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WSWS : Portuguese

Império da mídia de Murdoch trama a favor de uma guerra contra o Irã

Por Peter Symonds
22 Setembro 2006

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 9 de setembro

O editorial do Australian de segunda-feira, intitulado “Fim da linha para o Irã”, é mais um sinal de que as vastas fontes do império mundial das telecomunicações sob o comando de Murdoch estão sendo mobilizadas para apoiar uma nova guerra dos EUA contra o Irã. Um editorial semelhante denominado “Um Irã nuclear não é uma opção” foi publicado no mesmo jornal na semana anterior. No Times de Londres foi divulgado um texto de opinião intitulado “Que bagunça sobre o Irã”. Além disso, há a agitação contínua de comentadores da Fox News, nos EUA.

A mensagem comum é: o Irã desprezou os prazos finais da União Européia; está produzindo armas nucleares; o tempo está se esgotando; diplomacia é uma perda de tempo perigosa e a ação militar é um imperativo urgente. O mesmo tema dominou discursos recentes de Bush, Cheney e Rumsfeld ao longo da última semana, refletindo uma mudança definitiva na administração Bush. Seu propósito é o de igualar o regime de Teerã ao diabo e produzir um clima de medo e histeria indispensável para justificar a ação militar dos EUA contra o Irã. Murdoch e seus comitês editoriais seguiram o exemplo.

O editorial do Australian ignorou os esforços da União Européia e das potências européias no sentido de resolver o impasse nuclear por vias diplomáticas: “observando a lenta dança do Irã e do resto do mundo sob o programa nuclear de Teerã, duas coisas ficam cada vez mais claras. Os déspotas teocráticos do Irã estão determinados a adquirir armas atômicas, usando-as para ameaçar Israel e controlar não somente o Oriente Médio, mas para avançar além dessa região. Apesar disso, boa parte do mundo aparenta estar disposta a deixá-los alcançar seu objetivo”, declarava o editorial.

O argumento é recheado de cinismo e hipocrisia. Na invertida concepção do Australian, o regime iraniano é a principal ameaça à paz, procurando através da força militar “controlar não somente o Oriente Médio, mas avançar além dessa região”. Na verdade, a descrição se aplica melhor aos Estados Unidos, que em nome de sua falsa “guerra ao terror” ocuparam o Afeganistão, invadiram ilegalmente o Iraque e apoiaram a invasão criminosa de Israel ao Líbano. A administração Bush não hesita em “controlar” a região. Em meio às ruínas do Líbano, a Secretária de Estado, Condoleeza Rice, declarou abertamente que o objetivo de Washington seria o de moldar “um novo Oriente Médio”.

Da mesma maneira que ocorreu durante a invasão ao Iraque, os defensores da administração Bush não hesitam, atualmente, em basear-se em mentiras. O Australian não forneceu prova alguma para a grave acusação de que Teerã estaria “adquirindo armas nucleares”. Ao invés de evidências concretas, ele ofereceu o argumento ilusório de que o Irã, com sua vasta reserva de petróleo e gás, não teria necessidade de energia nuclear, e deveria estar, portanto, produzindo armas atômicas. No entanto, não foi o atual regime que iniciou os programas nucleares do Irã, mas o anterior, aquele do Xá Mohammed Reza Pahlavi, que tinha o apoio dos EUA. Foi também o Xá quem argumentou que o petróleo e o gás do país deveriam ser destinados à exportação. Foi ele também que, nos anos 60, planejou a construção de uma rede de 23 estações de energia nuclear, o que também recebeu o apoio dos EUA.

É possível que alguns setores do regime iraniano tenham ambições de produzir armas nucleares, mas após três anos de inspeções, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) não encontrou prova alguma. Apesar disso, a Agência se nega a admitir a inexistência de armas. Ao contrário, nega a inexistência: somos incapazes de provar que o Irã não possui programas de armas. Mesmo que o governo do Irã estivesse extremamente determinado em produzir a bomba atômica, seus aparelhos atuais são completamente inadequados para alcançar tal objetivo. Um reator para a investigação de água-pesada localizado em Arak, capaz de produzir plutônio, só poderia entrar em funcionamento em 2009. A aparelhagem de enriquecimento, localizada em Natanz, ainda possui apenas uma pequena cascata de 164 centrífugas operando a gás. Seriam necessárias milhares delas para produzir quantidades suficientes de urânio altamente enriquecido. Até mesmo na Avaliação da Inteligência Nacional, elaborada pela CIA e vazada no ano passado, admite-se que precisaria de uma década para que o Irã fosse capaz de produzir armas nucleares. Nada disso, no entanto, faz com que o Australian pare de afirmar grosseiramente: “cada vez mais se aproxima o dia no qual Teerã se tornará capaz de produzir uma bomba suja ou uma arma completa de fissão atômica”.

O sentimento de pânico que permeia o editorial do Australian é determinado pela profunda crise política enfrentada pela Casa Branca. As ocupações dos EUA no Afeganistão e no Iraque se tornaram desastres absolutos, a guerra de Israel (que teve o apoio dos EUA) contra o Hezbollah no Líbano foi outro desastre e, internamente, há hostilidade aberta à administração Bush, particularmente quanto à contínua presença militar dos EUA no Iraque. Mesmo assim, longe de recuar, os EUA estão se preparando para se lançar em uma nova aventura militar. Sua agenda é nada menos do que a afirmação da hegemonia norte-americana sobre as regiões do Oriente Médio e da Ásia Central, ricas em recursos naturais, ao mesmo tempo provocando uma tensão bélica com a finalidade de intimidar a oposição interna e justificar futuros ataques aos mais elementares direitos democráticos.

O verdadeiro veneno do Australian foi direcionado à “boa parte do mundo”, que dificulta a realização dos planos da administração Bush—Rússia e China, que se opuseram a quaisquer medidas punitivas contra o Irã, e as forças européias, que continuam a propor negociações, bem como alguns membros das instituições norte-americanas, que esboçaram sua preocupação quanto às conseqüências do militarismo intransigente dos EUA. O editorial fala por um governo que percebe seu profundo isolamento e sente, às vésperas das eleições de novembro e a apenas dois anos do término do segundo mandato de Bush, que seu tempo está se esgotando.

Como tem feito durante as guerras dos EUA contra a Iugoslávia, o Afeganistão e o Iraque, o jornal expôs o novo alvo de agressão como se esse fosse o agente “do mal” e o presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad o novo Hitler. Atacando os oponentes da administração Bush, declarou: “a esse respeito, o clima atual relembra o fim dos anos 30, quando muitos no Ocidente apoiavam o direito da Alemanha de se armar novamente por ter tido seu orgulho ferido pelo Tratado de Versalhes, ou relembra também os anos 40, quando alguns consideraram que o ataque japonês a Pearl Harbour foi simplesmente uma resposta às sanções em relação ao petróleo impostas ao Japão Imperial”.

Mas, assim como a Iugoslávia, o Afeganistão e o Iraque, o Irã não é uma potência imperialista. Diferentemente do Japão e da Alemanha dos anos 30, o Irã não possui capacidade militar suficiente para ameaçar seriamente os Estados Unidos, mesmo se produzisse armas atômicas. A comparação mais correta ao Terceiro Reich e ao regime do Japão Imperial é a própria administração Bush, que procura contrabalancear o declínio econômico dos Estados Unidos e tenta resolver o aprofundamento das contradições sociais por meio do uso de sua força militar, ameaçando seus rivais e estabelecendo um domínio extremo sobre importantes recursos naturais. Assim como os atuais admiradores e apoiadores da administração Bush, os apologistas do regime de Hitler encontravam-se, nos anos 30, entre as porções mais à direita das elites políticas.

O Australian retrata Ahmadinejad em termos apocalípticos, como um homem que reivindica para si o título de Imam (líder) “escondido”, o profeta do fim dos tempos. O objetivo do jornal é justificar a guerra como o único caminho: “ameaças diplomáticas e sanções poderiam ter o efeito perverso de encorajar o Sr. Ahmadinejad”. O Australian ignora o fato de que o regime iraniano tenha, ao longo da última década, demonstrado disposição para negociar o fim do impasse com os Estados Unidos. Os EUA, por outro lado, descartam repetidamente a possibilidade de realizar acordos com o Irã. Em discussões com os poderes europeus, uma das principais reivindicações de Teerã é a garantia de segurança, que tem sido continuamente descartada pela administração Bush com a seguinte afirmação—“todas as opções estão sobre a mesa”.

O Australian declara: “a única opção para o mundo é a opção militar, apesar da oportunidade de ataque contra o programa nuclear do Irã estar rapidamente se fechando, enquanto o Irã joga com o tempo e solidifica seu equipamento. O presidente dos EUA, George Bush, e o Primeiro Ministro de Israel, Ehmud Olmert, podem estar enfraquecidos por seus múltiplos de cálculo no Iraque e no Líbano, respectivamente. Mas eles podem também não ter escolha. Só lhes resta agir, já que ninguém mais no mundo parece preparado para tal”.

O propósito não era o de avisar Bush e Olmert. Como a equipe editorial de Murdoch sabe muito bem, a Casa Branca e o Pentágono têm estado envolvidos por mais de um ano na elaboração de planos detalhados para uma campanha aérea massiva contra o Irã. Falando no programa de rádio Democracy Now, no mês passado, o experiente jornalista Seymour Hersh explicou que a Casa Branca considerava a guerra de Israel contra o Líbano a precursora inevitável de uma guerra contra o Irã.

Questionado a respeito dos atuais planos dos EUA de bombardear o Irã, Hersh respondeu: “Bem, não se pode aplicar racionalidade a isso. Penso que é simplesmente algo que Bush e Cheney querem fazer. Como eu disse anteriormente, eles querem conquistar o Irã. Eles não querem fazer um acordo com o Irã. Eles consideram que o Irã é o eixo do mal ao cubo. E assim, francamente, minha real preocupação é em relação ao que acontecerá—eu penso que nada acontecerá antes das próximas eleições. Isso é impossível. Minha verdadeira preocupação é o que acontecerá quando George Bush estiver prestes a deixar o cargo, sem poder ser reeleito”.

Hersh escreveu uma série de abrangentes artigos no New Yorker, baseado em fontes do alto escalão do Pentágono e da CIA, nos quais ele detalha os planos para um ataque militar ao Irã, incluindo discussões censuradas sobre o uso de armas nucleares. Como indica o editorial do Australian, ao invés das derrotas no Líbano e no Iraque terem representado um freio para novos planos, elas se tornaram um novo incentivo à ação. Os setores mais fascistas da elite política norte-americana declaram estridentemente que os EUA não podem vencer no Iraque sem antes levar à luta a Síria e ao Irã.

Em seu artigo do mês passado, intitulado “A Verdadeira Guerra”, Michael Leeden, do conservador Instituto Empresarial Americano, expôs a tortuosa lógica do militarismo: “mesmo se continuarmos a vencer cada batalha em cada região do Iraque e do Afeganistão, nós vamos unicamente prolongar a luta... mas se o poder dos mullahs for substituído por um governo fortalecido por dezenas de milhões de pessoas pró-americanos e pró-democracia - pessoas hoje oprimidas pelos malvados senhores do terror em Teerã - a luta no Iraque e no Afeganistão seria rapidamente transformada numa operação cujo balanço de poder estaria decisivamente ao lado dos governos”, declarou ele.

Neste absurdo mundo de fantasia, os “malvados senhores do terror em Teerã” são responsáveis por todos os problemas enfrentados pela administração Bush. Remova-os e a população do Iraque, Afeganistão e Irã receberão os soldados norte-americanos de braços abertos. Esta é a linha do Australian. Esta é a receita de uma guerra interminável que tenta destruir a resistência da população do Oriente Médio às ambições dos EUA. Esta linha não procura convencer, mas forçar e intimidar. O editorial do Australian é mais uma indicação de que um ataque ao Irã está sendo planejado para mais cedo do que se pensa.