Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 11 de Janeiro de 2005.
No fim de semana de 8 e 9 de Janeiro, 2005, o Partido da
Igualdade Socialista (SEP) organizou um encontro nacional em Ann
Arbor, Michigan. Esta é a segunda das três partes
do relato de abertura feito por David North, o secretário
nacional do SEP e presidente da comissão editorial do Site
Socialista de Interligação Mundial(wsws.org).
Completando exatamente 20 anos nesta semana, em janeiro de
1985, delegados de várias seções do Comitê
Internacional da Quarta Internacional (CIQI) viajaram à
Inglaterra para participar do 10º Congresso do Comitê
Internacional, que acabou sendo o último congresso internacional
presidido pelo Partido Revolucionário dos Trabalhadores
da Grã-Bretanha (WRP), liderado por Gerry Healy, Cliff
Slaughter e Michael Banda.
Uma crise política se levantava dentro do movimento
internacional por mais de uma década até então.
Durante os três anos anteriores, o esforço em discutir
e examinar concepções filosóficas errôneas
e sérios erros na linha política do Comitê
Internacional havia sido reprimido pela liderança do WRP.
Quando o CIQI se reuniu em janeiro de 1985, o movimento mundial
inteiro estava perigosamente desorientado, e o Partido Revolucionário
dos Trabalhadores estava na pior forma possível. O esboço
da resolução de perspectivas preparado por Slaughter
buscava mascarar sua vacuidade analítica com uma retórica
bombástica. Em passagem sintomática disso, proclamava:
As leis objetivas do declínio capitalista agora operam
sem empecilhos, elas avançaram.. Se isso fosse verdade,
significaria então que teria surgido uma situação
não somente sem precedentes na história do capitalismo
como também uma que o próprio Marx teria considerado
teórica e praticamente impossível.
Afirmar que as leis do declínio capitalista operavam
sem empecilhos só poderia significar que: 1)
toda resistência subjetiva a esse declínio da parte
da própria burguesia teria chegado a um fim e, 2)até
mesmo aquelas contra-tendências balanceadoras que emergem
naturalmente de dentro dos processos do próprio capitalismo
para atenuar, quando não reverter inteiramente, o declínio
já se tornaram totalmente inoperantes. Em outras palavras,
a dialética socioeconômica do capitalismo como um
sistema histórico teria simplesmente se acabado.
Uma outra passagem dizia que A realidade é que
as batalhas revolucionárias decisivas já estão
sendo travadas . Mesmo com essas palavras fluindo do bico
da caneta tinteiro de Cliff Slaughter, havia sinais inconfundíveis
de que a classe trabalhadora estava em recuo por todo o mundo.
Se fosse verdade que as batalhas revolucionárias
decisivas estavam em progresso, seríamos então
forçados a reconhecer que elas teriam sido perdidas.
De forma semelhante, intoxicado por sua própria retórica,
Slaughter declarava que O proletariado dos Estados Unidos,
nunca derrotado, entra em lutas de natureza revolucionária
juntamente com proletários do restante do mundo.
A rigor, a classe trabalhadora dos Estado Unidos havia passado
pela experiência de uma série de grandes derrotas
desde que Reagan chegara à Casa Branca quatro anos antes.
Traídos e desencorajados, as atividades de greve haviam
caído ao menor número em décadas.
O fato de tais passagens poderem ser apresentadas como uma
contribuição séria à elaboração
das perspectivas revolucionárias comprovava o atordoamento
teórico e a falência política dos líderes
do WRP.
Dada a extraordinária história política
dos líderes do Partido Revolucionário dos Trabalhadores,
principalmente a de Gerry Healy, a situação na qual
eles haviam chegado era profundamente trágica. A participação
de Healy no movimento revolucionário se alastrava por mais
de meio século, ele cumpriu um papel importante como apoiador
de James P. Cannon na luta internacional contra o revisionismo
Pablista que levou à fundação do Comitê
Internacional da Quarta internacional em 1953. Durante a década
seguinte, Healy resistiu aos deslizes do Partido Socialista dos
Trabalhadores (SWP) nos Estados unidos e se opôs a seus
esquemas de reunificação sem princípios com
o movimento Pablista. A sobrevivência do Comitê Internacional,
em face de condições políticas extremamente
desfavoráveis, deu-se principalmente graças à
defesa incansável de Healy dos princípios trotskistas.
Sem a luta que ele liderou, a Liga dos Trabalhadores (precursora
do Partido Socialista da Igualdade) nunca haveria surgido.
Além disso, é em grande parte graças aos
esforços de Healy que o Comitê Internacional, principalmente
após o rompimento com o SWP em 1963, prestou atenção
especial aos sinais de uma crescente crise econômica dentro
do capitalismo mundial. Em contraste com os pablistas, cujas políticas
oportunistas refletiam sua própria fé profunda na
estabilidade do capitalismo pós-guerra, o Comitê
Internacional da Quarta Internacional acompanhou de perto os sinais
de que os fundamentos financeiros e monetários do capitalismo
mundial lançados no final da 2ª guerra estavam sob
intensa pressão. O Comitê Internacional se encontrava,
então, em uma posição de compreender até
mesmo as implicações políticas e econômicas
de longo alcance e as implicações políticas
das decisões feitas pela administração de
Nixon em 1971, as quais trouxeram um fim abrupto aos Anos
Dourados do capitalismo pós-guerra.
Na noite de domingo de 15 de agosto de 1971, o presidente Richard
M. Nixon foi à TV nacionalmente anunciar que estava tomando
uma série de medidas econômicas em resposta à
deterioração profunda das balanças comercial
e de pagamentos dos Estados Unidos, assim como aos sinais de crescente
pressão inflacionária. Ele anunciou que os Estados
Unidos não iriam mais honrar sua obrigação,
de acordo com as regras do sistema monetário internacional
que haviam se estabelecido após a conferência de
Bretton Woods de julho de 1944, de converter em ouro de acordo
com a demanda os dólares detidos por seus parceiros comerciais
internacionais. Esse desenvolvimento passou em grande parte desapercebido
pelos pablistas. Para o Comitê Internacional, no entanto,
ele representou o desenvolvimento econômico mais significativo
desde o fim da segunda guerra e abriu caminho para um enorme aprofundamento
da crise econômica mundial e para a intensificação
do conflito internacional de classes. No coração
desse conflito encontrava-se a deterioração da posição
mundial do capitalismo americano.
Em sua análise desse desenvolvimento, o CIQI reviu a
significância do sistema econômico internacional cujas
bases foram fundadas na conferência de Bretton Woods em
1944, durante o estágio final da segunda guerra mundial.
Fora dos Estados Unidos, os velhos poderes burgueses estavam arruinados.
A burguesia francesa estava politicamente desacreditada e seu
sistema financeiro havia estremecido. O regime de Hitler afundou
o capitalismo alemão no abismo e o país inteiro
estava em chamas. Os custos da 2a Guerra, que seguiu a primeira
com um intervalo de apenas 20 anos, haviam levado a Grã-Bretanha
à falência. Por toda a Europa, a classe trabalhadora
havia tomado a ofensiva contra o fascismo e a barbárie
imperialista, o desejo popular pelo estabelecimento revolucionário
em lugar do capitalismo era impressionante. Uma situação
parecida estava na ordem do dia no Japão, onde a guerra
caminhava rapidamente ao seu horrível desenlace. Ao redor
da Ásia, África e Oriente Médio, a onda de
lutas anti-coloniais e antiimperialistas crescia.
Em meio ao caos da guerra, os Estados Unidos se mantinham como
o grande sustentáculo do capitalismo. A guerra havia quebrado
todos os seus competidores internacionais, e o país estava
numa posição de ditar a seus rivais humilhados a
ordem econômica mundial que emergiria das cinzas da guerra.
A classe dominante americana, no entanto, entendeu muito bem que
seu destino dependia da sobrevivência do capitalismo na
Europa. Se a onda revolucionária pós-guerra varresse
o continente europeu, estabelecendo o poder da classe trabalhadora
nos velhos centros do capitalismo, o destino final de um capitalismo
americano isolado estaria selado. Portanto, em uma série
de decisões tomadas com uma visão de longo alcance,
a classe dominante americana resolveu mobilizar seus imensos recursos
industriais e financeiros para estabilizar e reconstruir o sistema
capitalista mundial. O fundamento desse plano econômico
envolvia a criação de um novo sistema monetário
internacional, que providenciaria os recursos necessários
para o restabelecimento do comércio mundial (após
a interrupção de uma década causada pela
depressão e pela guerra) e para a reconstrução
da Europa e do Japão.
Os desastres financeiros do pós 1ª Guerra haviam
convencido os Estados Unidos que a expansão do comércio
mundial e que a reconstrução do capitalismo mundial
eram incompatíveis com o regime de restrição
de créditos do velho padrão do ouro. Porém,
o que poderia substituir o ouro como um primeiro instrumento de
crédito e comércio? A resposta simples seria o papel-moeda
americano.
Sob as leis estabelecidas pelo novo Fundo Monetário
Internacional, criado em 1947, o dólar americano serviria
como a principal moeda reserva, isto é, como uma moeda
através da qual ocorre a transação de um
grande volume de comércio internacional. Todas as moedas
internacionais teriam seus valores calculados em termos do dólar.
Por sua vez, o dólar teria seu valor definido em relação
ao ouro, para ser preciso, 35 dólares equivalia a uma onça.
Por detrás desses arranjos estavam dois importantes
fatores: primeiro, uma porção substancial do suprimento
mundial de ouro era guardado nos cofres de Fort Knox, Kentucky;
segundo, e mais importante, a supremacia industrial dos Estados
Unidos após a segunda guerra garantiu que suas balanças
comerciais registrariam um grande superávit. Os dólares
investidos ou transferidos ao exterior eram repatriados eventualmente
quando países estrangeiros consumiam produtos e serviços
americanos.
Portanto, o sistema monetário do pós-guerra,
um sistema baseado no dólar e ancorado no ouro, era uma
expressão da supremacia global dos Estados Unidos dentro
das relações capitalistas. Até onde se possa
falar de uma era de hegemonia americana, esta foi o período
definido pela operação do sistema monetário
internacional Bretton Woods baseado no dólar.
No entanto, o sistema Bretton Woods continha em si mesmo uma
contradição fatal: o sucesso de sua operação
tinha suas premissas na habilidade dos Estados Unidos manterem
o saldo positivo em sua balança comercial e de pagamentos,
ao mesmo tempo em que providenciava capital à Europa e
Japão para reconstruir suas indústrias e oferecia
mercado às exportações desses países.
Era inevitável que o ressurgimento das indústrias
européias e japonesas iriam subjugar a supremacia uma vez
inquestionável dos Estados Unidos nos mercados mundiais
e ter um impacto em sua balança comercial e de pagamentos.
A acumulação resultante de dólares no exterior,
a qual cresceria até ser substancialmente acima do valor
das reservas de ouro detidas nos EUA, chegariaem algum momento
a questionar a viabilidade do sistema Bretton Woods. Um economista
europeu, Robert Triffin, chamou atenção a essa contradição
no final dos anos 50. Nos meados da década de 60, era visivelmente
aparente que as pressões sobre o sistema se tornavam mais
sérias. A crise foi exacerbada pelo aumento na pressão
financeira no orçamento americano causado pelo custo da
guerra no Vietnã e pelo financiamento de novos programas
sociais concedidos pela classe dominante americana em face às
lutas das massas.
Como havia antecipado o CIQI, a quebra do sistema Bretton Woods
tinha conseqüências econômicas, políticas
e sociais de longo alcance. As relações econômicas
internacionais estavam desestabilizadas a um nível desconhecido
desde a década de 30. O velho sistema de taxas de câmbio
fixas deu lugar a um novo e imprevisível sistema baseado
em moedas flutuantes, com o valor de cada moeda nacional sendo
determinado pelo mercado. Quanto ao dólar, não mais
conversível em ouro a um preço fixo, este entrou
em um processo de declínio prolongado, sua desvalorização
levou quase que imediatamente a um estouro na inflação
global e a um colapso nos valores de ações nos mercados
acionários. Até 1973, o capitalismo mundial havia
confrontado a combinação mais perigosa de crises
econômicas e políticas desde os anos 30.
Esses acontecimentos substanciaram a análise que o Comitê
Internacional havia feito da crise global do capitalismo. Os anos
70 foram uma década que testemunhou um levante revolucionário
da classe trabalhadora. Em resposta à inflação,
a classe foi à ofensiva: a greve dos mineiros britânicos
no inverno de 1973-74 forçou a renúncia do governo
Tory (Partido Conservador); em abril de 1974, caiu a ditadura
fascista de Portugal, seguida pela queda da ditadura militar do
General Papadopoulos na Grécia. Um mês depois, em
agosto de 1974, Richard Nixon renunciou à presidência;
menos de um ano depois, entre abril e maio de 1975, a guerra imperialista
no Vietnã e na Camboja chegou a um fim humilhante.
Mas esse levante foi prejudicado pelas políticas contra-revolucionárias
das burocracias stalinistas e social-democratas no movimento internacional
dos trabalhadores. Até mesmo no Irã, onde as greves
dos petroleiros ao fim de 1978 foram decisivas no enfraquecimento
do regime do Xá (que havia sido instalado pela CIA em 1953),
as políticas stalinistas preveniram a vitória de
uma revolução socialista. Ao invés disso,
o poder caiu nas mãos das forças religiosas e nacionalistas.
As traições das lutas da classe trabalhadora providenciaram
ao imperialismo o tempo necessário para planejar sua própria
estratégia contra-revolucionária e ir à ofensiva
contra a classe trabalhadora.
Enquanto a maré política virava, o Partido Revolucionário
dos Trabalhadores da Grã-Bretanha (WRP) falhou em fazer
uma nova análise da situação e introduzir
as mudanças necessárias em sua própria prática.
Cliff Slaughter havia avisado diversas vezes às seções
do CIQI: Quando suas perspectivas não forem confirmadas,
é necessário revê-las. Porém,
o WRP não seguiu seu próprio conselho e foi incapaz
de adaptar sua prática à virada na situação
política. Quando as perspectivas para a revolução
socialista se apagaram, o WRP buscou manter sua força organizacional
na base de relações novas e oportunistas com seções
da burocracia trabalhista britânica e movimentos nacionais
burgueses na África e no Oriente Médio. Voltando
suas costas às lições da longa luta contra
o revisionismo do CIQI, o WRP desenvolveu uma linha política
que se assemelhava cada vez mais com aquela dos pablistas. E,
além disso, em sua fixação unilateral pelo
que foi percebido por Healy como sendo os imperativos organizativos
do WRP, a linha da seção britânica assumiu
uma orientação cada vez mais nacionalista. O trabalho
do CIQI como um partido internacional ficou cada vez mais subordinado
às atividades de construção do partido
nacional do WRP.
A crise que surgiu dentro do WRP no verão e outono de
1985 era o resultado inevitável de seu prolongado afastamento
dos princípios trotskistas e da desorientação
política conseqüente daquela traição.
O WRP chegara a valorizar mais suas diversas alianças com
burocratas trabalhistas, nacionalistas burgueses e radicais pequeno-burgueses
do que as relações fraternas com seus camaradas
e co-pensadores dentro do CIQI. Até mesmo no outono de
1985, enquanto o partido se encontrava entre os destroços
provocados por suas políticas desastrosas, membros do WRP
se vangloriavam descaradamente de seus novos laços com
várias tendências antitrotskistas. Em um encontro
público em Londres, Slaughter ofereceu sua mão ostensivamente
a Monty Johnstone, um dos representantes mais notórios
do Partido Comunista Britânico.
Por debaixo dessas ações se encontrava uma análise
completamente falsa da situação política
internacional. Em nenhum momento ocorreu a qualquer dirigente
do WRP que as diversas organizações reformistas
e oportunistas que eles cortejavam estavam elas mesmas à
beira de um desastre. Tendo abandonado o trabalho sério
e sistemático sobre as perspectivas internacionais, o WRP
havia falhado completamente em tomar ciência das novas tendências
na economia capitalista mundial, quanto mais em considerar suas
implicações no desenvolvimento da luta de classes
internacional.
Após o rompimento com o WRP em fevereiro de 1986, o
Comitê Internacional enfrentou duas tarefas teóricas
cruciais e inter-relacionadas. A primeira foi fazer uma análise
detalhada das raízes da traição ao trotsquismo
perpetrada pelo WRP e responder a seu ataque à história
da Quarta Internacional. A segunda era de retomar o trabalho crítico
de perspectivas que havia sido abandonado pelo WRP. A crítica
ao WRP e a nova avaliação da história da
Quarta Internacional possibilitou que o Comitê Internacional
restabelecesse suas ligações históricas com
a herança programática inteira do movimento trotskista,
considerada desde a fundação da Oposição
de Esquerda em 1923. Ao mesmo tempo, a retomada do trabalho sistemático
sobre as perspectivas internacionais era necessária a fim
de reorientar o trabalho do CIQI de acordo com as tendências
objetivas reais de desenvolvimento da economia capitalista mundial.
Na quarta plenária do Comitê Internacional em
julho de 1987, a seguinte questão foi colocada: de quais
tendências do desenvolvimento da economia mundial e da luta
de classes internacional a Quarta Internacional é necessariamente
uma expressão? Considerada historicamente, havia relações
profundas entre o desenvolvimento das forças produtivas
do capitalismo em escala mundial, seu impacto correspondente no
crescimento da classe trabalhadora como uma força social,
e as formas políticas através das quais essas tendências
socioeconômicas objetivas encontravam expressão no
desenvolvimento histórico do movimento marxista internacional.
A fundação da Primeira Internacional em meados
de 1860 foi a antecipação política da emergência
de um proletariado internacional nas bases da expansão
da indústria capitalista e do comércio em escala
mundial. As formas ainda imaturas desse processo social e econômico
foram insuficientes para sustentar os esforços da Primeira
Internacional, que parou com suas atividades práticas no
meio da década de 1870. No entanto, dentro de menos de
duas décadas, o crescimento extraordinariamente rápido
da indústria na Europa ocidental e na América do
Norte estimulou o desenvolvimento de um novo proletariado industrial
e, junto com isso, seu movimento em direção a uma
organização política independente. Ao mesmo
tempo, a expansão do sistema colonial atraía massas
no mundo todo ao vértice do desenvolvimento capitalista
internacional.
A fundação da Segunda Internacional em 1889 refletiu
esse novo estágio no desenvolvimento capitalista e seu
crescimento resultante no tamanho e na significância econômica
da nova classe trabalhadora industrial. Durante o próximo
quarto de século, o desenvolvimento da Segunda Internacional
foi ligado à expansão da indústria capitalista.
Enquanto esse processo era, em essência, internacional,
a forma dominante de sua expressão era o crescimento das
poderosas economias industriais nacionais e a emergência
de fortes organizações trabalhistas nacionais. De
fato, a Segunda Internacional mantinha a perspectiva de solidariedade
da classe trabalhadora internacional, mas o trabalho prático
de suas seções era profundamente embasado nos fundamentos
da indústria nacional, e, quando adentrou a segunda década
do século XX, ela falhou em considerar a medida em que
a crescente ameaça do militarismo imperialista refletia
a erosão da soberania das economias nacionais sob pressão
da economia mundial.
O estourar da 1ª Guerra, o colapso da Segunda Internacional
e a emergência da Terceira Internacional foram as expressões
fundamentais dessa mudança. Como explicou Trotsky:
Em 4 de Agosto de 1914 soou a hora final dos programas
nacionais de todos os tipos. O partido revolucionário do
proletariado só pode se basear em um programa internacional
correspondente ao caráter da época atual, a época
do mais alto desenvolvimento e colapso do capitalismo. Um programa
comunista internacional não é de maneira alguma
a soma total de programas nacionais nem um amálgama de
suas características comuns. O programa internacional deve
proceder diretamente de uma análise das condições
e tendências da economia mundial e do sistema político
mundial levados em consideração como um todo em
todas as suas contradições e conexões, isto
é, com a interdependência mutuamente antagônica
de suas partes separadas. Na época presente, a um nível
muito maior do que no passado, a orientação nacional
do proletariado deve e pode seguir somente uma orientação
mundial e não vice-versa. Aqui jaz a diferença básica
e primordial entre o internacionalismo comunista e todas as variedades
de nacional-socialismo (The Third International After
Lenin (London, 1974), pp. 3-4).
Quando Trotsky escreveu essas palavras em 1928, a concepção
de que a economia mundial formava a base essencial sobre a qual
a estratégia revolucionária deveria se desenvolver
já se encontrava sob ataque dentro da Internacional Comunista.
O programa stalinista do socialismo em um só país
era a antípoda do internacionalismo que constituía
a base estratégica da conquista de poder pelo Partido Bolchevique
em 1917. A concepção stalinista de que o desenvolvimento
da economia nacional soviética seria o determinante decisivo
e primordial do sucesso do projeto socialista na URSS representou
um retorno à posição nacionalista que havia
prevalecido na Segunda Internacional. É bom notar que a
perspectiva de Stalin encontrava uma resposta dentro das lideranças
de muitas seções da Internacional Comunista, que
dividiam sua concepção de que as condições
nacionais imediatas encontradas pela classe trabalhadora em cada
país específico deveriam formar o verdadeiro ponto
de partida da atividade prática.
Dentre aqueles que não apenas defendiam a orientação
nacionalista de Stalin, mas também buscavam justificá-la
teórica e politicamente estava Antônio Gramsci.Com
razão, escreveu ele,a linha de desenvolvimento
é em direção ao internacionalismo, mas o
ponto de partida é nacional e é desse
ponto de partida que se deve começar (Prison Notebooks
(New York, 1971), p. 240). Sob a luz da história subseqüente
do Partido Comunista da Itália, o qual resgatou a burguesia
e o capitalismo italiano após o colapso do regime de Mussolini
e se transformou em um partido nacional reformista par excellence,
as implicações políticas da posição
de Gramsci ficaram explícitas. Não é surpresa
que os stalinistas italianos abraçaram a memória
de Gramsci, que morrera nos anos 30 em decorrência de abusos
sofridos nas mãos dos fascistas, e o honraram como sua
inspiração teórica.
A Quarta Internacional foi fundada por Trotsky em resposta
à degeneração stalinista da 3ª Internacional.
A explosão da 2ª Guerra imperialista demonstrou da
maneira mais trágica a primazia da economia mundial e da
política mundial. No entanto, paradoxalmente, a restabilização
do capitalismo depois da guerra, nas premissas de Bretton woods,
levou a um ressurgimento do programa de reformismo nacional no
movimento trabalhista internacional.
A renovada expansão do comércio mundial, o crescimento
nos PIBs de economias capitalistas nacionais e até mesmo
o extraordinário aumento na qualidade de vida na União
Soviética durante os anos 50 e 60 trouxeram aos partidos
reformistas, incluindo às organizações stalinistas,
um novo sopro de vida. Mas por mais impressionante que fosse o
crescimento nos PIBs e até mesmo nos padrões de
vida durante o período, esse período provou não
ser nada além de uma prolongada bonança do reformismo
nacional. A quebra do sistema Bretton Woods e o início
de uma prolongada crise econômica caracterizada por surtos
decorrentes de inflação, recessão, desemprego
crescente e uma queda contínua da lucratividade, junto
com uma virada da burguesia, mais notável nos Estados Unidos
e na Grã-Bretanha, em contra-ofensiva à classe trabalhadora,
levou à falência total do reformismo nacional como
uma política viável.
Foi sob essas condições, no verão de 1987,
que o Comitê Internacional começou as preparações
para fazer uma nova resolução de perspectivas. Para
responder à questão posta no início dessa
discussão na quarta plenária, o Comitê Internacional
dirigiu sua atenção ao estudo das novas formas de
produção capitalista que emergiram durante o fim
dos anos 70 e início dos 80, facilitadas pelos desenvolvimentos
na tecnologia de computação e pela disponibilidade
de formas mais rápidas e baratas de transporte e comunicação.
A criação da corporação transnacional
representou um avanço qualitativo na integração
global da produção e nas finanças capitalistas.
Esse desenvolvimento elevou a um nível de tensão
sem precedentes a contradição histórica entre
economia mundial e o sistema de Estado nacional dentro do qual
o capitalismo era enraizado historicamente, o qual permanece como
a unidade básica de organização política.
Uma solução revolucionária a essa crise
só poderia ser encontrada nas bases do internacionalismo
socialista, isto é, através da unificação
prática e política da classe trabalhadora internacional.
Nenhum dos partidos e organizações de orientação
nacional existentes, sejam eles stalinistas, social-democratas
ou trabalhistas reformistas, poderia solucionar a crise. Realmente,
a interminável série de derrotas que eles haviam
sofrido nos períodos recentes advinha inevitavelmente da
total impotência de sua orientação nacional
em face das novas formas de organização capitalista
internacional. Somente o programa internacional do Comitê
Internacional correspondia ao desafio imposto à classe
trabalhadora pela integração global do capitalismo.