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Crise do crédito hipotecário causa queda em Wall Street

Por Patrick Martin
6 de agosto de 2007

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 27 de julho de 2007.

Três dias de vendas acima do normal em Wall Street reduziram em quase 540 pontos o índice Dow-Jones Industrial Average e tornaram pó centenas de bilhões aplicados no mercado acionário. A queda brusca, ocorrida pouco tempo depois da quebra da marca de 14.000 pontos no Dow-Jones na semana passada, ressalta a crescente instabilidade dos EUA e do sistema financeiro mundial.

O clima no pregão da quinta feira (26 de julho) foi descrito por todos os meios de comunicação como de "pânico" e "medo". Os operadores tiveram que reagir a uma enxurrada de más notícias econômicas: quedas bruscas nas vendas de residências novas e usadas, mais uma elevação do preço do petróleo, baixa demanda de bens duráveis e dificuldades financeiras nas aquisições de duas importantes empresas.

O Dow-Jones havia caído quase 450 pontos no meio da tarde de quinta-feira. Até as últimas horas do pregão não havia se recuperado completamente. No cômputo geral, as ações em queda superaram as ações em alta por uma margem de 14 a 1, e o pregão foi extremamente pesado, com um volume de comercialização recorde na Bolsa de Nova York de 2,78 bilhões de ações.

O desequilíbrio da bolsa de Nova York se refletiu em todo o mundo. Em conseqüência do recuo em Wall Street, as bolsas da Europa despencaram nas últimas horas de operação do mesmo dia. A Bolsa de Londres sofreu sua maior queda em quatro anos e o índice FTSE 100 caiu 3,15%. Houve baixas semelhantes na Alemanha e na França.

Impulsionando o início das liquidações, a maior empresa hipotecária dos EUA, a californiana Countrywide, anunciou, na terça-feira (24), que estava disposta a dar baixas contábeis por perdas devidas a pagamentos atrasados ou inadimplência dos mutuários. A companhia informou que os divórcios e a perda de emprego são as duas principais causas que fazem com que os mutuários deixem de pagar, e que um número cada vez maior de mutuários com boa reputação no mercado está começando a atrasar seus pagamentos. Atualmente, as pessoas que procuram créditos hipotecários de alto risco não são somente aquelas que têm renda mais baixa e má reputação. Há um ano, a proporção de atraso de até 30 dias dos clientes conhecidos como bons pagadores era de 1,8%. Hoje esse índice quase triplicou, chegando a 4,6%.

Numa conferência telefônica com analistas, Angelo Mozilo, presidente e diretor da Countrywide, informou que o preço dos imóveis estava caindo "como nunca havia caído antes, exceto na época da Grande Depressão".

Na quarta-feira (26), a Associação Nacional de Corretores de Imóveis (National Association of Realtors) divulgou um relatório informando que as vendas de residências usadas haviam caído 3,8% em junho, atingindo o mais baixo nível de vendas dos últimos quatro anos. No dia seguinte, o Departamento de Comércio anunciou que as vendas de residências novas haviam caído 6,6% no mesmo mês, uma queda três vezes maior do que a expectativa e a maior desde janeiro.

O preço médio de venda de um imóvel residencial novo caiu para U$ 237.900 — valor que não é baixo, pois representa ainda quase cinco vezes a renda média anual de uma família. Apesar disso, esse valor é 2,2% mais baixo do que há um ano atrás. No sul, a venda de residências novas subiu ligeiramente, mas despencou 27,1% no nordeste, 22,5% no oeste e 17,1% no meio-oeste. Nas quatro regiões, a venda de residências usadas caiu entre 1,7 a 7,3%.

Outros números contribuíam para o ambiente negativo nas bolsas. O Departamento de Comércio relatou um aumento de 1,4% na demanda de bens duráveis, mas se fosse abstraída uma única venda - a de uma aeronave de alto valor - o relatório teria apresentado queda na demanda. O preço do barril de petróleo chegou a atingir U$ 77, e o dólar caiu 1% com relação ao iene, uma queda grande para um único dia. Mas o que causou mais dano foi a evidência quantitativa e qualitativa de um colapso no mercado imobiliário.

A Pulte Homes, de Bloomfield Hills, em Michigan, a segunda maior construtora imobiliária dos EUA, divulgou uma perda de U$ 507 milhões no segundo trimestre, que contrasta com o lucro de U$ 243 milhões do ano passado, sem contar com um prejuízo extra decorrente da queda dos preços dos terrenos.

A maior construtora, a D.R. Horton Inc., apresentou uma situação semelhante: de U$ 293 milhões de lucro no segundo trimestre do ano passado para U$ 824 milhões de prejuízo neste ano, incluindo baixas contábeis substanciais devido aos preços descendentes de casas e terrenos. Durante uma conferência telefônica com investidores e repórteres financeiros, o presidente da Horton, Donald Tomnitz, afirmou que a crise no crédito hipotecário de alto risco causava um impacto direto na sua companhia. "Em alguns dos nossos escritórios espalhados pelo país, estamos tentando checar a situação do mesmo comprador duas ou três vezes, em conseqüência das mudanças que vem ocorrendo no setor hipotecário," revelou. "Não temos como prever quando haverá uma recuperação do mercado. Por enquanto não estamos vendo nenhuma melhora no horizonte".

No maior e mais caro mercado imobiliário do país, a Califórnia, as execuções hipotecárias subiram 799% entre 01 de abril e 30 de junho deste ano em comparação com o mesmo período do ano passado. Cerca de 17.408 imóveis foram tomados de volta pelas instituições de crédito no último trimestre. A inadimplência subiu 158% em todo estado durante o mesmo período.

Investidores da bolsa e a imprensa financeira têm prestado cada vez mais atenção na crise do crédito hipotecário de alto risco, porque a exploração de mutuários pobres e vulneráveis se tornou um dos empreendimentos mais lucrativos para credores hipotecários e seus vários intermediários financeiros, desde bancos até os fundos de hedge (fundos de alto risco que são destinados apenas a alguns investidores selecionados), que obtém seus lucros por meio destes empréstimos que são concedidos mediante a cobrança de altas taxas de juros.

Mais de U$ 1,2 trilhão em crédito hipotecário de alto risco foram concedidos em 2005 e 2006. A maior parte disso foi vendida para grandes empresas hipotecárias e transformada em complexos instrumentos financeiros, para serem comprados e vendidos por fundos de hedge, empresas de capital fechado e outros grandes investidores de Wall Street, num processo conhecido como "securitização". As duas maiores agências de classificação de risco, Moody's e Standard & Poor, apenas recentemente começaram a diminuir as negociações desses títulos, conhecidos como obrigações de dívida com garantia ou CDOs (collateralized debt obligations), preocupados com o crescente número de inadimplências no pagamento de dívidas hipotecárias.

Atualmente, o valor total de crédito hipotecário de alto risco securitizado chega a U$ 1,8 trilhão, segundo estimativas recentes da imprensa financeira. Os principais agentes de Wall Street procuraram abafar a crescente preocupação de que as CDOs seriam um castelo de cartas que desmoronaria com a inadimplência dos mutuários. Ben Bernanke, presidente do Federal Reserve (o FED, Banco Central dos EUA) comunicou ao Congresso Nacional na semana passada que as perdas dos grandes credores de crédito hipotecário de alto risco poderiam chegar a U$ 50 a U$ 100 bilhões, mas alegou que o impacto seria limitado.

Alguns analistas, no entanto, apontam para perigos de longo alcance desta crise dos empréstimos de alto risco. William Gross, da Pimco Bonds, alertou, no seu comentário mensal de 24 de julho, sobre uma "repentina crise de liquidez no mercado de alto risco". A reação em cadeia minaria a disponibilidade de crédito fácil para financiar os LBOs (leveraged buyouts - que são as operações de aquisição de empresas utilizando dinheiro emprestado), recompra de ações, fusões e aquisições. Estas operações são as maiores responsáveis pela subida dos preços das ações. "As ações não terão mais o apoio fácil do duplo impacto dos LBOs e recompra de títulos", concluiu Gross.

Os efeitos práticos desse processo já eram visíveis na quarta-feira (25), quando a DaimlerChrysler foi obrigada a adiar a venda da sua divisão Chrysler para a sociedade anônima de capital fechado Cerberus, que teve dificuldade em obter empréstimos bancários. No mesmo dia, banqueiros de outra gigante de capital fechado, a Kohlberg Kravis Roberts, sacaram U$ 10 bilhões em empréstimos para financiar a aquisição da Alliance Boots, uma rede de drogarias britânica. Ao todo, cerca de 20 débitos como esses foram adiados ou revistos por causa da crescente pressão no mercado de crédito, incluindo o plano da GM de vender sua unidade da Allison Transmission para o Carlyle Group, mais uma gigante de capital fechado.

Um artigo de primeira página no Washington Post na quinta-feira (26) apontava a origem comum de eventos como o colapso do preço das ações da agência de viagens virtual Expedia, a crise do empréstimo hipotecário e a queda do valor das ações da Blackstone, uma sociedade anônima que abriu seu capital no mês passado.

"Na raiz de todos esses eventos aparentemente sem conexão está uma nova realidade, uma realidade que pode significar problemas para toda a economia norte-americana: a era do dinheiro barato parece estar no fim", observava o jornal. Durante anos, o crédito fácil incentivou um crescimento aparentemente sem esforço do mercado financeiro. "Mas agora, a maioria dos investidores, que até um mês atrás estavam dispostos a emprestar dinheiro a baixas taxas de juro para Wall Street, está recuando, pois todos estão preocupados em ter que pagar o preço de um padrão de empréstimos totalmente frouxo".

"O problema começou num dos setores financeiros mais instáveis - o financiamento residencial para pessoas com má reputação no mercado - mas está se espalhando. Em conseqüência da escassez do crédito fácil, os pagamentos de grandes contratos empresariais começam a atrasar. A pergunta agora é até onde a dor vai se estender e quantas pessoas vão se machucar".