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Trabalhadores franceses dizem NÃO à reforma da previdência

Por Pierre Mabut e equipe de reportagem do WSWS
28 de maio de 2008

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 24 de maio de 2008.

Greves e protestos de massas explodiram por toda a França em protesto contra a decisão do governo de aumentar o tempo de contribuição previdenciária de 40 para 41 anos de trabalho, para ter direito à uma aposentadoria integral. O efeito deverá ser uma queda brusca na renda dos aposentados. Atualmente, a menor aposentadoria estatal é de 628 Euros por pessoa (ou 1127 Euros para o casal).

A CGT (Confederação Geral do Trabalho) calcula que 700 mil tomaram as ruas de 153 cidades através da França (a polícia estimou 300 mil). Em Paris, 70 mil trabalhadores, jovens e imigrantes considerados ilegais protestaram contra os planos governamentais, que na prática irão aumentar o tempo de trabalho médio durante a vida do trabalhador. Já em Nantes, foram 25 mil pessoas que marcharam em defesa de suas aposentadorias; em Lyon foram 12 mil; em Bordeaux foram mais 25 mil que tomaram as ruas. Marselha, por sua vez, viu um dos maiores protestos, com 60 mil mobilizados para lutar contra a reforma previdenciária e contra a privatização da zona portuária.

Apesar das ameaças de greves feitas pelos sindicatos, nenhum deles chamou por greve no dia de protestos. Mesmo assim vários setores da economia foram atingidos por paralisações e passeatas realizadas pelos trabalhadores.

Um em cada dois trens parou nas ferrovias nacionais (SNCF), com 24,9% dos ferroviários aderindo à greve. Entre os trabalhadores dos correios, 11,33% aderiram, sendo 19,5% de adesão na France Telecom, 20,8% na companhia de eletricidade (EDF) e mais 16,2% de adesão à paralisação entre trabalhadores da companhia de gás. Funcionários das administrações locais, funcionários dos hospitais e funcionários públicos registraram 8% de participação.

Apenas 7,5% dos professores tomaram parte nos protestos, um número pequeno em comparação com os 34% que haviam participado dos protestos de 15 de maio contra os cortes de empregos. Na verdade, isso ocorreu devido a uma manobra deliberada da parte dos sindicatos para separar o problema da previdência do problema dos cortes de empregos, impedindo um avanço político do movimento que possa desafiar a livre destruição das conquistas sociais pelo governo.

De acordo com pesquisa de opinião realizada pela CSA o apoio às ações em defesa das aposentadorias foi de 58%, enquanto apenas 24% se opuseram.

A resposta dos trabalhadores na última semana foi bem maior do que em 2003, quando 500 mil participaram. Na época, os trabalhadores foram traídos pela CGT, CFDT (Federação Democrática Francesa do Trabalho) e FSU (Federação Unificada dos Sindicatos Unitários, representando trabalhadores do setor educacional), que concordaram então em aceitar um aumento do tempo de contribuição previdenciária de 37,5 para 40 anos de trabalho. Esse colossal retrocesso deixou os funcionários públicos em paridade de condições com os do setor privado.

A equipe de reportagem do WSWS em Paris observou uma ampla participação espontânea nos protestos, assim como uma enorme revolta contra os cortes sociais do governo. Participaram estudantes, trabalhadores ferroviários, muitos professores e trabalhadores hospitalares, assim como um forte contingente de sans papier (sem documentos, trabalhadores ilegais). Um contingente que ocupou o prédio da CGT no terceiro distrito, exigindo que o sindicato incorporasse suas demandas por moradia, recebeu grande apoio. Muitas pessoas assinaram sua petição e fizeram doações em dinheiro.

No entanto, apesar da força das mobilizações do dia 22 de maio os sindicatos não anunciaram nenhum tipo de ação que desse continuidade aos protestos, aparentemente apostando nas boas graças do governo para mudar a política! “Chutamos a bola para o campo do governo”, disse a CGT. O secretário geral da Force Ouvrière, Jean-Claude Mailly disse que o governo seria culpado de “negar a democracia” se não desse ouvido aos protestos. O líder sindical da CFDT François Chérèque, por sua vez, afirmou que “o protesto de um dia foi um sucesso”, e que “após uma demonstração de forças desse tipo, o governo será obrigado a nos receber e nós poremos nossas propostas na mesa.”

Entretanto, o ministro do trabalho Xavier Bertrand imediatamente deixou bem clara a intransigência do governo em relação aos 41 anos de contribuição. O projeto, disse ele, era “balanceado”, e o papel do governo “não era de contar número de manifestantes, mas de proteger as pensões de todos os franceses.” E ainda disse: “nós concordamos com os parceiros sociais [patrões e sindicatos] quando dizem que o cerne do problema, a prioridade das prioridades, está no emprego de trabalhadores mais velhos, em como manter os trabalhadores mais velhos empregados nas companhias.”

De fato, os sindicatos têm estado em constante negociação com o governo do presidente Nicolas Sarkozy em torno de um acordo que aceitaria as mudanças governamentais na previdência em troca do compromisso dos empresários em manter os trabalhadores mais velhos na folha de pagamento. Atualmente, 38,1% dos trabalhadores entre 55 e 64 anos continuam empregados. A UE espera aumentar esse percentual para 50% em toda a Europa até 2010.

Outra concessão que o ministério do trabalho estaria disposto a conceder para aprovar os 41 anos seria um aumento de 25% no valor mínimo da aposentadoria num período de 5 anos, além de um aumento de 54 a 60% no valor da pensão para as viúvas.

A líder da organização dos empresários (MEDEF), Laurence Parisot, indicou para onde o grande capital pensa que o governo deve se dirigir. Em discurso no dia dos protestos, sua defesa de que a idade legal para a aposentadoria deveria passar dos 60 para os 63,5 anos revoltou os trabalhadores. Este seria o “único cenário” que, em conjunção com os 41 anos de contribuição, permitiria o financiamento das aposentadorias, defendeu ela. Os sindicatos já haviam aderido a essa proposta em 2003, quando abandonaram a defesa dos 37,5 anos de contribuição previdenciária para os funcionários estatais e prepararam o desmantelamento da aposentadoria especial defendida pelos ferroviários (e traída pelos sindicatos) em greve do ano passado.

Enquanto os sindicatos continuam colaborando semanalmente com o governo Sarkozy calculando como administrar a raiva e frustração que cresce na população em torno de seus empregos, educação e poder de compra dos salários, muitos já questionam sobre como seguir adiante. Jacky Wagner, representante local da CGT em Estrasburgo (França), observou: “estou feliz porque dissemos que seríamos mais fortes do que nas manifestações anteriores, e de fato nós fomos... Mas eu penso que será necessário voltar ás ruas novamente, porque o Sarkozy não parece estar ouvindo o que as ruas dizem. Os trabalhadores já estão cansados com tudo isso, e nós vemos paralisações praticamente todos os dias na região.”

O WSWS entrevistou manifestantes nos protestos em Paris:

Stephan, 22, trabalha na SNCF desde setembro. Ele disse que lá os trabalhadores estão sendo obrigados a trabalhar cada vez mais, e que as condições de trabalho estão declinando. “Nós vamos ter que lutar para manter aquilo pelo que nossos avós conseguiram com luta. É por isso que tem tanta gente na rua. Nós queremos 37,5 anos de contribuição com direito à aposentadoria integral para todos. Os economistas falam que é impossível. Mas se todos os sindicatos se juntarem, eu acho que podemos fazer o governo recuar”.

“Durante os 10 dias de greve no ano passado”, continuou ele, “nós estávamos muito motivados. Agora eles querem que a gente recue, mas a gente não quer. Nós não estamos aqui para derrubar o governo, mas temos que convencer o governo de que não somos vacas leiteiras. Por toda a Europa está-se tentando construir uma frente comum. Têm havido protestos europeus unificados entre a CGT e outros sindicatos. A juventude precisa se mobilizar. Eles deveriam ver como está a situação dos sem-teto e dos sans papier (imigrantes sem-documento). É realmente chocante. Os sindicatos estão lá para defendê-los. Mas atualmente, eu não acho que exista nenhum partido para nós, nenhum candidato realmente de esquerda surgiu. E eles não têm nenhum programa.”

Jean, 54, trabalha para a SNCF em Seine-Saint-Denis. Logo ele vai se aposentar. Ele disse ao WSWS que as coisas estão cada vez piores, e que todos os direitos estão sendo retirados. “Nós devemos nos unir. A greve de 2007 foi uma farsa; eu estou muito decepcionado. Os sindicatos ignoraram as demandas da base. Nós não estamos aqui para derrubar o governo, mas está claro que greves de 24 horas não são o suficiente. Sarkozy não é diferente dos governos do resto do mundo, onde todos os direitos também estão sendo retirados em nome da globalização. Nós estamos voltando à estaca zero, onde não há mais direitos. A idade da pedra! Sarkozy está imitando Thatcher e os Estados Unidos: essas coisas não estão acontecendo só aqui na França.”

Jean ainda acrescentou: “Uma pequena percentagem das pessoas impõe que sua lei e sua riqueza não são para todos. A França manda navios e interfere com pessoas em outros países. O futuro para os jovens é muito sombrio, os secundaristas e todas as pessoas temem por seu futuro. Por isso precisamos colocar todas as nossas idéias em conjunto, elaborar um programa para avançarmos juntos. Nós não deveríamos nos reunir atrás de bandeiras. Devíamos nos livrar do Tratado de Maastricht, é muito perigoso, significa fechar escolas para aumentar os lucros. Os partidos de direita e esquerda deveriam se juntar.”

Danièle, 59, também trabalha em Seine-Saint-Denis. “Nossos direitos estão indo pro saco e isso é só o começo.” Disse ela. “As pessoas precisam se unir, especialmente aquelas em dificuldade. Qual o significado da vitória? Eu não saberia dizer. Estou pensando nos palestinos e no povo em Gaza. O futuro está na luta, na luta de todos os oprimidos."