Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 13 de abril de 2007.
No primeiro turno das eleições presidenciais
do Timor Leste, realizado na última segunda-feira, o candidato
do Fretilin, Francisco Lu-Olo Guterres recebeu a maior
votação, com 28,8% do total, de acordo com resultados
preliminares. O primeiro-ministro José Ramos-Horta, que
concorreu como independente, recebeu 22,6% dos votos, à
frente dos seis outros candidatos, incluindo o candidato do Partido
Democrata, Fernando La Sama de Araújo, que
recebeu 18,6%. Devido ao fato que nenhum candidato obteve mais
que 50% dos votos, o segundo turno entre Guterres e Ramos-Horta
está marcado para 8 de Maio.
Candidatos da oposição, liderados por Araújo,
questionaram os resultados e estão ameaçando em
impetrar uma ação judicial, alegando a intimidação
aos eleitores e a alteração de votos. A Comissão
Eleitoral Nacional decidiu ontem não realizar a recontagem
de votos, a menos que seja ordenada por uma corte de apelações.
A mídia australiana fez denúncias de corrupção
contra o Fretilin. A incerteza das eleições certamente
causará instabilidade, dando ao governo Howard uma ótima
oportunidade para intervir. Canberra deixou claro que está
decidido a impedir uma vitória do Fretilin.
Cerca de 1.200 soldados australianos e neo-zelandeses ocupam
atualmente o Timor Leste. Essas forças foram enviadas em
maio passado, depois que o governo Howard fomentou uma cisão
violenta entre os militares do Timor Leste, a fim de favorecer
o domínio de Canberra sobre as reservas de petróleo
- e de gás - do país e abalar o poder do governo
de Mari Alkatiri, do Fretilin. O governo Howard considerou Alkatiri
muito próximo de potências rivais como a China e
Portugal, e um obstáculo aos interesses econômicos
e estratégicos da elite australiana. Enquanto Canberra
obtinha êxito na desestabilização de Alkatiri,
e no estímulo de seu candidato favorito, Ramos-Horta, o
Fretilin permanecia com uma ampla maioria no parlamento.
O governo Howard considera a eleição presidencial
e a eleição parlamentar - esta marcada para o dia
30 de junho - como um meio de minar futuramente o partido governante
e instalar um dócil governo pró-australiano. Camberra
apoiou os esforços de Ramos-Horta e do presidente Xanana
Gusmão em trocar os seus cargos através das eleições
presidenciais e parlamentares. Gusmão criou um novo partido
de direita para fortalecer a oposição ao Fretilin.
Seções da mídia australiana não
conseguiram conter sua satisfação ao serem divulgados
os primeiros os votos na capital, Dili, que indicavam que Ramos-Horta
tinha uma boa vantagem sobre Guterres, que nem aparecia entre
os dois primeiros candidatos. O tom mudou, entretanto, quando
Guterres ultrapassou Ramos-Horta, ao iniciar a divulgação
dos resultados das bases eleitorais do Fretilin, no leste do país.
As denúncias levantadas pelos candidatos de oposição
a respeito da corrupção e manipulação
dos votos ganharam cada vez mais força.
A mudança [no percentual entre os candidatos]
ocorrida hoje é que grande parte dos votos que estão
sendo apurados é das cidades do leste do país, particularmente
Baucau e Lautem, que são duas fortes bases eleitorais do
Fretilin naquela região, declarou a locutora da Rádio
ABC, Ann Barker, na quarta-feira. O Fretilin afirma possuir
muito bons propagandistas e organizadores naquela região,
e esta é a razão pela qual sua votação
cresceu tanto hoje. Mas à luz das denúncias levantadas
hoje à tarde, não nos surpreenderíamos houvesse
algo a mais por traz disso.
Não há provas que confirmem as denúncias
da oposição. Mais de 2.000 observadores, internacionais
e do Timor Leste, monitoraram os 700 postos de votação
e registraram poucas irregularidades. Alguns postos perderam cédulas
eleitorais, mas muitos desses postos estavam em áreas que
tradicionalmente apóiam o Fretilin. Araújo e outros
candidatos de oposição acusaram membros do Fretilin
de roubar os votos de 150.000 eleitores - com base na diferença
entre os 357.000 votos válidos e as 520.000 pessoas aptas
a votar. Entretanto, o chefe da missão da ONU no Timor
Leste, Atul Khare, explicou que o motivo da perda
das cédulas foi a diminuição do número
de eleitores que votaram, que ficou em torno de 70% abaixo das
estimativas iniciais.
As denúncias de fraude eleitoral estão sendo
divulgadas pela mídia australiana, como prevenção
da possível vitória de Guterres no segundo turno,
no próximo mês. A elite política e a imprensa
australiana irão, sem dúvida, considerar esse resultado
ilegítimo e fraudulento. Ramos-Horta está sendo
considerado como certo na disputa do segundo turno das eleições.
Tendo investido consideráveis recursos para desestabilizar
Alkatiri no último ano e manter sua ocupação
no país, o governo Howard não deixará que
uma eleição atrapalhe os seus planos.
Desilusão eleitoral
A eleição presidencial revelou uma ampla desilusão
dos eleitores com toda a elite política do Timor Leste.
Nenhum candidato recebeu mais que 30% de apoio. A votação
no Fretilin foi significantemente menor que os 57% dos votos que
ganhou nas eleições para a Assembléia Constituinte,
realizada em 2001. Este declínio é conseqüência
da frustração com os resultados da chamada independência
do Timor Leste. O Fretilin havia prometido a seus apoiadores que
a independência do país, conquistada em 2002, representaria
a base para o desenvolvimento econômico nacional e para
a elevação do padrão de vida da população.
Com o passar do tempo, isto mostrou ser uma enorme ilusão.
Enquanto a independência beneficiou uma minúscula
camada da elite do Timor, as pessoas comuns continuaram a sofrer
com a extrema pobreza. De acordo com o Banco Mundial, mais de
20% da população vive com menos de 1 dólar
por dia, e o desemprego nas áreas urbanas é maior
que 40%. Dezenas de milhares de pessoas desalojadas durante os
últimos anos ainda vivem em campos de refugiados sujos
e fedorentos.
Ramos-Horta tentou capitalizar sobre o recorde do Fretilin
ao se apresentar como o presidente para os pobres.
Tanto ele como Xanana Gusmão prometeram gastar a receita
obtida na venda de petróleo em programas sociais com o
objetivo de reduzir a pobreza e o desemprego. Comprometendo-se
a pagar US$ 40 por mês em pensões aos 100.000 timorenses
mais pobres, Ramos-Horta acusou Alkatiri de ser um conservador
fiscal.
O governo do Fretilin havia concordado com as exigências
do FMI de que os rendimentos provenientes do petróleo e
do gás natural fossem destinados a um fundo de investimento,
como uma suposta forma de prevenir a corrupção e
o desperdício. O propósito real, entretanto, era
garantir que a Austrália e outros países pudessem
se livrar da responsabilidade de ajudar financeiramente o Timor
Leste. A implementação desta medida por parte do
Fretilin demonstrou a natureza pró-mercado de seu programa,
contrariando a caracterização de marxista
feita por elementos de direita timorense e de seções
da mídia australiana.
Entretanto, o truque populista de Ramos-Horta sobre o fundo
do petróleo parece que não surtiu os resultados
desejados. O candidato recebeu apenas 22% dos votos, apesar do
apoio político - e provavelmente econômico - de Canberra
e Washington, e do apoio da mídia australiana, que o mostrava
como um fenômeno político. Por trás do apelo
de Ramos-Horta aos pobres está um claro apelo aos investidores
internacionais e aos interesses financeiros timorenses. Ele prometeu
eliminar todas as taxas, substituindo-as por uma pequena taxa
de 10%, a fim de fazer do Timor Leste um paraíso
fiscal, próximo apenas de Hong Kong, com o objetivo de
atrair investidores da Austrália e da região inteira.
O que permanece incerto é o número de votos Ramos-Horta
receberá, no segundo turno, dos eleitores dos outros seis
candidatos derrotados. Se, por um lado, a maioria dos candidatos
é fortemente anti-Fretilin, por outro, Ramos-Horta é
amplamente conhecido como um oportunista e um manipulador, motivado
somente pelos seus próprios interesses. Alguns dos candidatos
menores ameaçaram boicotar o segundo turno, caso não
fosse feita a recontagem dos votos do primeiro turno. Qualquer
que seja o resultado, nenhum dos problemas que afetam a classe
operária e os pobres do campo do Timor Leste serão
resolvidos.