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O Partido dos Trabalhadores (PT) expulsa legisladores de 'esquerda'

Por Bill Vann
18 de Dezembro de 2003

Nas vésperas do primeiro aniversário da formação de seu primeiro governo o Partido dos Trabalhadores (PT) levou a cabo a expulsão de uma senadora de expressão nacional e três deputados, em virtude de oposição às políticas econômicas e sociais direitistas introduzidas sob orientação do presidente Luiz Inácio "Lula" da Silva.

Por uma margem superior de dois votos a um, o diretório nacional petista de 84 membros votou no domingo pela expulsão da senadora Heloisa Helena e de três deputados, Luciana Genro, João "Babá" Batista Araújo e João Fontes.

Heloisa Helena foi acusada de votar 19 vezes contra medidas apoiadas pelo governo no curso de um ano. Ela e outros membros do que é conhecido no Brasil como ala radical ou "xiita" do PT tem se chocado com a liderança partidária desde a campanha presidencial de 2002.À época, opuseram-se à escolha por Lula do nome de José Alencar para vice-presidente, o maior empresário do ramo têxtil do país, e ao mesmo tempo dirigente de um dos mais direitistas partidos brasileiros e de uma igreja evangélica.

Os argumentos formais para a expulsão foram os votos dos legisladores contra a chamada reforma do sistema previdenciário exigida pelo Fundo Monetário Internacional—FMI e promovida pela administração Lula. As modificações do sistema de pensões, que estão à espera da ratificação final do Senado, cortariam benefícios dos trabalhadores e tornariam os fundos de pensão acessíveis à privatização.

Os cortes propostos no sistema de pensões provocaram demonstrações maciças de trabalhadores contra o governo no início do ano. Quando o antecedssor de Lula, Fernando Henrique Cardoso, propôs a mesma "reforma" previdenciária como parte das negociações com o FMI em 1999, o PT denunciou a proposta como revogação ilegal dos direitos dos trabalhadores. O governo do PT agora perfilhou integralmente a mesma reforma, que aumenta a idade para aposentadoria, corta benefícios futuros previdenciários dos trabalhadores e taxa as pensões dos aposentados.

Chegando ao poder com a promessa de extensas reformas sociais, a administração Lula aderiu estritamente ao modelo de austeridade prescrito pelo FMI que o PT denunciava quando era na oposição.

É mais do que coincidência que um dia após as expulsões, o FMI anuncie a decisão de conceder ao Brasil a prorrogação de um acordo de empréstimo de 34 bilhões de dólares com novos fundos no valor de 6,6 bilhões de dólares.

"A resposta da nova administração a pressões financeiras foi tanto ambiciosa quanto corajosa, acomodando disciplina fiscal e monetária à busca resoluta de metas sociais chaves a fim de amenizar a pobreza e reforçar a rede de segurança social", afirmou Horst Koehler, presidente do FMI.

Na realidade, a determinação do governo do PT de agradar o FMI e o mercado financeiro internacional frustrou até mesmo iniciativas mínimas de melhoria das desesperadoras condições que enfrentam a classe trabalhadora e os pobres no Brasil.

Em troca do apoio do FMI e para contrabalançar temores da parte dos investidores estrangeiros de que o governo do PT negligenciaria a dívida externa, a administração petista prometeu reservar 4,25% do produto bruto nacional—no montante de 15 bilhões de dólares. O destaque desta impressionante quantia a fim de assegurar o pagamento de juros à banca internacional virtualmente impede qualquer iniciativa social significativa.

A expulsão dos quatro legisladores é sinal claro de que o governo do PT não se desviará desta política e um aviso aos outros de que não tolerará qualquer oposição a novos ataques à classe trabalhadora brasileira.

No ano vindouro, Lula, que começou sua carreira política como dirigente sindical metalúrgico, prometeu solenemente implementar a "reforma" da legislação trabalhista que despojará os sindicatos de muitos dos atuais direitos e facilitará a dispensa de operários pelos empregadores, reduzirá salários e eliminará benefícios. O objetivo declarado destas medidas é tornar as empresas brasileiras mais competitivas no mercado mundial.

Para introdução de tais políticas, o partido tem confiado num regime partidário sempre mais rígido, sob o qual aqueles que ousam alçar a voz em crítica das políticas governamentais são ameaçados de ação disciplinar.

O diário brasileiro Folha de São Paulo comentou que tais expulsões somente têm sido aplicadas contra oponentes de esquerda dentro do partido. Aqueles que têm violado a disciplina, alinhando-se com a direita não têm enfrentado conseqüências severas. Desta forma, em 1993 quando Luiza Erundina, ex-prefeita de São Paulo, aceitou convite do então presidente Itamar Franco para participar de seu governo, desrespeitando decisão da liderança do PT, apenas recebeu uma suspensão, cancelada logo que deixou sua pasta ministerial.

Semelhantemente, em 1996, Eduardo Jorge, deputado federal por S.Paulo, votou com a direita pela aprovação de legislação financeira a que o PT se opunha. O partido meramente publicou uma declaração condenando o voto, repetido pelo parlamentar quando a matéria retornou para ratificação.

O governo petista foi eleito o ano passado prometendo a criação de 10 milhões de novos empregos e a redução do nível de desigualdade social que está entre os piores do mundo. Desde que assumiu o poder, ele tem presidido um inflexível crescimento do desemprego e acentuado declínio no padrão de vida da classe trabalhadora e da população pobre brasileiros.

Em São Paulo, a maior cidade do Brasil e seu centro financeiro e industrial, o desemprego atingiu o recorde de 20,4% em outubro. Enquanto isto, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou recentemente informe revelando que o número de pessoas desempregadas no país a procurar emprego subiu a 21,7 % até esta altura do ano.

A renda real dos trabalhadores brasileiros declinou pelo menos 15% este ano, como resultado do aumento dos preços e da desvalorização da moeda, e também por causa da oposição governamental a aumentos salariais.

Outro evidente indicador do declínio das condições sociais sob a administração petista é um recente informe do IBGE demonstrando que o número de jovens entre 10 e 14 anos nas cidades brasileiras forçados a trabalharem para ajudar suas famílias subiu 50% entre janeiro e setembro do corrente ano.

Um dos programas mínimos defendidos por Lula ao assumir o governo, o "Fome Zero", visando à distribuição de alimentos para os pobres, ainda não se consolidou. Cerca de 40 milhões de brasileiros passam fome num país onde o salário mínimo equivale a somente 80 dólares e quase a metade da população vê-se forçada a subsistir com esta importância.

Os três deputados expulsos revelaram que planejam fundar novo partido e afirmam contar com o apoio de 7000 membros. Helena não indicou se apoiaria o movimento, declarando apenas que tinha a intenção de continuar lutando com os de dentro e os de fora do PT. Era uma figura proeminente no PT, em parte devido a seu passado de filha de trabalhador pobre migrante do empobrecido estado de Alagoas.

A expulsão do domingo, coincidiu com um anúncio do Partido Democrático Trabalhista—PDT, liderado por Leonel Brizola, rompendo com a coalizão liderada pelo PT sobre o que ele acusava a governamental "subserviência aos interesses do capital financeiro internacional."

O resultado final é que o PT tem se tornado ainda mais dependente dos partidos direitistas que estiveram antes associados à ditadura militar, na medida em que executa políticas econômicas e sociais com que essas tendências políticas concordam.

A ameaça de expulsão dos quatro legisladores esteve pendente por vários meses e inspirou uma campanha internacional pela esquerda trabalhista britânica, pelos verdes e personalidades como Noam Chomsky, nos Estados Unidos, e Ken Loach, cineasta britânico.

Os apelos advertiam o PT de que efetuar as expulsões "sugeriria que o PT como partido renunciara à sua altiva tradição de democracia, de pluralismo e de tolerância" e conclamava-o a "reafirmar o papel do PT como baliza das esperanças de todos aqueles que no mundo necessitam de labutar ombro a ombro na realização de nosso sonho comum de que outro mundo é possível."

Tais apelos distorciam grosseiramente o caráter de classe e político do PT, favorecendo a tentativa de usar a pessoa de Lula para acobertar a prática de políticas direitistas de um governo comprometido na defesa dos interesses capitalistas no Brasil.

Ao vencer o PT as eleições em outubro de 1991, o World Socialist Web Site esboçou a direção invariável do partido para a direita e advertiu:

"O que tem sido cada vez mais explícito é que, a despeito dos antecedentes de Lula, o Partido dos Trabalhadores nem é um partido de trabalhadores nem em sua composição ou programa representa seus interesses. Constituído nos anos 1980s por um setor de liderança sindical, elementos da Igreja Católica, professores universitários e estudantes anteriormente radicais, tem caminhado firmemente para a direita no decurso de três malogradas campanhas presidenciais iniciadas em 1989.

"Tem modificado sua política em tal amplitude que no presente emparelha com uma secção definida da burguesia brasileira. Esta intersecção é o que explica a ausência de agitação nas casamatas do Brasil contra a posse do Lula."

Nossa advertência tem sido cabalmente confirmada. Lula e o PT são instrumentos das elites dirigentes brasileiras e das instituições financeiras internacionais, impondo o pesado ônus da crise do Brasil nas costas dos trabalhadores e dos pobres das cidades e do campo. As últimas expulsões expressam tão-somente o resultado lógico de uma política que está criando as condições para uma confrontação inevitável entre o governo do PT e as massas trabalhadoras brasileiras.