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Peru explode em greves por todo o país e governo de Alan García aproxima-se rapidamente do Bonapartismo

Por Jair Antunes
31 de julio de 2007

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Desde o início do mês de julho, várias greves explodiram em diversas regiões do Peru. Desde o dia 05 os professores da rede pública nacional (secundaristas) cruzaram os braços em uma greve contra um decreto do governo que imprime uma radical reforma educacional no país e atinge diretamente o plano de carreira dos docentes. Segundo o SUTEP (Sindicato Unitário dos Trabalhadores da Educação), esta nova lei acarretará a perda de vários direitos dos professores.

Desde então, os professores têm enfrentado a polícia em manifestações em várias regiões e cidades (Cerro de Pasco, Puno, Cusco, Huancayo, Piura, Iquitos, Arequipa, entre outras) e, especialmente em Lima, a capital do país.

Em Lima, os professores protestaram em frente ao Congresso Nacional e, em vários locais (juntamente com os camponeses e operários e mineiros), fecharam a Carretera Panamericana, principal rodovia do Peru que liga Lima ao norte e ao sul do país.

Em Huancayo, os professores tomaram a sede do Ministério da Educação exigindo que seja criado um projeto de lei para discutir a carreira do magistério e que o mesmo tenha a participação dos professores ligados ao Sutep.

Também a CGT (Central Geral dos Trabalhadores), principal central sindical operária do país, convocou uma greve geral dos trabalhadores em nome de uma maior distribuição de renda no país. Na cidade andina de Ayacucho, os camponeses se uniram à greve geral. Desde o início do mês, os camponeses ayacuchanos protestam por melhores condições de crédito à agricultura campesina e chegaram a manter preso por cinco horas o governador da província de Huanto.

Em Lima, pelo menos sete mil pessoas se concentraram no centro histórico da capital, vigiados de perto pela polícia. Em Machu Pichu, uma das novas "sete maravilhas modernas do mundo", as rodovias de acesso ao santuário incaico foram bloqueadas e milhares de turistas chegaram a ficar isolados nas montanhas por falta de transportes. Em Cuzco, os turistas foram obrigados a deixar a cidade em bicicletas e carroças devido à paralisação do transporte ferroviário.

Também os camponeses produtores de folhas de coca da região amazônica do Peru teriam paralisado suas atividades e fechado várias rodovias da região, em protesto por mais créditos e contra a campanha de erradicação forçosa do cultivo desta planta. Segundo a imprensa peruana, há pelo menos 150.000 camponeses cultivando este produto no país. Nesta região, o comércio está fechado e os transportes públicos parados.

Se juntam ainda aos produtores de folha de coca, o produtores de algodão, arroz e pecuaristas de todo o país. O protesto se dirige também contra o Tratado de Livre Comércio (TLC), que o governo peruano estaria negociando com o governo dos EUA.

Diante de tal onda de greves e protestos que varrem o país, qual a resposta do presidente Alan García? O governo simplesmente taxou os grevistas de radicais, suicidas e loucos. O governo peruano desde o início colocou a polícia para conter e enfrentar os grevistas. O resultado é uma onda de violência e mortes de civis, provocada, segundo os manifestantes, pelas tropas governamentais.

Na região de Andahuaylas, um protesto de camponeses liderado pela FEDRA (Frente Regional de Defesa Agrária) pedia maiores subsídios ao governo e a eliminação do Imposto Seletivo ao Consumo de Fertilizantes (ISC). No entanto, a polícia reprimiu os manifestantes e o ex-prefeito da cidade de Argama, Jorge Altamirano Morán, foi assassinado à queima-roupa com um tiro de fuzil de tipo FAL, arma de uso exclusivo das forças policiais, que perfurou o pulmão esquerdo do ex-alcaide. Durante o funeral, mais de 3.000 pessoas gritavam nas ruas de Andahuaylas "Alan García, assassino! Polícia, assassina!".

Em Satipo, os confrontos com a polícia deixaram pelo menos um camponês morto e sete feridos a bala, entre eles um adolescente de 14 anos. Na capital, Lima, uma professora de 40 anos morreu com um tiro no enfrentamento com a polícia. Também uma criança de doze anos morreu na cidade andina de Abancay, durante as manifestações. Ali, a polícia acusou, e prendeu, 16 professores pela morte da criança.

Este fato gerou revolta na população, que foi para a frente da Corte Superior de Justiça pedir a imediata libertação dos presos. Em Huaraz, local de destino de escaladores de montanhas de todo o mundo, os confrontos com as forças do governo teriam ferido pelo menos dez policiais e dois camponeses.

Na província de Apurímac os camponeses exigem a renúncia do presidente regional e do alcaide porque, nas palavras dos camponeses, eles "não nos representam junto ao governo central".

Alan García, que está na presidência do Peru a menos de um ano e derrotou nas eleições o pseudo-nacionalista Ollanta Humala, aliado de Hugo Chávez, presidente da vizinha Venezuela, faz um governo pró-EUA e está em vias de passar a fazer parte do Tratado de Livre Comércio (TLC) com os Estados Unidos, juntamente com Colômbia e Equador.

García prometeu ao governo americano um combate rigoroso à produção de folha de coca e, em especial, à transformação dela em cocaína. Segundo o jornal on-line RPP (18/0707), em 2003 havia 44.200 hectares de terras produzindo folhas de coca no país. Em 2004, este número havia passado para 50.300 hectares, um aumento de 14% nas terras de cultivo da folha no Peru.

O jornal diz ainda que, em contraposição a esta política governista de erradicação do plantio da cultura da coca, a região sul-andina de Cuzco oficializou uma ordem que "declara patrimônio regional a coca e também legaliza seu cultivo em um vale para uso tradicional e industrialização".

Este enfrentamento entre as autoridades locais, em especial de governadores provinciais e prefeitos de várias cidades, e o governo central se manifestou também no apoio de várias destas autoridades regionais e locais aos protestos dos grevistas da educação, dos camponeses e trabalhadores em geral.

Muitos presidentes regionais (governadores de províncias) inclusive lideram os movimentos grevistas, como é o caso (entre outros) de Hugo Ordóñez, presidente da província de Tacna, do Partido Nacionalista, e de Ernesto Molina, presidente da província de Ayacucho, ambos de oposição ao governo de Alan García.

Segundo a ministra de Comércio Exterior do Peru, Mercedes Aráoz, com as greves nas regiões turísticas, em especial em Cuzco e Machu Picchu, deixam de circular na economia do país pelo menos 500 mil dólares diários de turistas de todo o mundo que querem conhecer as cidades históricas e os santuários incaicos.

Em resposta a esta rebeldia de autoridades regionais, que vem já de algum tempo, a presidência da república fez aprovar no último dia 26 de abril no congresso, de maioria governista, uma lei que dá faculdades extraordinárias ao presidente Alan García para que este possa legislar por decreto durante 60 dias. Com tais poderes, o governo tornou público no último dia 21 um pacote de medidas contendo onze novas leis que revoga várias leis constitucionais.

Entre estas normas decretadas, inclui-se a proibição dos altos funcionários do Estado (ministros, congressistas, alta direção dos ministérios, presidentes e governadores regionais e alcaides) de participarem das greves ao lado dos manifestantes, sob pena de perda imediata do cargo: "O artigo 220 precisa que os funcionários públicos que desempenham cargos de confiança ou direção serão inabilitados a participarem de uma greve".

Segundo o jurista peruano Aníbal Quiroga, esta medida tem como meta principal calar as autoridades locais, ao mesmo tempo em que "distorce tanto as funções dos presidentes como também o processo de descentralização [político-administrativa]".

Neste pacote de medidas, o presidente também deu carta-branca para que as forças armadas do país possam reprimir violentamente as manifestações grevistas. Segundo o jornal peruano on-line La República, de 23/0707, o Código Penal foi alterado para legalizar a morte de civis pelas forças armadas: "O artigo 20 desta norma estabelece a inimputabilidade para os membros das Forças Armadas ‘que, no cumprimento de seu dever e no uso de suas armas na forma regulamentada, causem lesões ou morte'".

Ainda segundo o jornal, o diretor da Associação dos Direitos Humanos do Peru (Aprodeh), Francisco Soberón, "não se pode exonerar de responsabilidade penal as Forças Armadas antes da realização de suas operações... Isso é atribuição do juiz e dos fiscais que coletam as denúncias contra".

Tais medidas de Alan Garcia, no entanto, foram rechaçadas pelos presidentes regionais de Áncash, Apuríma,c Arequipa, Cajamarca, Cusco, Huánuco, Ica, Lambayeque, Loreto, Moquegua, Puno, Tacna e Ucayali. Estes governadores, juntamente com os prefeitos locais, já se pronunciaram totalmente contrários a tais decretos. As críticas mais duras teriam partido das autoridades de Arequipa, Loreto, Tacna e Ucayali, os quais questionam a constitucionalidade de tais decretos governamentais. O presidente da província de Tacna, Hugo Ordóñez, disse que o pacote de medidas "é de cunho antidemocrático, torna vulnerável o estado de direito e viola a Constituição".

Segundo o advogado penal Mario Amoretti, as medidas tomadas pelo governo de Alan García são "muito preocupantes", pois, quando o governo pediu ao congresso poderes extraordinários para poder legislar por decretos "explicou que era para enfrentar e reprimir o crime organizado, mas a maioria dos artigos deste pacote de leis está direcionada para reprimir aqueles que realizam greves ou protestos".

O advogado diz ainda que algumas destas leis determinam a prisão de até 35 anos para quem dirigir uma greve. Para Amoretti, Alan García teria tomado medidas que nem mesmo Alberto Fujimori (que teria governado o país de forma ditatorial durante a década de 1990) teria decretado: "Nem Fujimori ditou leis tão duras e perigosas" (La República - 23/0707).

Alan García, deste modo, ao proibir todas as principais instâncias do executivo e legislativo peruanos de apoiarem abertamente as greves populares, bem como ao garantir legalmente a não-punição aos militares que matarem grevistas civis, caminha cada vez mais para um governo bonapartista onde todo o poder se concentra nas mãos de um serviçal do grande capital.

No Peru de Alan Garcia, para garantir a irracionalidade do capitalismo e a acumulação de lucros nos bolsos da burguesia, pisar em cima da Constituição, amordaçar a sociedade civil, concentrar todo o poder em mãos do presidente e matar impunemente trabalhadores em greves tornou-se, assim, norma legal.