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Eleições na Nicarágua: vitória de Ortega e o fim do sandinismo

Por Rafael Azul e Patrick Martin
7 Dezembro 2006

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 30 de novembro de 2006.

Daniel Ortega, o histórico líder da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) da Nicarágua, venceu as eleições gerais para Presidente do país no dia 5 de novembro. Ortega recebeu 38% do total de votos, aproximadamente 9% a mais que o segundo colocado, o conservador Eduardo Montealegre, da Aliança de Libertação Nacional [ALN], apoiado pelos EUA, que recebeu 29% dos votos.

Um segundo candidato de direita, José Rizo, do Partido Liberal Constitucionalista (PLC), obteve 26% dos votos, enquanto Edmundo Jarquin, do Movimento de Renovação Sandinista, uma dissidência da FSLN, recebeu 6%, e o ex-sandinista Éden Pastora ficou com menos de 1% dos votos. A Assembléia Legislativa, composta por noventa membros, será basicamente dividida nas mesmas proporções da votação presidencial, de forma que nenhum partido obteve a maioria.

Ortega venceu apesar de ter recebido a menor quantidade de votos nas cinco vezes que concorreu à presidência da Nicarágua. Em 1984, o líder sandinista venceu por uma margem impressionante, cinco anos depois que a FSLN tomou o poder, ao derrubar a ditadura de Somoza. Ortega perdeu em 1990 para Violeta de Chomorro, recebendo 42% dos votos, numa eleição realizada sob grande pressão econômica e militar dos EUA, que pôs fim ao mandato sandinista. Ortega teve uma diminuição de votos nas derrotas eleitorais subseqüentes, perdendo, em 1996, para o candidato de direita, Arnoldo Alemán, e para o atual presidente conservador, Ernesto Bolaños, em 2001.

A FSLN foi se desviando de forma lenta e constante para a direita no decorrer dos últimos 16 anos, desde que perdeu a presidência. Os sandinistas nunca estiveram totalmente afastados do poder, mantendo influências nas forças armadas e controlando um considerável, embora minoritário, número de cadeiras na Assembléia, além de concentrar diversas propriedades nas mãos de destacados líderes sandinistas, como o próprio Ortega.

Nos últimos sete anos, a política da Nicarágua foi determinada pela coalizão entre o grupo de Ortega e do ex-presidente Alemán. O acordo celebrado em 1999, chamado “El Pacto”, garantiu assentos permanentes a Alemán e a Ortega na Assembléia, conferindo-lhes imunidade vitalícia, caso fossem processados por corrupção.

Uma emenda constitucional adotada como parte do acordo entre PLC e FSLN diminuiu a margem mínima para vitória na eleição presidencial, de 45 para 35%, desde que o candidato vitorioso obtivesse pelo menos 5% de votos a mais do que seu rival mais próximo. Estes critérios foram criados em função da comprovada base eleitoral de Ortega, ou seja, para facilitar a sua vitória no dia 5 de novembro.

No final das contas, “El Pacto” levou a um rompimento da direita, com os apoiadores de Alemán ficando com o aparato do PLC e nomeando Rizo, enquanto uma facção dissidente se opôs ao acordo com os sandinistas e apresentou Montealegre como seu candidato presidencial, com o apoio aberto do governo Bush.

A campanha de 2006 marcou um desvio ainda mais agudo para a direita por parte de Ortega e da FSLN. Indo além da aliança com o grupo de Alemán, Ortega chegou a um acordo com elementos dos “contras”, a guerrilha armada e treinada pela CIA para realizar ataques terroristas nas vilas e cidades nicaragüenses durante a década de 80.

Um ex-contra, Jaime Morales Carazo, é um aliado de Ortega e será o vice-presidente. Se acontecer alguma coisa com Ortega—que tem sessenta anos—seu sucessor será o ex-porta-voz e chefe dos contras (que atualmente ocupa a casa da família de Ortega, que foi confiscada). Carazo é íntimo amigo do ex-presidente Alemán, sendo inclusive padrinho de seus filhos.

Um outro ex-guerrilheiro de direita, Salvador Talavera, formou o Partido de Resistência da Nicarágua para representar os ex-soldados dos contras, muitos dos quais são pobres camponeses e índios Miskito, que não receberam as concessões de terra prometidas em troca de seus serviços na revolta apoiada pelos EUA. Em setembro, Talavera, conhecido como “Pequeno Canalha” durante a guerra dos contras, assinou o “pacto de paz” com os sandinistas, aparecendo eventualmente na campanha de Ortega.

A FSLN corteja a igreja e os grandes empresários

Como parte de seu envolvimento com a direita, Ortega selou acordos com os dois mais poderosos representantes da reação na Nicarágua: a igreja católica e as instituições empresariais.

Em 2005, Ortega prestou reverência à hierarquia da igreja católica, casando-se com sua companheira de longa data, Rosário Murillo, numa cerimônia conduzida pelo bispo da igreja da Nicarágua, Cardeal Miguel Obando y Bravo. Ele ainda “confessou” publicamente a Obando y Bravo supostos pecados do regime sandinista na década de 80, o que levou o cardeal a fazer vários depoimentos na televisão durante a campanha eleitoral, afirmando que os católicos poderiam votar em Ortega de forma consciente.

A reaproximação com a igreja chegou a seu ponto máximo no mês passado, quando deputados sandinistas, a mais ampla fração do legislativo, votaram a favor de uma absurda lei anti-aborto, a mais atrasada do hemisfério norte, que prevê sentenças de seis a trinta anos de prisão para mulheres e médicos que realizarem abortos.

Não há exceções na lei em relação ao estupro, incesto ou riscos de saúde ou de vida da mãe. As leis existentes já são tão restritas que apenas 24 abortos legais foram realizados nos últimos três anos na Nicarágua, sendo que o número de abortos ilegais foi de 32.000.

O retorno de Ortega à presidência tem assim um alto custo, que já está ainda sendo pago pelas mulheres nicaragüenses. A primeira morte registrada sob a nova lei ocorreu poucos dias depois das eleições presidenciais, quando Jazmina Bojorge, de 18 anos, faleceu por complicações numa gravidez de risco. O feto de cinco meses também faleceu.

Ortega e a FSLN também procuraram estreitar as relações com os grandes empresários. A FSLN trocou a retórica radical pela defesa do nacionalismo burguês, reivindicando que o desenvolvimento da economia capitalista da Nicarágua deve ser menos subserviente ao imperialismo norte-americano, ao invés de propor a substituição do capitalismo pelo socialismo.

Durante a campanha presidencial, Ortega se esforçou para reafirmar tanto aos capitalistas da Nicarágua quanto aos investidores estrangeiros que suas propriedades estariam seguras sob o novo governo sandinista. No dia 29 de setembro, ele se reuniu com mais de cem investidores norte-americanos e representantes de Estado prometendo a eles que no seu governo “nada será confiscado”. Mais tarde ele assinou um “pacto de governabilidade” elaborado pela Câmara de Comércio da Nicarágua, no qual ele promete respeitar o “livre” mercado e o direito de propriedade.

Dois dias após a vitória eleitoral, Ortega se reuniu com o ex-presidente norte-americano, Jimmy Carter, que liderou uma grande operação de monitoramento da eleição, garantindo a ele que o novo governo respeitará os direitos de propriedade, o “livre mercado” e o acordo de livre comércio com os EUA. O New York Times declarou que “empresários afirmaram que eles acreditam que o Sr. Ortega fará uma revisão das reformas postas em prática na década de 90”. Espera-se, com isso, a privatização de mais de 360 empresas estatais.

Ortega disse ainda que manterá alguns membros do governo anterior, do presidente Bolaños, sobretudo aqueles que são a favor da economia de mercado. Em 16 de novembro, ele declarou seu “absoluto acordo” com as severas condições impostas pelo Fundo Monetário Internacional para a concessão de novos empréstimos. Tais condições exigem a redução dos gastos governamentais e dos impostos, limitando enormemente a capacidade do governo em distribuir a renda e usar o dinheiro em programas sociais e de infra-estrutura.

Satisfeitos pela declaração de Ortega, uma equipe de negociação do FMI estava sendo enviada a Manágua. O FMI, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial prometeram ajudar o futuro governo com 200 milhões de dólares em investimentos.

A resposta de Washington

O retorno do líder da FSLN ao palácio presidencial produziu um previsto mal-estar no governo Bush e na ultra-direita norte-americana. Muitos daqueles que detém altos cargos no aparelho de segurança nacional norte-americano se destacaram durante a campanha de Reagan para destruir o regime sandinista nos anos 80.

Robert Gates, nomeado por Bush para suceder Donald Rumsfeld no Pentágono, foi deputado diretor da CIA na década de 80 e se envolveu profundamente na guerra ilegal contra a Nicarágua. John Negroponte, atual diretor da inteligência nacional, era então embaixador dos EUA em Honduras, o país vizinho onde funcionava a base de treinamento e armamento dos contras. Elliot Abrams, atual diretor do Conselho Nacional de Segurança para o Oriente Médio, foi o chefe do Departamento de Estado diretamente responsável pelos contras. No escândalo Irã-Contra do final da década de 80, ele declarou-se culpado por falso testemunho diante de uma comissão do Congresso, sendo posteriormente perdoado pelo então presidente Bush.

A campanha eleitoral na Nicarágua produziu uma reunião virtual, em Manágua, de fascistas norte-americanos financiadores dos contras, alertando em tom apocalíptico que a eleição de Ortega poderia transformar a Nicarágua numa base para o terrorismo internacional, retratando o regime sandinista da década de 80 como uma agência do “comunismo internacional”.

Oliver North, o coronel aposentado da marinha que se tornou a face pública do escândalo Irã-Contra, apareceu em Manágua, seguido por Jeane Kirkpatrick, ex-embaixador da ONU no governo Reagan. Eles não chegaram a um acordo, pois North apoiou Rizo e Kirkpatrick apoiou Montealegre.

Outros norte-americanos que se opõem a Ortega são: o ex-patrocinador do departamento de Estado dos contras e chefe das políticas para a América Latina nos primeiros anos do atual governo Bush, Otto Reich; o governador da Flórida e irmão do presidente norte-americano, Jeb Bush; e o Secretário de Estado Assistente para os Assuntos do Hemisfério Ocidental, Tom Shannon.

Os anteriores patrocinadores dos contras no congresso também foram decisivos. Os congressistas republicanos, Dana Rohrabacher, Tom Tancredo e Dan Urton pediram ao governo norte-americano que proibisse a transferência de dinheiro feita pelos imigrantes nicaragüenses que moram nos Estados Unidos para suas famílias na Nicarágua, o que representa uma soma aproximada de 850 milhões de dólares anuais. “Se Daniel Ortega, que se declarou inimigo dos EUA, tomar de volta o controle da Nicarágua, você pode esperar que o governo norte-americano responderá de acordo”, afirmaram eles numa declaração conjunta. “Nós não permitiremos que um governo hostil, anti-americano, consiga os mesmos benefícios econômicos” que um regime a favor dos EUA.

O congressista Peter Hoekstra, presidente do Comitê de Inteligência, escreveu uma carta pública à Secretária de estado, Condoleezza Rice, pedindo para que o governo Bush faça uma “completa reavaliação das relações com a Nicarágua” no caso de uma vitória de Ortega. O Secretário de Comércio norte-americano, Carlos Gutierrez, advertiu que com a eleição de Ortega, mais de 220 milhões de dólares em ajudas e investimentos importantes correrão sérios riscos.

A possibilidade de Ortega se eleger fez com que o governo Bush investisse pesado na tentativa de evitar sua vitória. A Agência Americana para o Desenvolvimento Internacional, o Instituto Nacional Democrático, o Instituto Republicano Internacional e a Fundação Internacional para Sistemas Elétricos gastaram um total de 15 milhões de dólares para treinar dezenas de milhares de fiscais e oficiais eleitorais—valor que se aproxima muito da despesa estimada de todos os candidatos à presidência da Nicarágua (17 milhões de dólares).

Um clima ainda mais pesado foi gerado pelo anúncio de que o Comando do Exército do Sul dos EUA enviaria 2.000 reservistas para o departamento nicaragüense de Carazo, alegando exercícios humanitários “para construir escolas e clínicas e realizar serviços médicos”. As tropas norte-americanas estarão na Nicarágua do dia primeiro de janeiro ao dia 15 de maio, coincidindo com os meses iniciais do novo mandato.

Entretanto, é notável que os empresários locais demonstraram muito menos preocupação que Washington a respeito dos perigos do governo Ortega. Uma carta dos membros da Associação da Nicarágua de Investidores, publicada pelo Los Angeles Times, afirmava: “o Sr. Ortega declarou que ele está completamente comprometido em estimular os investimentos estrangeiros e o turismo, percebendo que esse é o futuro do crescimento econômico do país. Nós acreditamos que suas intenções são sérias”. Mike Cobb, o investidor norte-americano do primeiro resort na praia Marriott, na Nicarágua, e presidente de desenvolvimento da Gran Pacifica, disse que planeja “seguir adiante a toda velocidade” e “alcançar o objetivo que planejamos”.

O aliado do governo Bush na região, o presidente colombiano Álvaro Uribe, parabenizou Ortega e se ofereceu para atuar como um mediador nas negociações com agências de empréstimos. Depois de mais de uma semana de relativo silêncio, o embaixador norte-americano, Paul Trivelli, anunciou no dia 16 de novembro que o governo Bush poderia reconhecer o resultado da eleição e trabalhar com Ortega. Trivelli apoiou Montealegre publicamente durante a campanha.

Um balanço do sandinismo

A integração de Ortega e sua camarilha nos esforços da elite nicaragüense em realizar uma reaproximação com o imperialismo norte-americano confirmam a análise da natureza de classe dos sandinistas feita pelo movimento trotskista mundial depois que a FSLN chegou ao poder em 1979. A FSLN adotou publicamente o castrismo e a luta contra o imperialismo norte-americano e ainda prestou um falso serviço ao socialismo. No entanto nunca chegou a ser um partido da classe trabalhadora ou um partido socialista. Ao contrário, significou sempre um movimento nacionalista-burguês, procurando usar o apoio de Cuba e da URSS para conseguir espaço de manobra numa região dominada pelo imperialismo norte-americano.

O governo Reagan respondeu ao regime sandinista financiando forças organizadas da CIA, os contras, que conduziram uma década de guerra de sabotagem e terror contra a população da Nicarágua, na qual mais de 500.000 pessoas morreram. O conflito arrastou-se até que a crise do regime stalinista pôs fim ao apoio da União Soviética aos sandinistas, quando Ortega e seus aliados fizeram um acordo com Washington, o que levou à sua derrota nas eleições de 1990.

Nos últimos 16 anos ocorreu a rápida degradação dos já limitados direitos sociais, como educação e assistência médica, conquistados pelos sandinistas na década de 80. Um milhão de crianças em idade escolar não vai à escola, e a taxa de alfabetização, que era próxima dos 90% em 1990, despencou para 67,5% atualmente. Apenas 29% das crianças completam o ensino fundamental. Mais da metade da população não consegue ter acesso aos serviços médicos mais elementares.

Tanto a FSLN quanto os seus oponentes políticos conservadores aderiram às políticas do “livre mercado”. Mas, ao contrário das declarações de que a Nicarágua poderia se desenvolver economicamente sob a base do livre comércio, o que ocorreu foi uma enorme diminuição dos investimentos. O capital saiu livremente para fora do país, que acabou se tornando dependente de empréstimos das instituições financeiras internacionais.

Este foi um período no qual a ampla maioria dos nicaragüenses caiu na miséria, enquanto os ricos se enriqueceram ainda mais. Estes, que representam cerca de 10% da população, ficam atualmente com 45% da renda nacional. Oficialmente, 22% da força de trabalho está desempregada e outros 40% subempregada; as taxas de crescimento indicam um aumento anual de 1,4% no desemprego. A fome é endêmica; mais de 20% da população é desnutrida, e cerca de um milhão vive na fronteira da morte devido à fome.

A Nicarágua continua sendo a segunda nação latino-americana mais pobre, depois do Haiti, com uma taxa de pobreza de 45%. Em média, a renda per capita é de 790 dólares por ano, com uma distribuição absurda, na qual 80% da população recebe menos de dois dólares por mês. Um crescente número de trabalhadores nicaragüenses emigrou para a Costa Rica e para os Estados Unidos a fim de procurar por emprego.

O trabalho infantil é desenfreado, com o número aproximado de 167.000 crianças que são forçadas a trabalhar todos os dias. A mortalidade materna é de 150 para cada 100.000 pessoas vivas (este número é duas vezes mais alto na parte mais pobre da Costa Atlântica). Há dezenas de milhares de minas explosivas deixadas pela guerra dos contras da CIA, que continuam a mutilar crianças e adolescentes.

A infra-estrutura social está se desintegrando. Apenas duas vias principais são utilizáveis; a linha férrea do país foi desmantelada em 1990; a Nicarágua não possui mais uma estrutura pesqueira como antigamente e seus portos encontram-se num estado tão avançado de degradação que as exportações e importações são feitas pelos portos de Honduras e Costa Rica. As falidas políticas de “livre mercado” tornaram os serviços básicos, como saneamento e eletricidade, inacessível para centenas de milhares de nicaragüenses. Ao mesmo tempo, o aumento no preço dos combustíveis refletiu no aumento do preço do transporte público.

Ao longo desse período, o Partido Sandinista garantiu sua participação na Assembléia Nacional e fez parte da introdução das reformas de “livre mercado”. Enquanto a população sofria, a elite nicaragüense, incluindo Ortega e outros líderes da FSLN, enriquecia-se por meio das políticas de mercado, da onda de corrupção que varreu o país, particularmente no rastro do furacão Mitch, que matou milhares de nicaragüenses em 1998.

A resposta de Ortega para o aprofundamento da calamidade social foi a de defender a eliminação das barreiras aos investimentos e garantir que a Nicarágua é ainda um país onde as corporações transnacionais podem pagar baixos salários, expandindo a tão comentada zona de livre comércio que emprega agora milhares de nicaragüenses em condições semelhantes à escravidão, pagando-lhes salários de fome.

O líder sandinista assumirá a presidência sob condições nas quais a Nicarágua e a América Central estão se dirigindo rapidamente para um ponto de colapso social. No ano passado, trabalhadores da Nicarágua protestaram diversas vezes contra as políticas das grandes empresas, da FSLN e do PLC. Este ano ocorreram greves de milhares de trabalhadores dos transportes, professores e trabalhadores da saúde pública contra a austeridade política do governo e o colapso dos padrões de vida básicos. Os trabalhadores das zonas de livre comércio estão exigindo cada vez mais a negociação coletiva de direitos e de condições decentes. Os trabalhadores agrícolas e os desempregados estão dando seu apoio, organizando greves e manifestações.

Ortega foi eleito pela oligarquia que foi anteriormente sua inimiga, tendo ao seu lado um vice-presidente dos contras, para dar resposta à crise crescente. A FSLN, um movimento que surgiu como uma guerrilha que se apresentava como representante dos pobres e oprimidos contra a ditadura de Somoza, tem a confiança e a proteção do capitalismo nicaragüense, totalmente comprometido com a defesa dos lucros dos grandes empresários e com a repressão da classe trabalhadora e dos pobres.

Na imprensa norte-americana, o retorno de Ortega ao poder na Nicarágua será caracterizado como mais uma expressão do amplo movimento à esquerda em curso na América Latina, que viu social-democratas, ex-guerrilheiros anti-americanos ou líderes de sindicatos, como Lula no Brasil, chegarem ao poder na maioria dos países. Como se sabe, a campanha presidencial de Ortega recebeu subsídio financeiro direto da Venezuela, e o presidente venezuelano Hugo Chavez prometeu baratear o fornecimento de petróleo no caso de nova pressão norte-americana sobre a Nicarágua.

Mas, no final das contas, o surgimento desses regimes está longe de representar a chegada ao poder pelo povo ou pela classe trabalhadora, mas significa a última linha de defesa da classe capitalista da América Latina e seus patrões imperialistas em Washington.

O problema estratégico enfrentado pela classe trabalhadora latino-americana, assim como em todos os países atrasados e oprimidos, permanece o mesmo que aquele elaborado por Leon Trotsky em sua teoria da Revolução Permanente: a construção de partidos revolucionários que estabelecerão a independência política da classe trabalhadora em relação à burguesia nacional e a união dos oprimidos do “terceiro mundo” com a classe trabalhadora dos países avançados numa luta comum pelo socialismo.