Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 5 de julho de 2006.
Diante de um futuro incerto, milhares de estudantes universitários
chineses expressaram suas frustrações no mês
passado em protestos e revoltas.
A maior demonstração dessas revoltas explodiu
em 15 de Junho. Cerca de 10.000 estudantes, na cidade de Zhengzhou,
na China central, saquearam as salas de aulas e as dependências
administrativas e enfrentaram centenas de policiais em um dos
mais intensos protestos estudantis desde o massacre da Praça
da Paz Celestial, em 1989.
A rebelião explodiu na Escola, privada, de Economia,
Comércio e Administração Shengda, que é
afiliada à prestigiada Universidade de Zhengzhou, e possui
13.000 estudantes. Depois de pagar caras mensalidades escolares
e obrigados a anos de estudos, os estudantes estão revoltados
com a decisão da faculdade em emitir os diplomas utilizando
seu próprio nome, e não o da Universidade de Zhengzhou,
como prometido em sua campanha publicitária. O título
"Escola Shengda de Economia, Comércio e Administração
da Universidade de Zhengzhou" irá imediatamente revelar
o caráter de segunda classe de suas qualificações
aos empregadores.
Em meio a uma intensa competição no mercado de
trabalho Chinês, nem mesmo a graduação em
uma universidade bem conhecida garante um emprego. De acordo com
estimativas recentes do governo chinês, em torno de 60%
dos 4 milhões de estudantes que se formarão este
ano provavelmente não conseguirão um emprego. (veja:
"China's
middle-class dream shattered: millions of graduates face unemployment")
O jornal de Hong Kong Ming Pao relatou em 19 de Junho:
"Os estudantes, irritados, primeiro atiraram objetos das
janelas, e houve uma chuva de garrafas térmicas, garrafas
de cerveja, extintores, televisores, máquinas de lavar
e vidros."Mais tarde, na mesma noite, milhares de estudantes
reuniram-se em frente à administração e entoaram
palavras-de-ordem pedindo seu dinheiro de volta. Os estudantes
destruíram os escritórios e a biblioteca, e queimaram
as estátuas dos fundadores da escola.
"Os estudantes, enfurecidos, então foram às
ruas, destruindo tudo o que encontravam.... A polícia fez
diversas investidas, mas deparou-se com uma chuva de pedras, e
apenas pôde recuar. Somente após a chegada da tropa
de choque de Zhengzhou é que os estudantes se acalmaram
um pouco," notou o jornal. Uma centena de policiais armados
e 14 veículos da polícia, então, fecharam
o campus. O corpo de segurança tirou fotografias dos estudantes
que participaram da rebelião e recusou-se a autorizar a
saída da maioria dos estudantes da escola. O comitê
editorial do boletim online da escola foi dissolvido após
os estudantes o usarem para "dar voz" à seus
protestos e emitirem e-mails para a mídia internacional
com seus comentários.
Em resposta, os estudantes iniciaram ocupações
e um boicote às provas durante os próximos dias.
Um estudante, Xu, disse à AFP: "A posição
da escola permanece inflexível mas, se o instituto não
resolver esse problema, nós iremos continuar o boicote
às aulas e às provas."
Um professor canadense que trabalha na escola enviou um e-mail
ao jornal The Globe and Mail em 20 de Junho: "Nesta
manhã os estudantes reuniram-se e quase metade deles estão
recusando-se a fazer suas provas hoje. Eles se sentem enganados
e traídos, e eles perderam tudo, incluindo o dinheiro de
seus pais. Os professores chineses os ordenam a realizar suas
provas mas eles se recusam a fazer."
Em 22 de Junho, o New York Times nos ofereceu alguns elementos
para entender os protestos. Muitos dos estudantes matriculados
na Shengda não foram bem o suficiente no exame nacional
de admissão, necessário para entrar nas universidades
de prestígio. Pagam cerca de US$ 2.500 por ano para permanecer
na Shengdacomparado com a renda per capita bruta
chinesa, de apenas US$ 1.500. As mensalidades da Shengda são
cinco vezes maiores que as praticadas pela Universidade de Zhengzhouque
é de nível nacional. Longe de obter uma educação
de alta qualidade, as altas mensalidades são, virtualmente,
um meio de comprar uma graduação.
Em 1998, a "reforma de mercado" do sistema educacional
feita pelo governo chinês incluiu a expansão, abundante,
da educação superior privada voltada ao lucro. Centenas
de novas faculdades foram criadas para abrigar milhões
de estudantes que não podem entrar nas grandes universidades
públicas, mas são capazes de pagar altas mensalidades
para obterem educação superior. Algumas dessas faculdades
oferecem certificados usando o nome de instituições
de prestígio como maior atrativo, justificando os altos
preços praticados. Uma regra aprovada em 2003, entretanto,
obriga essas faculdades a emitir diplomas em seus próprios
nomes.
Como uma forma de conter a fúria dos estudantes, Hou
Heng, o diretor da Shengda, foi forçado a renunciar sob
a pressão de seus superiores na Universidade de Zhengzhou,
e provavelmente também do governo. Entretanto, os estudantes
não receberão aquilo que eles pagaramum certificado
dizendo aos empregadores que foram treinados na Universidade de
Zhengzhou.
Wang, um estudante da Zhengda vindo de uma comunidade rural
na província de Henan, disse ao The New York Times
que o rebaixamento dos diplomas foi catastrófico aos estudantes.
"Não há muitas vagas no mundo dos negócios
comparado com o número de candidatos, e os empregadores
preferem os estudantes formados em escolas prestigiadas,"
disse. Wang disse também que seus colegas irão lutar
para renegociar suas dívidas enquanto estiverem enfrentando
grandes dificuldades em encontrar emprego.
Os estudantes da Shengda não foram os primeiros a protestar.
Em Dezembro passado, 3.000 estudantes no Instituto de Informática
e Software da cidade de Dalian, afiliada à Universidade
do Nordeste, rebelaram-se pela mesma causa.
Enquanto os protestos continuam em Zhengzhou, a Associated
Press relatou em 21 de Junho que cerca de 9000 estudantes
do campus de Jiangan da Universidade Sichuan, no sudoeste da China,
rebelaram-se depois que a direção os proibiu de
assistir os jogos da Copa do Mundo. Eles incendiaram tudo e destruíram
os equipamentos depois da administração da escola
cortar o suprimento de energia, no meio da noite, para forçar
os estudantes a estudarem para as provas.
Em 25 de Junho, de acordo com a BBC local, baseado em relatos
de vários jornais de Hong Kong, milhares de estudantes
na Faculdade Jiujiang, na província de Jiangsu, protestaram
contra as arbitrárias taxas escolares. Os estudantes destruíram
alguns equipamentos da escola e vários carros, pertencentes
aos funcionários da escola.
O governo chinês está muito ciente dos perigos
de uma agitação estudantil, que historicamente é
o prelúdio de descontentamentos mais amplos da classe trabalhadora.
Em Junho de 1989, as exigências dos estudantes da Universidade
de Beijing por direitos democráticos rapidamente tornaram-se
um foco do descontentamento entre os trabalhadores através
do país, que levantaram suas próprias demandas sociais.
O movimento terminou em um banho de sangue depois que o regime
ordenou que tropas e tanques esmagassem as demonstrações
na Praça da Paz Celestial. Dezessete anos depois, nenhum
desses conflitos sociais fundamentais foi resolvido, mas em lugar
disso intensificaram-se assim que Beijing iniciou suas medidas
capitalistas.
O surgimento dos protestos entre os estudantes chineses é
parte de processos globais muito maiores. No início deste
ano, milhões de estudantes franceses e trabalhadores travaram
uma intensa luta contra a legislação do CPE que
permitiria patrões tratarem estudantes recém-formados
como força de trabalho barata e descartável.
Os explosivos eventos na França podem parecer desligados
daqueles que ocorrem hoje na China. Entretanto, os ataques à
juventude francesa não podem ser compreendidos isoladamente
da situação de centenas de milhões de trabalhadores
e jovens chineses que estão sendo brutalmente explorados
pelo capital para aprofundar o rebaixamento da renda e das condições
sociais em todo o mundo.