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Pânico induzido oficialmente: terror britânico provoca grande onda de pequenos medos

Por Kate Randall
6 Setembro 2006

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 19 de Agosto de 2006

Mais de uma semana depois dos anúncios americano e britânico sobre a falência do plano terrorista de explodir linhas aéreas comerciais provenientes da Inglaterra com destino aos Estados Unidos, as afirmações oficiais ainda são desencontradas. As autoridades foram incapazes de provar qualquer evidência concreta que sustentasse a hipótese de que a polícia, por meio de prisões e investigações na Inglaterra, teria conseguido impedir uma ação que poderia ter tirado a vida de milhares de passageiros.

Na verdade, há detalhes significativos que indicam justamente o oposto. Além da revelação de que não havia bomba alguma, nenhum dos suspeitos—britânicos muçulmanos que continuam sob custódia, mesmo sem serem culpados—havia sequer comprado passagens aéreas. Alguns nem mesmo possuíam passaporte.

É cada vez mais evidente que a histeria do governo e da mídia sobre o alegado plano foi disseminada sem um embasamento sólido, mas tendo sempre o claro objetivo de dispersar a atenção em relação à crise crescente de ambos os governos, Blair e Bush. Diante da profunda falência militar e política no Iraque, da crescente oposição nacional em relação à guerra, da situação militar se deteriorando no Afeganistão e do desenvolvimento desfavorável para os EUA e para a Inglaterra na questão no Líbano, a divulgação do último suposto plano terrorista serviu para “mudar de assunto”, aumentando uma atmosfera de medo e pânico que os dois governos esperam utilizar para desorientar o público e facilitar novos ataques aos direitos democráticos.

Agora fica claro que não houve, de fato, nenhum ataque iminente a ser impedido. Mas a provocação massiva produzida por Washington e Londres acarretou a criação, de maneira generalizada, de um clima próximo à histeria, por meio dos círculos oficiais, da mídia, da indústria aeronáutica e das agências policiais, plantando uma série de incidentes onde as menores ocorrências eram noticiadas de forma sensacionalista e repletas de afirmações bárbaras e assustadores sobre rumores de novos “acontecimentos terroristas”.

Sob outras circunstâncias, essas ocorrências teriam sido encaradas de foram rotineira. Mas na situação atual, tornaram-se notícias de porte nacional e internacional—antes mesmo das desesperadas notícias terem sido devidamente provadas.

Esses casos seguem um padrão comum: alegações são levantadas pelas autoridades, a mídia entra em ação, sem fazer críticas, para promover e até mesmo embelezar a linha oficial. Rapidamente, as afirmações iniciais são abandonadas e a história passa a ficar de fora das manchetes, sem fazer menção às falsas reportagens iniciais, enquanto a mídia aguarda pelo próximo “perigo terrorista”.

Pânico de bombas, pousos de emergência

Novos incidentes estão sendo divulgados com tal freqüência que é difícil acompanha-los. O mais recente pânico em razão de bombas fictícias ocorreu na sexta-feira, quando um avião fretado com destino à Hurghada, no Egito, decolou do aeroporto de Gatwick, em Londres.

A polícia declarou que um passageiro encontrou um recado numa poltrona afirmando que havia uma bomba na aeronave. A notícia levou o piloto a ordenar um pouso de emergência. O jato 767 foi escoltado por um jato militar italiano para o aeroporto de Brindisi, na Itália. Carros dos bombeiros acompanharam o avião durante a aterrissagem e os passageiros foram desembarcados. Depois de confirmada a inexistência de bomba, a direção do aeroporto encerrou oficialmente o estado de emergência.

Um dia antes, um vôo de Heathrow, em Londres, à Washington, DC, fez uma aterrissagem de emergência em Boston, devido à suspeita em relação a uma mulher, que discutiu com os comissários de bordo.

Estações de televisão locais e da rede nacional interromperam suas programações normais para uma cobertura ao vivo do incidente, que teve a escolta de um jato F15 da força aérea, acompanhando-o a um pouso de emergência no aeroporto Logan. No aeroporto, as autoridades interrogaram os passageiros e suas bagagens foram revistadas por cães farejadores em busca de explosivos. Nada foi encontrado.

A suspeita era Catherine Mayo, uma mulher de 59 anos, de Vermont, que, segundo as autoridades, possuía um sotaque de uma língua estrangeira, podendo, por isso, ter, de alguma maneira, uma ligação com a Al Qaeda. Ainda foi divulgado que ela portava uma chave de fenda de aproximadamente quinze centímetros. A referência à chave de fenda foi posteriormente descartada. De acordo com o FBI, isso revelou que a possível conexão com a Al Qaeda se deu por uma vaga afirmação de Mayo de que “estava com pessoas associadas a ‘duas palavras'”.

Na última terça-feira divulgou-se que a mulher não representava nenhum perigo. Na verdade, o que ocorreu é que sua indisposição durante o vôo foi conseqüência de claustrofobia ou de pânico em relação a um possível ataque terrorista. O procurador americano Michael J. Sullivan afirmou: “por enquanto não há evidências de que esse tenha sido um incidente relacionado aos terroristas”.

Mayo foi intimidada e acusada pelos comissários de bordo, ficando presa durante a noite. Se condenada ela deverá cumprir 20 anos de prisão ou pagar uma multa de $250.000.

Na terça-feira, um aeroporto em West Virginia foi fechado por dez horas devido à existência de duas garrafas contendo líquidos na bagagem de mão de uma mulher. A suspeita era de que fossem resíduos explosivos. O serviço de vôo da empresa foi suspenso e cerca de cem passageiros e trabalhadores do aeroporto foram obrigados a abandonar o terminal.

Na investigação, foram utilizados cães farejadores e uma máquina de teste de explosivos da Transportation Security Administration (TSA). Deu “resultado positivo”. Mas, naquele mesmo dia, testes químicos não detectaram explosivo algum nas garrafas. Uma delas continha um tipo de gel de limpeza facial. Os testes feitos pela TSA detectam uma ampla gama de resíduos explosivos, alguns dos quais também são encontrados em utensílios domésticos comuns.

A mulher, de 28 anos, de descendência paquistanesa, foi levada do aeroporto por autoridades federais às cinco horas da tarde. Nenhuma acusação foi arquivada em relação a ela.

Na quarta-feira ocorreu um outro incidente que demonstra a produção de um estado de pânico em relação à explosivos: um perímetro de aproximadamente meio quilômetro foi cercado ao redor de um terminal de carga em Seattle, Washington, devido à notícia de que cães farejadores teriam encontrado bombas em pelo menos um container proveniente de um navio. Dúzias de pessoas foram obrigadas a abandonar o local.

O Serviço de Proteção aos Costumes e Fronteiras dos EUA declarou que a máquina de raio-X “revelou ‘anomalias' em dois containeres do Paquistão”. No entanto, nenhum material radioativo foi encontrado.

“Planos terroristas” por celulares

Na semana passada, a hipótese de um ataque terrorista supostamente planejado por um grupo de pessoas que continham uma grande quantidade de aparelhos celulares pré-pagos serviu como justificativa para diversas prisões e investigações. Em fevereiro e março, o FBI e o Departamento de Segurança Nacional enviaram boletins aos departamentos de polícia locais dos EUA. Nos boletins alertava-se que os lucros provenientes da revenda destes aparelhos não rastreáveis poderiam ser usados para o financiamento de organizações terroristas—ou ainda que os próprios aparelhos poderiam ser utilizados como detonadores de explosivos.

Na semana passada, foram noticiadas duas ocorrências envolvendo aparelhos de telefonia celular no Oriente Médio. No dia 11 de agosto, três homens do Texas de descendência palestina foram presos em Michigan, depois de tentar comprar 80 telefones celulares, de três em três. Adham Abdelhamid Othman, 21, Maruan Awad Muhareb, 18, e Louai Abdelhamied Othman, 23, foram presos do lado de fora do Wal-Mart em Caro, Michigan, cerca 80 quilômetros ao norte de Detroit, ao serem denunciados por trabalhadores da loja de celulares.

Através da investigação, descobriu-se que um dos homens possuía, numa câmera digital, imagens da ponte Makinac—que liga as penínsulas alta e baixa de Michigan. A partir disso, autoridades locais suspeitaram que havia um plano para explodir a ponte. A segurança da ponte foi reforçada em toda a sua extensão (cerca de cinco quilômetros).

Promotores públicos acusaram os homens de coletar e fornecer materiais para atos terroristas e inspecionar alvos vulneráveis à ações terroristas—crimes cuja pena máxima é de 20 anos de prisão. Os três foram condenados a uma fiança de $750.000 e ficaram detidos por aproximadamente cinco dias na prisão destinada à suspeitos terroristas, em Tuscola County.

Ao deporem judicialmente, no dia seguinte à prisão, os homens afirmaram que eles haviam comprado os aparelhos com o objetivo de revendê-los, e que haviam tirado fotos da ponte, além de fotos de lagos e de animais em habitat natural, na condição de meros turistas. Na segunda-feira, o escritório do FBI em Detroit informou que não havia informações suficientes que comprovassem qualquer “ligação direta dos homens com o terrorismo”.

Na quarta-feira, o promotor público de Tuscola County, Mark Reene, pediu que os suspeitos fossem liberados e ficassem sob a responsabilidade das autoridades federais. Os três compareceram ao Tribunal Regional, em Bay City, Michigan, na terça-feira, e foram acusados de fraude, conspiração federal e lavagem de dinheiro—acusações não relacionadas ao terrorismo.

Na segunda-feira, acusações semelhantes ocorreram perto de Ohio. Aqui também telefones celulares foram relacionados ao terrorismo. Da mesma maneira nada foi encontrado. Moradores de Dearborn, em Michigan, Osama Sabhi Abulhassan e Ali Houssaiky, ambos de 20 anos, foram presos no dia 8 de agosto em Marietta, Ohio, quando a polícia encontrou dúzias de celulares pré-pagos em seus carros, juntamente com $11.000 em dinheiro. A polícia foi informada pelo gerente da loja onde os dois compraram os aparelhos.

Os investigadores encontraram, no carro dos dois homens, listas de passageiros e um manual de segurança de um aeroporto (logo depois descobriram que a mãe de Houssaiky trabalha na Royal Jordanian Airlines e havia deixado no carro uma antiga lista de passageiros e um manual). Os dois foram acusados de colaboração com o terrorismo, lavagem de dinheiro, além de ter mentido à polícia sobre a finalidade dos telefones. Segundo a polícia, as declarações dos dois a respeito dos aparelhos foram contraditórias.

Da mesma forma que no suposto perigo de explosão da ponte Mackinac, em Michigan, centrais de notícias preveniram sobre a conexão terrorista. A cobertura da mídia assumiu uma forma particularmente frágil no blog de Debbie Schlussel, um programa de rádio local hospedado e ocasionalmente convidado da Fox News's “O'Reilly Factor”.

Numa notícia do blog intitulada “o terrorismo americano: como garotos de Dearborn foram dos campos de futebol para o terror islâmico”, Schussel escreveu que os dois homens presos em Ohio, ex-estudantes do Fordson High School em Dearborn, vieram do “mais populoso colégio muçulmano da América” sugerindo que qualquer estudante do Fordson poderia ser considerado um terrorista em potencial.

Mas na segunda-feira, as autoridades de Ohio afirmaram que não havia evidências suficientes para condenar Abulhassan e Houssaiky. Eles foram liberados na terça-feira, depois de passar uma semana atrás das grades, separados dos outros detentos. Com a intenção de utilizar todas as acusações que possui, o Promotor público de Washington, James Schneider, afirmou que seu escritório continuará a investigação em relação às acusações menores.

Ainda num outro caso relacionado a aparelhos de celular, a polícia em Tucson, no Arizona, tem procurado dois homens de descendência árabe que tentaram comprar 50 telefones celulares descartáveis numa loja do Sam's Club. As autoridades afirmam que os homens são procurados pela polícia, embora não pese sobre eles nenhuma acusação criminal.

O Centro de Informações Anti-Terrorista do Arizona avisou aos departamentos de polícia locais que havia um possível aumento de compras suspeitas de aparelhos de telefone celular pré-pagos. Todavia, o Centro admite ser improvável que a compra de tão grande número de aparelhos tenha como objetivo detonar uma bomba, pois isso poderia ser realizado com menores quantidades.

Apesar de tudo, a KVOA Television noticiou, gerando enorme pânico, que a polícia encontrara uma pista, segundo a qual dois homens de descendência árabe haviam comprado grandes quantidades de celulares em Huachuca City, no Arizona, ao sul de Tucson:

“A policia da cidade de Huachuca entrou em ação. Eles começaram a vigilância da Dollar General, filial das lojas da Family Dollar”.

“Ao ser denunciado à polícia, um Ford Explorer preto com placa da Califórnia, foi detido imediatamente”.

“Três pessoas—uma mulher e dois homens de descendência do árabe—foram presas, interrogadas e posteriormente liberadas pelos agentes federais”.

Novamente, nada de substancial revelou qualquer conexão entre ações terroristas e a compra de aparelhos celulares.

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