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A Guerra Civil Espanhola e a Frente Popular

Parte 1

Por Ann Talbot
18 de fevereiro de 2009

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Abaixo segue a primeira parte de palestra realizada na escola de verão do Socialist Equality Party (SEP — Partido da Igualdade Socialista, dos EUA) em Ann Arbor, Michigan, em agosto de 2007.

Em 2006, o World Socialist Web Site (wsws.org) foi convidado para realizar uma palestra numa grande conferência em Madri, organizada em comemoração ao aniversário de 70 anos da Guerra Civil Espanhola. O próprio convite evidenciava como o WSWS havia se estabelecido como a voz legítima do trotskismo e como a referência a partir da qual seria possível obter uma perspectiva claramente trotskista sobre a Guerra Civil Espanhola. Também indicava o estado extremamente tenso das relações de classe na Espanha e a emergência de uma fome genuína por conhecimento histórico sobre esse período importante do Séc. XX.

Pouco depois da conferência, bispos espanhóis emitiram uma declaração condenando o governo do Partido Socialista por reabrir as "velhas feridas da Guerra Civil". O governo, por sua vez, implementou a "Lei da Memória Histórica", na tentativa de controlar e conter a pesquisa de informações sobre os crimes do regime Franco. Mas, ainda assim, enraiveceu a direita.

A conferência teve bom comparecimento e, além de seminários acadêmicos, sessões públicas ocorreram por toda noite, enchendo um grande teatro no centro de Madri.

A exposição de abertura da conferência foi ministrada pelo escritor e ex-ministro da cultura Jorge Semprun, que denunciou o que chamou de "a tese de Trotsky, de que a guerra civil teria sido ganha se a revolução não tivesse sido traída". Segundo ele, Stalin e o Partido Comunista Espanhol estavam corretos, apesar de não aprovar seus métodos. Com algumas exceções, os historiadores que falaram na conferência concordavam acriticamente com as políticas do governo Republicano da Frente Popular e dispensavam a idéia de que a uma revolução estava em processo na Espanha durante a década de 1930.

O conferência que apresentei em nome do WSWS recebeu um ataque por um dos principais historiadores da Espanha, Angel Viñas. Viñas chegou ao ponto de afirmar que os Dias de Maio, levante da classe trabalhadora que ocorreu em maio de 1937, foram incitados por agentes provocadores fascistas. Como um membro da platéia disse na época, é impressionante que alguém tente descartar a responsabilidade da burocracia stalinista pela repressão em Barcelona, uma vez que ela está tão bem documentada. Viñas, desde então, tenta sustentar seu argumento com um livro onde recicla as velhas mentiras stalinistas.

Esse não é um fenômeno puramente espanhol. No início do ano, o historiador Eric Hobsbawn publicou uma defesa da Frente Popular espanhola no Guardian, onde lançou um ataque amargo contra qualquer um que tentasse apresentar uma visão objetiva sobre a Guerra Civil Espanhola. "A única escolha" escreveu ele, "era entre dois lados - e a opinião liberal-democrática escolheu majoritariamente o anti-fascismo". Os únicos que não podem ver isto, e que também não podiam vê-lo na época, disse ele, são aqueles que olham para a Guerra Civil Espanhola de "um ângulo sectário, trotskista". O que Hobsbawn defende e o que Viñas e Semprun defendem é a Frente Popular.

A Espanha é a expressão mais genuína da política da Frente Popular, iniciada por Stalin depois que Hitler tomou o poder na Alemanha, em 1933. Foi imposta a todos os partidos stalinistas no último congresso [sétimo] do Comintern, em 1935. Significava que todos os Partidos Comunistas renunciariam ao objetivo da revolução proletária e, no lugar, se engajariam na colaboração inter-classes com partidos liberais, republicanos ou social-democratas em uma luta supostamente comum contra o fascismo, e se comprometiam com a defesa de seus próprios estados-nação.

Como mostraram outros palestrantes, ainda que os stalinistas já tivessem seguido políticas errôneas, que levaram à traição e derrota sangrenta de revoluções no passado, com a Frente Popular se tornaram pela primeira vez uma força conscientemente anti-revolucionária, uma vez que era impossível manter uma aliança aberta com partidos capitalistas e, ao mesmo tempo, encorajar a revolução, mesmo de uma maneira puramente verbal. Anteriormente, podiam ser caracterizados como centristas burocráticos que vacilavam e hesitavam sempre que a revolução estava em pauta, mas, agora, eram uma tendência definitivamente contra-revolucionária.

A intervenção soviética na Espanha pode ser melhor compreendida como uma tentativa de estrangular uma revolução em desenvolvimento, liquidar fisicamente seus principais dirigentes, aterrorizar amplas camadas de trabalhadores e camponeses e impedir que seus anseios revolucionários espontâneos adquirissem uma forma política mais consciente.

O acordo eleitoral que se tornou a Frente Popular espanhola foi assinado em janeiro de 1936, mas sua origem é muito anterior — 1931, o ano em que começou a revolução espanhola. Na época em que o acordo da Frente Popular foi assinado, a Espanha passava, após muitos sobes e desces, por uma revolução que já durava 4 anos, dado que a monarquia foi derrubada em 1931. Pode parecer um longo período, mas o ritmo e desenvolvimento das revoluções não é o mesmo sempre e em todo lugar. A revolução francesa esteve em andamento por quase quatro anos antes de alcançar seu clímax, quando os jacobinos chegaram ao poder. No caso da Rússia, o ritmo de desenvolvimento foi muito mais rápido, em parte porque o Partido Bolchevique já existia na véspera da revolução como, também, em parte por causa da Primeira Guerra Mundial. Na Espanha não havia partido revolucionário e não havia a guerra. O ritmo de desenvolvimento foi correspondentemente lento.

Em 1931, uma república foi estabelecida, abolindo a monarquia, separando igreja e estado, dissolvendo ordens religiosas, secularizando a educação e garantindo autonomia às nacionalidades. Essas eram medidas democráticas comparáveis àquelas introduzidas por todas as revoluções burguesas anteriores. Mas, aquele não era o século XVIII — mesmo as mais modestas medidas democráticas ameaçavam a propriedade privada capitalista.

As reformas agrária e religiosa desafiavam não apenas a riqueza da igreja e dos latifundiários, mas a da elite financeira e empresarial com quem estavam conectados por irredutíveis laços de classe. O programa democrático da república afundava diante da oposição enraizada entre essas camadas privilegiadas.

Quase tão rápido quanto chegou ao poder, a república se mostrou incapaz de levar adiante suas medidas democráticas. Os trabalhadores e os camponeses que haviam trazido a república ao poder se viram cada vez mais separados do governo republicano. Dentro de semanas foi imposta a lei marcial para reprimir as manifestações de rua. O governo republicano liberal lutou por dois anos antes de ser substituído por um governo de direita que reverteu o programa de reformas e rechaçou os anseios da classe trabalhadora e camponeses da forma mais brutal.

Mas, desde o início, a república demonstrava ser incapaz de resolver em um sentido progressista quaisquer questões confrontadas pela sociedade espanhola. A burguesia liberal na Frente Popular não era mais que a sombra da burguesia. A maior parte da burguesia, da Igreja e dos militares já rumava ao fascismo, e foi por isso que a Frente Popular na Espanha foi dominada de tal forma pelo stalinismo. Os republicanos e os Socialistas eram fantasmas políticos que podiam agir apenas graças ao apoio político que recebiam dos stalinistas.

A única classe capaz de resolver a situação pela qual passava a sociedade espanhola era a classe trabalhadora, que não tinha qualquer interesse velado pela propriedade privada. Já em maio de 1931, Trotsky antecipava uma segunda revolução, que seria uma revolução do proletariado arrastando os camponeses pobres atrás de si.

Por essa razão, a guinada de Stalin para a Frente Popular deu uma sobrevida à burguesia liberal dos partidos republicanos e social-democratas da Espanha. A Frente Popular ofereceu a estes os meios de confinar o movimento revolucionário da classe trabalhadora e camponeses a um quadro parlamentar para, assim, suprimi-lo.

Embora os defensores da Frente Popular possam deplorar os métodos dos stalinistas e tentam dizer que os líderes da república os desconheciam, há uma clara conexão, em um sentido lógico e histórico, entre a Frente Popular e os crimes do stalinismo. Tanto os líderes da república espanhola quanto os stalinistas compartilhavam o interese em suprimir a revolução e defender a propriedade privada na Espanha.

Stalin estava determinado a manter a paz com as democracias ocidentais — Grã-Bretanha, França e América — que, acreditava ele, defenderiam a União Soviética contra o ataque da Alemanha nazista. Em prol dessa aliança, preparava-se para destruir a revolução espanhola e provar ser um aliado confiável para as potências imperialistas. Os políticos republicanos e socialistas, igualmente determinados a defender a propriedade privada e prevenir a revolução, encontraram em Stalin, como disse Trotsky, "um carrasco experiente com a autoridade de um revolucionário".

A Frente Popular espanhola não pode ser entendida em um contexto meramente nacional. A Frente Popular na França forneceu o modelo para todas as outras Frentes Populares. O ascenso de Hitler ao poder causou pânico na burguesia francesa. Edouard Herriot, o líder do Partido Radical, foi à Moscou em 1933, onde foi muito bem recebido por Stalin.

A assinatura do pacto franco-soviético em 1934 pavimentou o caminho para a criação da Frente Popular francesa. Quando o ministro de relações exteriores francês, Laval, insistiu que Stalin reforçasse esse pacto de assistência mútua — ordenando que o Partido Comunista francês aprovasse as medidas que o governo francês havia tomado para a defesa nacional — Stalin disse: "Eu concordo". Stalin e Laval emitiram um comunicado conjunto que declarava: "O Sr. Stalin compreende e aprova totalmente a política de defesa nacional implementada pela França com o objetivo de manter sua força armada no nível requerido para sua segurança."

Muito já foi dito sobre o 4 de agosto de 1914 ¹. Este foi um evento análogo. Stalin se solidarizava policamente com o governo francês e insistia que o Partido Comunista Francês fizesse o mesmo.

Na Espanha, o ímpeto para a Frente Popular veio do republicano de esquerda Manuel Azaña. Com o exemplo da França, Azaña tinha motivos para acreditar que Moscou seria um aliado internacional confiável e forneceria recursos contra a classe trabalhadora espanhola.

Ora, para os republicanos e os socialistas, as atrações pela Frente Popular são evidentes, mas e para o POUM [Partido Operário da Unificação Marxista]? O POUM foi formado em 1935 pela fusão do partido de Andrés Nin, a "Esquerda Comunista", e o "Bloco de Trabalhadores e Camponeses" de Joaquín Maurín. Como Trotsky escreveu na época: "Os ex-´Esquerda Comunista´ espanhóis se tornaram um mero cortejo da burguesia de `esquerda´. É difícil conceber uma queda mais vergonhosa". O POUM foi o exemplo-chave de um partido esquerdista-centrista deste período.

Depois de trocar correspondências com Nin por vários meses, Trotsky chegou à conclusão de que "Nin, honesto e devotado à causa, não era um marxista, mas um centrista". O POUM foi incapaz de retirar conclusões táticas e organizacionais corajosas das concepções gerais que adotou. Teve um papel vital em dar à Frente Popular uma imagem esquerdista.

Nin foi um revolucionário conhecido internacionalmente. Sua presença, por si só, já era uma garantia aos trabalhadores mais conscientes de que a Frente Popular era uma aliança revolucionária. Ele esteve na conferência de fundação da Internacional Vermelha de Associações Trabalhistas em 1921 e se tornou seu secretário assistente. Juntou-se ao Partido Comunista e foi eleito para o Soviet de Moscou. Sua oposição ao stalinismo era de longa data. Foi expulso do partido e demitido de seu trabalho pelo apoio à Trotsky em 1928. Incapaz de retornar à Espanha por razão de suas atividades políticas, ficou em Moscou e foi salvo da prisão somente por sua reputação internacional. Forçado a retornar para a Espanha em 1930, Nin foi encarcerado. Sua reputação não tinha mácula.

Trotsky e Nin trocaram correspondências por quase três anos após o retorno de Nin à Espanha. Seu diálogo ocorria nos termos mais amigáveis, mas, na realidade, era de uma polêmica constante. Já se afirmou que Trotsky era duro demais em seu juízo sobre Nin. Mas, a característica mais marcante das cartas que Trotsky escreveu a Nin é o modo extremamente paciente com o qual procurou explicar sua análise da situação espanhola e o que era necessário que Nin fizesse.

Por volta de junho de 1936, ou seja, seis meses após o POUM aderir à Frente Popular, Trotsky não descartou uma reconciliação com Nin caso este estivesse preparado para levantar o estandarte da Quarta Internacional na Espanha de forma não-ambígua. Mesmo duas semanas após o golpe de Franco, Trotsky disse a Victor Serge: "Se Nin retomasse a compostura hoje e percebesse como está desacreditado aos olhos dos trabalhadores, se chegasse às conclusões necessárias, então nós o ajudaríamos como um camarada".

Ao longo da correspondência, Nin expressou sua concordância com o programa da Oposição, mas sempre se recusou a retirar dele as conclusões necessárias. A questão crucial, à qual Trotsky retornava sempre e sempre, era o internacionalismo e a necessidade do partido revolucionário trabalhar na mais próxima colaboração com seus co-pensadores internacionais e sob a disciplina de uma organização internacional. Em março de 1932, Trotsky escreveu uma carta à Oposição de Esquerda na Espanha, comemorando o fato de que haviam sido capazes de realizar sua primeira conferência. Ele dizia:

"Outra questão para a qual eu gostaria de chamar sua atenção diz respeito ao caráter internacional de nosso trabalho. Oportunistas como Maurín e seus seguidores em Madri constroem toda a sua política com base em suas particularidades nacionais. É verdade que não conhecer tais particularidades seria uma grande idiotice. Mas, sob elas, nós precisamos descobrir quais são as forças motivadoras dos desenvolvimentos internacionais e assimilar a dependência dessas particularidades nacionais com essas forças mundiais. A grande vantagem do marxismo, e portanto da Oposição de Esquerda, consiste precisamente nessa maneira internacional de resolver os problemas nacionais e as particularidades nacionais."

"Para sua jovem organização, uma tarefa importante é acompanhar cuidadosamente o trabalho das outras seções da Oposição de Esquerda Internacional e fazer seu trabalho sempre em conformidade com os interesses do todo. Sem o critério internacional, sem ligações internacionais regulares, sem controle sobre uma seção nacional, a formação de uma organização proletária revolucionária verdadeira é impossível em nossa época."

Em outra carta do mesmo período, Trotsky faz uma observação análoga bastante sintética. Como escreveu ele: "Não há dúvida que você concorda que, da mesma forma que o socialismo não pode ser construído em um só país, uma política marxista não pode ser almejada em um único país".

Já em 1931 Trotsky estava ciente de que existia o perigo dos camaradas espanhóis se adaptarem a Maurín. Maurín, alertava Trotsky, tentava disfarçar o separatismo nacional de comunismo e adotar slogans esquerdistas para se aproximar dos anarco-sindicalistas da CNT. Em dezembro de 1932, Trotsky criticava Nin diretamente pelo isolamento nacional de seu grupo e sua adaptação a Maurín. A Oposição de Esquerda Internacional havia acabado de realizar uma conferência improvisada em Copenhague, onde Trotsky realizou uma palestra. Outras seções européias enviaram delegados, mas não os camaradas espanhóis.

"Eu tomo a liberdade," escreveu Trotsky, "de expressar minha certeza de que os principais camaradas espanhóis, se tivessem se fechado menos em seu ambiente e mostrado maior interesse em sua organização internacional, teriam encontrado seu caminho para a conferência de Copenhague sem dificuldade."

"Mas é precisamente o maior infortúnio da Oposição Espanhola", continuou ele, "o fato de seus dirigentes repetidamente manterem sua organização afastada da vida interna e das lutas internas das outras seções. Assim, a desligam de uma experiência internacional insubstituível. Mas, na medida que a seção espanhola foi, até o momento presente, compelida a tratar de questões internacionais por conta de sua posição oficial, seus dirigentes, não influenciados pela experiência das outras seções ou pela opinião pública de sua própria organização, se permitiram ser guiados por conexões pessoais, simpatias e antipatias. Demasiadas vezes eles substituíram abertamente uma análise marxista da situação por psicologismo e sentimentalismo pequeno-burguês. Assim foi no caso da Federação Catalã (Maurín) onde a confiança de vários camaradas de Barcelona em 'relações pessoais amigáveis' tomou por um longo tempo o lugar de uma luta principista contra o nacionalismo pequeno-burguês, colocando um freio ao desenvolvimento da Oposição de Esquerda em seu período mais decisivo."

Delineando as tarefas da Oposição de Esquerda na Espanha, Trotsky avisou: "Na Catalunha, onde o proletariado oferece uma base natural para o rápido crescimento da influência bolchevique-leninista, os camaradas dirigentes perderam tempo de uma forma imperdoável. Em vez de se apresentarem abertamente sob sua própria bandeira, ainda que apenas com pequenos núcleos, brincaram de esconde-esconde com seus princípios durante os meses determinantes da revolução. Primeiro, engajaram-se na diplomacia com o pequeno-burguês nacionalista e fraseologista provinciano Maurín para, depois, segui-lo por completo".

Esse longo período de adaptação ao ambiente político nacional e a resistência de Nin às tentativas de Trotsky de desenvolver uma orientação internacional entre os oposicionistas de esquerda em 1935, resultaram na fusão com o Bloco de Trabalhadores e Camponeses de Maurín e, dentro de um ano, na sua adesão à Frente Popular.

A Frente Popular fazia promessas vagas sobre crédito barato para os camponeses e preços agrícolas mais altos, nenhuma das quais poderia ser cumprida mesmo que o governo estivesse preparado para resistir às pressões dos latifundiários e bancos; ela também rejeitava explicitamente a nacionalização da terra — a única maneira de resolver a questão agrária. Além disso, rejeitava a nacionalização dos bancos.

O sistema bancário deveria ser controlado — dizia o programa da Frente Popular — mas não pelos trabalhadores. O controle deveria ser governamental, ou seja, os representantes políticos do capital financeiro deveriam exercer controle sobre seus próprios bancos.

A política externa da Frente Popular deveria ser conduzida em acordo com os preceitos da Liga das Nações.

Sob todos os aspectos, era um programa que tinha como objetivo defender os interesses do capital e era idêntico ao programa da Frente Popular francesa.

Quando a Frente Popular francesa foi eleita em maio de 1936, sua orientação capitalista foi imediatamente manifestada pela maneira como o Partido Comunista pôs fim à greve geral, que tinha implicações revolucionárias. Trotsky saudou a greve como o começo de uma revolução na França. O jornal conservador francês Le Temps concordou com ele e alarmou que as greves em massa e as ocupações representavam "manobras práticas da revolução".

O Partido Comunista francês pôs fim às greves, dizendo aos trabalhadores que haviam obtido uma vitória decisiva — quando, na verdade, haviam conquistado pequenas migalhas. O comportamento dos stalinistas na França era um aviso prévio sobre o papel que teriam na Espanha. Além disso, quando a classe trabalhadora espanhola se voltou à francesa para receber ajuda, não recebeu nada. Quando traíram o movimento revolucionário dos trabalhadores franceses em 1936, os stalinistas privaram os trabalhadores e camponeses espanhóis de um aliado em um país revolucionário vizinho.

A eleição do governo da Frente Popular na Espanha precedeu um levante revolucionário renovado. Nessa época, o POUM poderia assumir a direção do movimento revolucionário no país, caso não tivesse deixado uma excepcional situação revolucionária escorregar por entre as mãos, conduzindo-se por um caminho político criminoso ao juntar-se à Frente Popular.

Trotsky avisou que o governo usaria as forças do estado para reprimir os trabalhadores e camponeses. Escreveu: "As organizações trabalhadoras, porém, permanecem completamente imobilizadas nas teias da Frente Popular. As convulsões das massas revolucionárias (sem um programa, sem uma direção digna de confiança) ameaçam assim abrir os portões para a ditadura contra-revolucionária".

Como explicou Trotsky: "A questão principal no momento é a Frente Popular. Os centristas de esquerda procuram apresentar essa questão como uma manobra tática ou mesmo técnica, de modo que possam vender suas mercadorias sob a sombra da Frente Popular. Na realidade, a Frente Popular é a principal questão da estratégia proletária desta época. Também oferece o melhor critério para a diferença entre bolchevismo e menchevismo, pois é frequentemente esquecido que o maior exemplo histórico de Frente Popular é a revolução de fevereiro de 1917. Em fevereiro-outubro, os mencheviques e os socialistas-revolucionários, que estão num paralelo muito próximo aos ´Comunistas´ [stalinistas] e aos social-democratas, estiveram em uma aliança estreita e numa coalização permanente com o partido burguês dos KDTs, com o qual formaram uma série de governos de coalizão. Sob o signo dessa Frente Popular se prostrava toda a massa do povo, incluindo os conselhos de trabalhadores, camponeses e soldados. É certo que os bolcheviques participavam dos conselhos. Mas eles não faziam a mínima concessão à Frente Popular, para destruir a aliança com os KDTs e criar um genuíno governo dos trabalhadores e camponeses".

Isso foi escrito em 16 de julho de 1936 e, no dia seguinte, Franco deu seu golpe militar. O governo de Frente Popular que o POUM ajudara a colocar no poder havia deixado intactos o exército e a corporação de oficiais. Tal situação não foi acidental, apenas refletiu o fato de que a classe dominante do país, quando se via forçada a fazer uma aliança com organizações de esquerda dos trabalhadores, precisava mais do que nunca dos militares para proteger a propriedade privada. Isso era parte da perspectiva do frentismo popular desde o início, quando Stalin havia assegurado a Laval que o Partido Comunista francês aceitaria todas as medidas que ele considerasse necessárias para defender a nação. Stalin esperava contar com o exército francês para defender a União Soviética contra a Alemanha nazista e estava preparado para deixá-lo intacto independentemente do custo para a classe trabalhadora francesa. Na Espanha, o POUM havia participado da Frente Popular que havia, segundo Trotsky, "mantido a casta militar com o dinheiro do povo, provendo autoridade, poder, armas e comando sobre jovens trabalhadores e camponeses, facilitando, assim, as preparações para um ataque esmagador contra os trabalhadores e camponeses".

Continua.

Notas:
[1] - Data em que o Partido Social-Democrata Alemão votou pelos créditos da Primeira Guerra Mundial, enveredando de uma vez por todas no chauvinismo e traindo definitivamente a classe operária. Para Lenin, o fato evidenciou a falência da Segunda Internacional.

[traduzido por movimentonn.org]