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Blair: tocando a marcha de guerra de Washington no Oriente Médio

Por Chris Marsden
22 Setembro 2006

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 12 de setembro de 2006.

A afirmação divulgada na mídia de que o primeiro ministro britânico, Tony Blair, foi ao Oriente Médio a fim de evitar conflitos internos que abalem o seu cargo de primeiro-ministro, ou que sua viagem teve como objetivo conseguir resgatar alguma credibilidade junto ao público, buscando demonstrar sua qualidade como estadista mundial, representa uma compreensão equivocada a respeito dele e de sua política.

Se sua motivação tivesse sido ganhar o apoio do eleitorado, porque ele teria escolhido o Líbano para sua visita?

Blair enfrentou vários protestos devido a seu apoio à guerra de Israel contra o Líbano, incentivada pelos Estados Unidos, guerra esta que já matou mais de 1.100 pessoas, na maioria civis. Blair se recusa a apoiar pedidos de cessar-fogo.

Uma mensagem veiculada na imprensa libanesa afirmava que tanto o Hezbollah quanto a coalizão de partidos libaneses tradicionais já tinham alertado que Blair não era bem vindo. Al Balad avisou sobre a possibilidade de ocorrer manifestações públicas, enquanto As-Safir chamou Blair de “o inglês feio”.

Galeb Abu Zeinab, membro destacado do bureau político do Hezbollah, disse que “Blair foi um verdadeiro aliado do assassinato de crianças e da destruição de milhares de lares; se ele não houvesse compactuado completamente com a posição EUA-Israel, a guerra não teria acontecido da maneira como ocorreu. Ele é co-responsável por todas essas atrocidades. Eu penso que ele deveria ser processado como um criminoso de guerra, juntamente com Bush e Olmert”.

O Partido Comunista Libanês, o Movimento Popular e vários outros partidos tradicionais divulgaram uma declaração na qual afirmam que “qualquer um que se reúna com Blair será considerado parceiro da agressão israelense”.

O clérigo xiita libanês de alto escalão, Sayyed Mohammad Hussein Fadlallah, disse que Blair deveria ser avisado para que ficasse distante. Assim “ele saberia que não somos tão ingênuos a ponto de recepcioná-lo bem quando ele contribuiu para massacrar nossas crianças”.

Nabih Berri, o orador do parlamento e dirigente do Partido da Esperança Xiita, deixou o Líbano para uma viagem de quatro dias à Suíça, a fim de evitar encontrar-se com Blair.

Para tentar prevenir manifestações, o governo criou uma zona de segurança no em torno do parlamento e de outros prédios oficiais. Blair foi escoltado por uma fila de automóveis que se deslocaram em alta velocidade desde o aeroporto, com milhares de soldados os seguindo. Tropas de carros blindados bloquearam as principais praças, obrigando milhares de manifestantes a se deslocarem para mais de um 1,5 quilômetro de distância do parlamento, onde ficaram cercados por uma enorme quantidade de policiais. Os manifestantes carregavam uma faixa, na qual se lia “em nome do povo libanês: obrigado por destruir nossas casas, vizinhanças e memórias”.

A entrevista concedida por Blair e pelo primeiro ministro libanês, Fouad Siniora, foi interrompida por uma militante pacifista irlandesa, Caoimhe Butterly, que gritou: “essa visita é um insulto. Você deveria se envergonhar, Tony Blair!”

Antes de ser reprimida por seguranças, Butterly agitou uma faixa que dizia “boicote ao apartheid israelense”.

Blair já esperava a hostilidade e o conseqüente constrangimento que ela produzira em seu país, mas seu público alvo não era o eleitorado britânico, e sim o governo Bush e a oligarquia em nome da qual governa. E a essa altura, ele pensa que o importante é mostrar a estes setores que ele é capaz de ignorar a oposição das massas. Ele deixou absolutamente claro que, mesmo que sua política seja impopular, não haverá nenhum recuo em relação ao seu apoio aos atos predatórios de Washington realizados para estabelecer a hegemonia norte-americana no Oriente Médio.

Numa conversa com Siniora, Blair prometeu míseros $93 milhões dos estimados $3,6 bilhões necessários para reconstruir a infra-estrutura que ajudou a destruir. Sua real preocupação é a de enfatizar a necessidade de desarmar o Hezbollah, conforme fora decidido na Resolução 1701 da ONU.

Isso é apenas uma pequena parte de toda a sua agenda.

Antes de sua visita a Beirute, Blair despendeu dois dias em Israel e nos territórios ocupados. No seu encontro com o primeiro ministro israelense Ehmud Olmert e com o presidente palestino Mahmoud Abbas, Blair procurou assegurar um acordo quanto à formação de um governo entre o Fatah, ao qual pertence Abbas, e o Hamas, baseado no reconhecimento do Estado de Israel por parte do Hamas, na renúncia da violência e na confirmação de acordos anteriores. Aparentemente ele teve algum sucesso pelo fato de Abbas ter se comprometido em estabelecer um governo de unidade nacional “em alguns dias” e Ohmert ter concordado com as negociações.

Na verdade, a pose de Blair como o emissário da paz tem como objetivo neutralizar a oposição popular à criação de uma entidade palestina fragmentada, dando, ao mesmo tempo, condições para que Israel continue anexando a margem ocidental e a totalidade de Jesrusalém. Ao mesmo tempo, Blair tenta conquistar uma trégua a ele próprio e a Olmert, que estão bastante enfraquecidos em função do fracasso na luta contra o Hezbollah, no Líbano.

Sua intenção principal é criar as melhores condições para que Israel, o aliado-chave de Washington na região, consiga impor seu poder político e militar contra o Irã e a Síria. Suas conversas com Olmert sobre o Irã não foram divulgadas. O único relato público foi feito por meio de uma entrevista coletiva concedida à imprensa, na qual Olmert descreveu Blair como “um dos maiores lutadores mundiais contra o terrorismo” e elogiou sua posição contra a suposta intenção de Teerã de produzir armas nucleares.

Da sua parte, Blair afirmou somente que “nós continuaremos firmes em relação ao caso iraniano”.

Numa entrevista à Haaretz, publicada no momento de sua chegada em Beirute, Blair foi mais claro quanto à importância da preparação do caminho de agressão ao Irã, comandada pelos EUA.

Nesta entrevista, o primeiro ministro afirmou que “a nova estratégia da comunidade internacional” é determinada pela existência de um “movimento global de inspiração extremista”, tendo o Irã “como direção”.

A terrível destruição ocorrida no Líbano indica que “enquanto prosseguir a guerra, é muito difícil para as pessoas pensarem em outra coisa que não seja o fim do conflito”. No entanto, “eu penso que esta situação tem possibilitado que as pessoas passem a ter uma noção mais clara das reais origens do conflito, e de como o Irã e, em extensão, a Síria, estão mexendo os pauzinhos para dar continuidade ao conflito”.

Isso foi certamente entendido pelos “líderes na Europa”, mas por enquanto as pessoas simples não entenderam: “há uma grande batalha a ser vencida entre os europeus e a opinião pública ocidental em geral... há um desejo em não se encarar o fato de que estamos em uma luta global. Todos estes assuntos estão relacionados com a América e com o desejo das pessoas de se associarem a ela”.

Para Blair, parte do problema está “em que, segundo a opinião pública ocidental, sempre nós é quem somos os culpados. Essas pessoas estão sempre insatisfeitas. Eles descarregam em nós, alegando que a culpa é nossa”.

Quando questionado se é possível comparar a oposição atual contra as sanções ao Irã com a conciliação com o nazismo nos anos 30, ele respondeu que sim:

“quando um presidente de um país tão poderoso como o Irã diz essas coisas, seria muito tolo da nossa parte se pensássemos que ele não está falando sério. Quando ele está tentando produzir uma arma nuclear, daí eu penso que os sinais de aviso são bem claros... eu penso que, se nós não nos preocuparmos com a situação atual, mesmo sabendo que um presidente de um país que diz que quer varrer outro país da face da terra começa a se capacitar a produzir armas nucleares, futuramente, historiadores lançarão algumas dúvidas a nosso respeito e a respeito das nossas opiniões.”

A posição intransigente de Blair é mais uma prova de que tanto ele quanto o governo Bush, em resposta à crise no Iraque e à crescente oposição política em seus países, estão preparando atos de agressão ainda mais bárbaros.

Setores em Washington estão profundamente preocupados com a crise política enfrentada por Blair. Indagam-se a respeito das mudanças na política externa inglesa que poderão ocorrer no caso de uma eventual saída de Blair do governo. Gerard Baker afirmou, num artigo publicado no Times de Rupert Murdoch, que “se o próximo primeiro-ministro for um líder real, e não um mero seguidor das tendências da opinião pública, ele tomará uma posição firme contra o sedutor anti-americanismo que tem desviado a Inglaterra e grande parte da Europa ... ele deve dizer, categoricamente, que quaisquer que sejam as nossas divergências, quaisquer que sejam as nossas desavenças, a Inglaterra ficará do lado da América”.

O principal rival de Blair, o chanceler Gordon Brown, garantiu que, se suceder Blair, não mudará o curso da política externa da Inglaterra. Ele deu uma entrevista exclusiva para o tablóide de Murdoch, o Sun, na qual ele promete visitar Nova Iorque para “reafirmar ao povo norte-americano que a Inglaterra—sob a corajosa liderança de Tony Blair—está agora como antes, ombro a ombro com eles... entre a justiça e o mal, a humanidade e a barbárie, a democracia e a tirania, ninguém pode ser neutro ou desinteressado”.