Publicado originalmente em inglês no dia 21 de novembro
de 2008
Com temores de que uma espiral deflacionária leve toda
a economia à depressão, mais perdas multi-bilionárias
derrubaram os mercados acionários globais nos últimos
dois dias. O governo e os comentadores da mídia ainda tentam
assegurar ao público de que não haverá uma
repetição da década de 30, mas os mercados
financeiros nos dizem outra coisa.
Nas páginas da imprensa financeira já se reconhece
abertamente que todas as garantias oficiais, todas as intervenções
governamentais e pedidos por cooperação internacional,
falharam em estancar o desastre econômico. No Wall Street
Journal do último dia 20, Peter A. McKay observa que o
"governo está ficando sem munição para
estabilizar o sistema financeiro e a economia".
No mesmo sentido, John Durie escreveu para o Australian: "Finalmente
foi dito NADA FUNCIONA e, como resultado, os mercados
acionários globais estão em queda livre". Durie
observou que a administração dos EUA e o governo
chinês adiantaram, cada um, cerca de 1 trilhão de
dólares em pacotes de resgate e, mesmo assim, "o mundo
ainda está afundando".
A queda foi ainda maior quando os executivos da General Motors,
Ford e Chrysler, junto aos chefes do sindicato United Auto Workers
(UAW), não conseguiram apoio do congresso dos EUA para
o resgate das "Big Three" [como são chamadas
as 3 grandes montadoras norte-americanas], um valor sem precedentes
de 25 bilhões de dólares. Após dois dias
de discussões em Washington, o resgate foi rejeitado, ao
menos em sua forma inicial, apesar de todos os participantes,
incluindo o UAW, concordarem que nenhum pacote de resgate pode
prescindir dos cortes nos empregos e condições de
trabalho.
Além das quedas de mais de 5% na quarta-feira, as ações
norte-americanas despencaram ao final da quinta-feira, após
terem subido por um breve período com base em rumores de
um acordo na questão das montadoras. Ao final do dia, o
Dow Jones Industrial Average havia caído quase 445 pontos,
ou 5,6%, atingindo a marca de 7,552.29. O índice Standard
& Poor's 500 continuou caindo, perdendo 54,14 pontos, ou 6,7%,
e atingindo 752,44 pontos o nível mais baixo em
11 anos.
As bruscas mudanças de rumo trouxeram à tona
elementos de puro pânico e instabilidade. Na quarta-feira,
o Chicago Board Options Exchange Volatility Index (índice
de volatilidade), conhecido como o medidor do medo de Wall Street,
subiu 10,1%, para 74,45 pontos, indicando aumento da tensão.
Preocupações em torno da possibilidade de uma
recessão mais longa e profunda que a que se temia anteriormente
catalisaram a venda desesperada de ações. Outro
fator relevante foi aquele que Sheryl King, economista sênior
da Merril Lynch, chamou de "fase deflacionária corrosiva".
A deflação é vista como precursora da depressão,
já que preços em queda podem gerar uma espiral interminável
de perdas corporativas, cortes na produção, demissões
em massa e redução na demanda.
Como foi o caso nos últimos 16 meses, os EUA permaneceram
o epicentro da desordem global, com novos dados mostrando aumento
da perda de empregos, declínio na área da construção
civil, preços em queda e crises afligindo gigantes financeiros
como o Citigroup e a GE. Relatos do último encontro de
políticas do Federal Reserve predizem contração
econômica ao menos até o final de 2009. "É
uma tempestade econômica perfeita, uma combinação
de recessão comum, colapso da habitação,
crise do crédito e grande deflação de bens",
disse aos jornalistas Barry Ritholtz, presidente e diretor de
pesquisas em eqüidade da Fusion IQ.
As dimensões globais da crise foram demarcadas por dados
do ministério de finanças japonês, que anunciou
que as exportações da segunda maior economia do
mundo caíram 7,7% em outubro, em relação
ao mesmo mês do ano anterior. Foi a maior queda em quase
7 anos. Sublinhando a dependência do capitalismo japonês
e asiático quanto ao mercado dos EUA, os números
do relato colocaram ontem as ações asiáticas
num mergulho em parafuso pelo segundo dia sucessivo.
O índice de referência Nikkei, de Tóquio,
perdeu 570,18 pontos e atingiu os 7,703.04, a marca mais baixa
desde 28 de outubro o dia em que tocou o menor nível
em 26 anos, atingindo os 6,994.90 pontos. Foi a maior perda percentual
em um dia desde 22 de outubro. Até agora, o Nikkei caiu
9% esta semana e 10% este mês. Os economistas agora prevêem
outros três trimestres de contração econômica
no Japão, trazendo o período de declínio
para cinco trimestres consecutivos, maior período contínuo
de perdas jamais registrado.
Bombardeado por quedas mais profundas na economia financeira
e na mineração, o índice australiano S&P/ASX
200 fechou com queda de 4,2%, em 3,252.90, o nível mais
baixo desde o início de 2004. O Seng Index de Hong Kong
fechou com queda de 4,3%, em 12,264.34. O Kospi sul-coreano finalizou
com queda de 6,7%, em 948,69, marcando sua oitava sessão
de perdas consecutiva.
As bolsas européias também caíram conforme
os temores de uma recessão profunda acertaram títulos
de bancos e produtores de matéria-prima. O FTSEurofirst
300, medidor das melhores ações européias,
fechou em 781,07 pontos, pior nível desde abril de 2003.
As firmas mais expostas à economia, como mineradoras e
bancos, lideram as perdas; essas firmas foram abaladas quando
as ações do Citigroup apresentaram problemas e os
investidores questionaram as possibilidades de sobrevivência
do banco norte-americano.
As ações da ArcelorMittal, maior fabricante de
aço do mundo, caíram 12,4%. As da Aviva, seguradora
britânica que administrava 359 bilhões de libras
em bens, caíram 15,5%. Com os futuros do petróleo
chegando aos 50 dólares/barril, produtores como a Royal
Dutch Shell e distribuidoras como a E.On tiveram declínios
acentuados.
Sublinhando as tendências sombrias, demissões
entre 1400-2700 empregados foram anunciadas na quinta-feira pela
AstraZeneca, Rolls Royce, Sandvik e Peugeot Citroen. Na Grã-Bretanha,
a BAE Systems, a fabricante de materiais de construção
SIG e a firma de investimentos Fidelity International também
anunciaram demissões significativas. As vendas inglesas
de artigos de consumo caíram mais 0,1% em outubro.
Foram os EUA, porém, que continuaram a produzir as piores
notícias. O número de trabalhadores americanos que
fizeram novos requerimentos de seguro-desemprego subiu em 27.000
na semana passada, número maior que o esperado e o mais
alto em 16 anos, relatou o Departamento Trabalhista. Estimativas
iniciais do número de novos beneficiados pelo seguro-desemprego
apontam um número sazonalmente ajustado de 542.000 na semana,
após os 515.000 da semana anterior. Foi maior que a previsão
dos analistas de 505,000 novos requerimentos. Os requerimentos
contínuos permaneceram em 4,012 milhões na semana
terminada em 8 de novembro, mais alto nível desde dezembro
de 1982. Na semana anterior o número de requerimentos contínuos
era 3,903 milhões.
Notas do encontro do Federal Reserve mostraram, segundo alguns,
que o desemprego poderia atingir os 8% até o próximo
ano. (A taxa oficial de desemprego chegou aos 6,5% em outubro).
As notas revelam preocupações com uma espiral
deflacionária, que o Fed não seria capaz de contrabalançar
com taxas de juro já tão baixas. Tal desenvolvimento
"colocaria importantes desafios regulamentais", segundo
o Fed. Alimentando esses temores, os preços de artigos
de consumo caíram 1% em outubro, a queda mais brusca desde
que o governo começou a fazer registros mensais, em 1947,
segundo relatado pelo Departamento de Comércio dos EUA.
Os números da moradia também são desoladores.
Construtoras americanas divulgaram em outubro a venda de casas
numa taxa anual de 791.000, menor número desde que o Birô
do Censo começou a registrar os índices de moradia
em 1959, quando havia 50% menos famílias no país.
Em setembro, havia 394.000 casas não-vendidas e mais de
4 milhões de casas disponíveis no mercado (muitas
das casas existentes eram propriedades hipotecadas).
Durante a semana, houve sinais de que a implosão financeira
está longe de acabar. As ações do Citigroup
caíram 24,2% para 4,85 dólares ontem, depois de
uma queda de 23% no dia anterior, após o banco ter assumido
mais de 17 bilhões em bens dúbios. O Citi também
fechou mais um hedge fund, que chegou a possuir mais de 4 bilhões
em bens. Seu valor, desde então, passou a menos de 60 milhões
de dólares, enquanto sua dívida é de cerca
de 880 milhões.
A General Electric pretende encolher a GE Capital, uma grande
provedora de crédito para consumidor, numa operação
que poderá acarretar num corte de custos em torno de 2
bilhões de dólares, a venda de 90 bilhões
em ações de alta alavancagem e uma redução
significativa de seu efetivo de 75.000 empregados. O JPMorgan
Chase planeja cortar 10% de sua equipe de investimentos bancários,
cerca de 3.000 empregados.
Enquanto esses gigantes financeiros lutam para se desvencilhar
da bancarrota completa cortando todos seus gastos, fica cada vez
mais claro que o capitalismo experimenta uma crise fundamental
na escala da Grande Depressão da década de 1930,
ameaçando devastar as condições sociais de
centenas de milhões de trabalhadores em todos os países.