Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 28 de setembro de 2007.
Foram revelados novos detalhes do acordo provisório
assinado entre o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria
Automobilística dos EUA e do Canadá (UAW - United
Auto Workers) e a General Motors, jogando nova luz sobre a
dimensão da traição levada a cabo pelo UAW.
Na manhã da quarta-feira (26/09), o sindicato assinou um
acordo e pôs fim à greve dos 73 mil trabalhadores
da GM - apenas dois dias depois de seu início.
As principais manchetes de vários jornais celebraram
a histórica deterioração das condições
de trabalho dos trabalhadores da indústria automobilística
contida no acordo entre a GM e o UAW: Acordo trabalhista
da GM inicia nova era para a indústria automobilística,
escreveu o Wall Street Journal; Acordo entre GM e
sindicato pode representar o fim dos negócios na forma
como os conhecemos em Detroit, declarou o New York Times;
Emerge uma nova indústria automobilística
americana, anunciou o Detroit Free Press.
O Wall Street Journal assim descreveu o significado
transformador do acordo: Durante grande parte do último
meio século, as três grandes fabricantes de automóveis
de Detroit colaboraram com o UAW para criar uma aristocracia de
trabalhadores industriais, cujos salários e benefícios
tornaram-se o parâmetro da classe média americana.
Se a proposta de acordo anunciada ontem for ratificada pelos associados
do sindicato - e for feita também na Ford Motor Co. e na
Chrysler LLC - essa época da história industrial
americana pode ter chegado ao fim.
A chave do acordo é uma proposta para liberar a GM de
sua obrigação de garantir a assistência médica
de seus quase 400 mil aposentados e seus dependentes através
da criação de um fundo de investimento multibilionário
controlado pelo sindicato - conhecido como Associação
Voluntária de Benefício dos Empregados (VEBA -Voluntary
Employees Benefit Association), que se responsabilizará
pelo pagamento dos benefícios. Além disso, o acordo
estabelece um sistema de duas categorias salariais - o primeiro
em toda a história num contrato nacional assinado pelo
UAW - que reduzirá drasticamente os salários e benefícios
da próxima geração de trabalhadores da indústria
automobilística.
O fundo da VEBA já iniciará com um déficit
orçamentário, pois a GM repassará apenas
US$ 35 bilhões dos US$ 55 bilhões que deve aos aposentados.
Com os custos de assistência médica subindo constantemente
- estes custos subiram 46% desde 2003 - é provável
que o fundo vá à falência e o UAW, que será
responsável a partir de agora pelos benefícios de
saúde dos aposentados, tenha que cortar benefícios
dos trabalhadores.
Além disso, os reajustes salariais de acordo com o aumento
do custo de vida - conquistados pelos trabalhadores do UAW na
GM em 1948 - serão desviados para ajudar a equilibrar o
custo dos benefícios de saúde dos aposentados. O
acordo, que tem validade de quatro anos, prevê três
abonos mas nenhum reajuste salarial. Com isso, o fim do reajuste
salarial de acordo com o aumento do custo de vida causará
uma diminuição substancial nos salários de
todos os trabalhadores da GM.
O UAW também aceitou que a GM desvie verbas do fundo
de pensão para o fundo de investimentos da VEBA, colocando
em risco a viabilidade futura do fundo de pensão.
De acordo com o Detroit Free Press, os aposentados,
que já tinham sido obrigados, em 2005, a pagar, pela primeira
vez na história, parte das despesas médicas, serão
novamente forçados a aumentar sua parcela de contribuição
com a assistência médica, na forma de contratos especiais
e da divisão das despesas de serviços com a empresa.
O UAW, por sua vez, se tornará um dos maiores administradores
privados dos EUA e controlará um fundo de investimento
de até US$ 70 bilhões, caso semelhantes acordos
sejam firmados com a Ford e a Chrysler. Apesar do presidente do
UAW, Ron Gettelfinger, assegurar que o fundo será viável
por 80 anos, VEBAs similares criados pelo UAW na Caterpillar e
na Detroit Diesel ficaram sem dinheiro, levando a significativos
aumentos nos custos da assistência médica para os
aposentados e suas famílias.
É absolutamente impossível que a VEBA dure
tanto. Isso vai virar uma panela de pressão, disse
ao MarketWatch o professor de história Nelson Lichtenstein,
da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara.
O Gettelfinger está cometendo um erro ao apresentar
uma derrota como se fosse uma vitória, acrescentou
ele.
A cobertura da assistência médica dos aposentados
pelos empregadores foi conquistada pelo UAW nos anos 1960. Desde
então os aposentados têm recebido benefícios
fixos da GM que aumentavam com o aumento dos custos
de saúde. Através da VEBA controlada pelo sindicato,
não haverá esse tipo de garantia para os trabalhadores.
O UAW poderá cancelar benefícios garantidos e seguir
o exemplo de muitas empresas, que concedem aos trabalhadores um
subsídio mínimo ou limitam o valor dos serviços
que podem ser usados pelos trabalhadores.
O Wall Street Journal observou que desembolsando
quantias fixas e limitando os aumentos, administradores de fundos
de assistência médica podem evitar a falta de verbas,
acrescentando que seria provável que o UAW recebesse tal
conselho de seus assessores financeiros e de outros consultores
que se colocarão à sua disposição.
O sistema de duas categorias salariais aceito pelo UAW reduzirá
os custos trabalhistas (salários e benefícios) nas
novas contratações para as chamadas funções
não-produtivas para uma média de US$ 27 por
hora, comparada à media atual de US$ 73 por hora. O sindicato
e a empresa oferecerão acordos de demissão e aposentadorias
precoces para tirar os atuais trabalhadores de seus empregos,
para serem substituídos por uma força de trabalho
muito mais barata.
Enquanto o UAW alegou que organizou a greve para garantir os
empregos - e agora afirma que o número de empregos nos
EUA continuará o mesmo até o fim do acordo em 2011
- o Detroit Free Press noticiou: desde o início
das negociações, a GM negou-se a garantir que novos
produtos específicos seriam destinados a fábricas
cobertas pelo sindicato. Qualquer compromisso de manter
os níveis de emprego, continuou o jornal, é
seguido pela ressalva de que o sindicato deve concordar com regras
trabalhistas flexíveis em negociações ao
nível das fábricas.
O banco de empregos, que paga a trabalhadores despedidos enquanto
estes não conseguem outro trabalho, será alterado,
aumentando-se a área geográfica na qual os trabalhadores
deverão procurar emprego, oferecer concessões e
abrir mão de seus benefícios.
Se aceito, esse acordo representará um ataque aos trabalhadores
que estão em atividade e suas famílias, como também
aos aposentados, assim como os jovens que estão para ingressar
no processo produtivo.
O contrato deve ser totalmente rejeitado pelos trabalhadores
nas assembléias que estão sendo agendadas pela burocracia
do UAW. Comitês de base devem ser organizados para assumir
a condução das negociações, tirando-as
das mãos da burocracia do UAW e organizando uma greve para
unir os trabalhadores da GM, da Ford e da Chrysler contra as empresas
automobilísticas.
Acima de tudo, lições devem ser tiradas dessa
traição, começando pela necessidade dos trabalhadores
de libertar-se do UAW e organizar suas lutas sob uma base completamente
nova. Isso significa uma luta política para unir todos
os setores da classe trabalhadora contra os dois partidos do grande
capital e o sistema do lucro que eles defendem.