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Governo dos EUA implantará um novo comando militar na África

Por Lawrence Porter
30 de maio de 2007

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 18 de maio de 2007.

Num desenvolvimento perigoso que reflete a expansão explosiva do militarismo norte-americano, o governo Bush tem considerado a África como um continente de “preocupação estratégica nacional”, dando início a uma nova política militar que coincide com essa nova posição.

O governo Bush anunciou em fevereiro a formação de um novo sistema de comando militar na África, o Comando dos Estados Unidos na África (AFRICOM), utilizando a terminologia usual que associa a defesa humanitária à luta anti-terrorista.

No mês passado, o principal assessor da Secretaria Política de Defesa, Ryan Henry, visitou seis países africanos com o objetivo de “esclarecer os mal-entendidos” sobre o novo programa militar do Pentágono. Vários governos levantaram a preocupação de que os EUA estavam se deslocando à região por causa da descoberta de enormes reservas petrolíferas em partes do continente e também devido à crescente influência da China, considerada como um rival econômico e político.

Já em Washington, ao retornar da viagem na qual se reuniu com representantes da África do Sul, Nigéria, Etiópia, Gana, Senegal e Quênia, Henry falou à imprensa que “o objetivo do AFRICOM não é estabelecer a liderança dos EUA no continente. Nosso objetivo é muito mais tornarmo-nos um complemento do que esforçarmo-nos numa suposta competição que esteja ocorrendo pela liderança”.

Ele acrescentou que o AFRICOM não representa “uma resposta à presença chinesa” ou uma tentativa de “assegurar recursos naturais” como petróleo. “Embora algumas dessas coisas fazem parte dos objetivos”, admitiu ele, a razão real é que a África “está emergindo no cenário mundial como um ‘ator’ estratégico, e nós precisamos tratá-la como um continente”.

Para tranqüilizar os líderes africanos, Henry disse que a criação do AFRICOM não ocasionará o envio de soldados em larga escala no continente ou o aumento da despesa do Pentágono nessa região. Entretanto, para qualquer um que esteja familiarizado com a linguagem diplomática, “ator estratégico” significa que, na visão do governo Bush, está começando a ficar interessante realizar guerras na África em defesa dos interesses norte-americanos.

A África Ocidental, incluindo a Nigéria, é responsável atualmente por 12% das importações de petróleo bruto dos EUA. Até 2015, estima-se que sua participação aumentará para 25%, uma parcela maior que da Arábia Saudita.

A China é o segundo maior importador de petróleo, perdendo apenas para os EUA. O petróleo africano é fundamental para garantir a rápida expansão econômica chinesa. De acordo com a Administração Geral de Taxas da China, o país importou aproximadamente 11% a mais de petróleo durante os quatro primeiros meses de 2007 em relação ao mesmo período em 2006. O volume adicional veio da África. Em 2006 a China consumiu 320 milhões de toneladas de petróleo bruto, sendo que 7% de suas importações vieram do Sudão.

A China importa 25% de seu petróleo bruto da África e está buscando formas de aumentar as importações deste continente. Desde 2000 houve um aumento de cinco vezes, totalizando atualmente US$ 5,5 bilhões por ano. A China é hoje o terceiro maior parceiro comercial da África, ficando atrás apenas dos EUA e da França, já se igualando a Inglaterra.

A África sub-saariana inclui oito países produtores de petróleo: Nigéria, Angola, Congo-Brazzaville, Gabão, Guiné Equatorial, Camarões, Chade, República Democrática do Congo e Sudão.

A Nigéria é o maior produtor de petróleo na África e tem a 11ª maior reserva de petróleo no mundo. Atualmente ela produz 2,45 milhões de barris por dia, 42% dos quais vai para os EUA. Das três maiores companhias petrolíferas do país incluem-se duas empresas nortes-americanas, a ExxonMobil e a Chevron, além da anglo-holandesa Shell.

Angola é o segundo maior produtor de petróleo na África, e estima-se que alcance a marca de 2 milhões de barris por dia em 2008.

O Sudão também é rico em petróleo. 40% da produção de petróleo do país são controlados pela China, que exerce a maior influência no Sudão atualmente, embora a Chevron tenha gasto US$ 1,2 bilhões no país, descobrindo campos de petróleo no sul, o que abre a possibilidade do Sudão ter mais petróleo do que o Irã e a Arábia Saudita.

Mandy Turner, do Guardian, caracterizou tanto os EUA como a China como atores chave numa nova “partilha da África”. “O novo integrante da partilha é a China”, escreveu ela. “A África detém os recursos naturais vitais para garantir seu rápido crescimento econômico,” incluindo cobre e cobalto na República Democrática do Congo e da Zâmbia, minério de ferro e platina na África do Sul, e madeira em Camarões, Gabão e República do Congo. A China está fechando acordos com a Nigéria, Angola, Sudão e Guiné Equatorial para a exploração de petróleo.

Os militares, a segurança e o petróleo

Com o fim da Guerra Fria, quando a maior preocupação dos EUA era a luta contra a União Soviética, o que exigia alianças com os ditos regimes independentes do Terceiro Mundo, após 1991, os EUA sentiram-se capazes de realizar mais abertamente uma política colonialista de controle hegemônico, por meio de ações militares. Os ataques de 11 de setembro serviram como um eficiente pretexto para essa forma de intervenção norte-americana na África.

Apesar da afirmação de que a luta contra o terrorismo e a ajuda humanitária sejam os principais objetivos das operações norte-americanas na África, um relatório publicado pelo Conselho de Inteligência Nacional, que considera a si próprio como o centro de pensamento estratégico de médio e longo prazo, deixa claro que os objetivos dos EUA na região são de natureza geopolítica, cuja principal preocupação é o controle do petróleo.

Intitulado “Relações Externas e a África”, o relatório afirma que “o envolvimento militar se transformou de um apoio direto a regimes ou movimentos aliados durante a guerra fria,” (assim como quando o governo Belga, com a ajuda da CIA, derrubou e assassinou o primeiro-ministro do Congo, Patrice Lumumba), “em um apoio à reconstrução, associada a um envolvimento militar norte-americano direto em bases localizadas em áreas como Djibouti, sobretudo após o atentado de 11 de setembro”.

Na seção “Caminhos Futuros no Envolvimento Externo com a África”, uma das primeiras razões dadas para o envolvimento militar direto é “a crescente importância do setor petrolífero em relação aos interesses norte-americanos na África”.

O relatório afirma ainda que “o mais importante é que os maiores produtores de petróleo não são membros da OPEP - especialmente Angola, Gabão, Guiné Equatorial, Congo-Brazzaville e Camarões”.

Um perigoso alerta em relação às futuras operações norte-americanas na África soou no mês passado, quando soldados etíopes, apoiados pelos EUA, realizaram um banho de sangue na Somália, destruindo grandes áreas das regiões mais pobres da capital, Mogadíscio (Veja “Massacre in Mogadishu - war crime made in the USA”). Mais de mil pessoas morreram, e entre 350.000 a 500.000 pessoas abandonaram as cidades, indo para os campos de refugiados, por causa dos ataques realizados por aviões norte-americanos contra as cidades do sul da Somália.

Embora não haja, oficialmente, soldados americanos envolvidos nesse conflito, membros da CIA e das forças especiais vem treinando soldados etíopes. Um dos primeiros objetivos das tropas etíopes era recuperar a embaixada norte-americana que havia sido ocupada. (Veja“Ethiopian troops ocupy Mogadishu”).

A Somália é apenas um ponto estratégico passageiro. J. Peter Pham, diretor do Instituto Nelson para Relações Internacionais e Públicas da Universidade James Madison e defensor da dominação norte-americana da África, comentou num editorial no National Interest Online, que a decisão do governo Bush de estabelecer um centro de comando “representa o passo fundamental no sentido de tratar a África como uma prioridade”. (Veja “The Africa Command Rises - Finally”)

“Essa ação”, afirmou Pham de maneira enfática, poderia representar “significativamente um envolvimento de longo prazo”, podendo “colocar o continente definitivamente na órbita norte-americana”. Ele voltou a citar o documento de 2002 de Estratégia de Segurança Nacional, no qual o governo Bush afirmou que tinha o direito de realizar ataques preventivos contra qualquer país, a fim de defender seus interesses. “A África,” afirma o relatório, “tem uma importância geo-estratégica crescente e é de grande prioridade para esse governo”.

Atualmente os EUA controlam três comandos regionais na África, que dividem a responsabilidade da defesa dos interesses norte-americanos no continente. A maior área é controlada pelo Comando Europeu, que supervisiona o norte da África, a África Ocidental, incluindo o golfo da Guiné e a África Central e do Sul. O Comando Central é responsável pelo chifre da África - países como a Somália, Etiópia, Eritréia, Quênia, Djibouti, Sudão e Egito. No Comando do Pacífico incluem-se Madagascar, as Ilhas Seichelles e a área do Oceano Índico na costa africana.

O AFRICOM irá inicialmente operar em Stuttgart, a base alemã do Comando Europeu, antes de mudar-se para uma base permanente na África. Os EUA estão tendo o cuidado de não mencionar os seus planos, afirmando apenas que ajudarão a manter a paz, realizar missões de ajuda humanitária, treinamento militar e apoio aos países africanos aliados.

Os EUA alegaram que não planejam enviar um grande número de soldados para a região, como fizeram no Iraque. Entretanto, a presença de tropas norte-americanas causará a militarização do continente, possibilitando a deflagração de outra guerra em busca do controle dos recursos naturais estratégicos, como ocorreu no Iraque, com implicações muito maiores e mais perigosas.