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Filme documenta o uso pelos americanos de armas químicas no Iraque

Por Por Rick Kelly
23 Noviembre 2005

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A rede de televisão italiana RAI divulgou extenso documentário com depoimentos e imagens que comprovam o uso por militares americanos de armas químicas no Iraque, inclusive em áreas civis. O filme intitulado Fallujah: o massacre oculto, especificamente enfocou o uso de fósforo branco(a), um agente químico incendiário e corrosivo, durante o assalto a Fallujah em novembro de 2004. Ex-soldados americanos, médicos iraquianos e jornalistas internacionais foram entrevistados, e imagens gráficas mostraram civis iraquianos trucidados por armas químicas.

Os realizadores do filme falaram com Jeff Englehart, especialista em armas do exército, que participou da ofensiva de Fallujah. Ele foi indagado se as forças dos Estados Unidos tinham empregado armas químicas. "Pelos militares dos Estados Unidos, sim, absolutamente sim", Emglehart respondeu. "Fósforo branco, possivelmente napalm(b) pode ter sido usado ou não, não sei, não sei. Eu sei realmente que fósforo branco foi usado, e é definitivamente e sem sombra de dúvida uma arma química".

O ex-militar que agora decididamente se opõe à guerra descreveu como viu os cadáveres dos mortos pelo fósforo. "Queimados. Corpos queimados. Quero dizer crianças queimadas, mulheres queimadas. Fósforo branco queima indiscriminadamente. Forma uma nuvem num raio de 150 metros de seu impacto, na maior parte dos casos se dispersa e queima todo ser humano ou animal."

"Os gases da ogiva de fósforo branco espalha-se em forma de nuvem. Quando entra em contacto com a pele, danifica-a irreversivelmente - queimando as carnes até os ossos. Se um indivíduo o aspirar formará bolhas na garganta e nos pulmões até que o sufoque, e em seguida queimá-lo-á por dentro. Basicamente ele reage à pele, diante ada presença do oxigênio e da água. A única maneira de deter a combustão é com lama úmida. Mas a esta altura é verdadeiramente impossível parar a combustão".

O documentário contém tomadas de cenas fixas feitas por um grupo de médicos iraquianos que entraram em Fallujah após a ofensiva para ajudar no sepultamento dos mortos. O narrador do filme descreveu imagens terríveis. "Os corpos das vítimas civis, mulheres ainda apertando em suas mãos o masbaha, o rosário islâmico, seus corpos mostrando estranhos ferimentos, alguns queimados até os ossos, outras com peles pendentes de suas carnes. Não há sinal de ferimentos de balas. As faces, literalmente fundidas, exatamente igual a outras partes do corpo. As roupas estão inusitadamente intactas... Alguns animais também estão mortos sem qualquer ferimento aparente".

O documentário também divulgou certo número de imagens colhidas por Mohamed Tareq al-Deraji, diretor do Centro de Estudos dos Direitos Humanos do Iraque. As fotografias mostram homens e mulheres queimados de tal forma que se torna impossível seu reconhecimento, suas peles dissolvidas e com a aparência de caramelo ou então completamente gelatinosas. Em alguns casos, pouco mais que os crânios e dentes das vítimas restaram. Nenhuma das roupas dos cadáveres queimadas, indicando que artefatos bélicos convencionais não poderiam ter sido usados.

Depois que jornalistas independentes relataram as acusações dos residentes de Fallujah, de que armas químicas foram usadas contra eles em dezembro de 2004, militares americanos emitiram um desmentido formal As forças dos Estados Unidos tinham usado ?granadas de fósforo branco? com muita parcimônia em Fallujah, para fins de iluminação", informa a declaração. "Foram detonadas no ar para iluminar as posições inimigas à noite, não sobre combatentes inimigos" . O documentário italiano comprova que isto é mentira - granadas químicas mataram tanto combatentes da resistência quanto civis.

O uso ofensivo de fósforo branco constitui clara violação de leis internacionais e representa outro crime cometido pelas forças dos Estados Unidos no Iraque. A resolução das Nações Unidas respeitante a certas armas convencionais condena o uso de apetrechos incendiários e químicos em áreas civis.

Falando no programa radiofônico "Democracia Agora!", o tenente-coronel Steve Boylan, porta-voz militar americano no Iraque, tentou desmentir esta acusação. "?Os cinegrafistas? chamaram o fósforo branco arma ilegal", disse ele. "Isto é um erro. É uma arma perfeitamente legal para uso segundo todas as convenções de guerra terrestre". Ele também insistiu em que as vítimas civis mostradas no documentário podiam ter sido mortas por explosivos convencionais. Boylan não pôde explicar, todavia, como as vestes dos cadáveres permaneceram intactas.

O emprego militar de armas químicas em Fallujah fez parte da punição coletiva aplicada a toda a população da cidade. Fallujah tornou-se o principal centro de resistência após abril de 2003, quando as forças estadunidenses dispararam contra multidões de citadinos que protestaram em duas ocasiões, matando 16 pessoas. Em abril de 2004, chefes militares americanos foram humilhados quando combatentes da resistência repeliram uma ofensiva terrestre destinada a recuperar o controle da área pelas forças de ocupação.

O subseqüente massacre de novembro tinha o propósito fazer saber a todo o povo iraquiano o que possivelmente lhe aconteceria; advertindo-o para que evitasse apoiar a resistência. Logo iniciado o assalto a Falujah, ninguém do sexo masculino de 15 a 55 anos de idade tinha permissão de deixar a cidade. A despeito da anterior solicitação americana para uma evacuação em massa, estimou-se que 100.000 civis não puderam nem desejaram partir. Insurgentes armados com pouco mais que carabinas AK-47 de granadas impulsionadas por foguetes foram pulverizados intensamente por artilharia terrestre e aérea. Forças americanas canhonearam, bombardearam toda a cidade, reduzindo-a em grande parte a escombros.

Em seqüência, o exército dos Estados Unidos alegou ter matado 1.200 insurgentes, mas recusou-se a divulgar qualquer estimativa das baixas civis. Os que foram mortos rapidamente foram enterrados, muitos em valas comuns, e até hoje ninguém sabe exatamente quantos morreram. Logo após a recaptura da cidade pelas forças americanas, Muhammad al-Nuri, porta-voz do Crescente Vermelho(c) Iraquiano estimou em 6.000 o número de indivíduos mortos.

Jeff Englehart descreveu assim os procedimentos que ele devia observar antes do ataque de novembro: "Fui pessoalmente envolvido na escolta de um comandante até Fallujah no decorrer da Operação Fúria," declarou ele à RAI. "Disseram-nos ?antes? que estávamos entrando na área de combate de Fallujah para a Operação Fúria, que toda e qualquer pessoa isolada que estivesse se locomovendo, falando, respirando era um combatente inimigo. Como tal, cada ser vivente que se movimentasse pela rua ou dentro de casa tornara-se um alvo".

Quando perguntado sobre o que diria seu filho quanto à operação, o ex-soldado respondeu, "parecia exatamente uma matança maciça de árabes. Assemelhava-se precisamente a um massacre".

Englehart também confirmou que o assalto foi aprazado de maneira a não influir na campanha de reeleição do presidente George Bush. "Era precisamente este evento", ele declarou. "Mesmo no seio das tropas, nas fileiras militares, sabíamos o que estava se passando. Diziam-nos que íamos aguardar ?até? depois da eleição, o pleito americano, antes de entramos em Fallujah. Tínhamos estruturado toda a operação, como se já estivesse pronta para começar. E estávamos aguardando por dois ou três dias que terminasse a eleição... Não obstante, ao evidenciar-se que Kerry perdera, em questão de um dia a operação estava acontecendo. Foi definitivamente o caso. Foi-nos expressamente determinado pelo Pentágono esperar para depois das eleições antes de entrarmos em Fallujah. Foi exatamente o ocorrido".

O documentário produzido pelos italianos também examinou o uso do MK-77, um explosivo incendiário, pelas forças americanas, em composição e efeito quase idêntico ao napalm. O Pentágono tem admitido o emprego da arma durante a invasão de 2003, embora alegue que se recorreu ao artefato químico apenas contra alvos militares iraquianos.

O uso de armas químicas por forças lideradas pelos Estados Unidos é indicativo do caráter criminoso de toda a guerra. Armas químicas são indelevelmente associadas com muitos dos mais bárbaros episódios do século 20 - desde o emprego do gás de mostarda(d) nas trincheiras da I Guerra Mundial ao uso indiscriminado do napalm e do agente laranja(e) na guerra do Vietnam. A história cedo lembrará os crimes da administração Bush ao lado destas atrocidades.

Fallujah: the hidden massacre, produzido por Sigfrid Ranucci e Maurizio Torrealta, está disponível em inglês e pode ser baixado de: http://www.rainewes24.rai.it/ran24/inchiesta/video.asp/

Tradução de Odon Porto de Almeida

Notas do tradutor - (a) Mesmo não inflamado, é nocivo ao meio ambiente. Nos anos 1940s verificou-se que seus resíduos deixados em áreas de treinamento militar nos Estados Unidos matavam aves aquáticas em número apreciável. (b)Termo formado de na(phthene) + palm(itate) componentes químicos do artefato incendiário; tem o aspecto de um gel. O professor de Harvard Louis Fieser (1899-1977) dirigiu as pesquisas que desenvolveram a arma incendiária. Com patente requerida em 1943, foi empregada no final da II Guerra Mundial. O principal fabricante do napalm foi ou é a Dow Chemical Company, poderosa multinacional cuja filial brasileira foi presidida, entre 1968 e 1973, pelo general Golbery do Couto e Silva (1911-1987), o principal ideólogo da ditadura militar implantada no Brasil em 1964. Intensamente usado pelos Estados Unidos em suas operações bélicas no Vietnam. Em grande parte, "os efeitos brutais do napalm motivaram os protestos de milhões de ativistas anti-guerra contra seu emprego naquele país asiático". Na aldeia vietnamita Trang Bang celebrizou-se o fotógrafo Nguyen Kong "Nick" ao retratar a menina Kim Phu,c de 9 anos de idade, correndo em chamas, sem vestes, pois que atingida em cheio pelo napalm. A foto chocou o mundo ao mostrar uma de suas inúmeras vítimas civis inocentes. c) A Cruz Vermelha dos paises muçulmanos, cujo emblema foi reconhecido oficialmente em 1949. (d) Lançado inicialmente pelos alemães contra as tropas franco-britânicas em 22 de abril de 1915. Seu emprego na frente de batalha apanhou estas forças desprevenidas e que não contavam, portanto, com qualquer proteção para a nova arma. e) Mistura de herbicidas contendo a substância cancerígena dioxina. Usada amplamente no Vietnam pelos americanos como desfolhante. Afirmavam os Estados Unidos, então, que era "inofensiva". Ao todo, os ianques empregaram cerca de 72 milhões de litros de produtos químicos no Vietnam, constituindo o agente laranja metade deste volume. Calcula-se que a substância vitima ainda hoje 1 em cada 1.000 vietnamitas, e continua a provocar cânceres, abortos e deformações genéticas. Ainda: estudos publicados em Washington em abril de 2000 revelaram que entre os pilotos da Força Aérea Americana (USAF) e o pessoal de terra da mesma nacionalidade, participantes da Guerra do Vietnam, aumentaram consideravelmente os casos de diabetes. Como o Brasil não podia escapar incólume, há alguns anos guardas do IBAMA e da Polícia Federal apreenderam volumosa carga de produtos químicos "pelo menos semelhantes ao agente laranja" na região do Xingu, pertencente a uma madeireira situada a 1.300 quilômetros de Belém.