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Junta militar assume o governo na Tailândia

Por John Roberts
18 Octubre 2006

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 14 de outubro de 2006.

A junta militar que tomou o poder no dia 19 de setembro definiu seu ministério na segunda-feira (09/10). O rei Bhumibol Adulyadej aprovou formalmente uma lista de 26 ministros submetidos ao primeiro-ministro temporário, Sarayud Chulanont, ex-comandante do exército.

O gabinete, composto predominantemente por burocratas civis, não passa de uma fachada política para os militares. As forças armadas, com a bênção do rei, derrubaram o governo do primeiro-ministro Thaksin Shinawatra, anularam a constituição e fecharam o parlamento. O líder do golpe, o general Sonthi Boonyaratkalin, preside o Conselho de Segurança Nacional (CSN) que, sob uma constituição provisória, possui poder absoluto sobre as ações do novo governo.

O ministro da defesa é o general aposentado Boonrawd Somtas, que estudou com o novo primeiro-ministro. Ele anunciou na quarta-feira que a lei marcial, que proibiu toda atividade política e censurou a imprensa, será mantida. Ele disse que as medidas permanecerão válidas por pelo menos um mês, já que a situação ainda encontra-se instável.

O CSN também nomeou uma Assembléia Legislativa Nacional (ALN), composta por 242 membros, para substituir o parlamento. Este grupo escolhido a dedo inclui 35 oficiais da ativa ou da reserva, e 60 funcionários do governo, alguns aposentados e outros ainda em atividade. Submetida à Constituição provisória, a Assembléia tem a função de aprovar leis e fiscalizar a redação de uma Constituição permanente.

Uma nomeação importante foi a escolha de um muçulmano, Aree Wongarya, para o cargo de ministro do interior. Seu vice é Banyat Jansena, ex-líder do Centro de Administração das Províncias Periférico do Sul abolido por Thaksin em 2001. Essas indicações são mais uma evidência de que a motivação para o golpe militar foi a preocupação com a crescente rebelião separatista no sul do país, estimulada pelas medidas repressivas de Thaksin.

Líderes muçulmanos da Tailândia receberam bem as indicações como uma demonstração de que o novo governo está disposto de resolver o conflito. O ex-primeiro-ministro da Malásia, Mahathir Mohamad, revelou na semana passada que ele, juntamente com o atual governo da Malásia, estiveram envolvidos durante meses em conversas secretas com líderes militares a fim de negociar um acordo de paz que acabasse com a rebelião.

A participação de civis no governo é uma tentativa deliberada de apaziguar as críticas internacionais, bem como as preocupações dos investidores estrangeiros. O tecnocrata de maior expressão é o chefe do Banco Central do país, Peridiyathron Devakula, que se tornou vice-primeiro-ministro e ministro das finanças. Burocratas veteranos foram indicados aos ministérios do trabalho, da agricultura e do comércio. Dentre todos os ministros, apenas um oficial da ativa foi nomeado - um almirante - para o ministério dos transportes.

De qualquer forma, para os investidores internacionais, o principal problema não é a composição dos ministérios, mas a política econômica. A este respeito, já surgiram divergências no interior do governo. Como a International Herald Tribune noticiou no dia 9 de outubro: “[O primeiro-ministro] Surayud impressionou os mercados este mês ao afirmar que o foco estaria mais voltado a manter felicidade do povo do que proporcionar o crescimento econômico, e Pridiyathorn garantiu aos investidores internacionais que a Tailândia permaneceria comprometida com a economia global”.

O jornal não se preocupou em explicar por que os mercados deveriam ficar “impressionados” pelo fato de alguém colocar a felicidade das pessoas acima do crescimento econômico. Afinal, segundo a ortodoxia predominante entre os defensores do capitalismo global, as reformas de mercado, o crescimento econômico e a felicidade das pessoas coincidem. Mas como bem sabem os grandes investidores, a agenda de reestruturação econômica do Banco Mundial e do FMI tem resultado no aprofundamento da disparidade social e no aumento do descontentamento popular na Tailândia, assim como em outros países.

Tensões econômicas e sociais

O governo apoiado pelos militares está enfrentando os mesmos dilemas econômicos e políticos enfrentados pelo antigo governo. Thaksin e seu partido, o Thai Rak Thai (TRT), venceram as eleições de 2001 e 2005 através da oposição aberta à submissão do governo do Partido Democrático às medidas do FMI impostas após a crise econômica de 1997-1998. Thaksin conseguiu montar uma base de apoio entre os pobres da cidade e do campo prometendo um plano de saúde universal, fundos destinados aos povoados e vilarejos, e empréstimos com juros baixos concedidos por um Banco Popular.

Enquanto esteve no poder, Thaksin encontrou dificuldades para conquistar o equilíbrio. Ele implementou medidas populistas limitadas e ajudou a apoiar os negócios da burguesia tailandesa, enfrentando a crescente competição internacional. Com o crescimento da oposição ao seu governo, Thaksin passou a censurar cada vez mais a imprensa, a assumir uma dura posição baseada na lei-e-ordem sobre supostos traficantes de drogas, e a provocar a opinião pública ao reprimir impiedosamente os separatistas muçulmanos.

Ao mesmo tempo, no entanto, Thaksin ficou sob intensa pressão internacional para que promovesse privatizações, cortasse gastos do governo e realizasse outras reformas de mercado, incluindo um tratado de livre comércio com os EUA. Estas medidas afastaram setores da classe trabalhadora e da classe média, bem como setores da elite governante, despertando uma forte luta política após a vitória esmagadora do TRT nas eleições do ano passado.

O magnata da imprensa que apoiava Thaksin no passado, Sondhi Limthongul, começou a organizar protestos anti-Thaksin em Bangcoc, baseados nas denúncias de corrupção na venda, ocorrida em janeiro este ano, de $1.9 bilhões das ações da Shin Corp pertencentes à família Thaksin. Estas manifestações chegaram a reunir mais de 100 mil pessoas. Em abril estourou uma crise institucional em conseqüência do boicote realizado pela oposição à eleição convocada por Thaksin, que tinha como objetivo ampliar sua base política. Receando o crescimento da instabilidade política e social, os militares entraram em cena para garantir o controle da situação.

Do mesmo modo que Thaksin, a junta está agora tentando reforçar sua base de apoio através de medidas populistas. O governo do TRT havia introduzido a assistência médica por um custo de simbólicos 30 baths. O novo governo deu um passo além, ao anunciar a abolição desse pequeno pagamento. Numa visita à base do TRT numa região agrícola situada no nordeste do país, o primeiro-ministro Surayud Cholanont disse aos líderes locais: “Eu insisto que nada vai mudar com o novo governo. Os projetos sociais só vão melhorar, ganhando mais transparência”.

O gabinete também engavetou aquilo que era considerado o eixo central dos planos de reestruturação de Thaksin - a privatização da empresa de geração de energia - Electricity Generating Authority of Thailand (EGAT). O ministro da energia, Piyasuasti Amranand, responsável pela privatização da EGAT no governo Thaksin, anunciou a paralisação deste programa. Ele afirmou que o novo governo se concentrará na promoção da harmonia social.

O governo já está sob a pressão dos investidores internacionais. A última edição do Newsweek noticiou que setores empresariais estão preocupados diante de “mensagens embaralhadas” oriundas do governo segundo as quais poderia se levantar a hipótese de estar havendo a “renovação de práticas protecionistas”. O ministro das finanças, Pridiyathorn, não foi capaz de garantir aos investidores internacionais que os planos de Thaksin para grandes projetos de transporte em Bangcoc iriam continuar.

O professor da Universidade Ramkhamaeng, Wuthisak Larpcharoensap, disse ao Bangcoc Post que o governo “é uma clara imagem da burocracia restaurada ao poder” e relembrou o governo civil dirigido pelo general Prem Tinsulanonda, nos anos 80.

Sem dúvida, alguns na nova junta gostariam de retornar à era de Prem - poder autocrático fantasiado com ornamentos democráticos por meio de administradores civis. Porém, a manutenção de Prem no poder foi extremamente facilitada devido ao imenso fluxo de investimentos estrangeiros e de altas taxas de crescimento que fizeram da Tailândia um dos “Tigres Asiáticos”. Ao contrário dos anos 80, quando o crescimento anual do PIB alcançou 13,2%, em 1988, a taxa de crescimento esperada para este ano é de apenas 4,2%, a menor em cinco anos.

Enfrentando tensões políticas e sociais para as quais não têm respostas, o governo militar está procurando consolidar sua posição através do desmantelamento do TRT. No dia 6 de outubro, o Conselho de Segurança Nacional anunciou uma nova Corte Constitucional, composta por nove juízes escolhidos a dedo, liderados pelo presidente da Suprema Corte, Panya Thanomrod.

No dia 29 de setembro, o general Winai Phattiyahul, membro do CSN, deixou claro o que se espera dos juízes, quando disse à imprensa que a principal preocupação da junta era um possível retorno de Thaksin. Ele disse que a decisão da Corte de investigar as denúncias de corrupção dentro do TRT “pode ser uma das medidas para impedir que o Thai Rak Thai volte a conquistar um grande número de votos populares”.

No dia 30 de setembro, o CSN decidiu que todo o membro de qualquer partido político que for dissolvido pela Corte Constitucional será proibido de exercer atividades políticas por cinco anos, assim como foram os membros do governo anterior, de Thaksin, que não revelaram seus bens financeiros. No dia 2 de outubro, o ex-ministro do trabalho, Somsak Thepsuthin, expulsou 115 membros de sua facção do TRT, incluindo cinco outros ministros do governo. No dia seguinte, Thaksin renunciou, manifestando assim o colapso do TRT, que foi construído fundamentalmente em torno de sua pessoa e de sua fortuna pessoal.