World Socialist Web Site
 

WSWS : Portuguese

Grã-Bretanha: Blair recomenda mudar a política no Oriente Médio

Por Chris Marsden e Julie Hyland
22 Noviembre 2006

Utilize esta versão para imprimir | Enviar por e-mail | Comunicar-se com o autor

Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia16 de novembro de 2006.

O discurso do primeiro-ministro britânico Tony Blair no banquete anual do palácio do Lord Mayor de Londres, em 13 de novembro, foi uma tentativa de reformular a política externa britânica, tendo em vista as conseqüências do repúdio popular da guerra do Iraque e da derrota sofrida pelo governo Bush nas eleições norte-americanas.

Sem nenhum apoio popular, a posição política e a autoridade de Blair têm sido constantemente minadas. Blair procura dar uma resposta à elite britânica, que considera que o apoio à guerra do Iraque e a aliança acrítica com o governo Bush acabou envolvendo a Grã-Bretanha num processo de desestabilização de todo o Oriente Médio, com conseqüências potencialmente desastrosas.

Seu discurso foi pronunciado um dia depois de ter sido entrevistado, via circuito fechado de televisão, pelo Grupo de Estudos do Iraque, liderado por James Baker, que foi Secretário de Estado do governo de George Bush pai. O objetivo da entrevista foi acalmar seus críticos, mostrando que ele aproveitará a oportunidade para influenciar a política externa norte-americana e que os interesses britânicos serão finalmente levados em conta.

O Grupo de Estudos do Iraque está cercado de lideranças Republicanas e Democratas—muitos dos quais estavam envolvidos no “processo de paz” entre Israel e a Palestina no final dos anos 80 e início da década de 90. Eles são críticos aos neo-conservadores e acreditam que as ações políticas destes danificaram severamente os interesses norte-americanos em todo o Oriente Médio.

Ao mesmo tempo em que enfatizou seu apoio aos EUA, defendendo a invasão do Iraque e insistindo que uma ruptura com Washington seria algo “insano”, Blair sinalizou que uma mudança de curso era necessária. “Já que a situação está evoluindo, nossa estratégia também deve evoluir para ir de encontro com o que está ocorrendo”, afirmou Blair.

Sem referir-se a qualquer retirada das tropas britânicas ou norte-americanas, Blair salientou que a tarefa a ser realizada é a de “fortalecer a liderança iraquiana” para assumir a responsabilidade em assumir e vencer “a luta contra o terrorismo.” Ultimamente, disse ele, deve-se levar em consideração as “forças externas ao Iraque que estão tentando criar desordem dentro do Iraque”. A “estratégia geral para o Oriente Médio” de Blair pressupõe negociações com a Síria e com o Irã.

Apesar de não contradizer diretamente a posição declarada da Casa Branca, Blair fez certas afirmações com o objetivo de apaziguar os críticos britânicos à política do governo Bush. Ele considera que a preocupação segundo a qual os EUA estariam procurando uma solução militar no Irã como “genuína, ainda que totalmente enganosa”. Ele defendeu a possibilidade de uma “nova parceria”, caso Teerã concorde em suspender seu programa de enriquecimento nuclear e em ajudar no processo de paz do Oriente Médio, deixando “de apoiar o terrorismo no Líbano ou no Iraque.”

Retomando o tom de ultimato que tem caracterizado as declarações britânicas e norte-americanas sobre o Irã, ele ameaçou “isolar” o país, caso o governo iraniano não concorde com as condições estipuladas.

A Grã-Bretanha está trabalhando ativamente para atingir esse fim. Em seu discurso, Blair afirmou que o Irã e a Síria “não compartilham todos os seus interesses”. No início deste mês, seu conselheiro pessoal para relações estrangeiras, Nigel Sheinwald, esteve na Síria e exigiu que o presidente Bashar al-Assad rompa a aliança com o Irã caso queira normalizar as relações com o Ocidente.

Blair considera que o centro da questão do Oriente Médio não são estes países ou o Líbano, mas “Israel/Palestina... este é o centro”.

Nesse sentido, Blair estimulou Washington a usar sua influência sobre Israel para pressioná-lo em aceitar um Estado Palestino em parte da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. Nesse momento, entretanto, suas cautelosas observações foram endereçadas não apenas ao governo Bush, mas também aos seus críticos, na esperança de que, diante da posição enfraquecida de Bush e da queda do Secretário de Defesa norte-americano, Donald Rumsfeld, suas idéias podem ter mais chances de serem ouvidas.

No entanto, mais do que qualquer outro líder europeu, Blair procura, ao contrariar o governo norte-americano, não passar do limite. Mesmo suas tímidas observações foram censuradas pela Secretária de Estado Condoleezza Rice. Durante visita a Alemanha, ela rejeitou explicitamente qualquer conexão entre o Iraque e o conflito entre Israel e Palestina, descartando a possibilidade de negociar com a Síria e com o Irã.

Isso torna Blair incapaz de amenizar o profundo descontentamento existente na elite britânica. A comparação da sua entrevista ao Grupo de Estudos do Iraque com o editorial do Financial Times publicado dia 14 de Novembro é reveladora.

O editorial fez uma profunda e extensa crítica às políticas dos neo-conservadores de Washington, baseando-se nas relações dos EUA com Israel, e pediu uma “reavaliação da política para o Oriente Médio como um todo”.

Numa dura avaliação das relações no Oriente Médio, o jornal declarou que o “fiasco do Iraque” levou o país a mergulhar “dentro de um esgoto de limpeza étnica e luta entre milícias.” A guerra de Israel contra o Líbano no último verão, apoiada pelos EUA, fortaleceu o Hezbollah estimulando assim “o enfraquecimento de um governo essencialmente pró-ocidental”. A ofensiva israelense na Cisjordânia e na Faixa de Gaza criou uma situação na qual os territórios palestinos estão “enfrentando o colapso social.”

O editorial denunciou os assentamentos ilegais israelenses na Cisjordânia, criticando sua atitude de erguer um muro em torno dos territórios palestinos e a edificação de “500 pontos de controle israelenses,” e censurou Blair por “tocar violino” para os norte-americanos e israelenses.

O editorial fez uma aguda crítica da política americana-britânica-israelense: “a combinação de irresponsabilidade diplomática e fé no uso da força mostrou-se desastrosa. Isso expandiu o poder e o prestígio de organizações como o Hamas e o Hezbollah para muito além de seu reduto tradicional. A causa desta situação é a total incapacidade de assinar um acordo de paz”.

“Nos últimos cinco anos, apesar de toda a retórica ocidental, Israel estendeu e consolidou seus domínios na Cisjordânia e no leste árabe de Jerusalém. Assim, com a invasão ilegítima do Iraque, cada acontecimento torna-se uma nova ameaça de incendiar a região inteira.”

O Financial Times considera que um acordo de paz entre Israel e os Palestinos seria o ponto central de uma nova estratégia para o Oriente Médio. Isso “exigiria o compromisso do Irã e da Síria.”

Nem Blair nem qualquer outro político britânico estão em condições de fazer exigências mais amplas à Casa Branca. Num outro momento, o colunista do Financial Times admitiu que, na tentativa de Washington de reformular sua estratégia para o Oriente Médio, “a política interna terá um peso muito maior do que cálculos estratégicos - ou qualquer compromisso com os aliados mais próximos”. Isso soa como uma referência explícita a Blair: “algumas vezes”, afirma o colunista, “a verdade deve ser dita publicamente para poder tornar-se fato”.

O Financial Times e muitos outros membros das instituições políticas britânicas têm grandes esperanças nas propostas que porventura sejam feitas pelo Grupo de Estudos do Iraque. Entretanto, o colunista republicano do New York Times, David Brooks, observou que “a idéia segundo a qual a comissão está caminhando rumo a algum plano mágico inédito não é verdadeira... Estes planos são todos conhecidos, e nenhum deles é particularmente confortável.”

Mas, antes de mais nada, é importante lembrar que o apoio de Blair à guerra do Iraque foi quase completamente endossado pela elite britânica. Isto demonstra a decadência da Grã-Bretanha como uma potência imperialista, pois ela só consegue garantir seus interesses contra os concorrentes mais poderosos por meio da aliança com os EUA. Esta situação não mudou.

Blair fez seus críticos lembrarem dessa realidade geopolítica, ao reiterar a importância fundamental de manter essa aliança. Ele insistiu que nenhum dos interesses vitais da Grã-Bretanha “podem ser dirigidos, nem resolvidos, sem os EUA”. Referindo-se à crescente posição da Rússia e ao crescimento do poder econômico da China e da Índia, ele afirmou: “novas potências estão emergindo”. Em conseqüência disso é necessário “aliarmo-nos com nações que compartilham os nossos valores”.

Essa confiança nos EUA é a raiz do aprofundamento da instabilidade tanto no governo Blair quanto em toda a burguesia britânica. A luta entre setores da burguesia que vem se manifestando em Washington influencia, mais do que qualquer outra, a burguesia britânica. A degeneração da situação no Oriente Médio estimula esta luta e, em conseqüência, esta instabilidade.