As tarefas que enfrenta o movimento contra a guerra
Relatório do World Socialist Web Site e do Socialist
Equality Party
20 de fevereiro de 2003
Raramente um crime de guerra foi planejado tão às
claras diante dos olhos de todo o mundo quanto esta iminente guerra
contra o Iraque. Por vários meses o governo dos Estados
Unidos têm demonstrado sua determinação de
invadir essa nação empobrecida, para colocá-la
sob o domínio militar americano e apoderar-se de seus campos
petrolíferos. Os preparativos militares procedem estritamente
de acordo com o plano. Tudo o mais... as supostas armas de destruição
em massa de Saddam Hussein, para as quais não há
evidência crível, as resoluções e debates
no Conselho de Segurança das Nações Unidas,
os inspetores das Nações Unidas... representa mera
propaganda com o propósito de manipular e ludibriar a opinião
pública.
A guerra contra o Iraque está a ameaçar toda
a humanidade com uma catástrofe. Através de seu
cruel plano de ação, o imperialismo americano agrava
as tensões entre diferentes nacionalidades e religiões.
A conquista do Iraque não satisfará o apetite de
Washington, aguçando-o ainda mais.
A guerra contra o Iraque é o disparo inaugural de uma
irrupção de militarismo que ameaça terminar
em conflagração mundial.
Milhões de pessoas expressarão sua preocupação
e oposição em 15 e 16 de fevereiro. É provável
que a Europa conheça as maiores demonstrações
de sua história. Acolhemos entusiasticamente tais protestos.
Eles demonstram que a maioria esmagadora dos povos de todo o mundo
opõe-se à guerra.
Contudo, estes protestos não alterarão o fato
de que Washington decidiu ir à guerra há bastante
tempo. Enquanto os povos ocupam os logradouros públicos
em números nunca dantes vistos, a contagem regressiva para
a deflagração da guerra procede inexoravelmente.
Bush, Cheney, Rumsfeld e o restantes da cabala guerreira não
se impressionarão com a opinião pública na
América ou no restante do mundo.
Esta inflexibilidade não é devida a qualquer
fortaleza da administração Bush. O presidente dos
Estados Unidos não deve seu cargo a qualquer maioria democrática,
mas à manipulação de votos e a decisões
judiciais politicamente motivadas. Não obstante a incansável
propaganda da mídia, não há entusiasmo pela
guerra entre o povo americano .
Numa coluna publicada no New York Times na última semana,
Thomas Friedman, ele próprio veemente proponente da guerra,
reconheceu que há uma "incrível base restrita
de apoio na América hoje em dia para este audacioso projeto."
Escreveu ele: "Tive oportunidade de viajar por todo o país
desde setembro, e posso afirmar sem nenhuma hesitação
que não há uma platéia a quem eu tenha falado
onde sentisse existir uma maioria favorável à guerra
contra o Iraque".
A vasta oposição à guerra não tem,
todavia, encontrado expressão política organizada.
A administração Bush tem se permitido ignorar a
opinião da maioria porque a paralisia do movimento dos
trabalhadores assegura que não encontrará resistência
política séria.
Nos Estados Unidos, não somente os republicanos, mas
também os dirigentes democratas, estão unanimemente
apoiando a guerra. Na Europa, até mesmo governos e partidos
que rejeitam o agressão militar no momento aceitam os objetivos
da guerra americana como plausíveis e legítimos.
Nenhum deles expõe a real finalidade desta guerra. Mesmo
o governo da Alemanha, que tem sido até aqui o mais claro
em sua oposição a ataques militares, defende a ficção
de armas de destruição em massa iraquianas, assim
legitimando os propósitos de Washington.
Quanto mais a guerra se aproxima, mais diretamente os governos
da Europa,do Oriente Médio e da Ásia convergem no
rumo da guerra. A Alemanha, enquanto ainda se recuse votar em
favor de uma resolução bélica no Conselho
de Segurança da ONU, mantém a permissão aos
Estados Unidos de cruzar seu espaço aéreo e o uso
de bases militares americanas na Alemanha. A França não
mais exclui a guerra "como um último recurso"
e levou seu único porta-aviões ao Oriente Médio.
A Turquia, após prolongada indecisão, franqueou
suas bases militares aos Estados Unidos.
Em oposição a este cenário, protestos
contra a guerra não bastarão. A luta contra a guerra
requer estratégia política conscientemente elaborada
e consistente.
O movimento anti-guerra deve transformar-se num movimento político
poderoso da classe trabalhadora. Isto exige um programa fundamentado
na compreensão das causas e das forças impulsionadoras
por trás desta guerra. Não unidade a qualquer preço,
mas a clareza é uma prerrogativa do momento.
Quais as razões da guerra?
A maior parte dos críticos sabe que esta guerra gira
em torno do petróleo. O porte das reservas de petróleo
iraquiano, a segunda maior reserva do mundo, é sobejamente
documentada. O controle dessas reservas satisfaria a demanda de
energia dos Estados Unidos por longo tempo e aliviaria sua dependência
da cada vez mais instável Arábia Saudita. O fato
de o presidente Bush e de grande parte de sua administração
ter suas raízes na indústria petroleira acentua
o papel crítico do petróleo como causa dos intentos
americanos.
No entanto, o petróleo é apenas um aspecto da
guerra. Os Estados Unidos estão perseguindo meta muito
mais ampla e ambiciosa. Buscam a hegemonia mundial, isto é,
a reorganização política e econômica
. do mundo no interesse do capital americano.
Isto exige que não somente as nações fracas
e subdesenvolvidas, como o Iraque, mas também os rivais
imperialistas da América na Europa ocidental e o Japão
sejam forçados a submeterem-se a sua vontade. A conquista
do Iraque capacitaria os Estados Unidos a dominarem todo o Oriente
Médio com a ajuda de Israel. O domínio dos principais
recursos energéticos mundiais proporcionaria aos Estados
Unidos uma alavanca poderosa contra seus competidores na Europa,
no Japão e na China.
Como eminente marxista do início do século XX
demonstrou, o imperialismo não surge simplesmente da ganância
de um ou de outro governo ou de um grupelho capitalista, mas das
contradições fundamentais inerentes à sociedade
capitalista.
A forma moderna de produção, que liga bilhões
de pessoas ao redor do globo em mútua interdependência,
não pode reconciliar-se com o sistema de estados-nações
e as relações econômicas firmadas na propriedade
privada em que se alicerça o capitalismo. A incompatibilidade
entre a economia mundial e as estados-nações compelem
as potências imperialistas a dividirem vezes seguidas o
mundo pela força.
Foi isto a causa fundamental das duas guerras mundiais que
devastaram grandes partes do globo terrestre no último
século. A Alemanha, cujas forças produtivas dinâmicas
foram sufocadas pelo sistema europeu de estado-nação,
empreendeu duas tentativas de reorganização da Europa.
Hoje, os Estados Unidos estão lançando um desafio
ainda maior: a América busca reorganizar o mundo.
O dilema europeu
A Europa está dividida no tocante à guerra. A
tão badalada "política externa comum"
esfrangalhou-se . Os governos britânico, espanhol e italiano,
e igualmente vários estados do leste europeu, compartilham
seu destino com Bush. Um fator não desprezível nesta
decisão é o desejo de reforçar suas posições
em relação à Alemanha. A França e
a Alemanha, de outra forma, estão tentando refrear as manobras
diplomáticas dos Estados Unidos.
Esta postura nada tem em comum com uma oposição
de princípios à guerra. Nem o governo da Alemanha
nem o da França estão questionando o direito de
as grandes potências atirarem-se contra o Iraque. Bush concordou
com a Resolução l441 das Nações Unidas,
que representa um ultimato ao Iraque, ameaçando-o com "sérias
conseqüências". .
Eles meramente temem que um domínio americano muito
forte prejudiue seu próprios interesses na região.
Em defesa desses interesses, estão cinicamente brincando
com as vidas de dezenas de milhares de iraquianos. Se não
pararem os Estados Unidos, estão pronto para concordar
numa segunda resolução da ONU que sancione a guerra,
de forma que estejam presentes na divisão do botim. Tanto
o presidente francês Chirac quanto o ministro do exterior
alemão Fischer têm feito observações
neste sentido.
A Alemanha e a França são velhas potências
imperialistas que perseguem seus próprios objetivos globais,
conforme demonstrado pela intervenção recente da
França na Costa do Marfim. A agressividade dos Estados
Unidos levou estes dois paises a um dilema. Se eles se dobrarem
aos ditames dos Estados Unidos, renunciarão ao desempenho
de qualquer papel na política internacional por muito tempo.
Se, todavia, eles opuserem alguma resistência, correrão
o risco de graves conflitos, com incalculáveis conseqüências
econômicas e militares.
O outro lado das críticas que fazem aos planos bélicos
dos Estados Unidos compreende a intensificação da
corrida armamentista. A fim de enfrentar Washington, a Europa
tem de revelar-ser capaz de ações militares de sua
própria iniciativa. Desacordos sobre a sorte do Iraque,
constituem apenas o prenúncio de um conflito direto e aberto
entre as próprias potências imperialistas.
Por esta razão, é errado alimentar esperanças
nos governos alemão ou francês, como o fazem alguns
setores do movimento pela paz. Sua conclamação para
que se preste "apoio moral" a Schröder, Fischer
e Chirac contra os Estados Unidos é fútil. Não
se pode lutar contra o poder imperialista apoiando um contra o
outro.
É igualmente errado deixar a decisão de guerra
ou de paz às Nações Unidas. Se os Estados
Unidos conseguirem ou não a sanção oficial
das Nações Unidas quando atacarem o Iraque, o fato
não alterará a natureza imperialista da guerra.
Longe de representar a "comunidade mundial", as Nações
Unidas constituem - a exemplo do Banco Mundial, do Fundo Monetário
Internacional e outras instituições internacionais
- um instrumento das potências imperialistas. São
empregadas por eles para impor sua vontade aos povos do mundo.
A crise da sociedade americana
Quando a Alemanha foi à guerra em 1914 e 1939, ela o
fez não apenas para conquistar novas fontes de matérias
primas, novos mercados e mais "espaço vital".
A guerra era também um meio de escapar à crise doméstica.
Em 1939, Hitler não tinha outra opção exceto
a guerra. A moeda e a economia alemães estavam à
beira do colapso, e produzir-se-ia um choque a que seu regime
dificilmente poderia sobreviver.
Os Estados Unidos encontram-se hoje em situação
semelhante. A unanimidade ostentada pela elite dirigente, inclusive
os líderes democratas, unindo-se em torno de Bush, é
uma expressão de seu desespero político. Eles necessitam
de uma guerra porque não têm resposta para os problemas
econômicos e sociais dilacerantes da sociedade americana.
O colapso da bolha especulativa de Wall Street revelaram os
fundamentos carcomidos em que se fundamentava o crescimento dos
anos 1990. Enormes ativos financeiros eram dilapidados. Bilhões
de dólares fluíam para transações
improdutivas, perdulárias e temerárias. A presunção
de que valores podiam gerar-se independentemente e à parte
do processo produtivo desempenhou profundo efeito na estrutura
da sociedade e na natureza da elite dirigente.
O comportamento das corporações assumiu crescente
caráter criminoso. Suas transações, direcionadas
quase exclusivamente em prol do enriquecimento particular de altos
executivos e indivíduos que tinham acesso a informações
sigilosas das corporações (insiders), importavam
numa descarada pilhagem da sociedade. Enquanto pequena camada
superior acumulava fabulosa riqueza, as amplas massas da população
trabalhadora viam sua situação estagnar ou mesmo
deteriorar-se..
A desigualdade social nos Estados Unidos é mais acentuada
do que a de outro qualquer país altamente desenvolvido.
A receita englobada das 13.000 famílias mais ricas é
maior que a renda total de 20 milhões das famílias
mais pobres. Abaixo da superfície, a sociedade americana
é devastada por implacável guerra de classes que
não encontra expressão política aberta em
razão do domínio de ambos os partidos tradicionais
- o Democrata e o Republicano, semelhantes - às escâncaras
defensores dos interesses da oligarquia dirigente.
Vastos setores do movimento pela paz fazem vista grossa à
conexão entre a febre guerreira de Washington e a crise
da sociedade americana. Todavia, é precisamente isto que
constitui a força impulsora por trás do perigo da
guerra, e também o motivo primordial para superá-lo.
O único meio de pôr um paradeiro aos fomentadores
de guerra é mobilizar a classe trabalhadora.
Uma estratégia política conta
a guerra
Esta análise histórica e de classe das causas
e forças impulsoras da guerra conduzem a um número
fundamental de conclusões, sem as quais está o movimento
anti-guerra condenado ao fracasso.
* Os que se opõem à guerra devem voltar-se para
a população trabalhadora, que se coloca em oposição
de princípio a todo o sistema capitalista de exploração
e de pilhagem imperialista, e percebe o declínio do sistema
diariamente, na forma de desemprego, cortes de verbas sociais
e assaltos aos direitos democráticos. A oposição
à guerra deve ligar-se a um programa voltado para questões
sociais candentes como emprego, renda, educação,
assistência médica, habitação e defesa
dos direitos democráticos.
* Os aliados dos oponentes europeus à guerra não
estão nos governos desse continente, que regateiam com
a administração Bush, mas com mais razão
com o povo trabalhador da América. Qualquer aliança
com governos europeus separa o movimento anti-guerra das classes
trabalhadoras tanto americanas quanto européias. Seria
uma aliança com governantes - por exemplo, França
e Alemanha - que estão eles próprios executando
brutais ataques aos direitos democráticos e às condições
sociais.
* O movimento contra a guerra precisa internacionalizar-se.
Deve unir os trabalhadores de todos os paises, cores e religiões
contra o inimigo comum, e rejeitar todas as tentativas de dividir
a classe trabalhadora.
* O movimento deve ser politicamente independente. Não
deve subordinar-se a partidos que fiquem com uma perna ou ambas
no campo do sistema burguês - isto diz respeito não
apenas aos democratas dos Estados Unidos, mas também aos
sociais democratas, os verdes, o PDS alemão, o Parido Comunista
da França e a Democracia da Esquerda na Itália.
Um novo partido do trabalhadores será indispensavelmente
estruturado na base de um programa socialista internacional.
O Comitê Internacional da Quarta Internacional criou
o World Socialist Web Site na qualidade de instrumento para desenvolver
tal partido. Diariamente o WSWS analisa os eventos políticos
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