriedade privada
pela conquista do poder pelo proletariado. O primeiro programa
expressou os interesses do capitalismo através da aristocracia
trabalhista, da cúpula dos círculos pequeno-burgueses
e, especialmente, da burocracia soviética. O segundo programa
traduziu para a linguagem do marxismo as tendências do movimento
revolucionário de massas, não plenamente consciente,
mas poderoso. Com pesar para a revolução, entre
o punhado de bolcheviques e o proletariado estava a parede contra-revolucionária
da Frente Popular."
O heroísmo dos trabalhadores, camponeses da Espanha
e dos voluntários internacionais que foram para lá
é demasiadamente usado como meio para encobrir o verdadeiro
caráter das políticas da Frente Popular. Qualquer
um que critique a República e seus apoiadores é
acusado de sujar a reputação desses lutadores abnegados.
Na realidade, a reputação dessas figuras heróicas
é melhor servida por um exame objetivo da história
e, particularmente, da Frente Popular.
Nesta palestra, tentei mostrar que uma revolução
proletária vitoriosa era possível na Espanha e que
a razão de sua derrota não foi a imaturidade do
proletariado espanhol, o atraso da economia ou o desfavorecimento
das condições internacionais, motivos tão
frequentemente apontados, mas a existência da Frente Popular.
As massas da Espanha permaneceram na teia da Frente Popular até
o momento em que já era tarde demais, pois nenhuma direção
genuinamente revolucionária foi construída.
O partido que estava em melhor posição para levar
adiante a tarefa de construir uma direção revolucionária
era o POUM, mas ele se provou o maior obstáculo a isso.
Se houvesse adotado uma política intransigentemente revolucionária,
o POUM teria se encontrado na liderança da classe trabalhadora
em Maio, senão antes. Uma enorme responsabilidade pela
derrota na Espanha recai sobre o POUM e suas políticas
centristas. As massas, como Trotsky disse uma vez em seus últimos
escritos, buscaram seu caminho na direção correta,
mas descobriram ser impossível construir uma direção
revolucionária no calor da revolução. Se
a revolução espanhola tivesse sido vitoriosa, a
história do século vinte teria sido imensuravelmente
diferente.