Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia Por 6 de fevereiro de 2007.
Em sua preparação para a agressão militar
ao Irã, o governo Bush está se utilizando mais uma
vez de uma série de mentiras, falsas informações
e meias-verdades para forjar um pretexto. No discurso do dia 10
de janeiro onde ele anunciou a intensificação na
guerra do Iraque, o Presidente Bush denunciou a Síria e
o Irã por apoiarem rebeldes anti-americanos e declarou
que o exército americano devia "procurar e destruir"
essas redes de comunicação. Desde então ele
deu ordens às tropas americanas para "capturar e matar"
agentes iranianos no Iraque.
O discurso de Bush foi seguido por um grande número
de declarações de altos oficiais americanos condenando
as supostas "intromissões" iranianas no Iraquetudo
transmitido ao mundo pelas grandes redes de comunicação,
que são cúmplices do governo. Até o momento,
nenhuma prova foi dada para sustentar tais afirmações.
Assim como a antiga alegação de Bush de que o Iraque
possuía armas de destruição em massa, as
acusações contra o Irã são simplesmente
repetidas até a exaustão como se fossem um fato.
O embaixador americano no Iraque, Zalmay Khalilzad, devia apresentar
um "dossiê" à imprensa no dia 31 de janeiro
com o objetivo de provar o ponto de vista dos EUA em relação
às atividades iranianas no Iraque. O encontro em Bagdá,
todavia, foi adiado sem explicação e sem previsão
de nova data. Enquanto diversas desculpas eram inventadas, a razão
real para "segurar" o dossiê é a falta
de evidências e a preocupação com a reação
pública nos EUA.
De acordo com o Los Angeles Times do dia 1 de fevereiro,
oficiais americanos estavam preocupados, pois "alguns dos
materiais podem não ser conclusivos". Eles queriam
"evitar a dificuldade originada pela invasão do Iraque
em 2003, quando ficou evidente que a informação
citada para justificar a guerra estava incorreta", explicou
o jornal. "Nós não queremos repetir a situação
criada quando Colin Powell (ex-secretário de estado dos
EUA) foi solicitar a aprovação da ONU para iniciar
a guerra no Iraque. As pessoas estão céticas",
explicou um representante do governo.
Um ex-oficial do alto escalão do ministério de
defesa declarou irritado ao Los Angeles Times que a tentativa
de denunciar o Irã a uma população cética
como a americana "não tem a menor chance de ter êxito".
Outro afirmou que o departamento de estado e os membros da inteligência
acreditam que "alguns estão utilizando de forma exagerada
provas obscuras e criando uma atmosfera negativa em relação
a iranianos inocentes, que não devem ser culpados".
Um terceiro afirmou ainda que "o resultado pode ser um relatório
fraco e não convincente".
O caráter dúbio das declarações
destes senhores foi confirmado pelo conselheiro nacional de segurança,
Stephen Hadley, no decurso de uma conferência da imprensa
no dia 3 de fevereiro. Em resposta aos insistentes questionamentos
sobre o cancelamento do plano para Bagdá, Hadley finalmente
revelou: "francamente, a verdade é que nós
pensamos que aquele plano era exagerado. Então o enviamos
de volta, para direcioná-lo e focá-lo mais nos fatos".
A conferência coletiva concedida por Hadley a todas as
16 agências americanas tinha como objetivo divulgar o resumo
da nova National Intelligence Estimate (NIE) a respeito do Iraque.
Além de dar uma imagem de frieza à ocupação
americana no Iraque, o documento descartou a importância
das influências externas na situação no Iraque.
Enquanto repetia as afirmações do governo dos
EUA sobre o "forte apoio iraniano" aos militantes xiitas
no Iraque e a "expatriação de membros do partido
baathista", usando a Síria como um porto seguro, o
relatório do NIE declarava que "os vizinhos do Iraque
influenciame são influenciados poracontecimentos
que ocorrem no Iraque, mas o envolvimento desses atores externos
não é uma grande e violenta ameaça, nem mesmo
traz a esperança de estabilidade, pois as ações
sectárias internas existentes no Iraque têm um caráter
auto-sustentável". Ou seja, segundo o NIE, o Irã
e a Síria não são fatores determinantes no
agravamento da guerra civil no Iraque.
Entretanto, o relatório do NIE parece não ter
repercutido entre os propagandistas de Bush. Numa entrevista na
Rádio Pública Nacional no dia 1 de fevereiro, o
vice-secretário de estado, Nicholas Burns, acusou o Irã
de dar assistência a militantes xiitas em ataques a soldados
britânicos perto de Basra e a forças americanas em
Bagdá. "Nós avisamos ao Irã em particular,
em diversas ocasiões nos últimos 18 meses, e os
iranianos, obviamente, parecem não ter dado importância.
Agora nós começamos a prender oficiais iranianos.
E nós pensamos que temos todo o direito de fazê-lo,
com base no artigo 51 da carta de direitos da ONU, que trata da
auto-defesa".
Apenas algumas horas depois do discurso de Bush no dia 10 de
janeiro, forças militares dos EUA capturaram cinco oficiais
iranianos numa provocativa invasão, realizada pela manhã
num escritório diplomático ao norte do Iraque, na
cidade de Irbil. Oficiais americanos afirmaram que os detidos
são agentes da inteligência iraniana e que mapas
e outros materiais "provam" seu envolvimento com a violência
sectária. Entretanto não foi divulgada prova alguma,
e os cinco oficiais permanecem sob a custódia dos EUA,
sem qualquer acusação, apesar do protesto não
somente de Teerã mas também de altos oficiais do
Iraque.
No dia 20 de dezembro, ocorreram outras detenções
em Bagdá de pelo menos cinco iranianos, incluindo dois
diplomatas credenciados. Todos foram liberados. Dois dos cinco
foram presos numa invasão na área dominada pelo
líder xiita Aziz al-Hakim, cujo partido é o maior
componente da coalizão dominante do Iraque, que havia comparecido
à reuniões com Bush em Washington na semana anterior.
O embaixador do Irã no Iraque, Hassan Kazemi Qumi, insistiu
que os dois oficiais de segurança estavam envolvidos em
negociações legítimas com o governo iraquiano
e nunca deveriam ter sido presos.
Um aspecto significativo das declarações de Burns
foi a referência ao artigo 51 da carta de direitos da ONU.
Desde as invasões de 2003, o exército americano
deteve arbitrariamente centenas de estrangeiros sem julgamento
nem apelação, baseando-se sempre na carta de direitos
da ONU. No entanto, o artigo 51 não se refere às
detenções. Ele dá "o direito individual
ou coletivo de autodefesa" a um membro de um governo contra
ataques militares, que tenha sido encarregado de cobrir atos diretos
de agressão tais como os ocorridos na Alemanha nazista
durante a II Guerra Mundial.
Do ponto de vista do governo Bush, a importância do artigo
51 é o fato dele ser a única cláusula que
permite ações militares sem alusão ao conselho
de segurança da ONU. A acusação sem provas
de que o Irã está apoiando "ataques armados"
contra forças americanas no Iraque pôde assim ser
amarrada por Washington como a falsa justificativa para que se
esquivar da ONU e iniciar um assalto ao Irã, tudo em nome
da "auto-defesa". A referência feita por Burns
ao artigo 51 revela mais sobre o pensamento na Casa Branca do
que ele pudesse ter imaginado.
Questionado sobre as intenções de atacar ou invadir
o Irã, Burns repetiu as respostas padrões de Bush
de que "todas as opções estão na mesa".
Quando pediram que ele comentasse o avanço militar dos
EUA no Golfo Pérsico e o perigo da guerra com o Irã,
Burns foi evasivo: "eu não acredito que um conflito
com o Irã seja inevitável", disse ele, acrescentando
que uma solução diplomática ainda seria possível.
Mas a sua dura exigência de que o Irã poderia "cessar
e desistir" de enviar armas aos rebeldes xiitas para "perseguir
e matar soldados americanos" indica que os EUA pretendem
avançar com a sua atitude bélica contra o Irã.
O consultor do Pentágono, Dan Goure, disse ao britânico
Sunday Telegraph no último fim de semana: "você
não pode tentar chegar a um acordo com a milícia
(no Iraque) se você não negociar com os iranianos
que estão apoiando-os. A partir de agora as formalidades
ficaram de lado". De acordo com o artigo, os EUA reforçaram
a espionagem, monitorando as fronteiras do Irã e do Iraque,
realizando uma vigilância 24 horas por dia. Um oficial da
inteligência dos EUA disse ao jornal que os zangões
voaram para o Irã. Ele disse que os militares ainda não
estão planejando atacar diretamente o Irã, uma vez
que os suspeitos estão instalados a algumas milhas dentro
do Iraque. Caso os americanos fossem para o Irã, eles estariam
"encurralados".
Diante da intensificação das provocações
dos EUA contra o Irã, não há dúvida
de que, em algum momento, o governo Bush apresentará um
dossiê para tentar justificar sua agressão. Mas o
fato do dossiê ter sido "adiado", apesar dos oficiais
americanos afirmarem constantemente que têm provas "irrefutáveis"
do apoio iraniano às milícias anti-americanas, demonstra
que tudo é uma farsa. Assim como as mentiras ditas por
Collin Powell à ONU sobre as armas de destruição
em massa do Iraque, assim como o dossiê britânico
sobre o Iraque, os EUA estão mais uma vez procurando um
pretexto para viabilizar a guerra contra o Irã.