World Socialist Web Site
 

WSWS : Portuguese

Uma resposta socialista ao aumento global no preço dos combustíveis

Pelo Comitê Editorial do wsws.org
18 de julio de 2008

Utilice esta versión para imprimir | Enviar por email | Comunicar-se com o autor

Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 5 de julho de 2008.

Nos últimos meses, o acentuado aumento no preço da gasolina impôs enormes fardos sobre a população trabalhadora dos Estados Unidos e do mundo todo. Nos EUA, com os preços nos postos de gasolina atingindo a média de mais de 4 dólares por galão, e caminhando para a marca de 5 dólares ou mais neste verão, as famílias trabalhadoras — já abaladas pelo aumento dos custos de alimentos, moradia, saúde e outros — experimentam um drástico corte nos seus padrões de vida.

Em virtude da amplitude espacial das áreas metropolitanas dos EUA, das longas distâncias da casa ao trabalho e da falta geral de investimento nas alternativas de transporte público, os trabalhadores dos EUA são mais dependentes de seus carros do que boa parte daqueles dos países desenvolvidos. Isso tornou a população ainda mais vulnerável à alta no preço da gasolina, que é de 38% desde julho passado (2007).

De acordo com uma pesquisa de opinião da Associated Press/Yahoo News, nove em cada dez entrevistados esperam passar por dificuldades financeiras nos próximos seis meses, em razão do aumento no preço dos combustíveis. Quase metade diz que o aumento poderia causar privações sérias. Os acréscimos nos custos de fertilizantes e transportes baseados em gás natural, contribuíram para o aumento agudo no preço dos alimentos. O preço do diesel levou caminhoneiros independentes à beira da falência, enquanto as indústrias automotiva e aérea executaram demissões massivas em face da alta dos combustíveis.

A situação nos EUA é parte de um fenômeno internacional. Protestos de caminhoneiros, fazendeiros e pescadores que se deparam com a ruína, causada pelo aumento no preço dos combustíveis, estão se espalhando pela Espanha, França, Itália, Grã Bretanha e outros países europeus. A raiva emergiu, também, na Ásia, com greves e manifestações em Hong Kong, Índia, Nepal, Indonésia e Coréia do Sul.

São vários os fatores que contribuem para a atual alta do petróleo — que subiu de 25 dólares o barril em 2003 para os 140 dólares hoje, mais que dobrando somente no último ano. Um fator decisivo é o valor declinante da moeda americana, o que levou nações produtoras de petróleo a aumentarem seus preços para compensar a queda no valor de seus pagamentos baseados em dólar.

As guerras e as ocupações no Iraque e Afeganistão, as crescentes ameaças dos EUA contra o Irã, assim como as tensões geopolíticas no Oriente Médio, África, Rússia e outras regiões produtoras de petróleo, também geraram receios de que repentinos cortes no suprimento aconteçam. Há, também, um consenso cada vez maior de que os recursos petrolíferos mundiais estão em queda e que não podem suprir a demanda global, particularmente aquela vinda das economias ascendentes da China e da Índia.

No coração da crise está o colapso do sistema econômico global. Por décadas, políticos, líderes corporativos e a mídia submeteram a população mundial ao argumento interesseiro de que o mercado capitalista é o meio mais racional de dividir os recursos da sociedade. O que está sendo revelado, agora, é o conflito básico entre as necessidades da moderna sociedade de massas e a anarquia do sistema do lucro.

É impossível realizar qualquer estimativa real a respeito do restante dos suprimentos globais, uma vez que os países produtores de petróleo e os conglomerados de energia ocultam da população, por possuírem interesses velados, seus “segredos comerciais”. A oposição política corporativa e fechada também impediu o desenvolvimento de alternativas ambientalmente seguras e sustentáveis, apesar de tecnologia existir para isso, em alguns casos, há décadas.

As supostas soluções produzidas dentro do quadro do sistema capitalista têm apenas aprofundado a crise. O desenvolvimento dos biocombustíveis é um exemplo. Mesmo se aceitássemos as amplamente contestadas afirmações de que os biocombustíveis são um meio de reduzir as emissões de carbono, vemos que somente sua produção já tem levado a um enorme aumento no preço do milho e de outros produtos agrícolas, causando estrago ao redor do mundo. Todo o projeto dos biocombustíveis foi vinculado aos interesses dos monopólios do agronegócio, como a ADM e a Cargill, que têm uma grande preocupação não em acabar com o aquecimento global, mas em elevar seus resultados financeiros.

O uso racional dos recursos petrolíferos restantes e o desenvolvimento de verdadeiras alternativas requerem um nível de cooperação internacional sem precedentes, bem como a reorganização dos recursos tecnológicos, materiais e humanos do mundo. Isso não é possível enquanto o capitalismo dividir o globo em estados nacionais competidores, cada um tentado tirar vantagem do outro.

A insana batalha pelo controle do restante dos suprimentos petrolíferos levou a uma luta violenta, na qual a sangrenta invasão e ocupação do Iraque pelos EUA é apenas um episódio. Todas as grandes potências — EUA, China, Europa e Japão — estão disputando o controle do Oriente Médio, da região que circunda o Mar Cáspio, do Ártico, da Antártica e, até, dos leitos oceânicos. A luta por recursos está novamente ameaçando o mundo com uma nova rodada de guerras imperialistas, que poderia pôr em risco a própria sobrevivência da humanidade.

Especulação financeira

Um outro aspecto importante no aumento global dos preços do petróleo é o frenesi especulativo que emergiu na New York Mercantile Exchange (NYMEX) e outros mercados de commodities. A crescente instabilidade financeira global dos últimos cinco anos — o dólar em queda, a onda de choque da explosão da bolha do mercado de ações pontocom, o colapso das hipotecas subprime e a bolha imobiliária — levou ricos investidores a realocarem seu dinheiro para o mercado de commodities, onde eles se engajaram na compra e venda de futuros do petróleo, milho e ouro, apostando principalmente no aumento contínuo dos preços.

Com pouquíssima regulação por parte da Comissão de Negócios em Futuros de Commodities (CFTC, Commodity Futures Trading Comission, comissão do Governo norte-americano), os investidores aumentaram suas compras de futuros de commodities em vinte vezes nos últimos cinco anos, de 13 bilhões de dólares em 2003 para 290 bilhões em 2008. Esse fluxo especulativo criou agora mais uma bolha, com os preços das 25 principais commodities subindo quase 200 por cento durante o período.

Na maioria dos casos, o petróleo nem chega às mãos dos especuladores que o compraram. Em vez disso, eles participam de um elaborado esquema de troca de contratos — com um mínimo de dinheiro envolvido nessas trocas — cujo impacto cumulativo é fazer subir os preços e garantir grandes retornos aos hedge funds, investidores institucionais e outros. Conforme algumas estimativas, a especulação já agregou 50 dólares ao atual preço do barril de petróleo.

Henry Paulson, o Secretário do Tesouro dos EUA, em entrevista à CNN no dia 10 de junho, deixou claro o apoio da administração Bush a esse tipo de empreendimento. Ele disse: “Eu não acredito que investidores financeiros sejam responsáveis, em qualquer grau significativo, por esse aumento no preço. Isso é oferta e procura”.

Tais comentários apenas salientam a subserviência do sistema político dos EUA à aristocracia financeira. O mercado capitalista não é um árbitro imparcial das relações econômicas. Ele pode ser e tem sido manipulado, pelos mais poderosos interesses financeiros e corporativos, para servir ao lucro.

No ano passado, a British Petroleum concordou em pagar 373 milhões de dólares para acabar com uma investigação do Departamento de Justiça dos EUA sobre a manipulação dos preços que ela realizava no aquecido mercado do petróleo. Ao mesmo tempo, ocorria a manipulação, pela Enron, do suprimento de eletricidade, incluindo a provocação deliberada de blecautes na Califórnia.

Neste caso da bolha do petróleo, os hedge funds e as grandes instituições financeiras, como a Goldman Sachs, Morgan Stanley e JP Morgan, tiveram um retorno de até 200 por cento sobre seus investimentos. Kenneth Griffin, chefe da negociante de energia Citadel Investment Group, fez 1,5 bilhões de dólares em 2007. Steven Cohen da SAC Capital Advisors fez 900 milhões.

Além disso, o aumento nos preços gerou uma fortuna para as empresas conhecidas como “Big Oil”, com a ExxonMobil, a Chevron e as outras cinco maiores corporações embolsando 36 bilhões de dólares em lucros durante o primeiro quadrimestre deste ano (e recompensando seus presidentes corporativos com pagamentos multimilionários).

Os partidos não oferecem solução

Como para todos os outros problemas sociais com os quais a população trabalhadora se confronta — hipotecas, enorme perda de empregos, crescimento da desigualdade social, perigo da guerra — os partidos políticos capitalistas ao redor do mundo não têm solução para o estonteante aumento nos preços dos combustíveis, quer eles se intitulem conservadores, trabalhistas, verdes ou socialistas. Pelo contrário, todos eles concordam que a população trabalhadora deve aceitar uma massiva redução no consumo como forma de pagar pela crise do sistema capitalista mundial.

Nos EUA, tanto o candidato Republicano à presidência quanto o Democrata não têm nada a oferecer. John McCain propôs um prêmio de 300 milhões de dólares pelo projeto de um carro elétrico, a suspensão do imposto federal de 18 centavos sobre o gás nos meses de verão e a retirada das restrições ambientais sobre a extração de petróleo além da costa marítima.

Os principais conselheiros de McCain, incluindo o co-coordenador de campanha, Phil Gramm, um antigo senador do Texas, são os responsáveis pela desregulação do mercado de energia, impulsionada pela Enron, que pavimentou o caminho para a atual explosão especulativa.

Esforçando-se em apresentar-se como um popular oponente das companhias petrolíferas e dos especuladores, Barack Obama propôs que as corporações da energia pagassem um grande imposto sobre seu lucro e o fechamento do chamado “Enron Loophole” (“Buraco Enron”). Isto não irá a lugar algum, já que amplas seções dos Democratas, particularmente aqueles vindos de Estados produtores de petróleo, se opõe a qualquer taxação sobre os conglomerados da energia, e a Wall Street — que jogou montes de dinheiro na campanha de Obama — é contrária a qualquer regulação séria da especulação.

O próprio Obama possui laços com a indústria de biocombustíveis. Tem entre seus principais conselheiros um ex-lobista do American Petroleum Institute, assim como ex-funcionários da administração Clinton que tiveram um papel crucial em desregular os mercados financeiros. Para ganhar a aprovação de seus patrões corporativos e financeiros, Obama repetidamente insistiu que não tomará medidas para comprometer seus interesses no lucro. O site do candidato Democrata declara, “Barack Obama reconhece ser fundamental que as companhias petrolíferas os e acionistas tenham fortes incentivos, para conduzir negócios bem administrados que invistam em eficiência e inovação”.

Longe de criar eficiência e inovação, o sistema do lucro agora ameaça dezenas de milhões de pessoas ao redor do globo com a fome, a desnutrição e os custos crescentes dos combustíveis. Os trabalhadores não são responsáveis pela crise do sistema capitalista e não deveriam pagar por ela.

Medidas emergenciais precisam ser tomadas para defender os padrões de vida da classe trabalhadora. Elas devem incluir a implementação da escala móvel de salários, para proteger o poder aquisitivo dos trabalhadores através do reajuste automático dos salários e compensar o aumento dos preços.

Décadas atrás, sindicatos como o United Auto Workers (UAW) lutaram e conseguiram o Cost of Living Adjustments (Ajustes pelo Custo de Vida, COLA, na sigla em inglês), também conhecido como Escalator Clauses (Cláusulas de Escalação), que aumentava automaticamente os salários conforme o aumento dos custos de vida. Os sindicatos abandonaram, há muito tempo, tais exigências e hoje exigem que os trabalhadores aceitem enormes cortes salariais para defender a lucratividade das corporações. Eles recomendam, junto com os partidos capitalistas, que os trabalhadores se adaptem ao aumento dos preços, apertando seus cintos e aceitando a queda permanente dos seus padrões de vida.

O Socialist Equality Party (SEP) reivindica a escala móvel de salários e outras medidas emergenciais para a subsistência dos trabalhadores diante do esmagador preço do combustível. As outras medidas incluem:

* O início da investigação sobre as práticas dos especuladores e dos conglomerados de energia. Assim como, também, sobre as práticas das agências governamentais que sancionaram o saque da sociedade.

* A expropriação dos desonestos ganhos dos investidores de commodities e dos presidentes corporativos, bem como seu depósito num fundo publicamente controlado para prover a subsistência da população.

Somente com a ascensão de um novo movimento político de massas da classe trabalhadora, contrário ao sistema do lucro, será possível lutar e obter essas medidas mínimas.

Elas são, porém, apenas o primeiro passo. É necessária uma reorganização fundamental da indústria de energia e do sistema financeiro nos EUA e no mundo, que coloque as necessidades da sociedade em primeiro lugar, e não o lucro capitalista.

Para romper a força dos conglomerados de energia, as corporações multinacionais como a ExxonMobil, a Chevron, ConocoPhillips, British Petroleum, Shell e outras, precisam ser convertidas em empresas de utilidade e propriedade públicas, democraticamente controladas, como parte do estabelecimento da economia planejada socialista.

Os vastos recursos energéticos do Oriente Médio e outros países produtores de petróleo — que agora estão nas mãos da família real saudita e outras elites, cujo domínio é, em muitos casos, defendido pelas forças armadas dos EUA — precisam ser colocados sob controle da população trabalhadora desses países.

Desse modo, a exploração, o desenvolvimento e o uso desses suprimentos energéticos podem ser guiados por um plano racional internacional, publicamente debatido e democraticamente aprovado pela classe trabalhadora, baseado numa distribuição justa e igualitária para preencher as necessidades de toda a população mundial.

Ao mesmo tempo, vastos recursos devem ser alocados para o desenvolvimento de energia barata, renovável e ambientalmente segura.

O esforço de décadas em impedir o desenvolvimento do transporte público decente — realizado pelos monopólios de energia, pela indústria automobilística e pelo governo dos EUA — deve ser respondido despejando centenas de bilhões de dólares no trânsito urbano de massas e sistemas de transporte por trilhos, como também pelo desenvolvimento de veículos eficientes do ponto de vista do consumo de combustível. Isto é crucial não apenas para os EUA, mas para a Índia e a China, onde o uso em expansão de veículos movidos por combustíveis fósseis ameaça produzir um desastre ecológico.

Os problemas atuais da humanidade não são causados propriamente pela falta de recursos, mas pelo caráter irracional do sistema capitalista, que desperdiça vastos montantes de trabalho humano e de potencial criativo para enriquecer uma elite já fabulosamente rica. Os recursos produtivos e naturais do mundo precisam ser libertados do confinamento da propriedade privada capitalista e do sistema de estados nacionais, e reorganizados de uma forma cientificamente planejada, racional e democrática, para corresponder aos desafios do século XXI.

A luta por esses objetivos exige um combate empenhado contra os governos do mundo, que representam a elite financeira e corporativa, e não as pessoas comuns. Nos EUA, isto significa uma ruptura política com o Partido Democrata e a construção de um novo partido político da classe trabalhadora, baseado num programa socialista e internacionalista.

Essa é a perspectiva pela qual luta o Partido da Igualdade Socialista (Socialist Equality Party, SEP) nos EUA e seus partidos irmãos no resto do mundo.