O seguinte manifesto foi lançado pelo Socialist Equality
Party [Canadá] para distribuição nas manifestações
que ocorreram no último domingo, 28 de outubro, em diversas
cidades do país exigindo a imediata retirada de todas as
tropas canadenses do Afeganistão.
Dois mil e trezentos soldados das Forças Armadas Canadenses,
apoiados por tanques de guerra e aviões da OTAN, estão
travando uma guerra de colonização no sul do Afeganistão,
tendo a colaboração do regime de Hamid Karzai, apoiado
pelos EUA.
No mês passado as tropas canadenses mataram centenas
de pessoas no distrito de Panjwayi, que haviam protestado contra
a polícia afegã e as forças de segurança
locais, que os vêm extorquindo, roubando e abusando sexualmente.
Esta semana ocorreu uma nova atrocidade: aeronaves da OTAN mataram
dezenas de moradores em Panjwayi e em Pashmul, um distrito da
província de Kandahar,.
A missão canadense no Afeganistão está
diretamente ligada à ocupação norte-americana
ilegal no Iraque. O aumento do pessoal das Forças Armadas
Canadenses [FAC] no sul do Afeganistão ocorreu a partir
de um pedido de Washington, com o claro objetivo de possibilitar
que o Pentágono concentre as suas forças na ocupação
do Iraque.
Os canadenses estão indignados com o empenho de seus
governantes em ajudar o governo Bush a se desvencilhar da armadilha
que ele próprio armou para si no Iraque, e pelas atrocidades
cometidas pelos E.U.A. e que acabam manchando a imagem do Canadá.
Entretanto, a imprensa e as instituiçõespolíticas
têm apoiado com entusiasmo a missão de combate aos
rebeldes levada a cabo pelas FAC no Afeganistão, saudando-a
como uma prova de que o Canadá mais uma vez atua nos assuntos
internacionais.
Em maio passado o parlamento endossou a minoria conservadora
nos planos do governo de prolongar a missão das FAC no
sul afegão por pelo menos mais dois anos, até o
início de 2009, e incluir o Canadá no comando geral
da ocupação da OTAN no Afeganistão durante
um ano, iniciando em fevereiro de 2008.
Sem dúvida, em meio às questões que levaram
Ottawa a ocupar um papel mais importante na guerra contra os rebeldes
afegãos está o fato de o Afeganistão se localizar
próximo aos países da Ásia Central que possuem
vastas reservas de petróleo e gás natural. Jean
Chretien, o primeiro ministro liberal que em 2001 foi o primeiro
a enviar tropas canadenses ao Afeganistão, tem se esforçado,
desde que se retirou do cargo, em para assegurar a participação
de empresas canadenses em projetos de oleodutos que poderiam acessar
as reservas de energia na Ásia Central através do
Afeganistão.
Mas as CAF já estão se preparando para futuras
guerras. Isso representa a repetição do caminho
traçado pelos E.U.A., no qual a invasão do Afeganistão
significou o ponto de partida para a guerra do Iraque. Por meio
da atual ocupação no Afeganistão, as elites
policial e empresarial canadenses estão procurando assumir
um caráter militarista, tentando acostumar a população
às fatalidades da guerra, justificando uma rápida
expansão e rearmamento do exército. Em particular,
os mais poderosos setores da elite dominante canadense estão
determinados a pôr fim à idéia de que o Canadá
é uma nação pela paz. Isso representa
um obstáculo aos seus planos de usar as CAF para conquistar
de modo violento os seus interesses predatórios no cenário
mundial.
A continuidade da guerra colonial de combate aos rebeldes,
conduzida pelas CAF no Afeganistão, representa um significativo
e ameaçador movimento político. Desde a Guerra da
Coréia há tropas terrestres canadenses envolvidas
em operações de guerra.
Mas, assim como os planos sócio-econômicos do
governo Harper, que prevêem o aumento de taxas e os cortes
nos serviços públicos e sociais, têm sido
elaborados pelas políticas de direita postas em prática
pelo governo liberal de Chretien-Martin e apoiados nos níveis
locais por todos os partidos, inclusive pelo sindicato ligado
ao New Democratic Party e ao Parti Quebecois, a
atual missão no Afeganistão também já
vinha sendo estimulada pelo governo federal. Nos últimos
quinze anos, o Canadá tem se envolvido frequentemente em
guerras ou operações militares de repressão,
incluindo a Guerra do Golfo em 1991, a sanção de
12 anos da ONU contra o Iraque, a campanha de bombardeamento da
Iugoslávia pela OTAN em 1999 e a invasão do Afeganistão
em 2001. Na última hora o governo liberal de Chretien decidiu
não enviar tropas das CAF em apoio à invasão
dos EUA no Iraque. Apesar disso, o apoio logístico do Canadá
à invasão é tão expressivo que o embaixador
norte-americano, Paul Celluci, chegou a declarar que o Canadá
fez mais pela ocupação liderada pelos EUA que muitos
membros da coalizão de Bush. Em fevereiro-março
de 2004, tropas canadenses foram enviadas juntamente com as tropas
do exército da França e dos EUA para assegurar a
expulsão do presidente eleito do Haiti, Jean-Bertrand Aristide.
O SEP apóia as manifestações contra a
guerra realizadas no dia 28 de outubro e a reivindicação
da imediata retirada de todas as tropas canadenses do Afeganistão.
Mas nós desconfiamos da liderança do movimento,
que vem dizendo aos trabalhadores e à juventude que o militarismo
pode ser combatido através do sistema político existente
e que o governo canadense pode ser pressionado a agir como uma
força democrática de paz no âmbito internacional.
A luta contra a guerra imperialista está ligada a uma
luta contra toda a estrutura político-social do Canadá
e do mundo capitalista como um todo.
Nos 15 anos decorridos desde o fim da Guerra Fria, as prometidas
paz e prosperidade não se realizaram. O que ocorreu, ao
invés disso, foi a continuidade das guerras como um instrumento
das políticas de Estado e a degradação permanente
das condições de vida da classe trabalhadora e a
perda dos direitos democráticos.
Estes dois fenômenos são, na verdade, expressões
da mesma crise do sistema. Empresas transnacionais varrem o mundo
em busca de recursos naturais e mão-de-obra barata para
exploração. Organizados numa escala global, elas
transferem sistematicamente a produção para os locais
onde o trabalho é mais barato. A guerra contra a classe
trabalhadora constitui a expressão consumada da permanente
e crescente busca por parte das empresas por lucros e novos investimentos.
Da mesma forma, grupos capitalistas rivais lutam entre si,
procurando melhorar sua posição por meio de alianças
econômicas e geopolíticas, tentando dominar, através
do controle econômico, político e militar, os recursos
naturais essenciais e as regiões estratégicas.
Por meio das guerras, cujo objetivo é assegurar sua
dominação sobre os suprimentos de petróleo
do planeta, os Estados Unidos - o mais poderoso país capitalista
do mundo - têm acabado com o sistema de relações
internacionais e alianças multilaterais que eles próprios
tinham ajudado a criar num período anterior, quando visavam
amenizar os antagonismos inter-imperialistas e fundamentar a sua
própria dominação. Isso serve para confirmar
que a crise atual tem um caráter sistêmico.
Em conseqüência da guerra de pilhagem ilegal dos
EUA no Iraque, todas as grandes potências voltaram a se
armar. A geopolítica mundial está caracterizada
por um estado de fluidez, rivalidade e inquietação
não vistas desde 1930. Mesmo onde as grandes forças
capitalistas parecem se aliar, como na campanha contra o Iraque
e seu programa nuclear, há grandes tensões em ebulição
submersas logo abaixo da superfície.
Todas as instituições norte-americanas reconhecem
que a guerra no Iraque transformou-se num fracasso de proporções
históricas. No entanto, a elite dos EUA é unânime
em afirmar que não há possibilidade de retorno.
Isso foi claramente demonstrado essa semana, quando o New York
Times, o tradicional órgão do liberalismo norte-americano,
publicou um editorial pedindo a intensificação da
guerra no Iraque. De acordo com o Times, a retirada dos
EUA poderia gerar terríveis conseqüências
- ou seja terríveis conseqüências
para o imperialismo norte-americano.
O receio do Times e de toda a elite americana é
que a classe trabalhadora dos EUA, que, submetida a uma liderança
burucrática, enrijecida e profundamente anti-socialista,
sofreu um catastrófico declínio em sua posição
social e está sendo cada vez mais afastada de toda a estrutura
política, incluindo o Partido Democrata - o partido da
classe dominante que se portou como um amigo do homem comum.
Como uma força imperialista de segundo ou terceiro nível,
o capital canadense precisa casualmente ceder, ou até mesmo
se ajoelhar, frente ao seu poderoso vizinho do sul. Mas seus instintos
e ambições não são diferentes.
O Canadá foi um dos grandes países beligerantes
nas duas grandes guerras imperialistas mundiais do século
passado. Seus governantes estão determinados a sentar na
mesa numa futura divisão do mundo. Neste mês, num
grande discurso sobre a política internacional realizado
em Calgary, Harper afirmou, na condição de primeiro-ministro:
dê só uma olhada na sala, nós estamos
em meio a canadenses que dirigem empresas que negociam em todos
os cantos do planeta. No mesmo discurso, Harper declarou
que as fatalidades enfrentadas pelas tropas no Afeganistão
representam o preço por reativar a liderança
canadense no mundo.
O National Post, o jornal mais próximo do governo
atual, proclamou abertamente que Ottawa deveria pressionar Washington
para aceitar a proposta feita pelo Canadá da cessão
de uma vasta porção do Oceano Ártico potencialmente
rica em minerais, em troca do apoio do Canadá aos EUA em
outras partes do mundo.
Nos últimos vinte e cinco anos, a liderança da
classe trabalhadora - sindicatos e os social-democratas do NDP
- têm bloqueado a luta de classes, impondo a degradação
das condições de trabalho, a redução
dos salários, além de sabotar as manifestações
dos trabalhadores contra a destruição dos serviços
públicos e sociais. Eles têm sido cúmplices
no militarismo característico da burguesia canadense. O
NDP apoiou as sanções impostas pela ONU ao Iraque
durante uma década, mesmo que estivesse custando a vida
de centenas de milhares de iraquianos. Ele colaborou com a guerra
contra a Iugoslávia liderada pela OTAN, e antes de agosto
deste ano apoiou a intervenção militar do Canadá
no Afeganistão. Na realidade, o NDP estava apoiando o governo
liberal de Paul Martin no parlamento quando decidiu enviar as
CAF para travar a guerra no sul do Afeganistão. Mesmo agora
o NDP apóia a manutenção das tropas canadenses
em Kabul.
Tanto o Bloc Quebecois quanto o partido indépendantiste,
apoiado pelos sindicatos de Quebec, têm denunciado a reivindicação
do NDP da retirada das tropas canadenses do Afeganistão
como irresponsável.
Os sindicatos e o NDP estão tentando agora colocar-se
à frente - ou ao menos se associar à liderança
- do movimento contra a guerra. Tanto o NDP quanto o BQ esperam
angariar votos apelando à oposição a Harper
e a Bush. Mas ambos estão igualmente interessados em bloquear
o movimento contra a guerra.
Estes partidos e os sindicatos uniram-se em torno da reivindicação
pelo retorno às políticas estrangeiras independentes
almejadas pelos governos liberais das décadas de 1960 e
1970.
A realidade é que durante a Guerra Fria o Canadá
foi parceiro da OTAN e do NORAD [Comando de Defesa do Espaço
Aéreo Norte Americano]. A manutenção
da paz era um meio para a elite dominante canadense ganhar
algum prestígio no cenário mundial, em busca dos
interesses do capital canadense, e um importante meio para re-estruturar
o nacionalismo canadense, a fim de torná-lo um instrumento
mais efetivo no controle dos trabalhadores, atendendo os interesses
da classe dominante.
A luta contra a guerra não avançará por
meio de apelos aos políticos capitalistas e à classe
dominante, ou contrapondo o programa da burguesia de hoje com
seus programas de ontem.
Ao invés disso, é necessário uma mobilização
política da classe trabalhadora independente da burguesia
com um programa socialista e internacionalista. A guerra imperialista
e a guerra aos trabalhadores e aos direitos democráticos
estão fundamentadas na crise do sistema. Uma luta é
inseparável da outra, e ambas requerem a mobilização
internacional da classe trabalhadora contra a dominação
da economia mundial por grandes empresas privadas e a divisão
do mundo num sistema de Estados rivais.
Os trabalhadores do Canadá têm uma longa história
de luta comum com os trabalhadores dos EUA e a sua integração
com a economia norte-americana lhes impõe uma especial
responsabilidade em apoiar os trabalhadores dos EUA para derrubar
o Partido Democrata e organiza-los como uma força política
independente em oposição ao imperialismo dos EUA.
É por esse programa que o SEP e o World Socialist
Web Site lutam.