Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 23 de dezembro de 2006
O World Socialist Web Site conversou com trabalhadores
agrícolas de diversas regiões do Sri Lanka, que
paralisaram suas atividades por duas semanas reivindicando melhores
salários, movimento que foi sabotado e destruído
pelos dirigentes de todos os sindicatos. Os trabalhadores demonstraram
sua revolta e discordância com a atuação dos
sindicatos e a incapacidade do presidente Mahinda Rajapakse e
seu governo em assegurar suas reivindicações.
O Congresso dos Trabalhadores do Ceilão (CWC) e os sindicatos
a ele aliados se opuseram à greve desde o início.
Na terça-feira (19/12) eles assinaram um acordo com os
patrões, com um reajuste extremamente rebaixado, se comparado
com a reivindicação dos trabalhadores. A direção
do CWC só foi capaz de concretizar sua traição
porque teve o apoio da Frente da População Unida
(UPF), que chamou a greve, mas foi ficando cada vez mais preocupada
com o crescimento do confronto com o governo Rajapakse.
Arumugam Thondaman, dirigente do CWC, e Periyasamy Chandrasekaran,
dirigente da UPF, são ministros. Num encontro especial
de gabinete no dia 15 de dezembro, Rajapakse pediu ao UPF que
acabasse com a greve, argumentando que ela estava prejudicando
a economia. Chandrasekaran realizou uma reunião dos delegados
do sindicato em Hatton no domingo (17/12), mas enfrentou uma forte
oposição dos trabalhadores, depois do ministro do
trabalho, Mervin Silva, ter defendido que eles deveriam aceitar
a oferta dos empresários.
No dia seguinte, Chandrasekaran escreveu à direção
do CWC pedindo que eles assumissem uma nova atitude,
abrindo negociações com os patrões. O acordo
que resultou desta nova atitude, que Chandrasekaran
considerou uma vitória, rebaixou a reivindicação
de reajuste salarial dos grevistas, que era de 300 rúpias
por dia (cerca de 3 dólares). O CWC assinou um acordo,
válido por dois anos, com um reajuste de somente 170 rúpias,
juntamente com uma bonificação de 90 rúpias,
dependendo da presença dos trabalhadores e dos preços
dos produtos. A maioria dos trabalhadores não receberá
a bonificação completa.
Os outros sindicatos, incluindo o Sindicato de Todos os Trabalhadores
Agrícolas do Ceilão (ACPWU) se aliaram ao chauvinista
Janatha Vimukthi Peramuna (JVP). Na segunda-feira (18/12), o JVP
declarou que todos os sindicatos de trabalhadores agrícolas
por ele dirigidos chamariam greve geral caso os trabalhadores
não recebessem o total de 300 rúpias. Na quarta-feira
(20/12), os dirigentes do ACPWU afirmaram que não tinham
escolha a não ser orientar os trabalhadores a retornarem
ao trabalho. Nenhuma menção foi feita à greve
geral.
De maneira significativa, a greve de duas semanas realizada
por meio milhão de trabalhadores envolveu camadas amplas
dos trabalhadores, tanto sinhala como tamil, que são a
maioria da força de trabalho no campo. A resposta se torna
mais absurda ainda se for levado em consideração
o apoio de Rajapakse a atitudes chauvinistas anti-tamil. O presidente
justifica seu apoio como sendo uma forma de evitar que o país
mergulhe novamente numa guerra civil.
A determinação dos grevistas em dar continuidade
à greve entra em evidente contradição com
as manobras oportunistas das direções sindicais
que apóiam o governo, e com os ataques destas direções
contra o LTTE. Longe de defender o direito dos trabalhadores,
os sindicatos são instrumentos para impor as exigências
de Rajapakse à classe trabalhadora e para barrar a explosão
da guerra.
A revolta entre os trabalhadores em relação ao
acordo assinado na terça-feira foi tão grande, que
muitos se recusaram a voltar ao trabalho. Entretanto, esse protesto
não foi noticiado amplamente. No noticiário da quinta-feira
(21/12), a televisão do governo ITN anunciou que metade
dos trabalhadores havia voltado ao trabalho na quarta-feira e
80% na quinta-feira. O WSWS recebeu informações
de que muitos trabalhadores em regiões longínquas,
como Bogawantalawa area, ainda não estavam trabalhando
na quinta-feira.
Citamos abaixo alguns comentários de trabalhadores agrícolas
e de seus apoiadores ao WSWS.
Várias centenas de estudantes da Universidade Peradeniya
participaram de uma manifestação de duas horas,
no dia 14 de dezembro, em apoio aos trabalhadores em greve. Suas
palavras de ordem diziam: Paguem o salário de 300
rúpias, Os sindicatos estão mortos,
Não traia a luta dos trabalhadores e Trabalhadores
não são escravos.
O secretário da União Nacional dos Estudantes
(UCSU), R. Chandramohan disse ao WSWS: esta é
a primeira manifestação estudantil em apoio aos
trabalhadores nos últimos tempos. Nós não
acreditamos nos sindicatos. O CWC já está trabalhando
para sabotar a greve. Eles têm feito uma campanha, passando
de porta em porta, pedindo para que os trabalhadores retornem
ao trabalho. Nós estamos discutindo como envolver todos
os estudantes nessa luta.
Sunil Tennakoon, um trabalhador sinhala de Kegalle,
estava em meio a centenas que se manifestaram no encontro do último
domingo organizado pelo UPF para o ministro do trabalho, Mervin
Silva, disse: eu vim aqui representando os trabalhadores
de nossa região para ouvir o que o nosso ministro do trabalho
eleito tem a dizer. Nem o ministro nem os dirigentes dos sindicatos
nos contaram concretamente o que farão em relação
à nossa exigência salarial. Nós pedimos um
aumento para podermos lidar com o aumento da carestia de vida,
mas o ministro eleito está falando em nos mandar para outros
lugares onde ganhemos mais. É como mostrar um favo de mel
a um homem amputado, que não tem as mãos. Depois
de partirem, meus companheiros me disseram para não aceitar
menos do que a nossa exigência.
Nós estamos numa luta sem qualquer diferença
religiosa ou racial. Mas eu ouvi dizer que alguns criminosos e
guarda-costas ministeriais estão tentando criar uma divisão
das comunidades, assaltando trabalhadores tamil e sabotando a
nossa luta. (Ele se refere a um incidente no estado de Lavent,
em Yatiyantota, onde os ministros empresários atacaram
os trabalhadores).
Nos últimos 20 anos, o governo levou a cabo uma
guerra contra nossos companheiros cidadãos tamil desse
país, e ainda gastaram uma grande quantia de dinheiro em
benefício de ninguém. Esse dinheiro poderia ter
sido utilizado para melhorar o bem estar de toda a população.
Eu concordo com sua opinião de que os trabalhadores desse
país e de todo o mundo devem se unir para mudar o sistema.
Devadas, do estado de Welioya, também compareceu
ao encontro de Hatton. Eu os ouvi dizendo que as companhias
estão sendo coniventes com essas perdas. Se este for o
caso, deveríamos dizer a eles que saiam do governo. Nós
podemos fazê-lo.
Quando nós lutamos por nossos direitos, somos
chamados de parceiros dos terroristas. Eu já fui preso
anteriormente e permaneci na prisão por um ano. Agora também
eles devem tentar me prender porque eu estou liderando a greve
na nossa região. Essa é a situação.
Se o governo pode gastar milhões de rúpias
para travar a guerra que não beneficia nem aos sinhala
nem a ninguém, porque não podem pensar no esforço
que nós fazemos e gastar esse dinheiro em beneficio da
população?
Usando a guerra (como um pretexto), o governo aprovou
leis anti-terroristas que são usadas contra os trabalhadores.
Agora o JVP está a favor do PTA (Ato de Prevenção
Terrorista) que foi re-imposto recentemente. Este partido se esqueceu
que a mesma lei foi utilizada contra eles. (em 1987-1990)
Trabalhadores do Estado na região de Bogawantalawa não
voltaram ao trabalho nem quarta e nem quinta-feira. Centenas de
trabalhadores do estado de Tientsen tentaram se manifestar na
cidade, na quarta-feira, para protestar contra o acordo, mas foram
barrados pela polícia. Trabalhadores que falaram com o
WSWS na quinta-feira estavam profundamente hostis aos sindicatos
e declararam que eles não pagariam mais a contribuição
aos seus sindicatos.
Sathasivam, de Tientsen, disse: os
sindicatos nos traíram. Nós nos opomos a esse acordo
coletivo, mas estamos desamparados. Ninguém está
fazendo a manutenção de nossas casas ou das estradas.
Se arrumam qualquer coisa eles debitam os gastos no nosso salário.
O preço de produtos básicos alcançou patamares
intoleráveis.
Eles (os sindicatos) não nos perguntam sobre nossos
salários. Eles decidem alguma coisa com a companhia e a
impõe para nós. Qual o sentido de ser membro de
um sindicato desses? Eles pensam que os trabalhadores os reverenciarão
como no passado. Agora a situação é outra.
Nós não deixaremos eles nos enganarem assim de novo.
Um jovem trabalhadordo estado de Tientsen
disse: nós tivemos um reajuste salarial de 35 rúpias.
Um quilo de açúcar custa agora 62 rúpias.
Eu fui membro do CWC por um longo período. Nós pagávamos
a eles 45 rúpias por mês. Mas eles não lutam
pela gente.
Eles assinaram esse acordo por dois anos. Hoje um quilo
de farinha custa 42 rúpias. O que pode acontecer no período
de dois anos? Nosso povo participou dessa greve sob condições
difíceis, vendendo algumas garrafas de leite, esterco de
vaca, ou fazendo trabalhos ocasionais para poder se conseguir
levar a greve até o fim. Mas esses políticos nunca
pensam sobre isso. Eles só estão interessados em
seus benefícios e privilégios.
Um grupo de trabalhadores do estado de Dunbar
estava extremamente revoltado com a traição dos
sindicatos. Um deles explicou: eles aumentaram nosso salário
em somente 35 rúpias, o que não é suficiente
nem para um quilo de arroz ou dois cocos. Apesar disso, assinando
esse acordo coletivo, os sindicatos nos alugaram por dois anos.
Você pode imaginar o que o custo de vida vai ser daqui a
dois anos? Chandrasekaran (o líder do UPF) diz que isso
é uma vitória dos trabalhadores. Isso é uma
mentira. Eles disseram que resolveriam o problema conversando
com o presidente. Mas o presidente favoreceu as companhias e não
a nós.
Nós estivemos em greve por mais de duas semanas,
realizando manifestações, piquetes e invasões,
mas não conseguimos conquistar nossas reivindicações.
Nós votamos pela oposição (UPN) e no SFLP
(de Rajapakse), porque os dirigentes sindicais pediram. De agora
em diante nós não votaremos mais em nenhum desses
partidos. Como vocês dizem, o governo de Rajapakse começou
de novo uma guerra para ocultar os problemas. Nós concordamos
com a reivindicação de vocês de que as forças
do Sri Lanka devem se retirar do norte e do leste.
Suratalee, uma trabalhadora do estado de Thalawakele
Coombwood e mãe de quatro crianças, explicou: eu
trabalhei aqui por 13 anos, desde os 15 anos de idade. Minha mãe
trabalhou por volta de 35 anos. Mas nós não temos
perspectivas de uma vida melhor. Eu não tenho uma casa,
apesar de ter pedido diversas vezes à administração.
Agora estou morando num barraco de barro anexo à casa de
minha mãe. O teto está quase caindo. Em dias de
chuva a água escorre pelos buracos no teto e temos que
ficar na casa da minha mãe.
Eu me queixei disso no CWC, mas eles me disseram para
conversar com o administrador. Eles não se importam com
as nossas vidas. O que eles querem é nossa contribuição
mensal. Minha filha de nove anos não consegue fazer sua
lição de casa porque não temos as condições
mínimas em casa. No ano que vem minha filha de cinco anos
vai para a escola. Eu não tinha as 2.000 rúpias
necessárias para colocá-la na creche.
Nós não conseguimos sobreviver com nosso
salário. Eu preciso de ao menos quatro pacotes de leite
em pó para o meu bebê. Um pacote custa 210 rúpias.
Nem sempre podemos comer. Para o almoço nós temos
rotis (pão de farinha) de um quilo. Depois de dá-los
às crianças, às vezes não sobra nada
para mim e vou trabalhar à tarde sem ter comido nada. Meu
marido manda pequenas quantias que ele recebe nos trabalhos que
arranja em Colombo.
Banda, um trabalhador sinhala do estado próximo
de Bandarawela, é um guarda público. Geralmente
os guardas não entram em greve, mas Banda explicou que
todos os 100 trabalhadores sinhala em seu estado aderiram à
greve.
Nosso salário diário é uma vergonha,
disse ele. Nós não temos esperanças
nesse governo. Eu tenho três filhos alfabetizados, mas eles
não têm emprego. Os preços dos produtos básicos
estão nas alturas. Essa guerra é um crime. Pessoas
estão morrendo de ambos os lados. O JVP está fazendo
uma campanha pela guerra e apoiando o governo. Alguns anos atrás
eles ainda travaram uma guerra contra o povo.
Rajendran e outros trabalhadores do
estado de Dambetenna, próximo a Bandarawela, não
retornaram ao trabalho na quarta-feira como um protesto contra
a traição do sindicato. Ele disse que os trabalhadores
pensaram que estariam em melhores condições sob
o Mahinda Chinthanaya, o programa de Rajapakse durante
a campanha eleitoral de 2005. Mas agora 450 gramas de pão
de fôrma custam mais que 20 rúpias, disse ele. O
preço de outros produtos básicos também subiu.
Os trabalhadores não confiam mais nas direções
dos sindicatos.
Bala, do estado de Nayabedde, próximo a Bandarawela,
disse: nós estamos retornando ao trabalho contra
a nossa vontade. Nós não permitiremos que os dirigentes
sindicais venham aqui. Estamos planejando pedir a um canal de
TV que venha aqui no fim de semana para que possamos explicar
nossas dificuldades e anunciar que estamos rompendo com os sindicatos.
Pagamos a eles 60 rúpias todo mês.
As chapas metálicas no teto de nossos quartos
estão corroídas. Nós não temos fornecimento
de água e de energia elétrica apropriados. Alguns
barracos não têm eletricidade. Não há
ruas apropriadas. O governo não está fazendo nada,
as companhias agrícolas também não.
Nos dias em que o clima está chuvoso, nós
precisamos terminar nosso serviço até às
duas horas da tarde, mas temos que esperar por uma hora ou uma
hora e meia até que eles coletem as folhas de chá
selecionadas no dia.
Nossas crianças estão sofrendo de desnutrição.
Não temos condições de levá-las à
escola. Eles têm 13 professores, dos quais 8 são
voluntários. Esses voluntários recebem uma bonificação
de 30 rúpias por mês para cada criança.