Publicado originalmente em inglês, no WSWS, em 17
de Setembro de 2008.
Seguindo as consultas de emergência entre o Federal Reserve,
o Departamento de Tesouro dos EUA e os líderes democratas
das duas casas do Congresso, o Federal Reserve anunciou, na terça-feira
à noite, o resgate da gigante dos seguros de Wall Street,
a American Internacional Group (AIG).
Segundo reportagens do New York Times e do Wall Street
Journal, com o plano de emergência o Fed fornecerá
US$85 bilhões à empresa prestes a falir. Em troca,
dominará 80% de seus ativos.
O resgate financeiro anunciado é uma reversão
da política adotada pelo governo federal no último
final de semana, quando se negou a intervir e impedir a falência
do Lehman Brothers, o quarto maior banco de investimento do país.
Segundo o Journal, os funcionários do governo acreditavam
que seria catastrófico permitir a falência
da AIG.
O jornal noticiou que o presidente do Fed, Ben Bernanke, e
o secretário do Tesouro dos EUA, Henry Paulson, concluíram
que a assistência federal seria necessária para evitar
a falência na AIG, que temiam ter repercussões desastrosas
em todo o mercado financeiro.
O resgate financeiro é mais uma demonstração
da crise sistemática pela qual passam todos os americanos
e o mundo capitalista. É sem precedentes e, em alguns aspectos,
vai além da nacionalização da Fannie Mae
e Freddie Mac, realizada cerca de uma semana atrás. Diferentemente
das duas gigantes hipotecárias, a AIG não é
uma instituição apoiada pelo governo e não
é regulada, diretamente, pelo governo federal.
A pressão pelo resgate da AIG cresceu após ter
sua classificação diminuída por três
grandes agências de rating na segunda-feira à noite,
aumentando a perspectiva de que perdesse muitos empréstimos.
Era temido que a falência da AIG, com US$1 trilhão
em ativos, desencadeasse um efeito dominó, ameaçando
falências bancárias e corporativas por todo o mundo.
A AIG é uma das maiores empresas no mercado mundial não
regulamentado (estimado em US$ 62 trilhões) que trabalha
com créditos de risco, ou seja, contratos privados onde
empresas como a AIG garantem a dívida, incluindo obrigações
hipotecárias, detida por outras empresas.
Enquanto uma companhia de seguros, a AIG empenhou-se no mesmo
parasitismo financeiro que todo o resto de Wall Street, investindo
pesado em seguros de hipotecas e escrituras derivadas da Obrigação
com Dívida Colateralizada (CDOs, na sigla em Inglês)
manchadas pela exposição ao subprime.
Agora, mais uma vez, milhões de trabalhadores comuns
serão forçados a pagar o preço por essa absurda
especulação em busca de lucros gigantescos.
A AIG foi forçada, nas últimas semanas, a adquirir
massivas quedas em seus ativos. Em agosto, a companhia anunciou
os resultados de seu segundo trimestre, que incluíam perdas
incríveis de US$25 bilhões em seus derivativos.
A intervenção do governo na AIG seguiu a falência,
durante o final de semana, de dois dos maiores bancos de investimentos
de Wall Street. A falência do Lehman Brothers e a aquisição
da Merrill Lynch pelo Bank Of America lançaram ondas de
choque nos mercados financeiros de todo o mundo, levantando o
temor do desencadeamento de falências bancárias.
Uma fuga de capitais a nível mundial expressou-se, terça-feira,
na queda de 504 pontos nas bolsas de Wall Street, a maior em um
único dia desde os ataques de 11 de setembro de 2001.
Em resposta à crise financeira que se aprofunda, o Federal
Reserve e seus respectivos na Europa e Ásia despejaram
milhares de bilhões de dólares em crédito
na economia. Entre eles, o Fed, o Banco Central Europeu, o Banco
da Inglaterra e o Banco do Japão puseram $210 bilhões
nos mercados na terça-feira, numa tentativa de prevenir
uma explosão do sistema de crédito global. Bancos
Centrais na Índia e Austrália também realizaram
grandes injeções em seus sistemas bancários.
O sinal imediato para a massiva infusão de dinheiro
vivo foi a duplicação da taxa de empréstimo
interbancário ao início da falência do Lehman
Brothers. O aumento agudo nas taxas de empréstimos a curto
prazo, que bateu a alta de 6.79% em sete anos, gerou a preocupação
de que a AIG seguiria o Lehman na falência, arrastando instituições
do mundo financeiro com milhares de bilhões de dólares
em perdas de créditos derivativos.
O aumento da taxa dos empréstimos interbancários
levou ao declínio do mercado de ações, com
os investidores desfazendo-se dos fundos financeiros. Na terça-feira,
o FTSE 100 de Londres caiu quase 5.000 pela primeira vez em sete
anos e o HBOS, o maior concessor de empréstimos hipotecários
da Inglaterra, viu suas ações caírem cerca
de 40%.
O mercado de ações de Tóquio caiu mais
de 4%, enquanto em Paris e Frankfurt os mercados caíram
mais de 2%. Na Rússia, o mercado de ações
mais importante do país interrompeu seus negócios
depois de sofrer perdas de 11.47%.
A diretoria do Federal Reserve chocou Wall Street na tarde
de terça-feira [16.09] deixando inalteradas as taxas de
juros dos EUA. Especulava-se nos mercados financeiros que o Fed
cortaria suas taxas de juros federais em mais de 75 pontos-base,
tendo em conta o aprofundamento da crise de créditos.
A declaração emitida pelo Banco Central dos EUA,
anunciando sua decisão, criou uma imagem terrível
da economia norte-americana. A tensão dos mercados
financeiros aumentaram significantemente e o mercado de trabalho
se enfraqueceu ainda mais, afirmou o banco. Condições
estreitas de crédito, diminuição progressiva
nos contratos imobiliários e alguns abrandamentos no crescimento
de exportação são como um peso para o crescimento
da economia ao longo dos próximos trimestres.
Os igualmente citados aumentos nos preços da energia
e algumas outras commodities deixaram a perspectiva de inflação
altamente incerta. Concluiu-se que os riscos
de queda no crescimento, bem como os riscos de aumento da inflação,
são bastante significativos.
A decisão de não atender as demandas do mercado
de ações foi atribuída por alguns analistas
à convicção do Fed de que, dada a profundidade
da crise bancária, baixar a taxa de juros teria um pequeno
ou nenhum efeito em termos de geração de crédito
para a economia.
Você poderia cortar a taxa de juros do Fed de 2%
para 1.5%. Não gerará mais nenhum empréstimo.
O Sistema bancário não tem capital base para emprestar,
disse George Feiger, chefe executivo do Contango Capital Advisors
em Berkley, Califórnia, à agencia de notícia
Reuters.
O anúncio da decisão da Fed provocou vaias sustentadas
da New York Stock Exchange (NYSE). As ações reiniciaram
sua queda antes de saltarem novamente ao fim da tarde. O índice
Dow Jones Industrial Average conseguiu fechar em 1.3%, ou 141.5
pontos, ao fim do dia.
A maioria dos analistas, desde segunda-feira, viu o controle
do declínio dramático do mercado como uma resposta
às previsões de que o governo promoveria o resgate
da AIG.
Nervosas negociações das ações
da empresa agitaram o mercado. Num dado momento do dia, as ações
da AIG perderam 74%, caindo para $1.25, se comparados à
alta de US$70 de um ano atrás. Ao final do dia, fecharam
em queda de 21.2%.
Diante desses acontecimentos, houve o reconhecimento de setores
da elite dominante, bem como da grande mídia internacional,
de que o capitalismo enfrenta uma crise de dimensões históricas.
Comparações com o princípio da Grande
Depressão dos anos 30 foram freqüentes.
O Financial Times de Londres, a voz sóbria do
capital financeiro britânico, comentou em seu editorial
na terça-feira: O mundo não acabou. A economia
internacional ainda não faliu. Mas uma coisa agora está
muito clara: o sistema bancário, como nós o conhecemos,
faliu.
Denúncias do sistema financeiro americano, bem como
da ideologia de livre mercado que Washington tentou
impor ao resto do mundo durante várias décadas,
também foram preponderantes.
Na Alemanha, o Frankfurter Rundschau afirmou: Os
americanos estão expondo o mundo a um experimento perigoso.
Por razões ideológicas, eles não querem salvar
outro banco com dinheiro de contribuintes e nacionalizá-lo.
Estão aceitando o risco de que essa política poderá
custar mais dinheiro e gerar revoltas que ninguém nunca
sequer ousou imaginar.
O jornal alemão acrescentou: Se as coisas piorarem
rapidamente, os contribuintes europeus... terão de pagar
bilhões de euros para salvar bancos locais. Os retornos
ao seguro de vida e outras provisões cairão rapidamente
e a crise trará à Europa milhões de desempregados.
Obrigado América!.
Por seu lado, o Wall Street Journal, o firme defensor
do livre mercado capitalista, publicou um editorial
intitulado Sobrevivendo ao pânico. Defendia
uma massiva intervenção do governo para comprar
todos os ativos sem valor das imobiliárias de Wall Street
e garantir, assim, seus lucros conjuntamente aos milhões
de dólares vindos dos rendimentos de seus principais executivos.
O jornal alertou de maneira preocupante: A falência
dos principais bancos é certa, incluindo alguns muito grandes.
A solução? Segundo o jornal: A reestruturação
de uma nova Resolution Trust Corporation, similar àquela
criada durante a crise de poupança e empréstimos
dos anos 80, que proveria um comprador de seguros inexistente
no mercado. Em outras palavras, o artifício do Tesouro
dos EUA seria preparar o resgate dos maiores investidores de Wall
Street e dos CEOs que fizeram bilhões com a bolha especulativa
imobiliária, que agora explodiu e precipitou a maior crise
financeira desde os anos 30, afetando milhões de trabalhadores
com a perda de seus empregos e suas casas.
O jornal de Wall Street não forneceu nenhuma indicação
de como pagaria tal socorro aos ricos. Sem dúvida, a resposta
virá após as eleições de novembro,
sob a forma de um feroz ataque aos padrões de vida da classe
trabalhadora e a destruição do restante da rede
de seguro social americana, incluído, no âmbito da
saúde, o Medicare e o Medicaid.