Abaixo segue a primeira parte de palestra realizada na escola
de verão do Socialist Equality Party (SEP Partido
da Igualdade Socialista, dos EUA) em Ann Arbor, Michigan, em agosto
de 2007.
Em 2006, o World Socialist Web Site (wsws.org) foi convidado
para realizar uma palestra numa grande conferência em Madri,
organizada em comemoração ao aniversário
de 70 anos da Guerra Civil Espanhola. O próprio convite
evidenciava como o WSWS havia se estabelecido como a voz legítima
do trotskismo e como a referência a partir da qual seria
possível obter uma perspectiva claramente trotskista sobre
a Guerra Civil Espanhola. Também indicava o estado extremamente
tenso das relações de classe na Espanha e a emergência
de uma fome genuína por conhecimento histórico sobre
esse período importante do Séc. XX.
Pouco depois da conferência, bispos espanhóis
emitiram uma declaração condenando o governo do
Partido Socialista por reabrir as "velhas feridas da Guerra
Civil". O governo, por sua vez, implementou a "Lei da
Memória Histórica", na tentativa de controlar
e conter a pesquisa de informações sobre os crimes
do regime Franco. Mas, ainda assim, enraiveceu a direita.
A conferência teve bom comparecimento e, além
de seminários acadêmicos, sessões públicas
ocorreram por toda noite, enchendo um grande teatro no centro
de Madri.
A exposição de abertura da conferência
foi ministrada pelo escritor e ex-ministro da cultura Jorge Semprun,
que denunciou o que chamou de "a tese de Trotsky, de que
a guerra civil teria sido ganha se a revolução não
tivesse sido traída". Segundo ele, Stalin e o Partido
Comunista Espanhol estavam corretos, apesar de não aprovar
seus métodos. Com algumas exceções, os historiadores
que falaram na conferência concordavam acriticamente com
as políticas do governo Republicano da Frente Popular e
dispensavam a idéia de que a uma revolução
estava em processo na Espanha durante a década de 1930.
O conferência que apresentei em nome do WSWS recebeu
um ataque por um dos principais historiadores da Espanha, Angel
Viñas. Viñas chegou ao ponto de afirmar que os Dias
de Maio, levante da classe trabalhadora que ocorreu em maio de
1937, foram incitados por agentes provocadores fascistas. Como
um membro da platéia disse na época, é impressionante
que alguém tente descartar a responsabilidade da burocracia
stalinista pela repressão em Barcelona, uma vez que ela
está tão bem documentada. Viñas, desde então,
tenta sustentar seu argumento com um livro onde recicla as velhas
mentiras stalinistas.
Esse não é um fenômeno puramente espanhol.
No início do ano, o historiador Eric Hobsbawn publicou
uma defesa da Frente Popular espanhola no Guardian, onde
lançou um ataque amargo contra qualquer um que tentasse
apresentar uma visão objetiva sobre a Guerra Civil Espanhola.
"A única escolha" escreveu ele, "era entre
dois lados - e a opinião liberal-democrática escolheu
majoritariamente o anti-fascismo". Os únicos que não
podem ver isto, e que também não podiam vê-lo
na época, disse ele, são aqueles que olham para
a Guerra Civil Espanhola de "um ângulo sectário,
trotskista". O que Hobsbawn defende e o que Viñas
e Semprun defendem é a Frente Popular.
A Espanha é a expressão mais genuína da
política da Frente Popular, iniciada por Stalin depois
que Hitler tomou o poder na Alemanha, em 1933. Foi imposta a todos
os partidos stalinistas no último congresso [sétimo]
do Comintern, em 1935. Significava que todos os Partidos Comunistas
renunciariam ao objetivo da revolução proletária
e, no lugar, se engajariam na colaboração inter-classes
com partidos liberais, republicanos ou social-democratas em uma
luta supostamente comum contra o fascismo, e se comprometiam com
a defesa de seus próprios estados-nação.
Como mostraram outros palestrantes, ainda que os stalinistas
já tivessem seguido políticas errôneas, que
levaram à traição e derrota sangrenta de
revoluções no passado, com a Frente Popular se tornaram
pela primeira vez uma força conscientemente anti-revolucionária,
uma vez que era impossível manter uma aliança aberta
com partidos capitalistas e, ao mesmo tempo, encorajar a revolução,
mesmo de uma maneira puramente verbal. Anteriormente, podiam ser
caracterizados como centristas burocráticos que vacilavam
e hesitavam sempre que a revolução estava em pauta,
mas, agora, eram uma tendência definitivamente contra-revolucionária.
A intervenção soviética na Espanha pode
ser melhor compreendida como uma tentativa de estrangular uma
revolução em desenvolvimento, liquidar fisicamente
seus principais dirigentes, aterrorizar amplas camadas de trabalhadores
e camponeses e impedir que seus anseios revolucionários
espontâneos adquirissem uma forma política mais consciente.
O acordo eleitoral que se tornou a Frente Popular espanhola
foi assinado em janeiro de 1936, mas sua origem é muito
anterior 1931, o ano em que começou a revolução
espanhola. Na época em que o acordo da Frente Popular foi
assinado, a Espanha passava, após muitos sobes e desces,
por uma revolução que já durava 4 anos, dado
que a monarquia foi derrubada em 1931. Pode parecer um longo período,
mas o ritmo e desenvolvimento das revoluções não
é o mesmo sempre e em todo lugar. A revolução
francesa esteve em andamento por quase quatro anos antes de alcançar
seu clímax, quando os jacobinos chegaram ao poder. No caso
da Rússia, o ritmo de desenvolvimento foi muito mais rápido,
em parte porque o Partido Bolchevique já existia na véspera
da revolução como, também, em parte por causa
da Primeira Guerra Mundial. Na Espanha não havia partido
revolucionário e não havia a guerra. O ritmo de
desenvolvimento foi correspondentemente lento.
Em 1931, uma república foi estabelecida, abolindo a
monarquia, separando igreja e estado, dissolvendo ordens religiosas,
secularizando a educação e garantindo autonomia
às nacionalidades. Essas eram medidas democráticas
comparáveis àquelas introduzidas por todas as revoluções
burguesas anteriores. Mas, aquele não era o século
XVIII mesmo as mais modestas medidas democráticas
ameaçavam a propriedade privada capitalista.
As reformas agrária e religiosa desafiavam não
apenas a riqueza da igreja e dos latifundiários, mas a
da elite financeira e empresarial com quem estavam conectados
por irredutíveis laços de classe. O programa democrático
da república afundava diante da oposição
enraizada entre essas camadas privilegiadas.
Quase tão rápido quanto chegou ao poder, a república
se mostrou incapaz de levar adiante suas medidas democráticas.
Os trabalhadores e os camponeses que haviam trazido a república
ao poder se viram cada vez mais separados do governo republicano.
Dentro de semanas foi imposta a lei marcial para reprimir as manifestações
de rua. O governo republicano liberal lutou por dois anos antes
de ser substituído por um governo de direita que reverteu
o programa de reformas e rechaçou os anseios da classe
trabalhadora e camponeses da forma mais brutal.
Mas, desde o início, a república demonstrava
ser incapaz de resolver em um sentido progressista quaisquer questões
confrontadas pela sociedade espanhola. A burguesia liberal na
Frente Popular não era mais que a sombra da burguesia.
A maior parte da burguesia, da Igreja e dos militares já
rumava ao fascismo, e foi por isso que a Frente Popular na Espanha
foi dominada de tal forma pelo stalinismo. Os republicanos e os
Socialistas eram fantasmas políticos que podiam agir apenas
graças ao apoio político que recebiam dos stalinistas.
A única classe capaz de resolver a situação
pela qual passava a sociedade espanhola era a classe trabalhadora,
que não tinha qualquer interesse velado pela propriedade
privada. Já em maio de 1931, Trotsky antecipava uma segunda
revolução, que seria uma revolução
do proletariado arrastando os camponeses pobres atrás de
si.
Por essa razão, a guinada de Stalin para a Frente Popular
deu uma sobrevida à burguesia liberal dos partidos republicanos
e social-democratas da Espanha. A Frente Popular ofereceu a estes
os meios de confinar o movimento revolucionário da classe
trabalhadora e camponeses a um quadro parlamentar para, assim,
suprimi-lo.
Embora os defensores da Frente Popular possam deplorar os métodos
dos stalinistas e tentam dizer que os líderes da república
os desconheciam, há uma clara conexão, em um sentido
lógico e histórico, entre a Frente Popular e os
crimes do stalinismo. Tanto os líderes da república
espanhola quanto os stalinistas compartilhavam o interese em suprimir
a revolução e defender a propriedade privada na
Espanha.
Stalin estava determinado a manter a paz com as democracias
ocidentais Grã-Bretanha, França e América
que, acreditava ele, defenderiam a União Soviética
contra o ataque da Alemanha nazista. Em prol dessa aliança,
preparava-se para destruir a revolução espanhola
e provar ser um aliado confiável para as potências
imperialistas. Os políticos republicanos e socialistas,
igualmente determinados a defender a propriedade privada e prevenir
a revolução, encontraram em Stalin, como disse Trotsky,
"um carrasco experiente com a autoridade de um revolucionário".
A Frente Popular espanhola não pode ser entendida em
um contexto meramente nacional. A Frente Popular na França
forneceu o modelo para todas as outras Frentes Populares. O ascenso
de Hitler ao poder causou pânico na burguesia francesa.
Edouard Herriot, o líder do Partido Radical, foi à
Moscou em 1933, onde foi muito bem recebido por Stalin.
A assinatura do pacto franco-soviético em 1934 pavimentou
o caminho para a criação da Frente Popular francesa.
Quando o ministro de relações exteriores francês,
Laval, insistiu que Stalin reforçasse esse pacto de assistência
mútua ordenando que o Partido Comunista francês
aprovasse as medidas que o governo francês havia tomado
para a defesa nacional Stalin disse: "Eu concordo".
Stalin e Laval emitiram um comunicado conjunto que declarava:
"O Sr. Stalin compreende e aprova totalmente a política
de defesa nacional implementada pela França com o objetivo
de manter sua força armada no nível requerido para
sua segurança."
Muito já foi dito sobre o 4 de agosto de 1914 ¹.
Este foi um evento análogo. Stalin se solidarizava policamente
com o governo francês e insistia que o Partido Comunista
Francês fizesse o mesmo.
Na Espanha, o ímpeto para a Frente Popular veio do republicano
de esquerda Manuel Azaña. Com o exemplo da França,
Azaña tinha motivos para acreditar que Moscou seria um
aliado internacional confiável e forneceria recursos contra
a classe trabalhadora espanhola.
Ora, para os republicanos e os socialistas, as atrações
pela Frente Popular são evidentes, mas e para o POUM [Partido
Operário da Unificação Marxista]? O POUM
foi formado em 1935 pela fusão do partido de Andrés
Nin, a "Esquerda Comunista", e o "Bloco de Trabalhadores
e Camponeses" de Joaquín Maurín. Como Trotsky
escreveu na época: "Os ex-´Esquerda Comunista´
espanhóis se tornaram um mero cortejo da burguesia de `esquerda´.
É difícil conceber uma queda mais vergonhosa".
O POUM foi o exemplo-chave de um partido esquerdista-centrista
deste período.
Depois de trocar correspondências com Nin por vários
meses, Trotsky chegou à conclusão de que "Nin,
honesto e devotado à causa, não era um marxista,
mas um centrista". O POUM foi incapaz de retirar conclusões
táticas e organizacionais corajosas das concepções
gerais que adotou. Teve um papel vital em dar à Frente
Popular uma imagem esquerdista.
Nin foi um revolucionário conhecido internacionalmente.
Sua presença, por si só, já era uma garantia
aos trabalhadores mais conscientes de que a Frente Popular era
uma aliança revolucionária. Ele esteve na conferência
de fundação da Internacional Vermelha de Associações
Trabalhistas em 1921 e se tornou seu secretário assistente.
Juntou-se ao Partido Comunista e foi eleito para o Soviet de Moscou.
Sua oposição ao stalinismo era de longa data. Foi
expulso do partido e demitido de seu trabalho pelo apoio à
Trotsky em 1928. Incapaz de retornar à Espanha por razão
de suas atividades políticas, ficou em Moscou e foi salvo
da prisão somente por sua reputação internacional.
Forçado a retornar para a Espanha em 1930, Nin foi encarcerado.
Sua reputação não tinha mácula.
Trotsky e Nin trocaram correspondências por quase três
anos após o retorno de Nin à Espanha. Seu diálogo
ocorria nos termos mais amigáveis, mas, na realidade, era
de uma polêmica constante. Já se afirmou que Trotsky
era duro demais em seu juízo sobre Nin. Mas, a característica
mais marcante das cartas que Trotsky escreveu a Nin é o
modo extremamente paciente com o qual procurou explicar sua análise
da situação espanhola e o que era necessário
que Nin fizesse.
Por volta de junho de 1936, ou seja, seis meses após
o POUM aderir à Frente Popular, Trotsky não descartou
uma reconciliação com Nin caso este estivesse preparado
para levantar o estandarte da Quarta Internacional na Espanha
de forma não-ambígua. Mesmo duas semanas após
o golpe de Franco, Trotsky disse a Victor Serge: "Se Nin
retomasse a compostura hoje e percebesse como está desacreditado
aos olhos dos trabalhadores, se chegasse às conclusões
necessárias, então nós o ajudaríamos
como um camarada".
Ao longo da correspondência, Nin expressou sua concordância
com o programa da Oposição, mas sempre se recusou
a retirar dele as conclusões necessárias. A questão
crucial, à qual Trotsky retornava sempre e sempre, era
o internacionalismo e a necessidade do partido revolucionário
trabalhar na mais próxima colaboração com
seus co-pensadores internacionais e sob a disciplina de uma organização
internacional. Em março de 1932, Trotsky escreveu uma carta
à Oposição de Esquerda na Espanha, comemorando
o fato de que haviam sido capazes de realizar sua primeira conferência.
Ele dizia:
"Outra questão para a qual eu gostaria de chamar
sua atenção diz respeito ao caráter internacional
de nosso trabalho. Oportunistas como Maurín e seus seguidores
em Madri constroem toda a sua política com base em suas
particularidades nacionais. É verdade que não conhecer
tais particularidades seria uma grande idiotice. Mas, sob elas,
nós precisamos descobrir quais são as forças
motivadoras dos desenvolvimentos internacionais e assimilar a
dependência dessas particularidades nacionais com essas
forças mundiais. A grande vantagem do marxismo, e portanto
da Oposição de Esquerda, consiste precisamente nessa
maneira internacional de resolver os problemas nacionais e as
particularidades nacionais."
"Para sua jovem organização, uma tarefa
importante é acompanhar cuidadosamente o trabalho das outras
seções da Oposição de Esquerda Internacional
e fazer seu trabalho sempre em conformidade com os interesses
do todo. Sem o critério internacional, sem ligações
internacionais regulares, sem controle sobre uma seção
nacional, a formação de uma organização
proletária revolucionária verdadeira é impossível
em nossa época."
Em outra carta do mesmo período, Trotsky faz uma observação
análoga bastante sintética. Como escreveu ele: "Não
há dúvida que você concorda que, da mesma
forma que o socialismo não pode ser construído em
um só país, uma política marxista não
pode ser almejada em um único país".
Já em 1931 Trotsky estava ciente de que existia o perigo
dos camaradas espanhóis se adaptarem a Maurín. Maurín,
alertava Trotsky, tentava disfarçar o separatismo nacional
de comunismo e adotar slogans esquerdistas para se aproximar dos
anarco-sindicalistas da CNT. Em dezembro de 1932, Trotsky criticava
Nin diretamente pelo isolamento nacional de seu grupo e sua adaptação
a Maurín. A Oposição de Esquerda Internacional
havia acabado de realizar uma conferência improvisada em
Copenhague, onde Trotsky realizou uma palestra. Outras seções
européias enviaram delegados, mas não os camaradas
espanhóis.
"Eu tomo a liberdade," escreveu Trotsky, "de
expressar minha certeza de que os principais camaradas espanhóis,
se tivessem se fechado menos em seu ambiente e mostrado maior
interesse em sua organização internacional, teriam
encontrado seu caminho para a conferência de Copenhague
sem dificuldade."
"Mas é precisamente o maior infortúnio da
Oposição Espanhola", continuou ele, "o
fato de seus dirigentes repetidamente manterem sua organização
afastada da vida interna e das lutas internas das outras seções.
Assim, a desligam de uma experiência internacional insubstituível.
Mas, na medida que a seção espanhola foi, até
o momento presente, compelida a tratar de questões internacionais
por conta de sua posição oficial, seus dirigentes,
não influenciados pela experiência das outras seções
ou pela opinião pública de sua própria organização,
se permitiram ser guiados por conexões pessoais, simpatias
e antipatias. Demasiadas vezes eles substituíram abertamente
uma análise marxista da situação por psicologismo
e sentimentalismo pequeno-burguês. Assim foi no caso da
Federação Catalã (Maurín) onde a confiança
de vários camaradas de Barcelona em 'relações
pessoais amigáveis' tomou por um longo tempo o lugar de
uma luta principista contra o nacionalismo pequeno-burguês,
colocando um freio ao desenvolvimento da Oposição
de Esquerda em seu período mais decisivo."
Delineando as tarefas da Oposição de Esquerda
na Espanha, Trotsky avisou: "Na Catalunha, onde o proletariado
oferece uma base natural para o rápido crescimento da influência
bolchevique-leninista, os camaradas dirigentes perderam tempo
de uma forma imperdoável. Em vez de se apresentarem abertamente
sob sua própria bandeira, ainda que apenas com pequenos
núcleos, brincaram de esconde-esconde com seus princípios
durante os meses determinantes da revolução. Primeiro,
engajaram-se na diplomacia com o pequeno-burguês nacionalista
e fraseologista provinciano Maurín para, depois, segui-lo
por completo".
Esse longo período de adaptação ao ambiente
político nacional e a resistência de Nin às
tentativas de Trotsky de desenvolver uma orientação
internacional entre os oposicionistas de esquerda em 1935, resultaram
na fusão com o Bloco de Trabalhadores e Camponeses de Maurín
e, dentro de um ano, na sua adesão à Frente Popular.
A Frente Popular fazia promessas vagas sobre crédito
barato para os camponeses e preços agrícolas mais
altos, nenhuma das quais poderia ser cumprida mesmo que o governo
estivesse preparado para resistir às pressões dos
latifundiários e bancos; ela também rejeitava explicitamente
a nacionalização da terra a única
maneira de resolver a questão agrária. Além
disso, rejeitava a nacionalização dos bancos.
O sistema bancário deveria ser controlado dizia
o programa da Frente Popular mas não pelos trabalhadores.
O controle deveria ser governamental, ou seja, os representantes
políticos do capital financeiro deveriam exercer controle
sobre seus próprios bancos.
A política externa da Frente Popular deveria ser conduzida
em acordo com os preceitos da Liga das Nações.
Sob todos os aspectos, era um programa que tinha como objetivo
defender os interesses do capital e era idêntico ao programa
da Frente Popular francesa.
Quando a Frente Popular francesa foi eleita em maio de 1936,
sua orientação capitalista foi imediatamente manifestada
pela maneira como o Partido Comunista pôs fim à greve
geral, que tinha implicações revolucionárias.
Trotsky saudou a greve como o começo de uma revolução
na França. O jornal conservador francês Le Temps
concordou com ele e alarmou que as greves em massa e as ocupações
representavam "manobras práticas da revolução".
O Partido Comunista francês pôs fim às greves,
dizendo aos trabalhadores que haviam obtido uma vitória
decisiva quando, na verdade, haviam conquistado pequenas
migalhas. O comportamento dos stalinistas na França era
um aviso prévio sobre o papel que teriam na Espanha. Além
disso, quando a classe trabalhadora espanhola se voltou à
francesa para receber ajuda, não recebeu nada. Quando traíram
o movimento revolucionário dos trabalhadores franceses
em 1936, os stalinistas privaram os trabalhadores e camponeses
espanhóis de um aliado em um país revolucionário
vizinho.
A eleição do governo da Frente Popular na Espanha
precedeu um levante revolucionário renovado. Nessa época,
o POUM poderia assumir a direção do movimento revolucionário
no país, caso não tivesse deixado uma excepcional
situação revolucionária escorregar por entre
as mãos, conduzindo-se por um caminho político criminoso
ao juntar-se à Frente Popular.
Trotsky avisou que o governo usaria as forças do estado
para reprimir os trabalhadores e camponeses. Escreveu: "As
organizações trabalhadoras, porém, permanecem
completamente imobilizadas nas teias da Frente Popular. As convulsões
das massas revolucionárias (sem um programa, sem uma direção
digna de confiança) ameaçam assim abrir os portões
para a ditadura contra-revolucionária".
Como explicou Trotsky: "A questão principal no
momento é a Frente Popular. Os centristas de esquerda procuram
apresentar essa questão como uma manobra tática
ou mesmo técnica, de modo que possam vender suas mercadorias
sob a sombra da Frente Popular. Na realidade, a Frente Popular
é a principal questão da estratégia proletária
desta época. Também oferece o melhor critério
para a diferença entre bolchevismo e menchevismo, pois
é frequentemente esquecido que o maior exemplo histórico
de Frente Popular é a revolução de fevereiro
de 1917. Em fevereiro-outubro, os mencheviques e os socialistas-revolucionários,
que estão num paralelo muito próximo aos ´Comunistas´
[stalinistas] e aos social-democratas, estiveram em uma aliança
estreita e numa coalização permanente com o partido
burguês dos KDTs, com o qual formaram uma série de
governos de coalizão. Sob o signo dessa Frente Popular
se prostrava toda a massa do povo, incluindo os conselhos de trabalhadores,
camponeses e soldados. É certo que os bolcheviques participavam
dos conselhos. Mas eles não faziam a mínima concessão
à Frente Popular, para destruir a aliança com os
KDTs e criar um genuíno governo dos trabalhadores e camponeses".
Isso foi escrito em 16 de julho de 1936 e, no dia seguinte,
Franco deu seu golpe militar. O governo de Frente Popular que
o POUM ajudara a colocar no poder havia deixado intactos o exército
e a corporação de oficiais. Tal situação
não foi acidental, apenas refletiu o fato de que a classe
dominante do país, quando se via forçada a fazer
uma aliança com organizações de esquerda
dos trabalhadores, precisava mais do que nunca dos militares para
proteger a propriedade privada. Isso era parte da perspectiva
do frentismo popular desde o início, quando Stalin havia
assegurado a Laval que o Partido Comunista francês aceitaria
todas as medidas que ele considerasse necessárias para
defender a nação. Stalin esperava contar com o exército
francês para defender a União Soviética contra
a Alemanha nazista e estava preparado para deixá-lo intacto
independentemente do custo para a classe trabalhadora francesa.
Na Espanha, o POUM havia participado da Frente Popular que havia,
segundo Trotsky, "mantido a casta militar com o dinheiro
do povo, provendo autoridade, poder, armas e comando sobre jovens
trabalhadores e camponeses, facilitando, assim, as preparações
para um ataque esmagador contra os trabalhadores e camponeses".
Continua.
Notas:
[1] - Data em que o Partido Social-Democrata Alemão votou
pelos créditos da Primeira Guerra Mundial, enveredando
de uma vez por todas no chauvinismo e traindo definitivamente
a classe operária. Para Lenin, o fato evidenciou a falência
da Segunda Internacional.