Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 6 de julho de 2007.
O número de dias de trabalho parados devido às
greves na Alemanha nos seis primeiros meses de 2007 é uma
vez e meia mais alta do que a média anual dos últimos
dez anos. Se os protestos continuarem no mesmo ritmo, esse número
será muito maior no final do ano.
A crescente disposição à realização
de greves demonstra que amplas camadas da população
trabalhadora não aceitarão mais os ataques às
suas condições de vida e direitos sociais
ataques que têm se repetido há mais de duas décadas.
Uma certa mudança de direção na economia
alemã, marcada pelo aumento dos lucros e pelo aumento desordenado
dos salários dos administradores, estimulou os trabalhadores
a exigir a reposição de parte do salário
que perderam nos últimos anos. A greve de seis semanas
na Deutsche Telekom e a recente greve dos trabalhadores
ferroviários é somente a ponta do iceberg.
Os sindicatos têm assumido com todas as suas forças
a tarefa de bloquear a militância dos trabalhadores e as
greves. O contrato assinado no último fim de semana pelo
sindicato Verdi com a Deutsche Telekom é uma escandalosa
traição. Qualquer sindicato que assine um acordo
como aquele perde completamente o direito de se reivindicar uma
organização que defende o direito de seus membros.
O sindicato é, na realidade, nada mais que um instrumento
disciplinador controlado pela administração das
empresas e uma camisa-de-força para os seus associados,
que não somente têm seus salários roubados,
mas também têm que pagar para a manutenção
do sindicato.
Em meados de maio, 96% dos trabalhadores da Telekom afetados
pelos novos planos da administração votaram a favor
da greve, recebendo amplo apoio popular. A resposta do Verdi foi
restringir a greve a ações localizadas e de curto
prazo, que não trouxeram danos reais à companhia.
Durante seis semanas o sindicato dirigiu a greve de maneira a
torná-la a mais ineficiente possível, isolando permanentemente
os grevistas. Ao final, o Verdi assinou um acordo que correspondia
à proposta imposta pela direção da Telekom.
O acordo impôs cortes de 6,5% dos salários e quatro
horas de trabalho adicionais por semana, sem pagamento adicional,
a 50.000 trabalhadores, e uma redução salarial de
cerca de 25% aos novos empregados. O acordo é único
na historia do pós-guerra na Alemanha. Algo semelhante
só ocorreu nos dias finais da República de Weimar,
no início da década de 1930. Àquele tempo,
o governo utilizou-se do parágrafo 48 da constituição
os decretos emergenciais do presidente do Reich
de forma a implementar ataques similares aos salários e
às condições de vida dos trabalhadores.
Agora, na disputa dos trabalhadores ferroviários que
começou na segunda-feira (02), os dois principais sindicatos,
Transnet e GDBA, estão prontos para seguir os passos do
Verdi.
A promíscua relação entre administradores,
funcionários do sindicato e políticos do Partido
Social Democrata é algo comum, tanto na companhia ferroviária
alemã (Deutsche Bahn DB) como na Telekom.
Os executivos de ambas as companhias são representantes
da administração e do sindicato. Na verdade, os
dirigentes do sindicato e do conselho de trabalhadores ocupam
metade dos assentos.
Muitos daqueles que estão do lado dos patrões
são membros do SPD. O presidente do quadro da DB é
Werner Muller, o ministro da economia no antigo governo de coalizão
entre o SPD e o partido verde, enquanto na Telekom, todas as decisões
importantes passam pelo crivo do ministro das finanças,
Peer Steinbrück (SPD) e do ministro do trabalho, Franz Müntefering
(SPD). Na DB, o ministro dos transportes, Wolfgang Tiefensee,
(também do SPD) supervisiona todas as grandes decisões.
Essa rede de corrupção, controlada pelo SPD,
é impenetrável. As decisões são feitas
a portas fechadas muito antes que a população ouça
falar delas. A exigência do Transnet/GDBA por um reajuste
salarial de 7% não recupera, nem de perto, as perdas dos
últimos anos. No entanto, todos sabem que os sindicatos
estão dispostos a firmarem acordos. Por isso,
é evidente que o resultado final, se depender dos sindicatos,
será negativo para os trabalhadores ferroviários.
Entretanto, os dirigentes do Transnet têm um problema,
pois os militantes condutores de trens estão organizados
em seu próprio sindicato, o GDL. Esse sindicato, que é
relativamente pequeno, optou, há seis anos, por um acordo
contratual com os outros seis sindicatos, aceitando uma série
de concessões firmadas pelo Transnet e pelo GDBA.
Atualmente, o GDL está exigindo um reajuste salarial
de mais de 31%. Na terça-feira, ele demonstrou que é
possível organizar greves efetivas, ao contrário
das ações limitadas do Transnet e do GDBA. Os condutores
de trens paralisaram grande parte das redes ferroviárias
do país por um período de quatro horas.
Esse tipo de ação é bem vinda. A acusação
do Transner, de que o GDL não teria solidariedade
com os outros ferroviários, é completamente cínica.
Alguém que rompe uma camisa de força que aprisiona
os outros está rompendo bloqueios, e não a solidariedade.
O resultado imediato dessa ação do GDL foi o
de mostrar a toda a população a remuneração
miserável recebida pelos trabalhadores das ferrovias. Por
meio dessa ação, ficou claro, entre outras coisas,
que os condutores altamente qualificados de um moderno expresso
de alta velocidade, que custa milhões, não ganham
mais do que os trabalhadores menos qualificados.
Mesmo o jornal Süddeutsche Zeitung, que dificilmente
poderia ser acusado de ter simpatias com a esquerda, comentou
na seção de economia: quem está preparado
para trabalhar a qualquer hora, realizando turnos, trabalhando
às vezes de manhã, às vezes de tarde ou de
noite, por 2.100 euros (líquidos) por mês, e ainda
com turnos regulares nos finais de semana? De acordo com a companhia
ferroviária, um condutor de trem casado recebe, na média,
2.100 euros... incluindo férias, natal e outros pagamentos
extras. Isso mal dá para sustentar uma família,
sobretudo em regiões centrais, onde os aluguéis
são mais caros.
A exigência feita pelo GDL por um salário inicial
de 2.500 euros bruto não é nada extraordinário.
Ao mesmo tempo, contudo, o GDL representa um limitado número
de trabalhadores, os quais, isolados, não têm força
para conquistar esta reivindicação. O sindicato,
que tem apoiado cortes sociais no passado, não será
capaz de conter a pressão exercida de todos os lados sobre
seus associados. Como foi o caso no ano passado com o sindicato
dos médicos, a Marburger Federation, a burocracia
do GDL concordará inevitavelmente com um compromisso podre
para assegurar seus próprios interesses.
Os trabalhadores ferroviários não estão
apenas enfrentando uma administração que poderia,
eventualmente, recuar sob forte pressão. O presidente da
DB, Hartmut Mehdorn, tem o apoio da grande coalizão do
governo alemão, formada pelo SPD, pela União Cristã
Democrata e pela União Social Cristã, que está
determinada a desnacionalizar completamente as ferrovias para
atender os interesses do grande capital.
É cada vez mais evidente a conexão existente
entre a política do governo e os ataques aos salários
e às condições de trabalho. Com esses cruéis
cortes nos benefícios sociais (as leis Hartz), o governo
anterior, do SPD-Partido Verde, liderado por Gerhard Schröder
(SPD), criou as condições para demitir os trabalhadores
melhor qualificados e mais bem pagos. Desde então, a atual
grande coalizão governamental avançou na ofensiva
contra o estado de bem-estar social, e os patrões têm
aproveitado as ameaças de demissão e a lei Hartz
para impor massivos cortes salariais, jornadas de trabalho mais
longas e ataques às condições sociais.
Somente um amplo movimento político, apoiado
em amplos setores da população operários
e trabalhadores administrativos, desempregados, jovens e aposentados
pode conduzir uma luta efetiva contra este governo. A greve
dos trabalhadores ferroviários deve se tornar o ponto inicial
de uma luta baseada na união dos trabalhadores de diferentes
indústrias por toda a Europa, que rompa com as organizações
nacionais reformistas e que busque a reorganização
socialista da sociedade. O controle da produção
deve ser tirado das mãos da elite financeira e posto a
serviço da sociedade como um todo.