Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
nodia 27 de setembro de 2006.
Numa série de intervenções políticas
no começo desta semana, o ex-presidente democrata Bill
Clinton e o candidato à presidência derrotado em
2004, John Kerry, divulgaram o programa militar dos democratas
às eleições de novembro.
O pronunciamento de Clinton foi divulgado no domingo, por meio
de uma inflamada entrevista concedida a Chris Wallace, do canal
de televisão de direita Fox News.
Questionado por Wallace a respeito das razões que o
impediram, durante o seu mandato, de exterminar a Al Qaeda e Osama
bin Laden, Clinton respondeu de maneira agressiva, insistindoprecisamenteque
a pergunta de Wallace era parte de uma campanha dos conservadores
republicanos, utilizada para falsificar a história e desviar
a atenção pública em relação
às desastrosas derrotas da política do governo Bush.
O contra-ataque de Clinton, todavia, não era uma acusação
ao governo Bush por sua criminosa política armamentistade
fato, ele não mencionou uma palavra crítica em relação
ao atual desastre no Iraquemas defendeu particularmente
sua própria reputação enquanto patrocinador
de ações militares.
A parte mais extraordinária de sua apaixonada defesa
própriae, por conseqüência, do partido
democratafoi a declaração de que ele havia
planejado conquistar e ocupar o Afeganistão, aproximadamente
um ano antes dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001
em Washington e New York City.
Na entrevista, Clinton disse que depois do ataque [em
12 de outubro de 2000] ao navio norte-americano Cole, eu elaborei
planos de combate contra o Afeganistão, contra o Taliban,
e iniciei uma investigação de grandes proporções
em busca de bin Laden.
O que o impediu de iniciar a guerra deflagrada por Bush um
ano depois, disse ele, foi a necessidade prévia do exército
instalar bases militares no Uzbequistão, que
só foi possível depois do onze de setembro. Ele
lembrou também da demora da CIA e do FBI em responsabilizar
bin Laden pelo bombardeio do Cole, o que ocorreu somente depois
de Bush ter ingressado na Casa Branca.
Clinton declarou ainda que se eu ainda fosse presidente,
teríamos mais de 20.000 homens buscando a cabeça
de Osama bin Laden.
O que a declaração de Clinton revela é
que a guerra global contra o terror levada à cabo pelo
governo Bush logo após os ataques de onze de setembro foi
uma política consensual da elite dominante norte-americana,
apoiada por ambos os partidos majoritáriosdemocratas
e republicanos.
Realmente, pode ser que a guerra deflagrada por Bush no Afeganistão
tenha sido baseada em planos traçados no governo Clinton.
A ação que visava eliminar o regime Taliban,
assim como a guerra forjada contra o Iraque, não tiveram
como objetivo principal derrotar o terrorismo ou socorrer as populações
que viviam sob uma ditadura. Sua intenção era a
de realizar uma antiga aspiração dos EUA: conquistar
a hegemonia sobre as regiões ricas em petróleo na
Ásia Central e no Oriente Médio. Democratas e Republicanos
tentaram igualmente explorar os ataques de onze de setembro e
promover a guerra global ao terror como um pretexto
para alcançar seus objetivos imperialistas.
Clinton queixou-se de que os republicanos acusavam os democratas,
nas eleições de 2002, de serem fracos frente
ao terror. Nosso partido apoiou os republicanos na
tarefa de investigar armas no Iraque e concordou cem por cento
com o que ocorreu no Afeganistão. Eles não têm
motivo algum para acusar-nos de sermos indiferentes ao terror,
declarou ele, enfatizando que os estrategistas republicanos deliberadamente
provocaram um conflito, introduzindo uma pílula de
veneno na legislação de segurança nacional,
na medida em que propuseram retirar aproximadamente 170.000 agentes
federais do serviço de segurança civil.
A realidade é que os democratas concederam poderes sem
precedentes a Bush para que se iniciasse uma guerra forjada, como
parte de uma cínicae covardeestratégia
eleitoral que procura esconder os problemas ocorridos no Iraque,
deslocando o eixo da campanha eleitoral para assuntos econômicos
e sociais. Em meio à aberta preparação da
guerra, o partido não ofereceu alternativa àqueles
que se opunham a tais agressões. Ao mesmo tempo, não
exigiu que o governo enfrentasse questões sérias
como o desemprego, a queda das condições de vida,
saúde e educação da maioria da população
norte-americana. Como conseqüência, um governo que
assumiu o poder por meio de um processo eleitoral fraudulento
e que enfrentou uma forte oposição foi conquistando
significativas vantagens em ambos os poderes.
Como tornam claras as observações de Clinton,
a liderança democrata tem a intenção de concorrer
nas próximas eleições mais uma vez se esquivando
de travar qualquer debate sério. Desta vez, todavia, procura
tratar o governo Bush como suave em relação
ao terrorismo e promover o partido democrata como o campeão
na escalada militar no Afeganistão.
Clinton lembrou ainda, com muita satisfação,
que o secretário naval de Reagan, James Webb,
está concorrendo como candidato do partido Democrata ao
Senado pelo Estado de Virginia, e que um gabaritado almirante,
antigo membro do Conselho de Segurança Nacional, que também
lutou contra o terror, Joe Sestak, está disputando
uma cadeira no Congresso da Pensilvânia pelo seu partido.
Nós temos uma presença militar maciça
nesta campanha, declarou Clinton. E nós não
podemos permitir que eles, por meio de simples retórica,
nos rotulem de forma mentirosa.
Numa coluna preparada para o editorial do Wall Street Journal,
o senador democrata de Massachusetts, John Kerrycandidato
do partido à presidência nas eleições
de 2004desenvolveu um tema similar. Lamentando a existência
de uma oposição à ocupação
do Afeganistão liderada pelos EUA, Kerry declarou: nós
precisamos mudar nossa direçãocomeçando
com o envio de, no mínimo, mais 5.000 soldados norte- americanos.
Continuou ele: isso inclui mais forças especiais
para derrotar o Taliban; mais equipes para assuntos civis, a fim
de sustentar as promissoras Equipes Provisórias de Reconstrução;
mais infantarias para prevenir da infiltração Taliban
pelo Paquistão; mais unidades de inteligência secreta
para procurar a al Qaeda em todos os lados da fronteira; mais
aviões militares para prover inteligência em tempo
real; mais helicópteros e aeronaves de transporte que permitam
uma rápida reposição; e mais equipamentos
pesados de combate para superar as forças inimigas.
Kerry concluiu: os EUA não devem fugir da linha
de frente real da guerra ao terror. Nós devemos reassumir
a responsabilidade pela vitória no Afeganistão.
A entrevista com Clinton e a coluna de Kerry põem às
claras que a direção do partido democrata está
totalmente determinada a não permitir que os republicanos
acusem o partido, durante a campanha eleitoral, de fraco
na questão da segurança ou suave em
relação ao terrorismo.
Fica claro que esta é uma estratégia nacional,
sobretudo se observarmos que a liderança democrata atou
suas mãos e calou sua boca enquanto o governo Bush procura
golpear a legislação, ao buscar a legalização
da tortura, assim como do poder de julgar e punir supostos combatentes
inimigos e investigar toda a população norte-americana.
Ambos os lados estavam de acordo, até que alguns deputados
republicanos levantarem objeções em relação
às medidas.
Howard Dean, o presidente do Comitê Democrata Nacional,
por enquanto, elogiou Clinton por sua performance no Foz News:
o presidente Clinton se manteve de pé frente às
táticas ilusionistas da máquina de propaganda da
direita, declarou Dean. Como foi divulgado hoje pela
Inteligência Nacional de Estimativas, a guerra do Iraque
e as políticas equivocadas do governo Bush prejudicaram
a possibilidade de vencer a guerra ao terror. Como disse o presidente
Clinton, os democratas se responsabilizam por medidas políticas
tão agressivas quanto inteligentes e nós continuamos
comprometidos em vencer a guerra ao terror.
E a senadora Hillary Clinton, de New York, repetiu esta mesma
retórica, na sua mais difícil e inarticulada forma.
Numa declaração publicada em sua página eletrônica,
ela comentou o testemunho feito segunda-feira, durante um painel
organizado pelos democratas sobre a guerra do Iraque, por três
comandantes militares recentemente afastados. Enquanto criticavam
o Secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, os oficiais reivindicaram
uma ampliação da guerra, com muito mais tropas e
uma prolongada presença dos militares no Iraque.
O General Paul Eaton, que liderou o treinamento militar no
Iraque, afirmou que deveriam ser enviados cerca de 60.000 soldados
adicionais. John Batiste, comandante da Primeira Divisão
da Infantaria do Exército, declarou: não há
outra saída senão a vitória. Eu acredito
que nós devemos completar o que já iniciamos no
Iraque e no Afeganistão. Ele acrescentou ainda: devemos
mobilizar nosso país para um enfrentamento prolongado.
Um terceiro testemunho, de um Coronel da Marinha, disse que a
guerra deve continuar por uma década ou mais.
Demonstrando total acordo com estes reivindicações
por uma escalada norte-americana de violência contra o Iraque,
Hillary Clinton declarou que o nosso problema em relação
ao governo é que, como dissemos, vocês sabem, a retórica
deles não tem sido compatível com os recursos ou
resoluções na direção necessária.
Então ouvimos constantemente aquilo que vocês sabem:
nós não podemos mudar, nós temos que
fazer isso, como se estivéssemos recebendo conselhos
do que deve ser feito.
O que a retórica de toda essa campanha torna muitíssimo
claro é que em 2006assim como em 2002 e 2004o
partido democrata confirmará que as eleições
não serão transformadas num referendum contra a
decisão do governo Bush de iniciar uma guerra de agressão
contra o Iraque.
Ao invés disso, as acusações dos democratas
ao governo Bush baseiam-se na premissa de que ele teve um desempenho
ruim nessa guerra, ao desviar recursos que deveriam ter sido destinados
ao Afeganistão. Tanto esta como as guerras que estão
por vir, deveriam, segundo os democratas, ser encaradas de forma
mais eficiente.
Enquanto líderes democratas expõem planos para
prosseguir com a guerra do Afeganistão e se solidarizam
com os militares, defendendo a expansão sem limites da
ocupação do Iraque, não há grande
figura no partido que não tenha adiado a proposta para
a retirada das tropas dos EUA do Iraqueo caminho preferido
pela grande maioria da população norte-americana,
de acordo com sucessivas pesquisas de opinião. Esta vasta
parcela da população, que considera a guerra o assunto
mais importante, está, mais uma vez, efetivamente encurralada
pelo sistema bipartidário.
Uma verdadeira luta contra a guerra do Iraque e contra o perigo
de novas guerras de agressão somente pode ser vitoriosa
por meio da quebra do monopólio político exercido
por esses dois partidos controlados pela oligarquia financeira
dos EUA. Isso requer o desenvolvimento de um novo e independente
partido político das massas trabalhadoras, baseado num
programa socialista que confronte as raízes do problema
da guerra: o sistema de lucros em si.
Esta é a causa pela qual o Socialist Equality Party
e seus candidatos vêm lutando nas eleições
de 2006, avançando como uma alternativa socialista para
o programa bipartidário da guerra, ataques aos direitos
democráticos, e a destruição dos padrões
de vida e das condições sociais da classe trabalhadora
norte-americana.