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Clinton e Kerry definem programa eleitoral pró-guerra

Por Bill Van Auken, candidato do Socialist Equality Party (SEP) por Nova York ao Senado norte-americano
29 Setembro 2006

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 27 de setembro de 2006.

Numa série de intervenções políticas no começo desta semana, o ex-presidente democrata Bill Clinton e o candidato à presidência derrotado em 2004, John Kerry, divulgaram o programa militar dos democratas às eleições de novembro.

O pronunciamento de Clinton foi divulgado no domingo, por meio de uma inflamada entrevista concedida a Chris Wallace, do canal de televisão de direita Fox News.

Questionado por Wallace a respeito das razões que o impediram, durante o seu mandato, de exterminar a Al Qaeda e Osama bin Laden, Clinton respondeu de maneira agressiva, insistindo—precisamente—que a pergunta de Wallace era parte de uma campanha dos conservadores republicanos, utilizada para falsificar a história e desviar a atenção pública em relação às desastrosas derrotas da política do governo Bush.

O contra-ataque de Clinton, todavia, não era uma acusação ao governo Bush por sua criminosa política armamentista—de fato, ele não mencionou uma palavra crítica em relação ao atual desastre no Iraque—mas defendeu particularmente sua própria reputação enquanto patrocinador de ações militares.

A parte mais extraordinária de sua apaixonada defesa própria—e, por conseqüência, do partido democrata—foi a declaração de que ele havia planejado conquistar e ocupar o Afeganistão, aproximadamente um ano antes dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 em Washington e New York City.

Na entrevista, Clinton disse que “depois do ataque [em 12 de outubro de 2000] ao navio norte-americano Cole, eu elaborei planos de combate contra o Afeganistão, contra o Taliban, e iniciei uma investigação de grandes proporções em busca de bin Laden”.

O que o impediu de iniciar a guerra deflagrada por Bush um ano depois, disse ele, foi a necessidade prévia do exército “instalar bases militares no Uzbequistão”, que só foi possível depois do onze de setembro. Ele lembrou também da demora da CIA e do FBI em responsabilizar bin Laden pelo bombardeio do Cole, o que ocorreu somente depois de Bush ter ingressado na Casa Branca.

Clinton declarou ainda que “se eu ainda fosse presidente, teríamos mais de 20.000 homens buscando a cabeça de” Osama bin Laden.

O que a declaração de Clinton revela é que a guerra global contra o terror levada à cabo pelo governo Bush logo após os ataques de onze de setembro foi uma política consensual da elite dominante norte-americana, apoiada por ambos os partidos majoritários—democratas e republicanos.

Realmente, pode ser que a guerra deflagrada por Bush no Afeganistão tenha sido baseada em planos traçados no governo Clinton.

A ação que visava eliminar o regime Taliban, assim como a guerra forjada contra o Iraque, não tiveram como objetivo principal derrotar o terrorismo ou socorrer as populações que viviam sob uma ditadura. Sua intenção era a de realizar uma antiga aspiração dos EUA: conquistar a hegemonia sobre as regiões ricas em petróleo na Ásia Central e no Oriente Médio. Democratas e Republicanos tentaram igualmente explorar os ataques de onze de setembro e promover a “guerra global ao terror” como um pretexto para alcançar seus objetivos imperialistas.

Clinton queixou-se de que os republicanos acusavam os democratas, nas eleições de 2002, de serem “fracos frente ao terror”. “Nosso partido apoiou os republicanos na tarefa de investigar armas no Iraque e concordou cem por cento com o que ocorreu no Afeganistão. Eles não têm motivo algum para acusar-nos de sermos indiferentes ao terror”, declarou ele, enfatizando que os estrategistas republicanos deliberadamente provocaram um conflito, introduzindo uma “pílula de veneno” na legislação de segurança nacional, na medida em que propuseram retirar aproximadamente 170.000 agentes federais do serviço de segurança civil.

A realidade é que os democratas concederam poderes sem precedentes a Bush para que se iniciasse uma guerra forjada, como parte de uma cínica—e covarde—estratégia eleitoral que procura esconder os problemas ocorridos no Iraque, deslocando o eixo da campanha eleitoral para assuntos econômicos e sociais. Em meio à aberta preparação da guerra, o partido não ofereceu alternativa àqueles que se opunham a tais agressões. Ao mesmo tempo, não exigiu que o governo enfrentasse questões sérias como o desemprego, a queda das condições de vida, saúde e educação da maioria da população norte-americana. Como conseqüência, um governo que assumiu o poder por meio de um processo eleitoral fraudulento e que enfrentou uma forte oposição foi conquistando significativas vantagens em ambos os poderes.

Como tornam claras as observações de Clinton, a liderança democrata tem a intenção de concorrer nas próximas eleições mais uma vez se esquivando de travar qualquer debate sério. Desta vez, todavia, procura tratar o governo Bush como “suave em relação ao terrorismo” e promover o partido democrata como o campeão na escalada militar no Afeganistão.

Clinton lembrou ainda, com muita satisfação, que “o secretário naval de Reagan”, James Webb, está concorrendo como candidato do partido Democrata ao Senado pelo Estado de Virginia, e que “um gabaritado almirante, antigo membro do Conselho de Segurança Nacional, que também lutou contra o terror”, Joe Sestak, está disputando uma cadeira no Congresso da Pensilvânia pelo seu partido. “Nós temos uma presença militar maciça nesta campanha”, declarou Clinton. “E nós não podemos permitir que eles, por meio de simples retórica, nos rotulem de forma mentirosa”.

Numa coluna preparada para o editorial do Wall Street Journal, o senador democrata de Massachusetts, John Kerry—candidato do partido à presidência nas eleições de 2004—desenvolveu um tema similar. Lamentando a existência de uma oposição à ocupação do Afeganistão liderada pelos EUA, Kerry declarou: “nós precisamos mudar nossa direção—começando com o envio de, no mínimo, mais 5.000 soldados norte- americanos”.

Continuou ele: “isso inclui mais forças especiais para derrotar o Taliban; mais equipes para assuntos civis, a fim de sustentar as promissoras Equipes Provisórias de Reconstrução; mais infantarias para prevenir da infiltração Taliban pelo Paquistão; mais unidades de inteligência secreta para procurar a al Qaeda em todos os lados da fronteira; mais aviões militares para prover inteligência em tempo real; mais helicópteros e aeronaves de transporte que permitam uma rápida reposição; e mais equipamentos pesados de combate para superar as forças inimigas”.

Kerry concluiu: “os EUA não devem fugir da linha de frente real da guerra ao terror. Nós devemos reassumir a responsabilidade pela vitória no Afeganistão”.

A entrevista com Clinton e a coluna de Kerry põem às claras que a direção do partido democrata está totalmente determinada a não permitir que os republicanos acusem o partido, durante a campanha eleitoral, de “fraco na questão da segurança” ou “suave em relação ao terrorismo”.

Fica claro que esta é uma estratégia nacional, sobretudo se observarmos que a liderança democrata atou suas mãos e calou sua boca enquanto o governo Bush procura golpear a legislação, ao buscar a legalização da tortura, assim como do poder de julgar e punir supostos “combatentes inimigos” e investigar toda a população norte-americana. Ambos os lados estavam de acordo, até que alguns deputados republicanos levantarem objeções em relação às medidas.

Howard Dean, o presidente do Comitê Democrata Nacional, por enquanto, elogiou Clinton por sua performance no Foz News: “o presidente Clinton se manteve de pé frente às táticas ilusionistas da máquina de propaganda da direita”, declarou Dean. “Como foi divulgado hoje pela Inteligência Nacional de Estimativas, a guerra do Iraque e as políticas equivocadas do governo Bush prejudicaram a possibilidade de vencer a guerra ao terror. Como disse o presidente Clinton, os democratas se responsabilizam por medidas políticas tão agressivas quanto inteligentes e nós continuamos comprometidos em vencer a guerra ao terror”.

E a senadora Hillary Clinton, de New York, repetiu esta mesma retórica, na sua mais difícil e inarticulada forma. Numa declaração publicada em sua página eletrônica, ela comentou o testemunho feito segunda-feira, durante um painel organizado pelos democratas sobre a guerra do Iraque, por três comandantes militares recentemente afastados. Enquanto criticavam o Secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, os oficiais reivindicaram uma ampliação da guerra, com muito mais tropas e uma prolongada presença dos militares no Iraque.

O General Paul Eaton, que liderou o treinamento militar no Iraque, afirmou que deveriam ser enviados cerca de 60.000 soldados adicionais. John Batiste, comandante da Primeira Divisão da Infantaria do Exército, declarou: “não há outra saída senão a vitória. Eu acredito que nós devemos completar o que já iniciamos no Iraque e no Afeganistão”. Ele acrescentou ainda: “devemos mobilizar nosso país para um enfrentamento prolongado”. Um terceiro testemunho, de um Coronel da Marinha, disse que a guerra deve continuar por uma década ou mais.

Demonstrando total acordo com estes reivindicações por uma escalada norte-americana de violência contra o Iraque, Hillary Clinton declarou que “o nosso problema em relação ao governo é que, como dissemos, vocês sabem, a retórica deles não tem sido compatível com os recursos ou resoluções na direção necessária. Então ouvimos constantemente aquilo que vocês sabem: ‘nós não podemos mudar, nós temos que fazer isso’, como se estivéssemos recebendo conselhos do que deve ser feito”.

O que a retórica de toda essa campanha torna muitíssimo claro é que em 2006—assim como em 2002 e 2004—o partido democrata confirmará que as eleições não serão transformadas num referendum contra a decisão do governo Bush de iniciar uma guerra de agressão contra o Iraque.

Ao invés disso, as acusações dos democratas ao governo Bush baseiam-se na premissa de que ele teve um desempenho ruim nessa guerra, ao desviar recursos que deveriam ter sido destinados ao Afeganistão. Tanto esta como as guerras que estão por vir, deveriam, segundo os democratas, ser encaradas de forma mais eficiente.

Enquanto líderes democratas expõem planos para prosseguir com a guerra do Afeganistão e se solidarizam com os militares, defendendo a expansão sem limites da ocupação do Iraque, não há grande figura no partido que não tenha adiado a proposta para a retirada das tropas dos EUA do Iraque—o caminho preferido pela grande maioria da população norte-americana, de acordo com sucessivas pesquisas de opinião. Esta vasta parcela da população, que considera a guerra o assunto mais importante, está, mais uma vez, efetivamente encurralada pelo sistema bipartidário.

Uma verdadeira luta contra a guerra do Iraque e contra o perigo de novas guerras de agressão somente pode ser vitoriosa por meio da quebra do monopólio político exercido por esses dois partidos controlados pela oligarquia financeira dos EUA. Isso requer o desenvolvimento de um novo e independente partido político das massas trabalhadoras, baseado num programa socialista que confronte as raízes do problema da guerra: o sistema de lucros em si.

Esta é a causa pela qual o Socialist Equality Party e seus candidatos vêm lutando nas eleições de 2006, avançando como uma alternativa socialista para o programa bipartidário da guerra, ataques aos direitos democráticos, e a destruição dos padrões de vida e das condições sociais da classe trabalhadora norte-americana.