World Socialist Web Site
 

WSWS : Portuguese

A campanha de mentiras e desinformação do governo Bush contra o Irã

Por Peter Symonds
17 Fevereiro 2007

Utilice esta versión para imprimir | Enviar por e-mail | Comunicar-se com o autor

Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia Por 6 de fevereiro de 2007.

Em sua preparação para a agressão militar ao Irã, o governo Bush está se utilizando mais uma vez de uma série de mentiras, falsas informações e meias-verdades para forjar um pretexto. No discurso do dia 10 de janeiro onde ele anunciou a intensificação na guerra do Iraque, o Presidente Bush denunciou a Síria e o Irã por apoiarem rebeldes anti-americanos e declarou que o exército americano devia "procurar e destruir" essas redes de comunicação. Desde então ele deu ordens às tropas americanas para "capturar e matar" agentes iranianos no Iraque.

O discurso de Bush foi seguido por um grande número de declarações de altos oficiais americanos condenando as supostas "intromissões" iranianas no Iraque—tudo transmitido ao mundo pelas grandes redes de comunicação, que são cúmplices do governo. Até o momento, nenhuma prova foi dada para sustentar tais afirmações. Assim como a antiga alegação de Bush de que o Iraque possuía armas de destruição em massa, as acusações contra o Irã são simplesmente repetidas até a exaustão como se fossem um fato.

O embaixador americano no Iraque, Zalmay Khalilzad, devia apresentar um "dossiê" à imprensa no dia 31 de janeiro com o objetivo de provar o ponto de vista dos EUA em relação às atividades iranianas no Iraque. O encontro em Bagdá, todavia, foi adiado sem explicação e sem previsão de nova data. Enquanto diversas desculpas eram inventadas, a razão real para "segurar" o dossiê é a falta de evidências e a preocupação com a reação pública nos EUA.

De acordo com o Los Angeles Times do dia 1 de fevereiro, oficiais americanos estavam preocupados, pois "alguns dos materiais podem não ser conclusivos". Eles queriam "evitar a dificuldade originada pela invasão do Iraque em 2003, quando ficou evidente que a informação citada para justificar a guerra estava incorreta", explicou o jornal. "Nós não queremos repetir a situação criada quando Colin Powell (ex-secretário de estado dos EUA) foi solicitar a aprovação da ONU para iniciar a guerra no Iraque. As pessoas estão céticas", explicou um representante do governo.

Um ex-oficial do alto escalão do ministério de defesa declarou irritado ao Los Angeles Times que a tentativa de denunciar o Irã a uma população cética como a americana "não tem a menor chance de ter êxito". Outro afirmou que o departamento de estado e os membros da inteligência acreditam que "alguns estão utilizando de forma exagerada provas obscuras e criando uma atmosfera negativa em relação a iranianos inocentes, que não devem ser culpados". Um terceiro afirmou ainda que "o resultado pode ser um relatório fraco e não convincente".

O caráter dúbio das declarações destes senhores foi confirmado pelo conselheiro nacional de segurança, Stephen Hadley, no decurso de uma conferência da imprensa no dia 3 de fevereiro. Em resposta aos insistentes questionamentos sobre o cancelamento do plano para Bagdá, Hadley finalmente revelou: "francamente, a verdade é que nós pensamos que aquele plano era exagerado. Então o enviamos de volta, para direcioná-lo e focá-lo mais nos fatos".

A conferência coletiva concedida por Hadley a todas as 16 agências americanas tinha como objetivo divulgar o resumo da nova National Intelligence Estimate (NIE) a respeito do Iraque. Além de dar uma imagem de frieza à ocupação americana no Iraque, o documento descartou a importância das influências externas na situação no Iraque.

Enquanto repetia as afirmações do governo dos EUA sobre o "forte apoio iraniano" aos militantes xiitas no Iraque e a "expatriação de membros do partido baathista", usando a Síria como um porto seguro, o relatório do NIE declarava que "os vizinhos do Iraque influenciam—e são influenciados por—acontecimentos que ocorrem no Iraque, mas o envolvimento desses atores externos não é uma grande e violenta ameaça, nem mesmo traz a esperança de estabilidade, pois as ações sectárias internas existentes no Iraque têm um caráter auto-sustentável". Ou seja, segundo o NIE, o Irã e a Síria não são fatores determinantes no agravamento da guerra civil no Iraque.

Entretanto, o relatório do NIE parece não ter repercutido entre os propagandistas de Bush. Numa entrevista na Rádio Pública Nacional no dia 1 de fevereiro, o vice-secretário de estado, Nicholas Burns, acusou o Irã de dar assistência a militantes xiitas em ataques a soldados britânicos perto de Basra e a forças americanas em Bagdá. "Nós avisamos ao Irã em particular, em diversas ocasiões nos últimos 18 meses, e os iranianos, obviamente, parecem não ter dado importância. Agora nós começamos a prender oficiais iranianos. E nós pensamos que temos todo o direito de fazê-lo, com base no artigo 51 da carta de direitos da ONU, que trata da auto-defesa".

Apenas algumas horas depois do discurso de Bush no dia 10 de janeiro, forças militares dos EUA capturaram cinco oficiais iranianos numa provocativa invasão, realizada pela manhã num escritório diplomático ao norte do Iraque, na cidade de Irbil. Oficiais americanos afirmaram que os detidos são agentes da inteligência iraniana e que mapas e outros materiais "provam" seu envolvimento com a violência sectária. Entretanto não foi divulgada prova alguma, e os cinco oficiais permanecem sob a custódia dos EUA, sem qualquer acusação, apesar do protesto não somente de Teerã mas também de altos oficiais do Iraque.

No dia 20 de dezembro, ocorreram outras detenções em Bagdá de pelo menos cinco iranianos, incluindo dois diplomatas credenciados. Todos foram liberados. Dois dos cinco foram presos numa invasão na área dominada pelo líder xiita Aziz al-Hakim, cujo partido é o maior componente da coalizão dominante do Iraque, que havia comparecido à reuniões com Bush em Washington na semana anterior. O embaixador do Irã no Iraque, Hassan Kazemi Qumi, insistiu que os dois oficiais de segurança estavam envolvidos em negociações legítimas com o governo iraquiano e nunca deveriam ter sido presos.

Um aspecto significativo das declarações de Burns foi a referência ao artigo 51 da carta de direitos da ONU. Desde as invasões de 2003, o exército americano deteve arbitrariamente centenas de estrangeiros sem julgamento nem apelação, baseando-se sempre na carta de direitos da ONU. No entanto, o artigo 51 não se refere às detenções. Ele dá "o direito individual ou coletivo de autodefesa" a um membro de um governo contra ataques militares, que tenha sido encarregado de cobrir atos diretos de agressão tais como os ocorridos na Alemanha nazista durante a II Guerra Mundial.

Do ponto de vista do governo Bush, a importância do artigo 51 é o fato dele ser a única cláusula que permite ações militares sem alusão ao conselho de segurança da ONU. A acusação sem provas de que o Irã está apoiando "ataques armados" contra forças americanas no Iraque pôde assim ser amarrada por Washington como a falsa justificativa para que se esquivar da ONU e iniciar um assalto ao Irã, tudo em nome da "auto-defesa". A referência feita por Burns ao artigo 51 revela mais sobre o pensamento na Casa Branca do que ele pudesse ter imaginado.

Questionado sobre as intenções de atacar ou invadir o Irã, Burns repetiu as respostas padrões de Bush de que "todas as opções estão na mesa". Quando pediram que ele comentasse o avanço militar dos EUA no Golfo Pérsico e o perigo da guerra com o Irã, Burns foi evasivo: "eu não acredito que um conflito com o Irã seja inevitável", disse ele, acrescentando que uma solução diplomática ainda seria possível. Mas a sua dura exigência de que o Irã poderia "cessar e desistir" de enviar armas aos rebeldes xiitas para "perseguir e matar soldados americanos" indica que os EUA pretendem avançar com a sua atitude bélica contra o Irã.

O consultor do Pentágono, Dan Goure, disse ao britânico Sunday Telegraph no último fim de semana: "você não pode tentar chegar a um acordo com a milícia (no Iraque) se você não negociar com os iranianos que estão apoiando-os. A partir de agora as formalidades ficaram de lado". De acordo com o artigo, os EUA reforçaram a espionagem, monitorando as fronteiras do Irã e do Iraque, realizando uma vigilância 24 horas por dia. Um oficial da inteligência dos EUA disse ao jornal que os zangões voaram para o Irã. Ele disse que os militares ainda não estão planejando atacar diretamente o Irã, uma vez que os suspeitos estão instalados a algumas milhas dentro do Iraque. Caso os americanos fossem para o Irã, eles estariam "encurralados".

Diante da intensificação das provocações dos EUA contra o Irã, não há dúvida de que, em algum momento, o governo Bush apresentará um dossiê para tentar justificar sua agressão. Mas o fato do dossiê ter sido "adiado", apesar dos oficiais americanos afirmarem constantemente que têm provas "irrefutáveis" do apoio iraniano às milícias anti-americanas, demonstra que tudo é uma farsa. Assim como as mentiras ditas por Collin Powell à ONU sobre as armas de destruição em massa do Iraque, assim como o dossiê britânico sobre o Iraque, os EUA estão mais uma vez procurando um pretexto para viabilizar a guerra contra o Irã.