Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 20 de outubro de 2006.
Na última quarta-feira, num intervalo de duas horas,
a Força de Assistência à Segurança
Internacional (ISAF), comandada pela OTAN, que ocupa o Afeganistão,
fez dois disparos de mísseis contra moradias de civis,
matando 26 pessoas, entre homens, mulheres e crianças.
As mortes comprovam o caráter criminoso das operações
de ISAF, que representam o homicídio da população
local, que reage, por sua vez, de forma hostil às forças
militares estrangeiras.
O primeiro incidente ocorreu no distrito de Zhari, na província
de Kandahar, onde o exército canadense alega ter matado
entre 1.000 e 1.500 guerrilheiros do Taliban nos meses de agosto
e setembro, numa ação denominada Medusa.
De acordo com o noticiado pela imprensa, helicópteros
da OTAN dispararam mísseis em direção a três
residências na vila de Ashogho, às duas horas da
madrugada. Os moradores declararam que treze pessoas, incluindo
quatro mulheres, foram mortas e outras quinze ficaram feridas.
O governador de Kandahar, Asadullah Khalid, afirmou à imprensa
que tudo indicava não haver membros do Taliban entre os
mortos. Declarou ainda que é pouco provável
que houvesse algum deles na vila àquela hora.
Algumas horas depois, mísseis foram lançados
numa casa em Gereshk, uma cidade na província de Helmand.
Tropas britânicas faziam parte do corpo das forças
da OTAN sediadas em Helmand, que estabeleceram, durante meses,
uma luta selvagem contra a resistência local.
Um vizinho da casa destruída declarou à imprensa
que o ataque aéreo matou treze civistrês homens,
cinco mulheres e cinco crianças. A polícia afegã,
como se sabe, solicitou o apoio aéreo da OTAN durante um
confronto com supostos militantes do Taliban no subúrbio
da cidade. Aviões de guerra e helicópteros atiraram
mísseis e lançaram bombas.
Os aviões não foram identificados em nenhum dos
incidentes. Mas parecia mais ser dos EUA, ou da Inglaterra, que
é responsável pela força aérea da
OTAN no Afeganistão.
Na quarta-feira a ISAF admitiu a responsabilidade pelas mortes
de civis em Kandahar. Numa nota à imprensa, declarou que
as operações se desenrolaram na área para
deter indivíduos envolvidos na instalação
de bombas próximas a estradas contra as forças de
ocupação no distrito vizinho de Panjwaii. Foi
utilizado um apoio aéreo localizado nas proximidades,
que causou diversas mortes.
A ISAF não explicou porque a captura de rebeldes teria
exigido o disparo de mísseis em residências. De qualquer
maneira, isso tem sido o procedimento padrão da ISAF. Com
base na mínima suspeita de resistência, as forças
norte-americanas e da OTAN fazem uso de ataques aéreos,
sem levar em conta a possibilidade de morte de civis.
Centenas de afegãos foram mortos em tais ataques. Um
dos mais criminosos ocorreu em maio, quando um avião norte-americano
modelo A-10 bombardeou a vila de Azizi, em Kandahar, massacrando
mais de 80 pessoas.
Normalmente, a quantidade de mortes de civis é ocultada
pela OTAN, sob a alegação de que as vítimas
eram rebeldes. Os moradores das vilas da área de Kandahar,
atingida pela Operação Medusa, dizem que dezenas
de civis foram consideradas pela OTAN como membros do Taliban.
No mês passado, o fazendeiro Toon Jaan declarou à
agência de imprensa canadense que 26 membros de sua família
foram mortos durante o bombardeio executado pelo exército
canadense na vila de Sperwan.
Esses assassinatos indiscriminados representam um significativo
fator de encorajamento para os afegãos pegarem em armas
contra a ocupação. O número de rebeldes aumenta
sem cessar, apesar das enormes perdas que a precária guerrilha
afegã sofre em qualquer enfrentamento direto com as tropas
da OTAN.
Há apenas um mês, o comandante da Operação
Medusa se vangloriou de ter derrotado o Taliban nos distritos
de Zhari e Panjwaii, apesar de ter encontrado forte apoio local.
Ele declarou que as tropas da ISAF estavam colaborando na reconstrução
que garantirá a assistência necessária
aos desalojados pela recente ocupação do Taliban.
Em 25 de setembro, o embaixador da OTAN em Kabul, Daan Everts,
saudou o sucesso da ISAF como uma evidência do nosso
comprometimento em ajudar a população afegã,
em absoluto contraste com os rebeldes, que se dedicam à
destruição, enquanto nós ajudamos a reconstruir
casas e vidas.
Agora, as forças da ISAF na região estão
sendo novamente atacadas por rebeldes locais, respondendo com
ataques aéreos indiscriminados que matam pessoas, destroem
casas e isolam os povoados.
Na quarta-feira, um morador da vila de Ashogho, em Kandahar,
afirmou à imprensa: se os soldados estrangeiros fossem
tão inteligentes para saber que há militantes do
Taliban aqui, porque eles não são capazes de perceber
que havia, no momento do ataque, mulheres e crianças dormindo?
Por que eles querem nos matar? Como eles podem nos ajudar a reconstruir
se eles querem nos matar. Talvez eles devessem ir embora.
Na quinta-feira, na província de Helmand, um suicida
reagiu ao ataque à vila de Tajikai. Ele se lançou
em meio a um comboio de veículos britânicos na principal
província de Lashkar Gah e detonou uma grande quantidade
de explosivos. Um marinheiro britânico morreu e outros ficaram
seriamente feridos. O número de norte-americanos e aliados
mortos neste ano já chega a 172o mais alto número
desde a invasão, em 2001.
O outro fator que estimula a resistência é o descontentamento
em relação ao abismo social existente entre os afegãos
comuns e a elite política, que cresceu em conseqüência
da colaboração dada por esta última à
ocupação liderada pelos EUA.
Mohammed Siddique, um oficial da instituição
de caridade Afegãos pelo Amanhã, declarou
esta semana à imprensa: por que o governo não
ajuda aos pobres? Por que as pessoas do governo e os comandantes
constroem grandes mansões e as pessoas pobres ainda vivem
em más condições? Por que, mesmo vindo todo
esse dinheiro do estrangeiro para o Afeganistão, as pessoas
continuam tão miseráveis? As pessoas dizem que o
Taliban é ruim, mas dizem que o governo também é.
A oposição popular aos invasores é muito
forte. Por essa razão um alto oficial britânico que
retornou do Afeganistão, o Brigadeiro Ed Butler, alertou
essa semana que a resistência pode durar por mais 20
anos. Butler declarou: eu penso que alguém
deve ter subestimado a tenacidade e a ferocidade do Taliban.
A resposta imediata do governo Bush e do governo afegão
é aumentar a violência. Os EUA, a Inglaterra e o
Canadá estão pressionando outras importantes forças
européias, como Alemanha, França, Itália
e Espanha, para que estas enviem tropas a fim de ajudar na repressão
à população afegã. Entretanto, apesar
do urgente apelo feito pelo mais importante comandante da OTAN,
que solicitava o envio de 2.500 soldados, após mais de
um mês, nenhum reforço foi enviado.