Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 30 de novembro de 2006.
Daniel Ortega, o histórico líder da Frente Sandinista
de Libertação Nacional (FSLN) da Nicarágua,
venceu as eleições gerais para Presidente do país
no dia 5 de novembro. Ortega recebeu 38% do total de votos, aproximadamente
9% a mais que o segundo colocado, o conservador Eduardo Montealegre,
da Aliança de Libertação Nacional [ALN],
apoiado pelos EUA, que recebeu 29% dos votos.
Um segundo candidato de direita, José Rizo, do Partido
Liberal Constitucionalista (PLC), obteve 26% dos votos, enquanto
Edmundo Jarquin, do Movimento de Renovação Sandinista,
uma dissidência da FSLN, recebeu 6%, e o ex-sandinista Éden
Pastora ficou com menos de 1% dos votos. A Assembléia Legislativa,
composta por noventa membros, será basicamente dividida
nas mesmas proporções da votação presidencial,
de forma que nenhum partido obteve a maioria.
Ortega venceu apesar de ter recebido a menor quantidade de
votos nas cinco vezes que concorreu à presidência
da Nicarágua. Em 1984, o líder sandinista venceu
por uma margem impressionante, cinco anos depois que a FSLN tomou
o poder, ao derrubar a ditadura de Somoza. Ortega perdeu em 1990
para Violeta de Chomorro, recebendo 42% dos votos, numa eleição
realizada sob grande pressão econômica e militar
dos EUA, que pôs fim ao mandato sandinista. Ortega teve
uma diminuição de votos nas derrotas eleitorais
subseqüentes, perdendo, em 1996, para o candidato de direita,
Arnoldo Alemán, e para o atual presidente conservador,
Ernesto Bolaños, em 2001.
A FSLN foi se desviando de forma lenta e constante para a direita
no decorrer dos últimos 16 anos, desde que perdeu a presidência.
Os sandinistas nunca estiveram totalmente afastados do poder,
mantendo influências nas forças armadas e controlando
um considerável, embora minoritário, número
de cadeiras na Assembléia, além de concentrar diversas
propriedades nas mãos de destacados líderes sandinistas,
como o próprio Ortega.
Nos últimos sete anos, a política da Nicarágua
foi determinada pela coalizão entre o grupo de Ortega e
do ex-presidente Alemán. O acordo celebrado em 1999, chamado
El Pacto, garantiu assentos permanentes a Alemán
e a Ortega na Assembléia, conferindo-lhes imunidade vitalícia,
caso fossem processados por corrupção.
Uma emenda constitucional adotada como parte do acordo entre
PLC e FSLN diminuiu a margem mínima para vitória
na eleição presidencial, de 45 para 35%, desde que
o candidato vitorioso obtivesse pelo menos 5% de votos a mais
do que seu rival mais próximo. Estes critérios foram
criados em função da comprovada base eleitoral de
Ortega, ou seja, para facilitar a sua vitória no dia 5
de novembro.
No final das contas, El Pacto levou a um rompimento
da direita, com os apoiadores de Alemán ficando com o aparato
do PLC e nomeando Rizo, enquanto uma facção dissidente
se opôs ao acordo com os sandinistas e apresentou Montealegre
como seu candidato presidencial, com o apoio aberto do governo
Bush.
A campanha de 2006 marcou um desvio ainda mais agudo para a
direita por parte de Ortega e da FSLN. Indo além da aliança
com o grupo de Alemán, Ortega chegou a um acordo com elementos
dos contras, a guerrilha armada e treinada pela CIA
para realizar ataques terroristas nas vilas e cidades nicaragüenses
durante a década de 80.
Um ex-contra, Jaime Morales Carazo, é um aliado de Ortega
e será o vice-presidente. Se acontecer alguma coisa com
Ortegaque tem sessenta anosseu sucessor será
o ex-porta-voz e chefe dos contras (que atualmente ocupa a casa
da família de Ortega, que foi confiscada). Carazo é
íntimo amigo do ex-presidente Alemán, sendo inclusive
padrinho de seus filhos.
Um outro ex-guerrilheiro de direita, Salvador Talavera, formou
o Partido de Resistência da Nicarágua para representar
os ex-soldados dos contras, muitos dos quais são pobres
camponeses e índios Miskito, que não receberam as
concessões de terra prometidas em troca de seus serviços
na revolta apoiada pelos EUA. Em setembro, Talavera, conhecido
como Pequeno Canalha durante a guerra dos contras,
assinou o pacto de paz com os sandinistas, aparecendo
eventualmente na campanha de Ortega.
A FSLN corteja a igreja e os grandes empresários
Como parte de seu envolvimento com a direita, Ortega selou
acordos com os dois mais poderosos representantes da reação
na Nicarágua: a igreja católica e as instituições
empresariais.
Em 2005, Ortega prestou reverência à hierarquia
da igreja católica, casando-se com sua companheira de longa
data, Rosário Murillo, numa cerimônia conduzida pelo
bispo da igreja da Nicarágua, Cardeal Miguel Obando y Bravo.
Ele ainda confessou publicamente a Obando y Bravo
supostos pecados do regime sandinista na década de 80,
o que levou o cardeal a fazer vários depoimentos na televisão
durante a campanha eleitoral, afirmando que os católicos
poderiam votar em Ortega de forma consciente.
A reaproximação com a igreja chegou a seu ponto
máximo no mês passado, quando deputados sandinistas,
a mais ampla fração do legislativo, votaram a favor
de uma absurda lei anti-aborto, a mais atrasada do hemisfério
norte, que prevê sentenças de seis a trinta anos
de prisão para mulheres e médicos que realizarem
abortos.
Não há exceções na lei em relação
ao estupro, incesto ou riscos de saúde ou de vida da mãe.
As leis existentes já são tão restritas que
apenas 24 abortos legais foram realizados nos últimos três
anos na Nicarágua, sendo que o número de abortos
ilegais foi de 32.000.
O retorno de Ortega à presidência tem assim um
alto custo, que já está ainda sendo pago pelas mulheres
nicaragüenses. A primeira morte registrada sob a nova lei
ocorreu poucos dias depois das eleições presidenciais,
quando Jazmina Bojorge, de 18 anos, faleceu por complicações
numa gravidez de risco. O feto de cinco meses também faleceu.
Ortega e a FSLN também procuraram estreitar as relações
com os grandes empresários. A FSLN trocou a retórica
radical pela defesa do nacionalismo burguês, reivindicando
que o desenvolvimento da economia capitalista da Nicarágua
deve ser menos subserviente ao imperialismo norte-americano, ao
invés de propor a substituição do capitalismo
pelo socialismo.
Durante a campanha presidencial, Ortega se esforçou
para reafirmar tanto aos capitalistas da Nicarágua quanto
aos investidores estrangeiros que suas propriedades estariam seguras
sob o novo governo sandinista. No dia 29 de setembro, ele se reuniu
com mais de cem investidores norte-americanos e representantes
de Estado prometendo a eles que no seu governo nada será
confiscado. Mais tarde ele assinou um pacto de governabilidade
elaborado pela Câmara de Comércio da Nicarágua,
no qual ele promete respeitar o livre mercado e o
direito de propriedade.
Dois dias após a vitória eleitoral, Ortega se
reuniu com o ex-presidente norte-americano, Jimmy Carter, que
liderou uma grande operação de monitoramento da
eleição, garantindo a ele que o novo governo respeitará
os direitos de propriedade, o livre mercado e o acordo
de livre comércio com os EUA. O New York Times declarou
que empresários afirmaram que eles acreditam que
o Sr. Ortega fará uma revisão das reformas postas
em prática na década de 90. Espera-se, com
isso, a privatização de mais de 360 empresas estatais.
Ortega disse ainda que manterá alguns membros do governo
anterior, do presidente Bolaños, sobretudo aqueles que
são a favor da economia de mercado. Em 16 de novembro,
ele declarou seu absoluto acordo com as severas condições
impostas pelo Fundo Monetário Internacional para a concessão
de novos empréstimos. Tais condições exigem
a redução dos gastos governamentais e dos impostos,
limitando enormemente a capacidade do governo em distribuir a
renda e usar o dinheiro em programas sociais e de infra-estrutura.
Satisfeitos pela declaração de Ortega, uma equipe
de negociação do FMI estava sendo enviada a Manágua.
O FMI, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco
Mundial prometeram ajudar o futuro governo com 200 milhões
de dólares em investimentos.
A resposta de Washington
O retorno do líder da FSLN ao palácio presidencial
produziu um previsto mal-estar no governo Bush e na ultra-direita
norte-americana. Muitos daqueles que detém altos cargos
no aparelho de segurança nacional norte-americano se destacaram
durante a campanha de Reagan para destruir o regime sandinista
nos anos 80.
Robert Gates, nomeado por Bush para suceder Donald Rumsfeld
no Pentágono, foi deputado diretor da CIA na década
de 80 e se envolveu profundamente na guerra ilegal contra a Nicarágua.
John Negroponte, atual diretor da inteligência nacional,
era então embaixador dos EUA em Honduras, o país
vizinho onde funcionava a base de treinamento e armamento dos
contras. Elliot Abrams, atual diretor do Conselho Nacional de
Segurança para o Oriente Médio, foi o chefe do Departamento
de Estado diretamente responsável pelos contras. No escândalo
Irã-Contra do final da década de 80, ele declarou-se
culpado por falso testemunho diante de uma comissão do
Congresso, sendo posteriormente perdoado pelo então presidente
Bush.
A campanha eleitoral na Nicarágua produziu uma reunião
virtual, em Manágua, de fascistas norte-americanos financiadores
dos contras, alertando em tom apocalíptico que a eleição
de Ortega poderia transformar a Nicarágua numa base para
o terrorismo internacional, retratando o regime sandinista da
década de 80 como uma agência do comunismo
internacional.
Oliver North, o coronel aposentado da marinha que se tornou
a face pública do escândalo Irã-Contra, apareceu
em Manágua, seguido por Jeane Kirkpatrick, ex-embaixador
da ONU no governo Reagan. Eles não chegaram a um acordo,
pois North apoiou Rizo e Kirkpatrick apoiou Montealegre.
Outros norte-americanos que se opõem a Ortega são:
o ex-patrocinador do departamento de Estado dos contras e chefe
das políticas para a América Latina nos primeiros
anos do atual governo Bush, Otto Reich; o governador da Flórida
e irmão do presidente norte-americano, Jeb Bush; e o Secretário
de Estado Assistente para os Assuntos do Hemisfério Ocidental,
Tom Shannon.
Os anteriores patrocinadores dos contras no congresso também
foram decisivos. Os congressistas republicanos, Dana Rohrabacher,
Tom Tancredo e Dan Urton pediram ao governo norte-americano que
proibisse a transferência de dinheiro feita pelos imigrantes
nicaragüenses que moram nos Estados Unidos para suas famílias
na Nicarágua, o que representa uma soma aproximada de 850
milhões de dólares anuais. Se Daniel Ortega,
que se declarou inimigo dos EUA, tomar de volta o controle da
Nicarágua, você pode esperar que o governo norte-americano
responderá de acordo, afirmaram eles numa declaração
conjunta. Nós não permitiremos que um governo
hostil, anti-americano, consiga os mesmos benefícios econômicos
que um regime a favor dos EUA.
O congressista Peter Hoekstra, presidente do Comitê de
Inteligência, escreveu uma carta pública à
Secretária de estado, Condoleezza Rice, pedindo para que
o governo Bush faça uma completa reavaliação
das relações com a Nicarágua no caso
de uma vitória de Ortega. O Secretário de Comércio
norte-americano, Carlos Gutierrez, advertiu que com a eleição
de Ortega, mais de 220 milhões de dólares em ajudas
e investimentos importantes correrão sérios riscos.
A possibilidade de Ortega se eleger fez com que o governo Bush
investisse pesado na tentativa de evitar sua vitória. A
Agência Americana para o Desenvolvimento Internacional,
o Instituto Nacional Democrático, o Instituto Republicano
Internacional e a Fundação Internacional para Sistemas
Elétricos gastaram um total de 15 milhões de dólares
para treinar dezenas de milhares de fiscais e oficiais eleitoraisvalor
que se aproxima muito da despesa estimada de todos os candidatos
à presidência da Nicarágua (17 milhões
de dólares).
Um clima ainda mais pesado foi gerado pelo anúncio de
que o Comando do Exército do Sul dos EUA enviaria 2.000
reservistas para o departamento nicaragüense de Carazo, alegando
exercícios humanitários para construir escolas
e clínicas e realizar serviços médicos.
As tropas norte-americanas estarão na Nicarágua
do dia primeiro de janeiro ao dia 15 de maio, coincidindo com
os meses iniciais do novo mandato.
Entretanto, é notável que os empresários
locais demonstraram muito menos preocupação que
Washington a respeito dos perigos do governo Ortega. Uma carta
dos membros da Associação da Nicarágua de
Investidores, publicada pelo Los Angeles Times, afirmava:
o Sr. Ortega declarou que ele está completamente
comprometido em estimular os investimentos estrangeiros e o turismo,
percebendo que esse é o futuro do crescimento econômico
do país. Nós acreditamos que suas intenções
são sérias. Mike Cobb, o investidor norte-americano
do primeiro resort na praia Marriott, na Nicarágua,
e presidente de desenvolvimento da Gran Pacifica, disse
que planeja seguir adiante a toda velocidade e alcançar
o objetivo que planejamos.
O aliado do governo Bush na região, o presidente colombiano
Álvaro Uribe, parabenizou Ortega e se ofereceu para atuar
como um mediador nas negociações com agências
de empréstimos. Depois de mais de uma semana de relativo
silêncio, o embaixador norte-americano, Paul Trivelli, anunciou
no dia 16 de novembro que o governo Bush poderia reconhecer o
resultado da eleição e trabalhar com Ortega. Trivelli
apoiou Montealegre publicamente durante a campanha.
Um balanço do sandinismo
A integração de Ortega e sua camarilha nos esforços
da elite nicaragüense em realizar uma reaproximação
com o imperialismo norte-americano confirmam a análise
da natureza de classe dos sandinistas feita pelo movimento trotskista
mundial depois que a FSLN chegou ao poder em 1979. A FSLN adotou
publicamente o castrismo e a luta contra o imperialismo norte-americano
e ainda prestou um falso serviço ao socialismo. No entanto
nunca chegou a ser um partido da classe trabalhadora ou um partido
socialista. Ao contrário, significou sempre um movimento
nacionalista-burguês, procurando usar o apoio de Cuba e
da URSS para conseguir espaço de manobra numa região
dominada pelo imperialismo norte-americano.
O governo Reagan respondeu ao regime sandinista financiando
forças organizadas da CIA, os contras, que conduziram uma
década de guerra de sabotagem e terror contra a população
da Nicarágua, na qual mais de 500.000 pessoas morreram.
O conflito arrastou-se até que a crise do regime stalinista
pôs fim ao apoio da União Soviética aos sandinistas,
quando Ortega e seus aliados fizeram um acordo com Washington,
o que levou à sua derrota nas eleições de
1990.
Nos últimos 16 anos ocorreu a rápida degradação
dos já limitados direitos sociais, como educação
e assistência médica, conquistados pelos sandinistas
na década de 80. Um milhão de crianças em
idade escolar não vai à escola, e a taxa de alfabetização,
que era próxima dos 90% em 1990, despencou para 67,5% atualmente.
Apenas 29% das crianças completam o ensino fundamental.
Mais da metade da população não consegue
ter acesso aos serviços médicos mais elementares.
Tanto a FSLN quanto os seus oponentes políticos conservadores
aderiram às políticas do livre mercado.
Mas, ao contrário das declarações de que
a Nicarágua poderia se desenvolver economicamente sob a
base do livre comércio, o que ocorreu foi uma enorme diminuição
dos investimentos. O capital saiu livremente para fora do país,
que acabou se tornando dependente de empréstimos das instituições
financeiras internacionais.
Este foi um período no qual a ampla maioria dos nicaragüenses
caiu na miséria, enquanto os ricos se enriqueceram ainda
mais. Estes, que representam cerca de 10% da população,
ficam atualmente com 45% da renda nacional. Oficialmente, 22%
da força de trabalho está desempregada e outros
40% subempregada; as taxas de crescimento indicam um aumento anual
de 1,4% no desemprego. A fome é endêmica; mais de
20% da população é desnutrida, e cerca de
um milhão vive na fronteira da morte devido à fome.
A Nicarágua continua sendo a segunda nação
latino-americana mais pobre, depois do Haiti, com uma taxa de
pobreza de 45%. Em média, a renda per capita é de
790 dólares por ano, com uma distribuição
absurda, na qual 80% da população recebe menos de
dois dólares por mês. Um crescente número
de trabalhadores nicaragüenses emigrou para a Costa Rica
e para os Estados Unidos a fim de procurar por emprego.
O trabalho infantil é desenfreado, com o número
aproximado de 167.000 crianças que são forçadas
a trabalhar todos os dias. A mortalidade materna é de 150
para cada 100.000 pessoas vivas (este número é duas
vezes mais alto na parte mais pobre da Costa Atlântica).
Há dezenas de milhares de minas explosivas deixadas pela
guerra dos contras da CIA, que continuam a mutilar crianças
e adolescentes.
A infra-estrutura social está se desintegrando. Apenas
duas vias principais são utilizáveis; a linha férrea
do país foi desmantelada em 1990; a Nicarágua não
possui mais uma estrutura pesqueira como antigamente e seus portos
encontram-se num estado tão avançado de degradação
que as exportações e importações são
feitas pelos portos de Honduras e Costa Rica. As falidas políticas
de livre mercado tornaram os serviços básicos,
como saneamento e eletricidade, inacessível para centenas
de milhares de nicaragüenses. Ao mesmo tempo, o aumento no
preço dos combustíveis refletiu no aumento do preço
do transporte público.
Ao longo desse período, o Partido Sandinista garantiu
sua participação na Assembléia Nacional e
fez parte da introdução das reformas de livre
mercado. Enquanto a população sofria, a elite
nicaragüense, incluindo Ortega e outros líderes da
FSLN, enriquecia-se por meio das políticas de mercado,
da onda de corrupção que varreu o país, particularmente
no rastro do furacão Mitch, que matou milhares de nicaragüenses
em 1998.
A resposta de Ortega para o aprofundamento da calamidade social
foi a de defender a eliminação das barreiras aos
investimentos e garantir que a Nicarágua é ainda
um país onde as corporações transnacionais
podem pagar baixos salários, expandindo a tão comentada
zona de livre comércio que emprega agora milhares de nicaragüenses
em condições semelhantes à escravidão,
pagando-lhes salários de fome.
O líder sandinista assumirá a presidência
sob condições nas quais a Nicarágua e a América
Central estão se dirigindo rapidamente para um ponto de
colapso social. No ano passado, trabalhadores da Nicarágua
protestaram diversas vezes contra as políticas das grandes
empresas, da FSLN e do PLC. Este ano ocorreram greves de milhares
de trabalhadores dos transportes, professores e trabalhadores
da saúde pública contra a austeridade política
do governo e o colapso dos padrões de vida básicos.
Os trabalhadores das zonas de livre comércio estão
exigindo cada vez mais a negociação coletiva de
direitos e de condições decentes. Os trabalhadores
agrícolas e os desempregados estão dando seu apoio,
organizando greves e manifestações.
Ortega foi eleito pela oligarquia que foi anteriormente sua
inimiga, tendo ao seu lado um vice-presidente dos contras, para
dar resposta à crise crescente. A FSLN, um movimento que
surgiu como uma guerrilha que se apresentava como representante
dos pobres e oprimidos contra a ditadura de Somoza, tem a confiança
e a proteção do capitalismo nicaragüense, totalmente
comprometido com a defesa dos lucros dos grandes empresários
e com a repressão da classe trabalhadora e dos pobres.
Na imprensa norte-americana, o retorno de Ortega ao poder na
Nicarágua será caracterizado como mais uma expressão
do amplo movimento à esquerda em curso na América
Latina, que viu social-democratas, ex-guerrilheiros anti-americanos
ou líderes de sindicatos, como Lula no Brasil, chegarem
ao poder na maioria dos países. Como se sabe, a campanha
presidencial de Ortega recebeu subsídio financeiro direto
da Venezuela, e o presidente venezuelano Hugo Chavez prometeu
baratear o fornecimento de petróleo no caso de nova pressão
norte-americana sobre a Nicarágua.
Mas, no final das contas, o surgimento desses regimes está
longe de representar a chegada ao poder pelo povo ou pela classe
trabalhadora, mas significa a última linha de defesa da
classe capitalista da América Latina e seus patrões
imperialistas em Washington.
O problema estratégico enfrentado pela classe trabalhadora
latino-americana, assim como em todos os países atrasados
e oprimidos, permanece o mesmo que aquele elaborado por Leon Trotsky
em sua teoria da Revolução Permanente: a construção
de partidos revolucionários que estabelecerão a
independência política da classe trabalhadora em
relação à burguesia nacional e a união
dos oprimidos do terceiro mundo com a classe trabalhadora
dos países avançados numa luta comum pelo socialismo.