Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 15 de Novembro de 2006.
O Presidente Hu Jintao afirmou que a China oferecerá
5 bilhões de dólares em empréstimos e assistência
à África até 2009.
Durante o primeiro final de semana de novembro, 48 representantes
de 53 países africanos, incluindo muitos chefes de governo,
se reuniram na capital chinesa de Beijing.
O regime chinês utilizou todos os recursos para fazer
deste um grande evento. Ao invés de anúncios, os
outdoors continham enormes fotos de animais africanos selvagens.
Símbolos africanos, tais como as pirâmides e as populações
tribais, decoravam as paredes dos prédios. Réplicas
de animais da savana foram dispostas nas áreas centrais
dos shoppings. Cartazes afirmavam: África, a terra
dos mitos e milagres.
Indústrias altamente poluidoras foram fechadas para
melhorar a qualidade do ar, carros foram banidos da cidade e muitos
dos habitantes das cidades organizaram-se em comitês de
bairros para decorar as árvores. Todas as rondas policiais
foram canceladas e o prestigiado mercado Hongqiao foi aberto para
o uso exclusivo das mulheres dos delegados africanos.
Hotéis luxuosos e frotas de carros foram reservados.
Quartos de hotéis foram adaptados à decoração
africana e cardápios especiais foram providenciados. Meanne
Dizerent Lau, representante do Hotel Shagrila, que hospedou delegados
da Tanzânia, declarou ao jornal British Guardian:
nós já hospedamos grandes grupos de oficiais,
mas nunca como agora. O governo nunca se envolveu tanto.
O objetivo deste elaborado e importante encontro foi o de aumentar
a influência e penetração da China na África.
O interesse da China pela a África é conseqüência
do enorme crescimento econômico chinês e do aumento
da demanda por matérias-primas. No período da guerra
fria, sob o governo de Mao Tse Tung, a China estabeleceu relações
com alguns países africanos, incluindo o treinamento militar
de tropas do Zimbabwe. Mas a retomada das relações
ocorreu nos meados dos anos de 90, quando o crescimento econômico
chinês decolou. O crescimento das relações
pode ser verificado observando-se as estatísticas comerciais.
O principal interesse chinês na África está
nas fontes de energia, sobretudo no petróleo, devido à
dificuldade de acesso ao petróleo do oriente médio,
por este se destinar prioritariamente à Europa e aos EUA.
A China mantém relações com o Sudão
desde meados de 1990. A atuação da estatal chinesa,
Companhia Costeira Nacional de Petróleo (CCNP), elevou
o Sudão da condição de importador de petróleo
a exportador, com uma receita de quase 2 bilhões de dólares
por ano. Metade das exportações sudanesas é
destinada à China. Na Nigéria, a China investiu
2,7 bilhões de dólares (a maior despesa além-mar
realizada até hoje) na compra dos direitos de exploração
de um campo de petróleo, direitos estes divididos com mais
quatro outras companhias. Angola, que recebeu investimentos de
2 bilhões de dólares, é atualmente a maior
fornecedora de petróleo para a China, estando à
frente inclusive da Arábia Saudita. A China também
tem interesse no petróleo da Guiné-Bissau, Congo-Brazavile
e Gabão.
Além do petróleo, as importações
da China incluem algodão bruto do oeste africano, cobre
e cobalto da República democrática do Congo, minério
de ferro e platina de Zâmbia e madeira do Gabão,
Camarões e Congo-Brazavile. A China também fez investimentos
em projetos de infra-estrutura, tais como a reconstrução
de linhas de trem na Angola, incluindo aquela para o porto em
Benguela, usada para escoar o cobre do Zâmbia. Novos projetos
de barragens estão sendo financiados em Zâmbia, Sudão,
Congo-Brazavile e Etiópia. A China também está
financiando o desenvolvimento de projetos tais como hospitais
e escolas.
Além de importar matérias-primas, a China tem
conseguido exportar várias mercadorias para a África.
O fim do acordo de Multi-Fibras (AMF), que garantia alguma proteção
aos produtores de países subdesenvolvidos,
golpeou a produção têxtil africana. O Primeiro
Ministro da Etiópia, Menes Zenawi, frisou que, atualmente,
90% das mercadorias à venda no maior mercado de Addis Abada
são de origem chinesa.
Os empresários e trabalhadores chineses também
têm se estabelecido na África. De acordo com um artigo
do New York Times do dia 3 de novembro, cerca de 80.000
chineses vivem e trabalham hoje na África. Deverá
ser criado em breve o departamento de língua Mandarim na
Universidade de Harvard do Zimbabwe.
Avalia-se que as relações comerciais entre a
China e a África, que em 1995 giravam em torno de 3 bilhões
de dólares, estão atualmente na casa dos 40 bilhões
de dólares. A China pretende expandir radicalmente seus
investimentos e negócios na África no próximo
período.
O encontro em Beijing da semana passada foi precedida por inúmeras
visitas de líderes chineses à África. No
começo do ano, o Ministro das Relações Exteriores,
Li Zhaoxing, visitou a Nigéria, a Libéria, Mali
e Senegal. Em abril, o presidente Hu Jintao visitou o Marrocos,
a Nigéria e o Quênia. Em junho, o Primeiro Ministro
Wen Jiabao visitou o Egito, Gana, Congo-Brazavile, Angola, África
do Sul, Tanzânia e Uganda.
No encontro, que atraiu mais de 2.000 delegados e empresários
chineses, foram assinados 16 acordos comerciais e de investimentos
que envolveram cifras em torno de 2 bilhões de dólares.
O Presidente Hu declarou, durante a reunião, que nos próximos
três anos a China concederia empréstimos preferenciais
de 3 bilhões de dólares e créditos preferenciais
de 2 bilhões de dólares para os países africanos,
comprometendo-se em dobrar os atuais recursos anuais de auxílio
à África até o ano de 2009.
Entre as propostas está a construção de
um prédio no Egito que abrigará uma fábrica
de alumínio, cujo custo da planta está estimada
em 300 milhões de dólares, a implantação
de uma extratora de cobre no Zâmbia, de 200 milhões
de dólares, além de um projeto de reforma de uma
estrada de ferro na Nigéria, que está orçado
em 300 milhões de dólares. A China pretende duplicar,
até 2009, as atuais relações comerciais,
que atualmente giram em torno de 50 bilhões de dólares.
A China também assinou um acordo que prevê a elevação
das tarifas das mercadorias africanas, que atualmente estão
em 190, para 440. Ainda não foram divulgadas quais as mercadorias
que receberão esta taxação.
A China tornou-se a terceira maior parceira da África,
ficando atrás somente dos EUA e da França. Apesar
dos negócios da África com a Europa terem declinado,
há um crescimento das relações comerciais
da África com os EUA. Os EUA têm pressionado insistentemente
os países africanos, sobretudo do oeste da África,
a garantirem o suprimento de petróleo, a fim de diminuir
a dependência norte-americana em relação ao
instável Oriente Médio.
A penetração da China na África soou como
um alerta às principais forças atuantes no mundo.
O Financial Times publicou recentemente uma série
de artigos sobre o aprofundamento das relações entre
a China e a África. Admitindo o papel da China na economia
mundial, observou-se que o embate estava apenas começando
e que este embate traria implicações.
No editorial de 25 de Outubro, denominado Lobos da África,
o FT expressou seu descontentamento pelo fato dos bancos
chineses não seguirem os Princípios do Equador.
Estes princípios buscam gerenciar os riscos
no financiamento de projetos sociais e ambientais. Observou-se
que a ação dos bancos chineses ameaça
não apenas a ética nos empréstimos, mas também
a direção da política de desenvolvimento
na África. Duas dessas características são
o perdão das dívidas e a ajuda financeira aos governos.
É impossível estabelecer critérios para o
perdão das dívidas se os bancos chineses simplesmente
viram as costas e emprestarem mais dinheiro. Governos corruptos
não serão superados enquanto tiverem apoio financeiro.
Num artigo do FT de 1° de novembro, Geoff Lamb,
ex-vice-presidente do Banco Mundial, declarou: a invasão
comercial chinesa numa região ocupada tradicionalmente
por outros países causou inquietação entre
os políticos do ocidente... Há preocupações
legítimas de que estes acordos - cujos termos são,
na maioria das vezes, obscuros - poderão sustentar regimes
dúbios e produzir um novo ciclo de dívidas insustentáveis.
A irmã francesa do Financial Times, a Les
Echos, publicou uma entrevista de Paul Wolfowitz, presidente
do Banco Mundial, que criticou os empréstimos dos bancos
chineses à África. Ele questiona o que ele chama
de empréstimos suaves. Entretanto, é
sabido que o Banco Mundial e os bancos comerciais ocidentais,
assim governos de vários países, concederam tais
empréstimos durante a guerra fria. Ao fazê-lo, estimularam
as elites corruptas que ainda se mantém no poder, que agora
eles condenam.
As conseqüências dos empréstimos chineses
são semelhantes. Há um enorme abismo entre as regiões
ricas de Cartum, a capital sudanesa, onde novas mansões
estão sendo construídas, e outras regiões
do país. Mesmo a grande maioria dos moradores de Cartum
não participa dos benefícios da expansão
das exportações de petróleo.
O mesmo artigo ainda indicava que o Banco Mundial participou
muito diretamente das negociações com
a China a este respeito, mas não foi capaz de chegar a
um acordo. Numa carta enviada posteriormente ao FT, Wolfowitz
tentou desmentir sua afirmação, ao declarar que
ele não condena a China. No entanto, é evidente
que a intervenção chinesa na África e em
outras partes do mundo tem sido considerada pelos países
imperialistas rivais como uma grande ameaça.