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Trabalhadores agrícolas do Sri Lanka estão revoltados contra os sindicatos e o governo

Por nossos correspondentes
4 Janeiro 2007

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 23 de dezembro de 2006

O World Socialist Web Site conversou com trabalhadores agrícolas de diversas regiões do Sri Lanka, que paralisaram suas atividades por duas semanas reivindicando melhores salários, movimento que foi sabotado e destruído pelos dirigentes de todos os sindicatos. Os trabalhadores demonstraram sua revolta e discordância com a atuação dos sindicatos e a incapacidade do presidente Mahinda Rajapakse e seu governo em assegurar suas reivindicações.

O Congresso dos Trabalhadores do Ceilão (CWC) e os sindicatos a ele aliados se opuseram à greve desde o início. Na terça-feira (19/12) eles assinaram um acordo com os patrões, com um reajuste extremamente rebaixado, se comparado com a reivindicação dos trabalhadores. A direção do CWC só foi capaz de concretizar sua traição porque teve o apoio da Frente da População Unida (UPF), que chamou a greve, mas foi ficando cada vez mais preocupada com o crescimento do confronto com o governo Rajapakse.

Arumugam Thondaman, dirigente do CWC, e Periyasamy Chandrasekaran, dirigente da UPF, são ministros. Num encontro especial de gabinete no dia 15 de dezembro, Rajapakse pediu ao UPF que acabasse com a greve, argumentando que ela estava prejudicando a economia. Chandrasekaran realizou uma reunião dos delegados do sindicato em Hatton no domingo (17/12), mas enfrentou uma forte oposição dos trabalhadores, depois do ministro do trabalho, Mervin Silva, ter defendido que eles deveriam aceitar a oferta dos empresários.

No dia seguinte, Chandrasekaran escreveu à direção do CWC pedindo que eles assumissem uma “nova atitude”, abrindo negociações com os patrões. O acordo que resultou desta “nova atitude”, que Chandrasekaran considerou “uma vitória”, rebaixou a reivindicação de reajuste salarial dos grevistas, que era de 300 rúpias por dia (cerca de 3 dólares). O CWC assinou um acordo, válido por dois anos, com um reajuste de somente 170 rúpias, juntamente com uma bonificação de 90 rúpias, dependendo da presença dos trabalhadores e dos preços dos produtos. A maioria dos trabalhadores não receberá a bonificação completa.

Os outros sindicatos, incluindo o Sindicato de Todos os Trabalhadores Agrícolas do Ceilão (ACPWU) se aliaram ao chauvinista Janatha Vimukthi Peramuna (JVP). Na segunda-feira (18/12), o JVP declarou que todos os sindicatos de trabalhadores agrícolas por ele dirigidos chamariam greve geral caso os trabalhadores não recebessem o total de 300 rúpias. Na quarta-feira (20/12), os dirigentes do ACPWU afirmaram que não tinham escolha a não ser orientar os trabalhadores a retornarem ao trabalho. Nenhuma menção foi feita à greve geral.

De maneira significativa, a greve de duas semanas realizada por meio milhão de trabalhadores envolveu camadas amplas dos trabalhadores, tanto sinhala como tamil, que são a maioria da força de trabalho no campo. A resposta se torna mais absurda ainda se for levado em consideração o apoio de Rajapakse a atitudes chauvinistas anti-tamil. O presidente justifica seu apoio como sendo uma forma de evitar que o país mergulhe novamente numa guerra civil.

A determinação dos grevistas em dar continuidade à greve entra em evidente contradição com as manobras oportunistas das direções sindicais que apóiam o governo, e com os ataques destas direções contra o LTTE. Longe de defender o direito dos trabalhadores, os sindicatos são instrumentos para impor as exigências de Rajapakse à classe trabalhadora e para barrar a explosão da guerra.

A revolta entre os trabalhadores em relação ao acordo assinado na terça-feira foi tão grande, que muitos se recusaram a voltar ao trabalho. Entretanto, esse protesto não foi noticiado amplamente. No noticiário da quinta-feira (21/12), a televisão do governo ITN anunciou que metade dos trabalhadores havia voltado ao trabalho na quarta-feira e 80% na quinta-feira. O WSWS recebeu informações de que muitos trabalhadores em regiões longínquas, como Bogawantalawa area, ainda não estavam trabalhando na quinta-feira.

Citamos abaixo alguns comentários de trabalhadores agrícolas e de seus apoiadores ao WSWS.

Várias centenas de estudantes da Universidade Peradeniya participaram de uma manifestação de duas horas, no dia 14 de dezembro, em apoio aos trabalhadores em greve. Suas palavras de ordem diziam: “Paguem o salário de 300 rúpias”, “Os sindicatos estão mortos”, “Não traia a luta dos trabalhadores” e “Trabalhadores não são escravos”.

O secretário da União Nacional dos Estudantes (UCSU), R. Chandramohan disse ao WSWS: “esta é a primeira manifestação estudantil em apoio aos trabalhadores nos últimos tempos. Nós não acreditamos nos sindicatos. O CWC já está trabalhando para sabotar a greve. Eles têm feito uma campanha, passando de porta em porta, pedindo para que os trabalhadores retornem ao trabalho. Nós estamos discutindo como envolver todos os estudantes nessa luta”.

Sunil Tennakoon, um trabalhador sinhala de Kegalle, estava em meio a centenas que se manifestaram no encontro do último domingo organizado pelo UPF para o ministro do trabalho, Mervin Silva, disse: “eu vim aqui representando os trabalhadores de nossa região para ouvir o que o nosso ministro do trabalho eleito tem a dizer. Nem o ministro nem os dirigentes dos sindicatos nos contaram concretamente o que farão em relação à nossa exigência salarial. Nós pedimos um aumento para podermos lidar com o aumento da carestia de vida, mas o ministro eleito está falando em nos mandar para outros lugares onde ganhemos mais. É como mostrar um favo de mel a um homem amputado, que não tem as mãos. Depois de partirem, meus companheiros me disseram para não aceitar menos do que a nossa exigência”.

“Nós estamos numa luta sem qualquer diferença religiosa ou racial. Mas eu ouvi dizer que alguns criminosos e guarda-costas ministeriais estão tentando criar uma divisão das comunidades, assaltando trabalhadores tamil e sabotando a nossa luta”. (Ele se refere a um incidente no estado de Lavent, em Yatiyantota, onde os ministros empresários atacaram os trabalhadores).

“Nos últimos 20 anos, o governo levou a cabo uma guerra contra nossos companheiros cidadãos tamil desse país, e ainda gastaram uma grande quantia de dinheiro em benefício de ninguém. Esse dinheiro poderia ter sido utilizado para melhorar o bem estar de toda a população. Eu concordo com sua opinião de que os trabalhadores desse país e de todo o mundo devem se unir para mudar o sistema”.

Devadas, do estado de Welioya, também compareceu ao encontro de Hatton. “Eu os ouvi dizendo que as companhias estão sendo coniventes com essas perdas. Se este for o caso, deveríamos dizer a eles que saiam do governo. Nós podemos fazê-lo”.

“Quando nós lutamos por nossos direitos, somos chamados de parceiros dos terroristas. Eu já fui preso anteriormente e permaneci na prisão por um ano. Agora também eles devem tentar me prender porque eu estou liderando a greve na nossa região. Essa é a situação”.

“Se o governo pode gastar milhões de rúpias para travar a guerra que não beneficia nem aos sinhala nem a ninguém, porque não podem pensar no esforço que nós fazemos e gastar esse dinheiro em beneficio da população?”

“Usando a guerra (como um pretexto), o governo aprovou leis anti-terroristas que são usadas contra os trabalhadores. Agora o JVP está a favor do PTA (Ato de Prevenção Terrorista) que foi re-imposto recentemente. Este partido se esqueceu que a mesma lei foi utilizada contra eles”. (em 1987-1990)

Trabalhadores do Estado na região de Bogawantalawa não voltaram ao trabalho nem quarta e nem quinta-feira. Centenas de trabalhadores do estado de Tientsen tentaram se manifestar na cidade, na quarta-feira, para protestar contra o acordo, mas foram barrados pela polícia. Trabalhadores que falaram com o WSWS na quinta-feira estavam profundamente hostis aos sindicatos e declararam que eles não pagariam mais a contribuição aos seus sindicatos.

Sathasivam, de Tientsen, disse: “os sindicatos nos traíram. Nós nos opomos a esse acordo coletivo, mas estamos desamparados. Ninguém está fazendo a manutenção de nossas casas ou das estradas. Se arrumam qualquer coisa eles debitam os gastos no nosso salário. O preço de produtos básicos alcançou patamares intoleráveis”.

“Eles (os sindicatos) não nos perguntam sobre nossos salários. Eles decidem alguma coisa com a companhia e a impõe para nós. Qual o sentido de ser membro de um sindicato desses? Eles pensam que os trabalhadores os reverenciarão como no passado. Agora a situação é outra. Nós não deixaremos eles nos enganarem assim de novo”.

Um jovem trabalhador do estado de Tientsen disse: “nós tivemos um reajuste salarial de 35 rúpias. Um quilo de açúcar custa agora 62 rúpias. Eu fui membro do CWC por um longo período. Nós pagávamos a eles 45 rúpias por mês. Mas eles não lutam pela gente”.

“Eles assinaram esse acordo por dois anos. Hoje um quilo de farinha custa 42 rúpias. O que pode acontecer no período de dois anos? Nosso povo participou dessa greve sob condições difíceis, vendendo algumas garrafas de leite, esterco de vaca, ou fazendo trabalhos ocasionais para poder se conseguir levar a greve até o fim. Mas esses políticos nunca pensam sobre isso. Eles só estão interessados em seus benefícios e privilégios”.

Um grupo de trabalhadores do estado de Dunbar estava extremamente revoltado com a traição dos sindicatos. Um deles explicou: “eles aumentaram nosso salário em somente 35 rúpias, o que não é suficiente nem para um quilo de arroz ou dois cocos. Apesar disso, assinando esse acordo coletivo, os sindicatos nos alugaram por dois anos. Você pode imaginar o que o custo de vida vai ser daqui a dois anos? Chandrasekaran (o líder do UPF) diz que isso é uma vitória dos trabalhadores. Isso é uma mentira. Eles disseram que resolveriam o problema conversando com o presidente. Mas o presidente favoreceu as companhias e não a nós”.

“Nós estivemos em greve por mais de duas semanas, realizando manifestações, piquetes e invasões, mas não conseguimos conquistar nossas reivindicações. Nós votamos pela oposição (UPN) e no SFLP (de Rajapakse), porque os dirigentes sindicais pediram. De agora em diante nós não votaremos mais em nenhum desses partidos. Como vocês dizem, o governo de Rajapakse começou de novo uma guerra para ocultar os problemas. Nós concordamos com a reivindicação de vocês de que as forças do Sri Lanka devem se retirar do norte e do leste”.

Suratalee, uma trabalhadora do estado de Thalawakele Coombwood e mãe de quatro crianças, explicou: “eu trabalhei aqui por 13 anos, desde os 15 anos de idade. Minha mãe trabalhou por volta de 35 anos. Mas nós não temos perspectivas de uma vida melhor. Eu não tenho uma casa, apesar de ter pedido diversas vezes à administração. Agora estou morando num barraco de barro anexo à casa de minha mãe. O teto está quase caindo. Em dias de chuva a água escorre pelos buracos no teto e temos que ficar na casa da minha mãe”.

“Eu me queixei disso no CWC, mas eles me disseram para conversar com o administrador. Eles não se importam com as nossas vidas. O que eles querem é nossa contribuição mensal. Minha filha de nove anos não consegue fazer sua lição de casa porque não temos as condições mínimas em casa. No ano que vem minha filha de cinco anos vai para a escola. Eu não tinha as 2.000 rúpias necessárias para colocá-la na creche”.

“Nós não conseguimos sobreviver com nosso salário. Eu preciso de ao menos quatro pacotes de leite em pó para o meu bebê. Um pacote custa 210 rúpias. Nem sempre podemos comer. Para o almoço nós temos rotis (pão de farinha) de um quilo. Depois de dá-los às crianças, às vezes não sobra nada para mim e vou trabalhar à tarde sem ter comido nada. Meu marido manda pequenas quantias que ele recebe nos trabalhos que arranja em Colombo”.

Banda, um trabalhador sinhala do estado próximo de Bandarawela, é um guarda público. Geralmente os guardas não entram em greve, mas Banda explicou que todos os 100 trabalhadores sinhala em seu estado aderiram à greve.

“Nosso salário diário é uma vergonha”, disse ele. “Nós não temos esperanças nesse governo. Eu tenho três filhos alfabetizados, mas eles não têm emprego. Os preços dos produtos básicos estão nas alturas. Essa guerra é um crime. Pessoas estão morrendo de ambos os lados. O JVP está fazendo uma campanha pela guerra e apoiando o governo. Alguns anos atrás eles ainda travaram uma guerra contra o povo”.

Rajendran e outros trabalhadores do estado de Dambetenna, próximo a Bandarawela, não retornaram ao trabalho na quarta-feira como um protesto contra a traição do sindicato. Ele disse que “os trabalhadores pensaram que estariam em melhores condições sob o Mahinda Chinthanaya, o programa de Rajapakse durante a campanha eleitoral de 2005. Mas agora 450 gramas de pão de fôrma custam mais que 20 rúpias, disse ele. O preço de outros produtos básicos também subiu. Os trabalhadores não confiam mais nas direções dos sindicatos”.

Bala, do estado de Nayabedde, próximo a Bandarawela, disse: “nós estamos retornando ao trabalho contra a nossa vontade. Nós não permitiremos que os dirigentes sindicais venham aqui. Estamos planejando pedir a um canal de TV que venha aqui no fim de semana para que possamos explicar nossas dificuldades e anunciar que estamos rompendo com os sindicatos. Pagamos a eles 60 rúpias todo mês”.

“As chapas metálicas no teto de nossos quartos estão corroídas. Nós não temos fornecimento de água e de energia elétrica apropriados. Alguns barracos não têm eletricidade. Não há ruas apropriadas. O governo não está fazendo nada, as companhias agrícolas também não”.

“Nos dias em que o clima está chuvoso, nós precisamos terminar nosso serviço até às duas horas da tarde, mas temos que esperar por uma hora ou uma hora e meia até que eles coletem as folhas de chá selecionadas no dia”.

“Nossas crianças estão sofrendo de desnutrição. Não temos condições de levá-las à escola. Eles têm 13 professores, dos quais 8 são voluntários. Esses voluntários recebem uma bonificação de 30 rúpias por mês para cada criança”.