Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 3 de julho de 2007.
As condições cada vez mais inseguras enfrentadas
pelos mineiros da Austrália foram denunciadas no último
mês, quando mais de 200 trabalhadores empregados nas operações
de minério de ferro da BHP (Billiton em Mount Newman),
no oeste australiano, deram um passo inédito ao elaborar
um manifesto e falar em rede nacional de televisão.
Os trabalhadores entrevistados no dia 11 de junho pelo programa
The 7.30 Report da Australian Broadcasting Corporation
(ABC), afirmaram que eles decidiram chamar a atenção
da população à falta de condições
apropriadas de segurança e a atmosfera de intimidação
mantida pela administração, mesmo sabendo que essa
atitude poderia por em risco os seus empregos.
Há duas décadas, a região mineira de Pilbara,
que produz cerca de 17% do minério de ferro mundial, era
a base mais forte do sindicato. Atualmente, no entanto, a maioria
dos 2.000 trabalhadores do projeto Whaleback, de Mount
Newman, a maior mina de extração de ferro do mundo,
não são sindicalizados, pois 80% dos trabalhadores
são registrados através de contratos estatutários
individuais, conhecidos na Austrália como Acordo de Emprego
Australiano (AWA - Australian Workplace Agreements).
O manifesto declarava: os trabalhadores estão
completamente pressionados, infelizes, desiludidos, frustrados
e desestimulados a fazer qualquer coisa a respeito disso.
Dizia que a moral está baixa e que os trabalhadores
que se posicionaram ou denunciaram práticas de trabalho
inseguras foram tratados pela administração como
bloqueios que dificultam as mudanças.
De acordo com os manifestantes, a BHP Billiton, a maior companhia
de mineração do mundo, não dá opções
aos trabalhadores na assinatura dos AWAs. Allen Zadow, um dos
responsáveis da manutenção, disse ao The
7.30 Report: você não tem escolha. Ou
você assina o acordo ou você não tem o emprego,
é simplesmente isso o que acontece. Em relação
às condições perigosas, Friede Morrison,
que dirige caminhões de 240 toneladas, disse: eu
acho que eles só querem os minérios. A produção
e a segurança ficam em segundo plano. Morrison acrescentou
ainda: existe um acordo de que você não deve
descarregar (o caminhão) à noite sem uma iluminação
adequada. E, você sabe, os trabalhadores descarregam no
escuro porque têm medo de chamar alguém e dizernós
precisamos de luz aqui, aqui não tem luz. Eles têm
medo de parar a produção e por isso eles continuam
descarregando no escuro.
Morrison ainda demonstrou preocupação em relação
à qualidade do treinamento. Eu tive sorte de ser
treinado por alguém que conhecia todos os procedimentos,
e havia trabalhado na mina por muitos e muitos anos e estava apto
a passar uma grande quantidade de informações para
mim. Mas agora temos um monte de pessoas inexperientes treinando
pessoas inexperientes, que estão ali há apenas alguns
meses e de repente tornaram-se orientadores. Eu me preocupo muito
com isso.
O manifesto foi pensado e encampado por Gracy Martin, um supervisor
que ouviu as preocupações de sua equipe em relação
às condições de trabalho e às intimidações
da administração. Martin disse: eu pensava
simplesmente em ir embora. É normal que quando você
não está satisfeito com o desenvolvimento de um
trabalho você peça as contas. Mas se eu fosse embora
e visse nos jornais que alguém havia se ferido gravemente
ou morrido aqui, eu me sentiria realmente mal com isso.
Existe uma pressão constante para que se aumente a produção
a qualquer custo. Estatísticas publicadas recentemente
mostram que, no oeste australiano, os projetos de mineração
e energia rendem $80 milhões por dia. As crescentes exportações
para a China são uma das causas. No dia 19 de junho, o
Australian Financial Review noticiou que, até abril,
as exportações do oeste australiano para a China
foram de $13,3 bilhões, um aumento de 41% em relação
ao ano passado, 317% em relação aos últimos
cinco anos e 966% em relação a uma década.
Riquezas e lucros enormes estão sendo gerados para os
magnatas e para as companhias. Gina Reinehart, que herdou reservas
de mineração de ferro de seu pai, Lang Hancock,
mais do que dobrou sua fortuna, que totalizou $4bilhões
no ano passado, de acordo com a lista de ricos de 2007 da Business
Review Weekly. Reinehart aumentou substancialmente a sua fortuna
depois de assinar um acordo com a gigante da mineração
Rio Tinto para desenvolver o projeto Hope Downs a um custo
de $1,3 bilhão.
De maneira semelhante, Andrew Forest, do Grupo Fortescue
Metals, passou ao quinto lugar da lista dos mais ricos da
Austrália, aumentando a sua riqueza de $810 milhões
no ano passado para $3,89 bilhões, sem contar que a sua
companhia ainda vai extrair algo de seu projeto Chichester de
$3,7 bilhões. Ela deve começar a exportar em meados
de maio de 2008.
O esforço exigido pela Fortescue para alcançar
essa meta contribuiu para que ocorressem duas mortes em uma de
suas estradas de ferro, em março deste ano. Apesar de ter
sido avisada a respeito da probabilidade da ocorrência de
um ciclone de categoria 4, a direção da companhia
se recusou a retirar os trabalhadores da área. Suas precárias
acomodações foram totalmente destruídas e
dois trabalhadores morreram. Muitos dos trabalhadores não
tinham experiência com a ocorrência de ciclones. Eles
vinham dos estados do leste australiano com a esperança
de ganhar salários mais altos na região das minas.
Os líderes do sindicato apoiaram o manifesto dos trabalhadores
da BHP que denuncia os AWAs, abrindo uma campanha contra as leis
de relações industriais (WorkChoices) do
governo Howard (do partido liberal) e pela eleição
do partido trabalhista este ano. O secretário do Conselho
Australiano dos Sindicatos (ACTU - Australian Council of Trade
Unions) e candidato federal pelo partido trabalhista, Greg
Combet, disse: o problema com os AWAs é que eles
deixam as pessoas isoladas contra uma companhia de mineração
internacional.
Há mais de duas décadas, o ACTU e seus sindicatos
filiados têm servido como instrumentos para quebrar a resistência
dos trabalhadores às condições inseguras
e opressivas, como os turnos de 12 horas, a produção
ininterrupta e a proibição das greves. Os ataques
iniciaram nos anos 80, por meio dos acordos assinados entre o
ACTU e o governo trabalhista de Hawke, que estabeleciam os preços
e os salários.
A oposição do sindicato aos AWAs não está
baseada em princípios com o objetivo de melhorar as condições
dos trabalhadores, mas no risco de perder completamente a função
de negociador e, conseqüentemente, os salários dos
seus dirigentes. Os acordos sindicais coletivos assinados pelos
sindicatos sempre representaram um meio de aumentar os lucros
e a competitividade internacional das companhias.
Num recente exemplo, no dia 22 de março, o Sindicato
da Construção, da Mineração e dos
Trabalhos Florestais (CFMEU - Construction, Mining, Forestry
and Mining Union) publicou um comunicado em seu website
segundo o qual números oficiais (do instituto
australiano de estatística) sobre a indústria de
mineração mostraram claramente (mais uma vez) que
a produtividade cresce em níveis muito mais altos quando
há negociações coletivas do que mediante
os AWAs.
A obrigatoriedade de contratos individuais na relação
entre a BHP e os trabalhadores, estabelecida em 1999, deu início
a uma dura e prolongada luta. Os trabalhadores realizaram uma
greve nas plantas da BHP em Pilbara, mas o propósito da
campanha do ACTU se restringia a pressionar a companhia a não
exigir o aumento no ritmo da produção. Depois que
a polícia atacou violentamente os trabalhadores que realizavam
um piquete nas minas de Mount Newman e Port Hedland, o ACTU organizou
piquetes pacíficos, que não impediam
a entrada de ninguém nas minas. Com isso, o sindicato conseguiu
acabar com a greve. Num encontro realizado em janeiro de 2000,
o sindicato se recusou a organizar uma greve nacional em todas
as minas da BHP a partir dos trabalhadores de Pilbara.
Desde então, a cumplicidade desses sindicatos somente
se aprofundou. Eles estão exigindo que os trabalhadores
parem com qualquer tipo de greve a fim de facilitar a eleição
do partido trabalhista, apesar deste partido ter prometido manter
todos os AWAs, uma política que garantiria os contratos
individuais nas minas pelo menos até 2013. O partido trabalhista
e os sindicatos não discordam das companhias como a BHP
na sua busca desenfreada por lucros e pelo aumento da competitividade,
diante das condições da produção globalizada.