Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 01 de dezembro de 2006
Uma reportagem publicada pela Anistia Internacional detalha
os abusos realizados pelas autoridades espanholas e marroquinas
contra diversos imigrantes provenientes da região da África
Sub-Saariana.
No ano passado, milhares de imigrantes arriscaram suas vidas
para fazer a perigosa jornada da África para a Espanha
e outros países da União Européia, movidos
pelo desespero, à procura de uma vida livre da privação
e da guerra. Muitos se sentem um pouco melhor quando chegam ao
seu destino, por suporem que ali estarão em segurança.
A reportagem levanta sérias denúncias em relação
aos maus tratos e às mortes de imigrantes que tentam atravessar
a fronteira entre a Espanha e o Marrocos, na região espanhola
de Ceuta e Melilla.
Segundo a Anistia, as pessoas entrevistadas que procuravam
asilo não obtiveram nenhuma assistência legal para
entrar no território espanhol e nenhuma chance de obter
a condição de asilo. Um porta-voz disse: as
autoridades da Espanha e do Marrocos usam excessivamente a força
para que os imigrantes retornem ao seu país. Em diversos
casos ocorrem expulsões massivas a países onde eles
estão sujeitos à tortura e aos maus-tratos.
Espanha e Marrocos assinaram o acordo de readmissão,
que lhes permite deportar pessoas para países onde os imigrantes
enfrentarão riscos de sérias violações
dos direitos humanos. Esta prática, conhecida como non-refoulement
é proibida pela lei internacional de refugiados.
A reportagem ainda denuncia o fato de que, apesar de já
ter decorrido um ano do conflito que matou 13 pessoas e feriu
mais de cem, por tentarem cruzar Ceuta e Melilla, nada ainda foi
investigado.
Alguns casos de mortes e ferimentos na fronteira parecem resultar
da queda das pessoas no momento em que tentavam escalar a grade.
A barreira é um obstáculo muito perigoso, constituída
de duas grades com seis metros de altura e arame farpado em seu
topo, além de inúmeras câmeras de segurança
e sensores de infravermelho. A fronteira é constantemente
patrulhada por policiais. Mesmo a Associação Independente
dos Guardas Civis levantou preocupações junto ao
governo espanhol em relação à cerca, declarando:
ela é feita de arame e postes e quando um imigrante
cai da altura de seis metros ele se desfaz em pedaços.
Em outros casos os corpos continham inúmeros ferimentos
de projéteis. Há declarações de que
algumas pessoas são capturadas pela Guarda Civil Espanhola
e depois jogadas para o lado marroquino sem receber qualquer tipo
de atendimento médico.
Um delegado da Anistia Internacional enviado à região
afirmou: as evidências que vimos mostraram que os
guardas da fronteira usam a força de maneira ilegal e desproporcional,
além de usarem armas letais. Eles feriram e assassinaram
pessoas que tentavam atravessar a barreira. Muitos desses que
foram seriamente feridos em território espanhol foram arrastados
de volta pelos portões da barreira sem qualquer formalidade
legal ou assistência médica.
Em setembro de 2005, pelo menos quatro pessoas foram mortas
por disparos de armas de fogo enquanto tentavam ultrapassar a
cerca de segurança. Em julho desse ano ocorreram mais três
mortes na mesma área da fronteira, onde testemunhas declararam
ter ouvido sons de disparos.
Em muitos dos incidentes são usadas balas de borracha
e armas de fogo enquanto os imigrantes escalam a cerca. Esses
atos brutais são claras violações da lei
espanhola, que diz que os imigrantes têm direito a um aviso
legal e a um intérprete. As autoridades tentaram se esquivar
dessa responsabilidade, alegando que o estreito espaço
entre as duas cercas é um território onde a lei
espanhola não se aplicatornando-se uma espécie
de limbo legal.
Apesar dos consideráveis riscos, imigrantes que fracassam
na primeira vez sempre tentam atravessar outras vezeso que
demonstra a sua dificuldade e seu desespero.
A brutalidade enfrentada por aqueles que se arriscam nessa
perigosa jornada continua após serem capturados. Diversas
matérias denunciaram o envio forçado dos imigrantes
para as autoridades marroquinas, que abandonaram centenas deles
no deserto da fronteira com a Argélia e ordenaram a eles
que fossem andando até o vilarejo mais próximo,
apesar de terem pouca comida ou água. Uma destas reportagens
mostra um homem morrendo por exaustão devido ao calor,
após voltar andando pelo deserto.
Aqueles que não sucumbem à desidratação
são levados pelos soldados argelinos. Há centenas
de pessoas detidas nas bases policiais e militares no Marrocos.
A dificuldade de cruzar na região fez com que milhares
de pessoas passassem a usar o mar como rota alternativa para chegar
à União Européia. Várias centenas
delas foram capturadas tentando atravessar da Mauritânia
para as Ilhas Canárias. Somente em março deste ano,
2.129 pessoas foram capturadaso que representa um enorme
crescimento em relação ao ano anterior.
Num esforço para conter o fluxo, o governo espanhol
aumentou seus equipamentos e o treinamento dos guardas, sobretudo
aqueles que trabalham nos botes e nas aeronaves de patrulha da
fronteira, recebendo o apoio de vários países da
União Européia, incluindo a França, a Alemanha
e a Inglaterra. Tais esforços serviram somente para desviar
as rotas de imigração mais para o sul, no Senegal,
onde a jornada de 2.000 quilômetros é ainda mais
perigosa. O número total de pessoas que chegam às
Ilhas Canárias passou de 25.000 neste anocinco vezes
mais do que em 2005. Estima-se que 3.000 pessoas devem ter morrido
na travessia em botes precariamente equipados. Houve um crescimento
semelhante do número de imigrantes para a Itália
provenientes do Marrocos. Mais de 10.000 chegaram à região
vindos da ilha da Sicília.
A maioria das pessoas capturadas parece vir da Mauritânia,
do Senegal e da Gâmbia, países do oeste do continente
africano. Muitos vêm da África central. As razões
para saírem de seus países de origem são
a extrema pobreza, a guerra e a falta de esperança na melhoria
de vida.