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Inglaterra: o governo Blair bloqueia as investigações sobre a guerra do Iraque

Por Chris Marsden e Julie Hyland
8 Noviembre 2006

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 3 de novembro de 2006.

A habilidade do primeiro-ministro britânico, Tony Blair, em impedir o pedido de um inquérito sobre a guerra do Iraque demonstra a incapacidade do parlamento em exercer o mínimo controle genuinamente democrático.

Há mais de dois anos a guerra do Iraque vem sendo debatida na Câmara dos Comuns. Àquele tempo, a forte oposição à invasão liderada pelos EUA tornou-se ainda mais acirrada - estimulada pela situação catastrófica criada pela ocupação. Grande parte do eleitorado britânico acredita que Blair arrastou o país a uma guerra baseada em mentiras e que, por isso, as tropas britânicas devem ser retiradas.

No dia 1 de novembro, o governo de Blair conseguiu vetar, por 298 votos a 273, uma moção que exigia o início das investigações sobre as circunstâncias que envolvem a invasão do Iraque.

As circunstâncias que permearam a votação são politicamente instrutivas. A idéia da moção foi levantada por dois pequenos partidos nacionalistas, o Scottish National Party e o Plaid Cymru, e propunha somente um comitê formado por líderes de sete partidos no parlamento com a finalidade de rever "as responsabilidades do governo em relação à guerra do Iraque".

A moção foi apoiada por uma grande parte do Liberal Democrat Party, que possui 63 membros no parlamento e que se opôs à guerra do Iraque. Mas a derrota de Blair somente passou a se tornar possível a partir da adesão do Conservative Party. Até agora, os conservadores vinham colaborando com Blair em relação ao Iraque - garantindo a maioria do governo mesmo diante de uma forte rebelião causada pelas medidas provisórias emitidas pelo Labour Party.

A decisão do Partido Conservador [Tory] de endossar a moção não representa uma tentativa de explorar o sentimento popular contra a guerra. A atitude deste partido frente à opinião pública é a mesma do governo. Ao invés disso, a mudança da posição do Tory foi motivada pela preocupação da burguesia a respeito da grave crise que a guerra do Iraque produziu em Londres.

Militares graduados, como o comandante do exército, general Richard Dannart, assim como diversos intelectuais e analistas, têm declarado nas últimas semanas que a ocupação do Iraque é uma política externa desastrosa, pior que a crise de Suez em 1956. Nos EUA, onde a maioria do eleitorado tem uma posição contrária à guerra, o debate sobre o Iraque dominou a campanha eleitoral para o Congresso. Setores significativos das elites norte-americana e britânica estão inquietos diante da degradação da situação da ocupação no Iraque, que começa a ameaçar suas grandes ambições geopolíticas de controlar o Oriente Médio e outras regiões.

Para estes setores, uma investigação como esta proposta pelo parlamento poderia servir como um meio de "corrigir" as distorções existentes no interior da estratégia neocolonial. Em particular, poderia procurar aproximar setores da burguesia que têm críticas quanto às relações do governo Blair com os EUA.

O líder do Partido Liberal-Democrata, Menzies Campbell, defendeu a moção, perguntando durante o debate parlamentar: "não seria agora a hora de colocar em prática uma estratégia britânica baseada em prioridades britânicas e não numa estratégia que dependa do resultado das eleições norte-americanas?"

Entretanto, os Torys estão desmoralizados devido a sua própria atuação no Iraque e a sua excessiva preocupação de que a investigação poderia dificultar a continuidade da ocupação do Iraque, prejudicando, assim, os interesses do imperialismo britânico. Por isso, eles propõem que o inquérito seja realizado dentro dos próximos doze meses, consistindo em audiências com ex-militares. Os conservadores somente passaram a apoiar a moção depois que o governo se recusou a aprovar qualquer investigação.

Apesar dessa relutância, a manobra dos Torys serviu para desmascarar qualquer pretensão do Parliamentary Labour Party em se opor ao governo. Somente doze membros do parlamento pertencentes ao Labour, assim como Clare Short, que no mês passado rompeu com o partido, votaram contra o governo. Isso não é nem metade do número de membros do Grupo de Campanha Socialista do Labour Party, que constitui a ala esquerda do partido, cujo presidente, John McDonnell, anunciou que se candidatará a líder do Labour quando Blair finalmente pedir demissão.

O nível de degeneração desta dita "esquerda" representada pelo Labour Party pode ser observado na sua atitude diante da guerra de 2003. No dia 18 de março daquele ano, 139 dissidentes do Labour Party votaram contra a invasão. Mas, ao iniciar a guerra, a grande maioria desses dissidentes imediatamente se alinhou. No dia 4 de junho do mesmo ano, somente 11 membros do Labour apoiaram a moção dos liberal-democratas que exigia uma investigação sobre a suposta existência de armas de destruição em massa no Iraque.

Nos três anos que se passaram nada mudou na composição de forças políticas do Labour Party. Um pequeno número de parlamentares do partido se limita a registrar o seu protesto formal, enquanto os outros justificam seu apoio a Blair afirmando que eles "não poderiam" votar com os torys ou fazer qualquer coisa que colocasse as tropas britânicas em risco.

Tais argumentos são grotescos. A esquerda do Labour não teve nenhuma dificuldade em aceitar as mentiras do governo e os seus ataques aos direitos democráticos, em aceitar uma guerra que custou centenas de milhares de vidas, incluindo inúmeros soldados britânicos.

A incapacidade do parlamento em discutir a questão do Iraque motivou o colunista político do Guardian, Simon Jenkins, a observar que "essa Câmara dos Comuns é o presente de Deus para a ditadura". O parlamento abriu mão de sua "função democrática", continuou ele, fazendo com que os parlamentares que se opunham fossem "incapazes de fazer o mínimo que se espera numa democracia, ou seja, disputar o executivo".

Mas como essa situação veio à tona? Jenkins responsabiliza a falência dos partidos de oposição, que não conseguem obrigar o governo a prestar contas, declarando que "a Câmara dos Comuns representa atualmente pouco mais que um colégio eleitoral para o primeiro-ministro". Ele insiste que o parlamento possui um poder que não utiliza, explicando: "não há nada que possa impedir os membros do parlamento de discutirem aquilo que quiserem. Nada pode impedir a criação de um grande comitê para investigar a guerra. Ele pode exigir "documentos" e intimar qualquer pessoa que achar necessário. Mesmo se o comitê tiver receio de agir, o parlamento é soberano. Não é necessário pedir permissão ao governo para realizar investigações".

Aqui existe uma confusão. Quem deveria fazer isso?

Jenkins, de fato, repreende a oposição Tory - o tradicional partido das grandes empresas - por não investigar o governo do Labour Party. Mas a democracia parlamentar foi quem, na realidade, escancarou muito da situação atual pelo fato de que - apesar de seus desacordos táticos - todos os partidos maiores concordam com o princípio do militarismo contra a reação social. Todos eles têm uma base social de apoio cada vez mais estreita, ancorada apenas nos setores mais privilegiados da população.

A transformação do Labour Party num instrumento da oligarquia financeira é fundamental para este processo de destruição da democracia.

A extensão dos direitos democráticos para a classe trabalhadora foi produto da luta de classes, ou seja, da ação política das massas que culminou no início do século vinte com a formação do Labour Party, que passou a ser o representante político dos sindicatos. A degeneração de tal partido e dos próprios sindicatos significa que o governo não expressa minimamente a visão política e os interesses sociais da classe trabalhadora. Ao invés disso, a intenção do governo é impedir qualquer interferência popular por meio de políticas que são decididas nas salas fechadas das grandes empresas, que se opõe fundamentalmente aos interesses da maioria da população.

No final das contas, o declínio da democracia parlamentar é uma expressão de agudos e irreconciliáveis antagonismos de classe existentes na sociedade. É impossível assegurar um mandato democrático por meio de guerras e conquistas coloniais, sustentadas através da dilaceração de programas sociais e do empobrecimento da grande maioria da população. As políticas oficiais se transformaram numa conspiração contra os direitos sociais e democráticos das massas.

A incapacidade da burguesia de examinar de maneira franca uma questão de importância estratégica como a guerra do Iraque está diretamente relacionada com a necessidade de controlar a revolta da classe trabalhadora. É isso o que justifica a paralisia política descrita por Jenkins - algo altamente desestabilizador para a elite dominante.

Mesmo se o desastre do Iraque pudesse finalmente impulsionar um movimento de setores da elite dominante contra o governo Blair - algo que não deve ser descartado - nada de progressivo poderia resultar disso.

Agora, tudo depende da mobilização independente dos trabalhadores, da juventude e dos estudantes contra o governo do Labour Party e todos os representantes do grande capital. No centro dessa movimentação estará a construção de um novo e legítimo partido socialista.