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Quem estava por trás do atentado à embaixada Americana na Síria?

Por Joe Kay
22 Setembro 2006

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 13 September 2006

Na terça-feira, oficiais sírios impediram uma tentativa de atentado à embaixada norte-americana em Damasco. Três dos criminosos foram baleados e mortos, enquanto o quarto era capturado. Três agentes de segurança da Síria foram feridos, juntamente com dez civis e um diplomata chinês.

As autoridades sírias responsabilizaram inicialmente um grupo pouco conhecido, chamado Jund al-Sham. De acordo com as informações existentes, este grupo tem vínculos com a Al Qaeda, de Osama bin Laden.

Ao avaliar um fato como este, é necessário, antes de mais nada, fazer a seguinte pergunta: “quem se beneficia com uma ação como esta?”—ou, nesse caso, “quem teria sido beneficiado?”

Quem poderia ter algum interesse em atacar a embaixada norte-americana? O atentado falhou por causa da intervenção de forças sírias, que foi facilitada pela qualidade aparentemente precária dos explosivos usados pelos criminosos. No entanto, caso o atentado tivesse dado certo, a conseqüência mais provável teria sido o aumento sistemático da pressão norte-americana contra a Síria. Seções do governo norte-americano assumiriam a responsabilidade do comando de ações militares contra a Síria e/ou contra o Irã.

Num artigo da revista Time publicado ontem (12 de setembro), Scott Macleod disse que, enquanto o regime da Síria mantém o conflito com os Estados Unidos, o governo Sírio não teria interesse em realizar ataque algum. “Assad sabe que isso poderia ser o motivo para uma investida militar americana na Síria”, escreveu ele. “As relações têm estado tensas há anos. Apesar das autoridades negarem, o pedido de retorno do embaixador norte-americano de Damasco, foi uma conseqüência do assassinato do primeiro ministro libanês Rafic Hariri, em fevereiro de 2005”. Por si só, o assassinato de Hariri é altamente suspeito, sendo impossível excluir o envolvimento de Israel e dos EUA neste acontecimento.

A hipótese menos provável é que o ataque tenha sido planejado por alguns indivíduos, motivados puramente pelo ódio aos Estados Unidos e à política norte-americana. Não é possível descartar completamente esta hipótese, mas a infiltração é uma constante em grupos como o Jund al-Sham, o que as torna extremamente suscetíveis às manipulações desta ou daquela força externa.

Tanto a agência de inteligência israelense quanto a norte-americana possuem um longo histórico de manipulação desses grupos. Sabe-se que o Jund al-Sham foi criado no Afeganistão, em 1999, por meio de uma aliança com Abu Musab al-Zarqawi, financiado por Osama bin Laden. Àquela época os EUA ainda faziam acordos com o Taliban e com os fundamentalistas islâmicos afegãos com o intuito de garantir a segurança do gasoduto que cruzava o país.

Desde a sua fundação, o Jund al-Sham sempre demonstrou pouco interesse em atacar os EUA. Seu alvo principal tem sido o governo Sírio, em função de sua orientação não religiosa. Ele atacou inclusive o Hezbollah, aliado da Síria.

Considerando o que ocorreu em 12 de setembro de 2006, deve-se recordar que, segundo o serviço de inteligência norte-americano, os ataques de cinco anos atrás foram executados por indivíduos que eram membros da Al Qaeda, autorizados a entrar e a sair dos EUA livremente, ter aulas de vôo e comprar passagens aéreas de primeira classe em grandes empresas aéreas—tudo isso sob os olhos da inteligência norte-americana, que sabia que a Al Qaeda planejava seqüestrar aviões e atacar os Estados Unidos. As seções da inteligência e da polícia norte-americana estavam preparadas para impedir qualquer ataque, mas preferiram deixar que ele acontecesse—com o intuito de criar um pretexto para realizar uma série de objetivos políticos dos EUA.

Durante as últimas semanas, diversos fatos ajudaram a nos lembrar da função extremamente conveniente exercida pela Al Qaeda na realização dos interesses do imperialismo norte-americano. Em grande parte dos discursos que se referiam a 11 de setembro, Bush reproduziu afirmações supostamente de Osama bin Laden, nas quais ele teria declarado que o Iraque é a peça central para a luta pelo “califado islâmico”. Isso obviamente é muito útil para o governo norte-americano, que gostaria de continuar a retratar a brutal ocupação do Iraque como parte da “guerra ao terror” e a relacionar essa ocupação, apesar de todas as evidências contrárias, aos ataques ocorridos em 11 de setembro de 2001.

Assim, pouco antes do aniversário, uma nova fita surgiu mostrando bin Laden saudando os seqüestradores de 11 de setembro pelos ataques: um outro conveniente lembrete de que a “guerra ao terror” continua.

De forma muito oportuna, os democratas acusaram a administração Bush de falhar em capturar e matar bin Laden. Fazem isso com a intenção de aparecerem como os mais consistentes defensores da “guerra ao terror”. Nenhum deles observa que a razão mais provável dele não ter sido capturado ou morto é o fato de que ele continua a ser muito útil à Agência Central de Inteligência. Antes de mais nada, foi a CIA que o adotou, na década de 80, como aliado na guerra contra a União Soviética, ocorrida no Afeganistão.

Agora ocorre um atentado na Síria, aparentemente organizado por um sombrio e amorfo grupo ligado a bin Laden. Este ataque acontece numa época em que as instituições políticas norte-americanas entram numa crise crescente. A ocupação no Iraque, por sua vez, também enfrenta uma profunda crise. Representantes democratas e republicanos exigem que um maior número de tropas norte-americanas se una às milícias Shia no sul e à organização Sunni, no oeste. A invasão israelense do Líbano tem sido um fracasso. Ela serviu somente para aumentar o prestígio do Hezbollah e a força do Irã na região.

Começam a aparecer os desentendimentos entre a Europa e os Estados Unidos com relação à política iraniana—sustentada no desastre israelita-americano no Líbano. A União Européia busca criar sua própria área de influência no regime do Teerã. Ao mesmo tempo, grande parte da população começa a rejeitar essa completa fraude de “guerra ao terror”, o que gera uma crescente oposição e ceticismo em relação aos EUA. O discurso do presidente no quinto aniversário está demonstrando claramente sua retórica irreal e inacreditável.

Existe uma significativa fração da elite norte-americana que considera como única solução para estes problemas um aprofundamento da ofensiva norte-americana—incluindo ataques ao Irã e à Síria e a completa militarização da sociedade norte-americana. Um ataque a uma embaixada norte-americana na Síria serviria, de maneira extremamente conveniente, como pretexto para ações como estas.

Não estamos afirmando que os agressores da última terça-feira estivessem trabalhando diretamente para seções da inteligência norte-americana. Individualmente, eles provavelmente eram motivados por uma combinação entre uma posição contrária à intervenção norte-americana no Oriente Médio e o caráter extremamente reacionário do fundamentalismo islâmico. Tais ações são organizadas de forma artesanal. Os indivíduos que se envolvem não percebem que estão sendo manipulados. A extrema precariedade da operação—que não conseguiu nem sequer entrar na embaixada—demonstra que os responsáveis diretos pelo planejamento da ação eram muito inexperientes.

É possível que isso servisse como um pretexto para atacar a Síria, e esse ataque poderia—e mesmo com o seu fracasso ainda pode—reforçar o argumento do governo norte-americano de que a guerra ao terror ainda não acabou, justificando assim a política e o discurso de Bush na segunda-feira. Isto ainda lhe permitiria aumentar a pressão sobre a Síria.

De fato, na terça-feira, além das observações que comumente são feitas após um atentado, os principais comentários dos membros do governo norte-americano tinham o seguinte teor: “parem de abrigar grupos terroristas, parem de ser agentes estimuladores do terror”, declarou o porta-voz da Casa Branca Tony Snow. “Trabalhar conosco para lutar contra o terror, assim como fez a Líbia—esse será o próximo passo da Síria”. A Secretária de Estado, Condoleezza Rice, disse que o atentado demonstrou que os terroristas ainda podem atacar instituições diplomáticas em qualquer lugar, apesar de todo “o esforço extraordinário” que tem sido feito para preveni-los.

É claro que, além do envolvimento norte-americano, existem diversas possibilidades que não devem ser descartadas. De qualquer forma, estes casos sempre dão margem à especulação.