A rede de televisão italiana RAI divulgou extenso documentário
com depoimentos e imagens que comprovam o uso por militares americanos
de armas químicas no Iraque, inclusive em áreas
civis. O filme intitulado Fallujah: o massacre oculto, especificamente
enfocou o uso de fósforo branco(a), um agente químico
incendiário e corrosivo, durante o assalto a Fallujah em
novembro de 2004. Ex-soldados americanos, médicos iraquianos
e jornalistas internacionais foram entrevistados, e imagens gráficas
mostraram civis iraquianos trucidados por armas químicas.
Os realizadores do filme falaram com Jeff Englehart, especialista
em armas do exército, que participou da ofensiva de Fallujah.
Ele foi indagado se as forças dos Estados Unidos tinham
empregado armas químicas. "Pelos militares dos Estados
Unidos, sim, absolutamente sim", Emglehart respondeu. "Fósforo
branco, possivelmente napalm(b) pode ter sido usado ou não,
não sei, não sei. Eu sei realmente que fósforo
branco foi usado, e é definitivamente e sem sombra de dúvida
uma arma química".
O ex-militar que agora decididamente se opõe à
guerra descreveu como viu os cadáveres dos mortos pelo
fósforo. "Queimados. Corpos queimados. Quero dizer
crianças queimadas, mulheres queimadas. Fósforo
branco queima indiscriminadamente. Forma uma nuvem num raio de
150 metros de seu impacto, na maior parte dos casos se dispersa
e queima todo ser humano ou animal."
"Os gases da ogiva de fósforo branco espalha-se
em forma de nuvem. Quando entra em contacto com a pele, danifica-a
irreversivelmente - queimando as carnes até os ossos. Se
um indivíduo o aspirar formará bolhas na garganta
e nos pulmões até que o sufoque, e em seguida queimá-lo-á
por dentro. Basicamente ele reage à pele, diante ada presença
do oxigênio e da água. A única maneira de
deter a combustão é com lama úmida. Mas a
esta altura é verdadeiramente impossível parar a
combustão".
O documentário contém tomadas de cenas fixas
feitas por um grupo de médicos iraquianos que entraram
em Fallujah após a ofensiva para ajudar no sepultamento
dos mortos. O narrador do filme descreveu imagens terríveis.
"Os corpos das vítimas civis, mulheres ainda apertando
em suas mãos o masbaha, o rosário islâmico,
seus corpos mostrando estranhos ferimentos, alguns queimados até
os ossos, outras com peles pendentes de suas carnes. Não
há sinal de ferimentos de balas. As faces, literalmente
fundidas, exatamente igual a outras partes do corpo. As roupas
estão inusitadamente intactas... Alguns animais também
estão mortos sem qualquer ferimento aparente".
O documentário também divulgou certo número
de imagens colhidas por Mohamed Tareq al-Deraji, diretor do Centro
de Estudos dos Direitos Humanos do Iraque. As fotografias mostram
homens e mulheres queimados de tal forma que se torna impossível
seu reconhecimento, suas peles dissolvidas e com a aparência
de caramelo ou então completamente gelatinosas. Em alguns
casos, pouco mais que os crânios e dentes das vítimas
restaram. Nenhuma das roupas dos cadáveres queimadas, indicando
que artefatos bélicos convencionais não poderiam
ter sido usados.
Depois que jornalistas independentes relataram as acusações
dos residentes de Fallujah, de que armas químicas foram
usadas contra eles em dezembro de 2004, militares americanos emitiram
um desmentido formal As forças dos Estados Unidos tinham
usado ?granadas de fósforo branco? com muita parcimônia
em Fallujah, para fins de iluminação", informa
a declaração. "Foram detonadas no ar para iluminar
as posições inimigas à noite, não
sobre combatentes inimigos" . O documentário italiano
comprova que isto é mentira - granadas químicas
mataram tanto combatentes da resistência quanto civis.
O uso ofensivo de fósforo branco constitui clara violação
de leis internacionais e representa outro crime cometido pelas
forças dos Estados Unidos no Iraque. A resolução
das Nações Unidas respeitante a certas armas convencionais
condena o uso de apetrechos incendiários e químicos
em áreas civis.
Falando no programa radiofônico "Democracia Agora!",
o tenente-coronel Steve Boylan, porta-voz militar americano no
Iraque, tentou desmentir esta acusação. "?Os
cinegrafistas? chamaram o fósforo branco arma ilegal",
disse ele. "Isto é um erro. É uma arma perfeitamente
legal para uso segundo todas as convenções de guerra
terrestre". Ele também insistiu em que as vítimas
civis mostradas no documentário podiam ter sido mortas
por explosivos convencionais. Boylan não pôde explicar,
todavia, como as vestes dos cadáveres permaneceram intactas.
O emprego militar de armas químicas em Fallujah fez
parte da punição coletiva aplicada a toda a população
da cidade. Fallujah tornou-se o principal centro de resistência
após abril de 2003, quando as forças estadunidenses
dispararam contra multidões de citadinos que protestaram
em duas ocasiões, matando 16 pessoas. Em abril de 2004,
chefes militares americanos foram humilhados quando combatentes
da resistência repeliram uma ofensiva terrestre destinada
a recuperar o controle da área pelas forças de ocupação.
O subseqüente massacre de novembro tinha o propósito
fazer saber a todo o povo iraquiano o que possivelmente lhe aconteceria;
advertindo-o para que evitasse apoiar a resistência. Logo
iniciado o assalto a Falujah, ninguém do sexo masculino
de 15 a 55 anos de idade tinha permissão de deixar a cidade.
A despeito da anterior solicitação americana para
uma evacuação em massa, estimou-se que 100.000 civis
não puderam nem desejaram partir. Insurgentes armados com
pouco mais que carabinas AK-47 de granadas impulsionadas por foguetes
foram pulverizados intensamente por artilharia terrestre e aérea.
Forças americanas canhonearam, bombardearam toda a cidade,
reduzindo-a em grande parte a escombros.
Em seqüência, o exército dos Estados Unidos
alegou ter matado 1.200 insurgentes, mas recusou-se a divulgar
qualquer estimativa das baixas civis. Os que foram mortos rapidamente
foram enterrados, muitos em valas comuns, e até hoje ninguém
sabe exatamente quantos morreram. Logo após a recaptura
da cidade pelas forças americanas, Muhammad al-Nuri, porta-voz
do Crescente Vermelho(c) Iraquiano estimou em 6.000 o número
de indivíduos mortos.
Jeff Englehart descreveu assim os procedimentos que ele devia
observar antes do ataque de novembro: "Fui pessoalmente envolvido
na escolta de um comandante até Fallujah no decorrer da
Operação Fúria," declarou ele à
RAI. "Disseram-nos ?antes? que estávamos entrando
na área de combate de Fallujah para a Operação
Fúria, que toda e qualquer pessoa isolada que estivesse
se locomovendo, falando, respirando era um combatente inimigo.
Como tal, cada ser vivente que se movimentasse pela rua ou dentro
de casa tornara-se um alvo".
Quando perguntado sobre o que diria seu filho quanto à
operação, o ex-soldado respondeu, "parecia
exatamente uma matança maciça de árabes.
Assemelhava-se precisamente a um massacre".
Englehart também confirmou que o assalto foi aprazado
de maneira a não influir na campanha de reeleição
do presidente George Bush. "Era precisamente este evento",
ele declarou. "Mesmo no seio das tropas, nas fileiras militares,
sabíamos o que estava se passando. Diziam-nos que íamos
aguardar ?até? depois da eleição, o pleito
americano, antes de entramos em Fallujah. Tínhamos estruturado
toda a operação, como se já estivesse pronta
para começar. E estávamos aguardando por dois ou
três dias que terminasse a eleição... Não
obstante, ao evidenciar-se que Kerry perdera, em questão
de um dia a operação estava acontecendo. Foi definitivamente
o caso. Foi-nos expressamente determinado pelo Pentágono
esperar para depois das eleições antes de entrarmos
em Fallujah. Foi exatamente o ocorrido".
O documentário produzido pelos italianos também
examinou o uso do MK-77, um explosivo incendiário, pelas
forças americanas, em composição e efeito
quase idêntico ao napalm. O Pentágono tem admitido
o emprego da arma durante a invasão de 2003, embora alegue
que se recorreu ao artefato químico apenas contra alvos
militares iraquianos.
O uso de armas químicas por forças lideradas
pelos Estados Unidos é indicativo do caráter criminoso
de toda a guerra. Armas químicas são indelevelmente
associadas com muitos dos mais bárbaros episódios
do século 20 - desde o emprego do gás de mostarda(d)
nas trincheiras da I Guerra Mundial ao uso indiscriminado do napalm
e do agente laranja(e) na guerra do Vietnam. A história
cedo lembrará os crimes da administração
Bush ao lado destas atrocidades.
Notas do tradutor - (a) Mesmo não inflamado,
é nocivo ao meio ambiente. Nos anos 1940s verificou-se
que seus resíduos deixados em áreas de treinamento
militar nos Estados Unidos matavam aves aquáticas em número
apreciável. (b)Termo formado de na(phthene) + palm(itate)
componentes químicos do artefato incendiário; tem
o aspecto de um gel. O professor de Harvard Louis Fieser (1899-1977)
dirigiu as pesquisas que desenvolveram a arma incendiária.
Com patente requerida em 1943, foi empregada no final da II Guerra
Mundial. O principal fabricante do napalm foi ou é a Dow
Chemical Company, poderosa multinacional cuja filial brasileira
foi presidida, entre 1968 e 1973, pelo general Golbery do Couto
e Silva (1911-1987), o principal ideólogo da ditadura militar
implantada no Brasil em 1964. Intensamente usado pelos Estados
Unidos em suas operações bélicas no Vietnam.
Em grande parte, "os efeitos brutais do napalm motivaram
os protestos de milhões de ativistas anti-guerra contra
seu emprego naquele país asiático". Na aldeia
vietnamita Trang Bang celebrizou-se o fotógrafo Nguyen
Kong "Nick" ao retratar a menina Kim Phu,c de 9 anos
de idade, correndo em chamas, sem vestes, pois que atingida em
cheio pelo napalm. A foto chocou o mundo ao mostrar uma de suas
inúmeras vítimas civis inocentes. c) A Cruz Vermelha
dos paises muçulmanos, cujo emblema foi reconhecido oficialmente
em 1949. (d) Lançado inicialmente pelos alemães
contra as tropas franco-britânicas em 22 de abril de 1915.
Seu emprego na frente de batalha apanhou estas forças desprevenidas
e que não contavam, portanto, com qualquer proteção
para a nova arma. e) Mistura de herbicidas contendo a substância
cancerígena dioxina. Usada amplamente no Vietnam pelos
americanos como desfolhante. Afirmavam os Estados Unidos, então,
que era "inofensiva". Ao todo, os ianques empregaram
cerca de 72 milhões de litros de produtos químicos
no Vietnam, constituindo o agente laranja metade deste volume.
Calcula-se que a substância vitima ainda hoje 1 em cada
1.000 vietnamitas, e continua a provocar cânceres, abortos
e deformações genéticas. Ainda: estudos publicados
em Washington em abril de 2000 revelaram que entre os pilotos
da Força Aérea Americana (USAF) e o pessoal de terra
da mesma nacionalidade, participantes da Guerra do Vietnam, aumentaram
consideravelmente os casos de diabetes. Como o Brasil não
podia escapar incólume, há alguns anos guardas do
IBAMA e da Polícia Federal apreenderam volumosa carga de
produtos químicos "pelo menos semelhantes ao agente
laranja" na região do Xingu, pertencente a uma madeireira
situada a 1.300 quilômetros de Belém.